Capítulo IV – Os fatores inflacionários
Segunda parte
O boom inflacionário: 1921—1929
IV – Os fatores inflacionários
A maioria dos autores que tratam da depressão de 1929 comete o mesmo erro grave que aflige os estudos econômicos em geral — o uso de estatísticas históricas para “testar” a validade da teoria econômica. Tentamos mostrar que essa metodologia é radicalmente defeituosa quando se trata de ciência econômica, e que teorias só podem ser confirmadas ou refutadas em bases anteriores. Os fatos empíricos entram na teoria, mas apenas no nível de axiomas básicos, e sem qualquer relação com os “fatos” históricos—estatísticos usados pelos economistas contemporâneos. O leitor terá de procurar em outras obras — principalmente nas de Mises, de Hayek e de Robbins — um desenvolvimento e uma defesa dessa epistemologia. Aqui basta dizer que as estatísticas nada podem provar, porque elas refletem a operação de diversas forças causais. Por exemplo, “refutar” a teoria austríaca de que o boom começa porque as taxas de juros podem não ter sido reduzidas num certo caso equivale a errar o alvo. Isso simplesmente significa que outras forças — talvez um aumento no risco, talvez a expectativa de um aumento de preços — foram fortes o bastante para elevar as taxas de juros. Mas a análise austríaca do ciclo econômico continua a operar independentemente dos efeitos de outras forças. O que é importante é que as taxas de juros são mais baixas do que teriam sido sem a expansão de crédito. Da análise teórica sabemos que esse é o efeito de toda expansão de crédito bancário; mas estatisticamente nada podemos fazer — não podemos usar as estatísticas para estimar qual teria sido a taxa de juros. As estatísticas só podem registrar acontecimentos passados; elas não têm como descrever acontecimentos possíveis mas não realizados.
Analogamente, a designação da década de 1920 como período de boom inflacionário pode perturbar aqueles que julgam que veem a inflação como um aumento de preços. Os preços geralmente permaneceram estáveis e chegaram até a cair um pouco durante aquele período. Mas temos de atentar para o fato de que havia duas grandes forças agindo sobre os preços durante a década de 1920 — a inflação monetária, que levou os preços para cima, e o aumento de produtividade, que diminuiu custos e preços. Numa sociedade em que há um livre mercado puro, o crescimento da produtividade aumentará a oferta de bens e reduzirá os preços e os custos, disseminando os frutos de um padrão de vida mais elevado a todos os consumidores. Mas essa tendência foi contrabalançada pela inflação monetária, que serviu para estabilizar os preços. Essa estabilização era e é um objetivo desejado por muitos, mas ela (a) impediu que os frutos de um padrão de vida mais elevado fossem disseminados tão amplamente quanto seriam num mercado livre; e (b) geraram o boom e a depressão do ciclo de negócios. Afinal, um traço distintivo do boom inflacionário é que os preços são mais altos do que seriam num mercado livre e desimpedido. Mais uma vez, as estatísticas não conseguem descobrir os processos causais em funcionamento.
Se estivéssemos escrevendo uma história econômica do período que vai de 1921 a 1923, teríamos de tentar isolar e explicar todos os feixes causais do tecido de estatísticas e dos demais acontecimentos históricos. Por exemplo, analisaríamos diversos preços, a fim de identificar os efeitos da expansão do crédito, de um lado, e do aumento da produtividade, de outro. E tentaríamos rastrear os processos do ciclo econômico, junto com todas as demais forças econômicas de mudança (como as alterações na demanda por produtos agrícolas, ou por novas indústrias etc.) que incidiram sobre a atividade produtiva. Mas nossa tarefa neste livro é muito mais modesta: é apontar as forças especificamente cíclicas em jogo, mostrar como o ciclo foi gerado e perpetuado durante o boom, e como o processo de ajuste foi impedido, assim agravando a depressão. Como o governo e o sistema bancário por ele controlado são integralmente responsáveis pelo boom (e por conseguinte por terem gerado a depressão subsequente), e como o governo é amplamente responsável por agravar a depressão, temos de necessariamente nos concentrar nesses atos de intervenção governamental na economia. Um mercado desimpedido não geraria booms e depressões, e, se tivesse de enfrentar uma depressão produzida por uma intervenção anterior, ele rapidamente eliminaria a depressão e erradicaria particularmente o desemprego. Nossa preocupação, portanto, não é tanto com o estudo do mercado, mas com o estudo das ações do culpado por gerar e intensificar a depressão — o governo.
A definição da oferta monetária
A moeda é o meio geral de troca. A partir dessas bases, os economistas definem geralmente a moeda como a oferta de dinheiro e de depósitos à vista nos bancos comerciais. Estes são os meios de pagamento: a moeda em ouro ou em papel (nos Estados Unidos, basicamente Notas do Federal Reserve), ou depósitos sujeitos à conferência nos bancos comerciais. Contudo, essa definição é na verdade inadequada. De jure, apenas o ouro durante a década de 1920, e hoje apenas papéis do governo, como as Notas do Federal Reserve são moeda padrão ou de curso forçado. Os depósitos à vista somente funcionam como moeda porque são considerados substitutos da moeda perfeitos, isso é, eles se prestam imediatamente a tomar o lugar do dinheiro, sendo equivalentes a ele. Como cada titular acredita poder converter seus depósitos à vista em moeda de curso forçado de igual valor, esses depósitos circulam como equivalentes inquestionados do dinheiro vivo, valendo tanto quanto a moeda mesma para fazer pagamentos. Porém, basta que desapareça a confiança em um banco, e que um banco vá à falência, para que seus depósitos à vista não sejam mais considerados equivalentes da moeda. O traço distintivo de um substituto da moeda é, portanto, que as pessoas creem que ele pode ser convertido em moeda de igual valor nominal, à vista, a qualquer momento. Mas, a partir dessa definição, os depósitos à vista não são de jeito nenhum o único substituto da moeda — ainda que sejam o mais importante. Eles não são os únicos constituintes da oferta monetária em sentido mais amplo.[1]
Nos últimos anos, cada vez mais economistas começaram a incluir depósitos a prazo em suas definições de oferta monetária. Afinal, um depósito a prazo também pode ser convertido à vista por seu valor nominal em moeda, e portanto merece o status de moeda. Os oponentes afirmam (1) que um banco pode legalmente demandar uma espera de trinta dias antes de resgatar um depósito a prazo em dinheiro, e que portanto o depósito não é estritamente conversível sob demanda, e (2) que um depósito a prazo não é um verdadeiro meio de pagamento, porque não é facilmente transferível: não se pode passar um cheque coberto por ele, e o proprietário tem de apresentar sua caderneta bancária para poder fazer um saque. Contudo, essas considerações não têm importância. Na realidade, o aviso prévio de trinta dias é letra morta; ele praticamente nunca é imposto, e, se fosse, sem dúvida o banco enfrentaria uma corrida imediata e devastadora.[2] Todo mundo age como se seus depósitos a prazo fossem resgatáveis à vista, e os bancos pagam seus depósitos do mesmo jeito que resgatam os depósitos à vista. A necessidade de retirada em pessoa é apenas um pormenor; pode demorar um pouco mais ir até o banco e retirar o dinheiro do que pagar em cheque, mas a essência do processo é a mesma. Em ambos os casos, a origem do pagamento monetário é um depósito bancário.[3] Outra distinção que já foi sugerida é que os bancos pagam juros sobre depósitos a prazo, mas não à vista, e que a moeda não pode gerar juros. Mas isso passa por cima do fato de que os bancos pagaram sim juros sobre depósitos à vista durante o período que estamos investigando, e continuaram a pagá-los até que essa prática foi criminalizada em 1933.[4] Naturalmente, pagava-se juros mais altos sobre depósitos a prazo, a fim de induzir os depositantes a passar a usar a conta que demandava menos reservas.[5]Esse processo levou alguns economistas a distinguir entre os depósitos a prazo nos bancos comerciais e aqueles nas caixas econômicas, já que os bancos comerciais são os que lucram diretamente com a mudança. Contudo, as caixas econômicas também lucram quando um depositante à vista fecha sua conta num banco comercial e a transfere para a caixa econômica. Portanto, não há diferença real entre as categorias de depósitos a prazo; ambos são aceitos como substitutos da moeda e, nos dois casos, os depósitos a pagar resgatáveis à vista de facto muitas vezes são o dinheiro que está no cofre, enquanto o resto representa empréstimos e investimentos que foram inchar a oferta monetária.
A fim de ilustrar o modo como uma caixa econômica incha a oferta monetária, suponha que Jones transfira seu dinheiro de uma conta corrente em um banco comercial para uma caixa econômica, fazendo um cheque de US$ 1.000 para sua conta poupança. Até onde Jones sabe, ele simplesmente tem US$ 1.000 numa conta poupança numa caixa econômica e não numa conta corrente num banco comercial. Mas agora a caixa econômica possui US$ 1.000 na conta corrente de um banco comercial e usa esse dinheiro para fazer empréstimos ou para investir em empresas. O resultado é que agora há US$ 2.000 de efetiva oferta monetária onde antes havia apenas US$ 1.000 — US$ 1.000 guardados num depósito de poupança e outros US$ 1.000 emprestados à indústria. Assim, em qualquer estoque de oferta monetária, o total de depósitos a prazo, em poupança e também nos comerciais deveria ser acrescentado ao total de depósitos à vista.[6]
Mas se admitirmos a inclusão de depósitos a prazo na oferta monetária, panoramas ainda mais amplos abrem-se diante de nossos olhos, porque assim todos os títulos conversíveis em dinheiro à vista constituem parte da oferta monetária, inchando a oferta monetária sempre que as reservas em dinheiro forem menores do que 100%. Nesse caso, as cotas das associações de poupança-e-empréstimo (conhecidas na década de 1920 como associações de construção-e-poupança), as cotas e os depósitos a prazo das associações de crédito e as obrigações de resgate das companhias de seguros de vida também fazem parte da oferta monetária total.
Imediatamente se vê que as associações de poupança-e-crédito contribuem para a oferta monetária; elas se distinguem das caixas econômicas (excetuando sua concentração em empréstimos imobiliários) apenas por ser financiadas por cotas de ações e não por depósitos. Mas essas “ações” são resgatáveis à vista por seu valor nominal em dinheiro (qualquer aviso prévio é letra morta) e portanto devem ser consideradas parte da oferta monetária. As associações de poupança-e-empréstimo cresceram num ritmo acelerado durante a década de 1920. As associações de crédito também são financiadas em grande medida por cotas resgatáveis; sua importância era desprezível durante o período do boom inflacionário, pois seus ativos totais somavam apenas US$ 35 milhões em 1929. Pode-se observar, porém, que elas praticamente iniciaram suas operações em 1921, com o incentivo de Edward Filene, filantropo de Boston.
As obrigações de resgate de seguro de vida são nossa sugestão mais controversa. Não se pode duvidar, porém, que elas supostamente podem ser resgatadas por seu valor nominal à vista, e devem, portanto, segundo nossos princípios, ser incluídas na oferta monetária geral. Para nossos fins, as principais diferenças entre essas obrigações e as outras listadas anteriormente são que o proprietário da apólice é incentivado por toda espécie de propaganda a não converter seus títulos em dinheiro, e que a companhia de seguro de vida não mantém praticamente nenhum de seus ativos em dinheiro — mais ou menos algo entre 1% e 2%. É possível estimar estatisticamente as obrigações de resgate por meio das reservas totais das apólices das companhias de seguro de vida, excetuando os empréstimos a pagar, porque as apólices que os proprietários usaram como garantia para tomar empréstimos junto à companhia seguradora não estão sujeitas a um saque imediato.[7] Os valores de resgate das companhias de seguros de vida cresceram rapidamente durante a década de 1920.
É verdade que, dentre esses constituintes da oferta monetária, os depósitos à vista são os mais fáceis de transferir, e portanto são aqueles usados de maneira mais imediata para fazer pagamentos. Mas isso é uma questão formal; as barras de ouro não eram menos moeda do que as moedas de ouro, mas eram usadas para menos transações. As pessoas mantém suas contas mais ativas em depósitos à vista, e seus saldos menos ativos em contas a prazo, poupança etc; contudo, elas podem sempre fazer transferências rapidamente, e à vista, de qualquer uma dessas contas para outra.
Inflação da oferta monetária, 1921—1929
Geralmente se acredita que o grande boom da década de 1920 começou por volta de julho de 1921, após um ano ou mais de forte recessão, e terminou por volta de julho de 1929. A produção e a atividade econômica começaram a cair em julho de 1929, ainda que o famoso crash da bolsa tenha acontecido em outubro daquele ano. A tabela 1 mostra a oferta monetária total do país, começando com US$ 45,3 bilhões em 30 de junho de 1921, e vai calculando o total, junto com seus principais constituintes, mais ou menos a cada seis meses a partir daquele momento.[8]
TABELA 1
OFERTA MONETÁRIA TOTAL DOS ESTADOS UNIDOS, 1921?1929*
(em bilhões de dólares)
Data |
Moeda Fora dos Bancos |
Depósitos à Vista Corrigidos |
Depósitos a prazo |
Total Corrigido de Depósitos e Moeda Fora dos Bancos |
Capital de Poupança e Empréstimos |
Reservas Líquidas de Apólices de Seguros de Vida |
Oferta Monetária Total |
Mudança Percentual Anual em Relação ao Ano Anterior |
|
(1) |
(2) |
(3) |
(4) |
(5) |
(6) |
(7) |
(8) |
1921 ? 30 de junho |
3,68 |
17,11 |
16,58 |
37,79 |
1,85 |
5,66 |
45,30 |
*** |
1922 ? 30 de junho |
3,35 |
18,04 |
17,44 |
39,00 |
2,08 |
6,08 |
47,16 |
4,1 |
1923 ? 30 de junho |
3,74 |
18,96 |
19,72 |
42,75 |
2,42 |
6,62 |
51,79 |
9,8 |
1923 ? 31 de dezembro |
3,73 |
19,14 |
20,38 |
43,50 |
2,63 |
6,93 |
53,06 |
4,9 |
1924 ? 30 de junho |
3,65 |
19,41 |
21,26 |
44,51 |
2,89 |
7,27 |
54,67 |
6,1 |
1924 ? 31 de dezembro |
3,70 |
20,90 |
22,23 |
47,08 |
3,15 |
7,62 |
57,85 |
11,6 |
1925 ? 30 de junho |
3,57 |
21,38 |
23,19 |
48,32 |
3,48 |
8,05 |
59,86 |
7,1 |
1925 ? 31 de dezembro |
3,77 |
22,29 |
23,92 |
50,30 |
3,81 |
8,48 |
62,59 |
9,2 |
1926? 30 de junho |
3,60 |
22,00 |
24,74 |
50,57 |
4,09 |
8,95 |
63,62 |
3,3 |
1926 ? 31 de dezembro |
3,83 |
21,72 |
25,33 |
51,12 |
4,38 |
9,45 |
64,96 |
4,2 |
1927 ? 30 de junho |
3,56 |
21,98 |
26,46 |
52,23 |
4,70 |
9,98 |
66,91 |
6,0 |
1927 ? 31 de dezembro |
3,70 |
22,73 |
27,37 |
54,08 |
5,03 |
10,50 |
69,61 |
8,1 |
1928 ? 30 de junho |
3,62 |
22,26 |
28,53 |
54,68 |
5,39 |
11,05 |
71,12 |
4,4 |
1928 ? 31 de dezembro |
3,59 |
23,08 |
28,68 |
55,64 |
5,76 |
11,60 |
73,00 |
5,2 |
1929 ? 30 de junho |
3,64 |
22,54 |
28,61 |
55,17 |
6,00 |
12,09 |
73,26 |
0,7 |
* A Coluna 1, moeda fora dos bancos, inclui moedas de ouro, Notas do Tesouro, Notas do Federal Reserve, e várias notas menores; como de hábito, exclui-se a moeda em poder dos bancos, porque ela é usada como reserva de parte da oferta monetária em circulação. A Coluna 3, depósitos a prazo, inclui as contas nos bancos comerciais e nas caixas econômicas, e no Postal Saving System [Sistema de Poupança dos Correios]. A Coluna 4 mostra o total das três anteriores mais a quantidade desprezível de depósitos do Governo dos Esados Unidos, a fim mostrar o total de depósitos e de moeda em circulação. A Coluna 5 é o capital de cotas de associações de poupança-e-empréstimo. A Coluna 6 são as reservas de apólices menos os empréstimos contra apólices das companhias de seguros de vida. A Coluna 7 mostra a oferta monetária total, somando as Colunas 4, 5 e 6. A Coluna 8 mostra a mudança percentual anual da Coluna 7 a partir da data anterior. As estatísticas para moeda e para depósitos podem ser encontradas em Conselho de Governadores do Federal Reserve System, Banking and Monetary Statistics (Washington, D.C.: Federal Reserve Board, 1943), pp. 34,passim. Os dados para as associações de poupança-e-empréstimo estão disponíveis em Historical Statistics of the U.S., 1789?1945 (Washington, D.C.: U.S. Department of Commerce, 1949), p. 175, e os dados para seguros de vida no Life Insurance Year Book.
Ao longo do período inteiro do boom, vemos que a oferta monetária cresceu em US$ 28 bilhões, um aumento de 61,8% ao longo de um período de oito anos. Isso equivale a um aumento médio anual de 7,7%, um grau de inflação bastante considerável. Os depósitos bancários totais aumentaram 51,1%, as cotas das associações de poupança e empréstimos 224,3%, e as reservas líquidas de apólices de seguro de vida, 113,8%. Os principais aumentos aconteceram em 1922—1923, no fim de 1924, no fim de 1925 e no fim de 1927. A abrupta estabilização aconteceu precisamente no momento em que esperaríamos — na primeira metade de 1929, quando os depósitos bancários diminuíram e a oferta monetária total permaneceu quase constante. Para gerar o ciclo econômico, a inflação precisa acontecer por meio de empréstimos às empresas, e a década de 1920 está em conformidade com as especificações. Não houve qualquer expansão no papel-moeda em circulação, que no início do período totalizava US$ 3,68 bilhões e, no final, US$ 3,64 bilhões. Toda a expansão monetária se deu por meio de substitutos da moeda, que são produtos da expansão monetária. Somente uma quantidade desprezível dessa expansão veio da compra de títulos do governo: a vasta maioria representava empréstimos e investimentos privados. (Um “investimento” no título de uma empresa é, economicamente, um empréstimo à empresa no mesmo sentido em que os créditos de prazo mais curto denominados “empréstimos” nos extratos bancários.) Os títulos do governo americano em poder dos bancos subiram de US$ 4,33 bilhões para US$ 5,50 bilhões ao longo do período, enquanto o total de títulos do governo em poder das companhias de seguros de vida na verdade caiu de US$ 1,39 bilhão para US$ 1,36 bilhão. Os empréstimos das associações de poupança-e-empréstimos estão quase todos em imóveis privados, e não em obrigações do governo. Assim, apenas US$ 1 bilhão do novo dinheiro não contribuía para gerar o ciclo, e representava investimentos em títulos do governo; quase todo esse crescimento desprezível aconteceu nos primeiros anos, entre 1921 e 1923.
A outra forma de empréstimo bancário que não contribui para gerar o ciclo econômico é o crédito ao consumidor, mas o aumento de empréstimos aos consumidores durante a década de 1920 ficou em no máximo umas poucas centenas de milhões de dólares; a maior parte do crédito ao consumidor foi dado por instituições não-monetárias.[9]
Como vimos, a inflação não é precisamente o aumento da oferta monetária total; é o aumento da oferta monetária que não consiste num aumento do ouro, isso é, um aumento que não é coberto pela moeda commodity padrão. Nas discussões sobre a década de 1920, muito se fala sobre a “inflação do ouro”, dando a entender que a expansão monetária foi simplesmente o resultado natural de um aumento da oferta de ouro nos EUA. Todavia, o aumento das reservas totais de ouro do Federal Reserve e do Tesouro foi de apenas US$ 1,16 bilhão de 1921 a 1929. Isso cobre apenas uma parte desprezível da expansão monetária total — a inflação dos dólares.
TABELA 2
TOTAL DE DÓLARES E TOTAL DE RESERVAS DE OURO*
(em bilhões de dólares)
Total de Créditos em Dólar | Total de Reservas de Ouro | Total de Dólares sem Cobertura | |
Junho de 1921 | 44,7 | 2,6 | 42,1 |
Junho de 1929 | 71,8 | 3,0 | 68,8 |
*”Total de créditos em dólar” é a “oferta monetária total” da Tabela 1 menos a parcela de moeda em circulação que não constitui créditos em dólar contra as reservas de ouro: isso é, moedas de ouro, certificados de ouro, dólares de prata e certificados de prata. “Total de reservas de ouro” é o número oficial para as reservas de ouro menos o valor dos certificados de ouro em circulação, e é igual ao “total de reservas” oficial dos bancos do Federal Reserve. Como os certificados de ouro correspondiam a obrigações, e como sabia-se que eles estavam cobertos por 100% de ouro, essa quantidade está excluída de nossas reservas para créditos em dólar, e, analogamente, os certificados em ouro estão aqui excluídas do total de “dólares”. A prata padrão e os créditos em prata padrão foram excluídos por não ser créditos de ouro, ao passo que uma moeda de ouro é ouro e crédito de ouro. Ver Banking and Monetary Statistics (Washington, D.C.: Federal Reserve System, 1943), pp. 544?45, 409, e 346?48.
A Tabela 2 compara o total de títulos de dólares emitidos pelo governo dos Estados Unidos, pelo sistema bancário por ele controlado, e por outras instituições monetárias (a oferta monetária total) com o total de reservas de ouro no banco central (a oferta total de ouro que poderia ser usada para preservar as garantias de resgate de dólares à vista). A diferença absoluta entre o total de dólares e o valor total das reservas de ouro equivale à quantidade de recibos “falsificados” de ouro que foram emitidos e o grau em que o sistema bancário estava falido de facto, ainda que não de jure. Há uma comparação dessas quantidades no começo e no final do período do boom.
O total de dólares descobertos ou “falsificados” aumentou de US$ 42,1 bilhões para US$ 68,8 bilhões no período de oito anos, um aumento de 63,4%, ao passo que as reservas de ouro aumentaram 15%. Assim, vemos que essa medida corrigida da inflação traz uma estimativa ainda mais alta do que a estimativa sem a consideração do influxo de ouro. O influxo de ouro não pode, portanto, servir de desculpa para nenhuma parte da inflação.
Gerando a inflação, parte 1: reservas mínimas
Quais fatores foram responsáveis pelos 63% de inflação da oferta monetária durante a década de 1920? Se o papel moeda em circulação simplesmente não aumentou, a expansão inteira aconteceu por meio de depósitos bancários e de outros créditos monetários. O elemento mais importante na oferta monetária é a base de crédito dos bancos comerciais, porque mesmo que as caixas econômicas, as associações de poupança e empréstimos e as companhias de seguro de vida podem inchar a oferta monetária, elas só podem fazer isso com base nos depósitos do sistema bancário comercial. As obrigações das outras instituições financeiras são resgatáveis em depósitos de bancos comerciais e também em papel moeda, e todas essas instituições mantêm suas reservas nos bancos comerciais, que portanto serve de base de crédito para as demais instâncias criadoras de moeda.[10] A devida política do governo federal, então, seria apertar as restrições de política monetária que incidem sobre os bancos comerciais a fim de contrabalançar a expansão do crédito nas outras áreas; isso é, sem contar a reforma mais radical, que seria submeter todas essas instituições a manter 100% de reservas em dinheiro.[11]
Que fatores, então, foram responsáveis pela expansão do crédito dos bancos comerciais? Como os bancos eram e são obrigados a manter uma porcentagem mínima de reservas de seus depósitos, existem três fatores possíveis — (a) uma redução das exigências de reservas mínimas, (b) um aumento de reservas totais, e (c) um esgotamento de reservas que anteriormente estavam acima da reserva mínima exigida por lei.
Sobre o problema do excesso de reservas, infelizmente não há estatísticas disponíveis para antes de 1929. Contudo, é de conhecimento geral que praticamente inexistia excesso de reservas antes da Grande Depressão, porque os bancos tentavam emprestar o máximo que podiam, ficando no limite das reservas mínimas. Os dados de 1929 confirmam essa opinião.[12] Podemos descartar com segurança qualquer possibilidade de que os recursos para a inflação tenham vindo do esgotamento de reservas que anteriormente estavam em excesso.
Podemos portanto voltar-nos para os outros dois fatores. Qualquer redução das reservas mínimas claramente geraria um excesso de reservas, e com isso incentivaria a múltipla inflação do crédito bancário. Durante a década de 1920, porém, as reservas mínimas dos bancos membros foram fixadas por regulamento da seguinte maneira: 13% (reservas de depósitos à vista) nos
bancos municipais centrais do Federal Reserve (os de Nova York e de Chicago); 10% nos bancos municipais do Federal Reserve; e 7% nos bancos rurais. Os depósitos a prazo nos bancos membros só tinham a exigência de 3% de reserva, independentemente da categoria do banco. Essas proporções não mudaram em nada. Contudo, não são as alterações nas proporções mínimas das reservas que interessam; quaisquer transferências de depósitos de uma categoria para outra são importantes. Assim, se houve qualquer grande transferência de depósitos de Nova York para os bancos rurais, as exigências de reservas menores em áreas rurais permitiriam uma inflação líquida geral considerável. Em suma, uma transferência de moeda de um tipo de banco para outro, ou de depósitos à vista para depósitos a prazo ou vice-versa muda as reservas mínimas agregadas reais da economia. Cabe-nos portanto investigar possíveis mudanças nas reservas mínimas reais durante a década de 1920.
Dentro da classe de depósitos à vista dos bancos membros, as categorias importantes, por razões jurídicas, são geográficas. Uma transferência dos bancos rurais para os de Nova York e de Chicago aumenta as reservas mínimas reais e limita a expansão monetária. A Tabela 3 apresenta o total de depósitos à vista nos bancos membros nas diversas áreas em junho de 1921 e em junho de 1929, e a porcentagem de cada área no total de depósitos à vista em cada data.
Vemos que a porcentagem dos depósitos à vista nos bancos nacionais caiu durante a década de 1920, de 34,2% para 31,4%, ao passo que sua porcentagem nos bancos urbanos aumentou, nas duas categorias. Assim, a transferência em reservas mínimas reais foi anti-inflacionária, porque os bancos urbanos tinham de manter por lei reservas mínimas mais altas do que as dos bancos rurais. Está claro que não veio nenhum ímpeto inflacionário de mudanças geográficas nos depósitos à vista.
E a relação entre depósitos nos bancos membros e nos bancos não-membros? Em junho de 1921, os bancos membros detinham 72,6% de todos os depósitos à vista; oito anos depois, eles detinham 72,5% do total. Assim, a relativa importância dos bancos membros e não-membros permaneceu estável durante o período, e ambos os tipos expandiram-se mais ou menos na mesma proporção. [13]
TABELA 3
DEPÓSITOS À VISTA NOS BANCOS MEMBROS*
(em bilhões de dólares)
Data |
Cidade de Reserva Central |
Cidade de Reserva |
Rural |
Total |
(em bilhões de dólares) |
||||
30 de junho de 1921 |
5,01 |
4,40 |
4,88 |
14,29 |
30 de junho de 1929 |
6,87 |
6,17 |
5,96 |
19,01 |
(em porcentagens) |
||||
30 de junho de 1921 |
35,7 |
30,8 |
34,2 |
100 |
30 de junho de 1929 |
36,1 |
32,5 |
31,4 |
100 |
A relação entre depósitos à vista e a prazo proporciona um campo de investigação mais fértil. A Tabela 4 compara os totais de depósitos à vista e a prazo:
TABELA 4
DEPÓSITOS À VISTA E A PRAZO
(em bilhões de dólares)
Data |
Depósitos à Vista |
Depósitos a Prazo |
Porcentagem de Depósitos à Vista do Total |
30 de junho de 1921 |
17,5 |
16,6 |
51,3 |
29 de junho de 1929 |
22,9 |
28,6 |
44,5 |
Vemos assim que a década de 1920 testemunhou uma alteração significativa na importância relativa dos depósitos à vista e a prazo: os depósitos à vista eram 51,3% do total de depósitos em 1921, mas caíram para 44,5% em 1929. A relativa expansão dos depósitos a prazo significou uma importante redução das reservas mínimas reais para os bancos americanos: a exigência de reservas mínimas para os depósitos à vista era de 10%, mas para os depósitos a prazo era de apenas 3%. A alteração relativa de depósitos à vista para depósitos a prazo foi, portanto, um fator importante para a grande inflação monetária da década de 1920. Enquanto os depósitos à vista aumentaram 30,8% de 1921 a 1929, os depósitos a prazo aumentaram nada menos do que 72,3%!
Durante esse período, os depósitos a prazo consistiam em depósitos nos bancos comerciais e em caixas econômicas. As caixas econômicas só têm depósitos a prazo, e os bancos comerciais, é claro, também são a oferta nacional de depósitos à vista. Se quisermos perguntar em que medida essa mudança de depósitos a vista para depósitos a prazo foi deliberada, podemos estimar a resposta considerando o grau de expansão dos depósitos a prazo nos bancos comerciais. Afinal, são os bancos comerciais que ganham diretamente ao induzir seus consumidores a passar de contas à vista para contas a prazo, reduzindo desse modo a quantidade de reservas mínimas e liberando suas reservas para novas expansões do crédito. Em primeiro lugar, os depósitos a prazo nos bancos comerciais eram praticamente o dobro da quantidade que havia nas caixas econômicas. E, além disso, os bancos comerciais expandiram seus depósitos a prazo em 79,8% durante esse período, enquanto as caixas econômicas expandiram os seus apenas 61,8%. Está claro que os bancos comerciais lideraram a mudança para os depósitos a prazo.
Esse aumento em depósitos a prazo não foi acidental. Antes do estabelecimento do Federal Reserve System, os bancos nacionais não tinham permissão da lei para pagar juros pelos depósitos a prazo, e assim essa categoria ficou restrita aos bancos estaduais e às caixas econômicas, menos importantes. O Federal Reserve Act permitiu que os bancos nacionais pagassem juros pelos depósitos a prazo. Além disso, antes do estabelecimento do Federal Reserve System, os bancos eram obrigados a manter as mesmas reservas mínimas tanto para os depósitos à vista quanto para os depósitos a prazo. O Federal Reserve Act cortou a proporção de reservas mínimas quase pela metade, e também diminuiu as reservas mínimas para depósitos a prazo para 5% e, em 1917, para 3%. Sem dúvida esse foi um claro convite para que os bancos se esforçassem para transferir os depósitos à vista para a categoria de depósitos a prazo.
TABELA 5
DEPÓSITOS A PRAZO
(em bilhões de dólares)
Data |
Caixas Econômicas |
Todos os bancos comerciais |
Bancos Membros |
Bancos Municipais Centrais do FRS |
Bancos Municipais do FRS |
Bancos Rurais |
30 de junho de 1921 |
5,5 |
10,9 |
6,3 |
0,4 |
2,1 |
3,8 |
29 de junho de 1929 |
8,9 |
19,6 |
13,1 |
2,2 |
4,8 |
6,8 |
Durante a década de 1920, os depósitos a prazo aumentaram mais exatamente naquelas áreas em que eram mais ativos e em que tinham menor chance de serem mal-interpretados, como se fossem “poupança” ociosa. A Tabela 5 apresenta o registro das diversas categorias de depósitos a prazo. As contas a prazo menos ativas estão nas caixas econômicas, e as mais ativas nos grandes bancos comerciais das cidades. Com isso em mente, abaixo seguem os aumentos ao longo do período nas diversas categorias:
Caixas Econômicas |
61,8% |
Bancos Comerciais |
79,8% |
Bancos Membros |
107,9% |
Bancos Rurais |
78,9% |
Bancos Municipais do Federal Reserve |
128,6% |
Bancos Municipais Centrais do Federal Reserve |
450% |
Assim, vemos, inequivocamente, que as categorias mais ativas de depósitos a prazo foram precisamente aquelas que mais cresceram na década de 1920, e essa correlação vale para cada categoria. A mais ativa — as contas dos bancos municipais centrais do Federal Reserve — aumentaram 450%.[14]
Gerando a inflação, parte 2: reservas totais
Duas influências podem gerar a inflação bancária — uma mudança nas reservas mínimas reais e uma mudança no total de reservas bancárias no Federal Reserve Bank. A força relativa desses dois fatores durante a década de 1920 pode ser estimada na Tabela 6.
Claramente os primeiros quatro anos desse período foram uma época de maior expansão monetária do que os últimos quatro. A contribuição dos bancos-membro para a oferta monetária aumentou US$ 6,9 bilhões, ou 37,1%, na primeira metade do nosso período, mas somente US$ 3,9 bilhões ou 15,3% na segunda metade. É evidente que a expansão dos primeiros quatro anos foi financiada exclusivamente pelas reservas totais, já que a proporção de reservas permaneceu mais ou menos a mesma, em cerca de 11,5 : 1. As reservas totais expandiram 35,6% de 1921 a 1925, e os depósitos nos bancos membros subiram 37,1%. Nos últimos quatro anos, as reservas subiram apenas 8,7%, enquanto os depósitos subiram 15,3%. Essa discrepância foi compensada por um aumento na proporção de reservas de 11,7 : 1 para 12,5 : 1, de modo que cada dólar de reserva sustentava mais dólares em depósitos. Podemos estimar a importância das mudanças nas reservas mínimas ao longo do período multiplicando a cifra final, US$ 2,36 bilhões, por 11,6, a proporção original entre depósitos e reservas. O resultado são US$ 27,4 bilhões. Assim, dos US$ 29,4 bilhões em depósitos de bancos membros em junho de 1929, US$ 27,4 bilhões podem ser explicado pelas mudanças nas reservas. Em suma, uma mudança nas reservas dá conta de US$ 2 bilhões do aumento de US$ 10,8 bilhões, ou 18,5%. Os 81,5% restantes da inflação se deveram ao aumento das reservas totais.
TABELA 6
RESERVAS E DEPÓSITOS DOS BANCOS MEMBROS*
Data |
Reservas dos Bancos Membros |
Depósitos dos Bancos Membros |
Proporção de Reservas |
30 de junho de 1921 |
1,60 |
18.6 |
11,6 : 1 |
30 de junho de 1925 |
2,17 |
25,5 |
11,7 : 1 |
29 de junho de 1929 |
2,36 |
29.4 |
12,5 : 1 |
*A Coluna 1 traz o total legal de reservas dos bancos membros no Fed, excluindo o dinheiro no cofre (que permaneceu constante em torno de US$ 500 milhões ao longo do período). A Coluna 2 traz os depósitos dos bancos membros, à vista e a prazo. A Coluna 3 traz a proporção entre depósitos e reservas.
Assim, o principal fator gerador de inflação da década de 1920 foi o aumento no total de reservas bancárias: isso gerou a expansão dos bancos membros e dos bancos não-membros. É principalmente o aumento de 47,5% no total de reservas (de US$ 1,6 bilhão para US$ 2,36 bilhões) que explica o aumento de 62% na oferta monetária total (de US$ 45,3 bilhões para US$ 73,3 bilhões). Um mero aumento de US$ 760 milhões nas reservas teve essa força toda por causa da natureza do nosso sistema bancário controlado pelo governo. Ele conseguiu gerar um aumento de quase US$ 28 bilhões na oferta monetária.
O que então causou o aumento no total de reservas? A resposta a essa pergunta tem de ser o principal objeto de nossa busca pelos fatores responsáveis pelo boom inflacionário. Podemos listar os já conhecidos “fatores de aumento e de diminuição” do total de reservas, mas considerando especialmente se eles podem ou não ser controlados ou se obrigatoriamente não são controlados pelas autoridades do Federal Reserve ou do Tesouro. As forças não-controladas emanam do público em geral, e as controladas, do governo.
Dez fatores aumentam ou diminuem as reservas bancárias.
1. O estoque de ouro monetário. Esse, na verdade, é o único fator não-controlado de aumento — um aumento nesse fator aumenta o total de reservas na mesma medida. Quando alguém deposita ouro num banco comercial (como era possível fazer livremente na década de 1920), o banco o deposita no Federal Reserve Bank e o acrescenta aquela quantidade às suas reservas ali. Enquanto alguns fluxos para dentro e para fora eram domésticos, a vasta maioria consistia de transações com o estrangeiro. Uma diminuição no estoque de ouro monetário causa uma diminuição equivalente de reservas bancárias. Seu comportamento não é controlado — é decidido pelo público — ainda que, a longo prazo, as políticas do Federal Reserve influenciem seu movimento.
2. Ativos Comprados pelo Federal Reserve. Esse é o grande fator controlado de aumento, e está inteiramente sob o controle das autoridades do Federal Reserve. Sempre que o Federal Reserve compra um ativo, qualquer que seja, ele pode comprá-lo ou dos bancos ou do público. Se ele comprar o ativo de um banco (membro), ele compra o ativo e, em troca, concede ao banco um aumento em suas reservas. Claramente as reservas aumentaram na mesma proporção que os ativos do Federal Reserve. Se, por outro lado, o Federal Reserve compra o ativo do público, ele dá um cheque contra si mesmo para o vendedor individual. O indivíduo pega o cheque e deposita-o em seu banco, dando assim ao banco um aumento em reservas equivalente ao aumento em ativos do Federal Reserve. (Se o vendedor decidir ficar com dinheiro em vez de depósitos, então esse fator é contrabalançado na mesma proporção por um aumento na moeda em circulação fora dos bancos — um fator de diminuição.)
O ouro não faz parte desses ativos; ele ficou listado na primeira categoria (Estoque de Ouro Monetário), e geralmente é depositado nos bancos do Federal Reserve, e não comprado por eles. Os principais ativos adquiridos são “Notas Compradas” e “Títulos do Governo dos Estados Unidos”. Os Títulos do Governo dos Estados Unidos são talvez o campo mais conhecido das “operações de mercado aberto”: as aquisições do Federal Reserve aumentam as reservas bancárias e as vendas as diminuem. As Notas Compradas consistiam em papéis de aceitação que o Federal Reserve comprava diretamente, numa política de subsídios que praticamente criou esse tipo de papel de novo nos Estados Unidos. Alguns autores tratam as Notas Compradas como um fator não-controlado, porque o Federal Reserve anunciava a taxa pela qual compraria todas as aceitações que lhe fossem apresentadas. Contudo, lei nenhuma o obrigava a adotar essa política de compras ilimitadas; portanto, ela deve ser considerada uma pura criação da política do Federal Reserve, sob seu controle.
3. Notas Descontadas pelo Federal Reserve. Essas notas não são compradas, antes representando empréstimos aos bancos membros. São notas redescontadas, e representam adiantamentos aos bancos contra suas promissórias. Sendo claramente um fator de aumento, elas não são tão bem vindas pelos bancos quanto outras maneiras de aumentar as reservas, porque elas precisam ser pagas de volta ao Federal Reserve; contudo, enquanto elas permanecem sem ser pagas, elas proporcionam reservas com a mesma eficácia de qualquer outro tipo de ativo. As Notas Descontadas, de fato, podem ser emprestadas de maneira precisa e rápida àqueles bancos que estão em dificuldades, e são portanto um meio forte e eficaz de resgatar bancos em apuros. Os autores de modo geral classificam as Notas Descontadas como fatores não-controlados, porque o Federal Reserve está sempre pronto a emprestar aos bancos tomando seus ativos elegíveis como garantia adicional., e emprestará quantidades quase ilimitadas a uma certa taxa. É verdade, é claro, que o Federal Reserve fixa a taxa de redesconto, e que ela é fixada num patamar mais baixo quando se está estimulando os empréstimos pelos bancos, mas muitas vezes se considera que essa é a única maneira de que o Federal Reserve dispõe para controlar esse fator. Mas o Federal Reserve Act não obriga, mas apenas autoriza, o Federal Reserve a emprestar aos bancos membros. Se as autoridades quiserem exercer um papel inflacionário enquanto “emprestadores de último recurso” aos bancos em dificuldades, elas simplesmente decidem fazê-lo por si mesmas. Se elas quisessem, poderiam simplesmente recusar-se a emprestar aos bancos em qualquer momento. Qualquer expansão das Notas Descontadas deve, então, ser atribuída ao arbítrio das autoridades do Federal Reserve.
Por outro lado, os próprios bancos membros em ampla medida controlam a velocidade do pagamento dos empréstimos do Federal Reserve. Quando os bancos prosperam mais, geralmente reduzem seu endividamento com o Federal Reserve. As autoridades poderiam compeli-los a um pagamento mais rápido, mas decidiram emprestar livremente aos bancos e influenciar os bancos mudando suas taxas de redesconto.
A fim de separar os fatores controlados dos não-controlados da melhor maneira possível, vamos portanto tomar a medida um tanto drástica de considerar qualquer expansão de Notas Descontadas como um fator controlado pelo governo, e qualquer redução como um fator descontrolado, e determinado pelos bancos. Claro que os pagamentos serão em parte governados pela quantidade de dívida anterior, mas essa parece a divisão mais razoável. Temos portanto de tomar essa medida, mesmo que ela complique o registro histórico. Assim, se as Notas Descontadas aumentarem US$ 200 milhões ao longo de um período de três anos, podemos chamar isso um aumento controlado de US$ 200 milhões, se consideramos apenas esse registro geral. Por outro lado, se dividirmos o registro ano a ano, então, o aumento controlado de reservas para os três anos foi de US$ 600 milhões e a redução não-controlada foi de US$ 400 milhões. Quanto mais dividirmos o registro, portanto, maiores ficam tanto os aumentos controlados por parte do governo, quanto as reduções não-controladas iniciadas pelos bancos. Talvez a melhor maneira de resolver esse problema seja dividir o registro em seus períodos mais importantes. Seria muito mais simples considerar todas as Notas Descontadas fatores não-controlados e pronto, mas isso distorceria de modo intolerável o registro histórico; desse jeito, no começo da década de 1920, o Federal Reserve mereceria um elogio imerecido por ter reduzido as dívidas dos bancos membros, quando essa redução foi em grande parte obra dos próprios bancos.
Podemos então dividir as Notas Descontadas em: Novas Notas Descontadas (fator controlado de aumento) e Notas Pagas (fator descontrolado de diminuição).
4. Outros Créditos do Federal Reserve. Isso em grande parte é “troco”, ou cheques em bancos que ainda não foram coletados pelo Federal Reserve. Essa é uma forma de emprestar sem juros aos bancos e é portanto um fator de aumento integralmente controlado pelo Federal Reserve. Na década de 1920, seu peso era desprezível.
5. Moeda em Circulação fora dos Bancos. Esse é o principal fator de redução — um aumento desse item reduz o total de reservas na mesma medida. Esse é o total de papel moeda em poder do público e é integralmente determinado pelo lugar onde as pessoas preferem colocar seu dinheiro, em vez de depositá-lo no banco. Trata-se portanto de um fator não-controlado, decidido pelo público.
6. Notas do Tesouro Nacional em Circulação. Qualquer aumento na Notas do Tesouro Nacional em Circulação é depositado no Federal Reserve na conta corrente do Tesouro. À medida que ela é gasta nas despesas do governo, a moeda tende a retornar para as reservas dos bancos comerciais. A moeda do Tesouro é portanto um fator de aumento, e ela é controlada pelo Tesouro (ou por regulamentações federais). Seu elemento mais importante são certificados de prata com cobertura de 100% de barras e de dólares de prata.
7. Dinheiro em Posse do Tesouro Nacional. Qualquer aumento no dinheiro em posse do Tesouro representa uma transferência das reservas bancárias, enquanto uma redução no dinheiro do Tesouro é gasto na economia e tende a aumentar as reservas. Trata-se portanto de um fator de diminuição que é controlado pelo Tesouro.
8. Depósitos do Tesouro no Federal Reserve. Esse fator é muito similar ao dinheiro em posse do Tesouro Nacional; qualquer aumento nos depósitos no Federal Reserve representa uma transferência das reservas bancárias, enquanto uma diminuição significa que mais moeda é acrescentada à economia, inchando as reservas bancárias. Esse, portanto, é um fator de diminuição controlado pelo Tesouro.
9. Depósitos de Bancos Não-Membros no Federal Reserve. Esse fator opera de modo muito similar ao dos depósitos do Tesouro no Federal Reserve. Um aumento nos depósitos de bancos não-membros reduz as reservas dos bancos membros, porque representam transferências dos bancos membros para essas outras contas. Uma redução aumentará as reservas dos bancos membros. Esses depósitos são feitos principalmente pelos bancos não-membros, e pelos governos e bancos estrangeiros. São um fator de diminuição, mas não-controlado pelo governo.
10. Fundos de Capital Não-Despendidos do Federal Reserve. Trata-se de fundos de capital do Federal Reserve que ainda não foram despendidos em ativos (em sua maioria, instalações bancárias e despesas operacionais). Esse capital vem dos bancos comerciais e, portanto, se não for despendido, constitui uma retirada de reservas. Esse item é quase sempre desprezível; ele está claramente sob o controle das autoridades do Federal Reserve.
Em suma, temos os seguintes fatores de mudanças nas reservas dos bancos membros[15]:
Fatores de Aumento
Estoque de Ouro Monetário???????????????…………………………………………………..não-controlado
Ativos Adquiridos do Federal Reserve…………………………………..????????????..controlado
Notas Compradas
Títulos do Governo dos Estados Unidos
Novas Notas Descontadas……………………………………………………………??????????????????controlado
Outros Créditos do Federal Reserve???????????.?………………………………………………?controlado
Notas do Tesouro Nacional em Circulação……………………………………..??????????.controlado
Fatores de Diminuição
Moeda em Poder do Público???????????????não…………………………………………………………controlado
Dinheiro em Poder do Tesouro????????????????…………………………………………………………….controlado
Depósitos do Tesouro no Federal Reserve???????????……………………………………………..controlado
Fundos de Capital Não-Despendidos do Federal Reserve????…………………………controlado
Depósitos de Bancos Não-Membros no Federal Reserve??…………………………não-controlado
Notas Pagas?????????????????????…………………………………………………………………………………….não-controlado
Uma visão geral do período inteiro de 1921 a 1929 não dá um imagem precisa das forças amplas por trás dos movimentos no total de reservas. Por algum tempo o total de reservas continuou a aumentar. Houve flutuações contínuas dentro das várias categorias, com algumas aumentando e outras diminuindo em qualquer período, e diferentes fatores predominando em diferentes momentos. As Tabelas 7 e 8 representam as forças que causaram mudanças nas reservas totais durante a década de 1920. A Tabela 7 divide o período de 1921 a 1929 em 12 sub-períodos, mostra as mudanças em cada fator causal e as consequentes mudanças nas reservas dos bancos membros para cada sub-período. A Tabela 8 transforma os dados da Tabela 7 em números por mês, assim permitindo a comparação das taxas relativas de mudança para os diversos períodos.
As reservas dos bancos membros chegaram a um total de US$ 1,604 bilhão em 30 de junho de 1921, e chegaram a US$ 2,356 bilhões oito anos depois. Ao longo dos 12 sub-períodos, as reservas não-controladas diminuíram em US$ 1,04 bilhão, enquanto as reservas controladas aumentaram em US$ 1,79 bilhão. Por si, então, os fatores não-controlados foram deflacionários; a inflação foi claramente precipitada de modo deliberado pelo Federal Reserve. Finalmente é derrubada a alegação de que o que houve na década de 1920 foi tão-somente uma “inflação do ouro” não enfrentada ativamente pelo Federal Reserve. O ouro nunca foi o grande problema, e em nenhum dos sub-períodos ele foi o fator crucial para o aumento das reservas.
Nos 12 sub-períodos, os fatores não-controlados diminuíram por sete vezes e aumentaram por cinco vezes. Os fatores controlados, por sua vez, subiram em oito períodos e caíram em quatro. Dos fatores controlados, as Notas Compradas desempenharam um papel fundamental na alteração de reservas em nove períodos; os Títulos do Governo, em sete; as Notas Descontadas, em cinco; e a Moeda do Tesouro, em três (os três primeiros). Se somarmos o impacto total de cada fator controlado sobre as reservas ao longo dos doze períodos, independentemente do sinal aritmético, vemos que os Títulos do Governo saem à frente (com US$ 2,24 bilhões), as Notas Compradas um pouco atrás (US$ 2,16 bilhões) e Novos Descontos logo atrás (US$ 1,54 bilhão).
No começo do período de oito anos, as Notas Descontadas somaram US$ 1,75 bilhão, as Notas Compradas ficaram em US$ 40 milhões, os Títulos do Governo dos Estados Unidos guardados ficaram em US$ 259 milhões, as Notas do Tesouro Nacional em Circulação somaram US$ 1,75 bilhão, o Estoque de Ouro Monetário ficou em US$ 3 bilhões, e a Moeda em Poder do Público ficou em US$ 4,62 bilhões.
As Tabelas 7 e 8 organizam-se da seguinte maneira. Notas Descontadas, Notas Compradas, Títulos do Governo guardados pelo Federal Reserve, e Outros Créditos constituem o Crédito do Federal Reserve. As mudanças no Crédito do Federal Reserve (excetuando as reduções líquidas nas Notas Descontadas), mais as mudanças na Moeda do Tesouro, no Dinheiro do Tesouro e nos Depósitos do Tesouro no Federal Reserve, e os Fundos de Capital Não-Despendidos do Federal Reserve constituem as mudanças controladas nas reservas dos bancos membros. As mudanças no Estoque de Ouro Monetário, na Moeda em Poder do Público, e em Outros Depósitos no Federal Reserve constituem as mudanças não-controladas, e o efeito resultante constitui as mudanças nas reservas bancárias. Os sinais aritméticos das mudanças efetivas de fatores de diminuição são invertidas para que concordem com seus efeitos sobre as reservas; assim, uma redução de US$ 165 milhões na Moeda em Poder do Público entre 1921 e 1929 aparece na tabela como uma mudança de mais 165 em reservas.
TABELA 7
MUDANÇAS NAS RESERVAS E NOS FATORES CAUSAIS, AO LONGO DE 12 PERÍODOS, DE 1921 A 1929
(em milhões de dólares)
Fatores |
I Jun 1921 – Jul 1922 |
II Jul 1922 – Dez 1922 |
III Dez 1922 – Out 1923 |
IV Out 1923 – Jun 1924 |
V Jun 1924 – Nov 1924 |
VI Nov 1924 – Nov 1925 |
VII Nov 1925 – Out 1926 |
VIII Out 1926 – Jul 1927 |
IX Jul 1927 – Dez 1927 |
X Dez 1927 – Jul 1928 |
XI Jul 1928 – Dez 1928 |
XII Dez 1928 – Jun 1929 |
Crédito do Federal Reserve |
-996 |
305 |
-186 |
-388 |
355 |
235 |
-60 |
-268 |
562 |
-222 |
376 |
-409 |
Notas Descontadas |
-1345 |
212 |
266 |
-550 |
-92 |
446 |
2 |
-248 |
140 |
449 |
25 |
-19 |
Notas Compradas |
100 |
132 |
-67 |
-168 |
277 |
45 |
-36 |
-151 |
220 |
-230 |
327 |
-407 |
Títulos do Governo |
278 |
-101 |
-344 |
339 |
153 |
-242 |
-41 |
91 |
225 |
-402 |
13 |
-12 |
Outros Créditos |
-28 |
62 |
-40 |
-9 |
17 |
-14 |
14 |
39 |
-22 |
-39 |
10 |
30 |
Moeda do Tesouro |
115 |
93 |
47 |
14 |
5 |
-43 |
9 |
13 |
3 |
-2 |
8 |
7 |
Dinheiro no Tesouro |
-43 |
16 |
2 |
4 |
0 |
5 |
-2 |
13 |
-4 |
7 |
-1 |
-2 |
Depósitos do Tesouro |
-16 |
48 |
-29 |
-3 |
6 |
-2 |
14 |
7 |
-6 |
1 |
1 |
-13 |
Fundos de Capital Não-Despendidos do Federal Reserve |
56 |
6 |
-6 |
21 |
3 |
-15 |
-20 |
-3 |
-5 |
-28 |
-19 |
-26 |
Estoque de Ouro Monetário |
554 |
100 |
238 |
321 |
39 |
-130 |
76 |
107 |
-201 |
-266 |
28 |
183 |
Moeda em Circulação |
487 |
-393 |
-112 |
80 |
-203 |
8 |
23 |
175 |
-157 |
302 |
-272 |
227 |
Outros Depósitos |
1 |
-2 |
6 |
0 |
-6 |
-4 |
1 |
4 |
2 |
-3 |
2 |
-1 |
Reserva Controlada |
462 |
468 |
-171 |
198 |
461 |
180 |
-74 |
16 |
564 |
-251 |
364 |
-423 |
Reserva Não-Controlada |
-303 |
-295 |
132 |
-149 |
-262 |
-126 |
100 |
38 |
-356 |
33 |
-242 |
390 |
Reservas dos Bancos Membros |
157 |
173 |
-39 |
49 |
199 |
54 |
26 |
54 |
210 |
-220 |
122 |
-33 |
TABELA 8
MUDANÇAS NAS RESERVAS E NOS FATORES CAUSAIS, AO LONGO DE 12 PERÍODOS, DE 1921 A 1929
(em milhões de dólares)
Fatores |
I Jun 1921 – Jul 1922 |
II Jul 1922 – Dez 1922 |
III Dez 1922 – Out 1923 |
IV Out 1923 – Jun 1924 |
V Jun 1924 – Nov 1924 |
VI Nov 1924 – Nov 1925 |
VII Nov 1925 – Out 1926 |
VIII Out 1926 – Jul 1927 |
IX Jul 1927 – Dez 1927 |
X Dez 1927 – Jul 1928 |
XI Jul 1928 – Dez 1928 |
XII Dez 1928 – Jun 1929 |
Crédito do Federal Reserve |
-76,6 |
61,0 |
-18,6 |
-48,5 |
71,0 |
2,0 |
-5,5 |
-29,8 |
112,4 |
-31,7 |
75,2 |
-68,2 |
Notas Descontadas |
-103,5 |
42,4 |
26,6 |
-68,8 |
-18,4 |
37,2 |
0,2 |
-27,6 |
28,0 |
64,1 |
5,0 |
-3,2 |
Notas Compradas |
7,7 |
26,4 |
-6,7 |
-21,0 |
55,4 |
3,8 |
-3,3 |
-16,8 |
44,0 |
-32,9 |
65,4 |
-67,8 |
Títulos do Governo |
21,4 |
-20,2 |
-34,4 |
42,4 |
30,6 |
-20,2 |
-3,7 |
10,1 |
45,0 |
-57,4 |
26 |
-2,0 |
Outros Créditos |
-2,2 |
124 |
-4,0 |
-1,1 |
3,4 |
-1,2 |
1,3 |
4,3 |
-4,4 |
-5,6 |
2,0 |
5,0 |
Moeda do Tesouro |
8,8 |
18,6 |
4,7 |
1,8 |
1,0 |
-3,6 |
0,8 |
1,4 |
0,6 |
-0,3 |
1,6 |
1,2 |
Dinheiro no Tesouro |
-4,0 |
3,2 |
0,2 |
0,5 |
0 |
0,4 |
-0,2 |
1,4 |
-0,8 |
1,0 |
-0,2 |
-0,3 |
Depósitos do Tesouro |
-1,2 |
9,6 |
-2,9 |
-0,4 |
1,2 |
-0,2 |
0 |
1,5 |
1,4 |
-0,9 |
0,2 |
-2,2 |
Fundos de Capital Não-Despendidos do Federal Reserve |
4,3 |
1,2 |
-0,6 |
2,6 |
0,6 |
-1,2 |
-1,8 |
-0,3 |
-1,0 |
-4,0 |
-3,8 |
-4,3 |
Estoque de Ouro Monetário |
42,6 |
20,0 |
23,8 |
40,1 |
7,8 |
-10,8 |
6,9 |
11,9 |
-40,2 |
-38,0 |
5,6 |
30,5 |
Moeda em Circulação |
37,5 |
-78,6 |
-11,2 |
10,0 |
-40,6 |
0,7 |
2,1 |
19,4 |
-31,4 |
43,1 |
-54,2 |
37,8 |
Outros Depósitos |
0 |
0,4 |
0,6 |
0 |
-1,2 |
-0,3 |
0,1 |
0,4 |
-0,4 |
-0,4 |
0,4 |
-0,2 |
Reserva Controlada |
35,5 |
93,6 |
-17,1 |
24,8 |
92,2 |
15,0 |
-6,7 |
1,8 |
112,8 |
-37,3 |
72,8 |
-70,5 |
Reserva Não-Controlada |
-23,3 |
-59,0 |
13,2 |
-18,6 |
-52,4 |
-10,5 |
9,1 |
4,2 |
-71,2 |
4,7 |
-48,4 |
65,0 |
Reservas dos Bancos Membros |
12,1 |
34,6 |
-3,9 |
6,1 |
39,8 |
4,5 |
2,4 |
6,0 |
42,0 |
-32,6 |
24,4 |
-5,5 |
Qualquer divisão em períodos históricos é arbitrária em algum grau. Contudo, as divisões nas Tabelas 7 e 8 foram escolhidas porque o autor acredita que elas são as que se encaixam melhor nos sub-períodos mais importantes da década de 1920, sub-períodos que diferem demais para poder ser adequadamente refletidos em qualquer estimativa geral. Estas são as características específicas de cada um desses sub-períodos:
I. Junho de 1921 a julho de 1922 (todas as datas vão até o fim do mês). As Notas Descontadas, que estavam caindo desde 1920, continuaram em forte queda, de US$ 1,751 bilhão em junho de 1921 para um mínimo de US$ 397 em agosto de 1922. O Crédito Total do Federal Reserve também atingiu o ponto mínimo em julho de 1922, assim como a Moeda em Poder do Público, que chegou a seu menor patamar em julho de 1922. Julho foi portanto escolhido como mês terminal.
II. Julho de 1922 a dezembro de 1922. O Crédito Total do Federal Reserve subiu fortemente, atingindo o ponto máximo em dezembro, assim como as reservas totais. As Notas Descontadas chegaram ao máximo em novembro.
III. Dezembro de 1922 a outubro de 1923. As Notas Descontadas continuaram a subir, chegando ao ponto máximo em outubro. Nesse ínterim, os Títulos do Governo dos Estados Unidos tiveram uma forte queda, chegando ao ponto mínimo de US$ 92 milhões em outubro, o menor patamar do período inteiro.
IV. Outubro de 1923 a junho de 1924. As Notas Compradas tiveram uma forte queda, chegando à mínima em julho. O Crédito Total do Federal Reserve chegou à mínima em junho.
V. Junho de 1924 a novembro de 1924. As Notas Descontadas, que estavam em queda desde outubro de 1923, continuaram a cair, chegando à mínima em novembro de 1924. Os Títulos do Governo dos Estados Unidos chegaram à máxima no mesmo mês. O Estoque de Ouro Monetário também atingiu a máxima em novembro de 1924. As Notas Compradas tiveram um pico em dezembro de 1924, assim como o Crédito Total do Federal Reserve e as reservas totais.
VI. Novembro de 1924 a novembro de 1925. As Notas Descontadas tiveram outro pico em novembro. Os Títulos do Governo atingiram uma mínima em outubro, e o Crédito do Federal Reserve atingiu uma máxima em dezembro.
VII. Novembro de 1925 a outubro de 1926. Os Títulos do Governo dos Estados Unidos atingiram uma mínima em Outubro, e as Notas Descontadas tiveram uma máxima no mesmo mês. Claramente os dois itens se agitaram nesse período.
VIII. Outubro de 1926 a julho de 1927. As Notas Compradas tiveram uma mínima em julho, e as Notas Descontadas atingiram uma mínima em Agosto. O Crédito Total do Federal Reserve chegou à mínima em maio.
IX. Julho de 1927 a dezembro de 1927. Os Títulos do Governo dos Estados Unidos chegaram a um pico em dezembro, assim como as Notas Descontadas, o Crédito Total do Federal Reserve, e as reservas totais.
X. Dezembro de 1927 a julho de 1928. As Notas Compradas tiveram uma forte queda em julho, assim como os Títulos do Governo dos Estados Unidos, o Crédito Total do Federal Reserve, e as reservas totais. As Notas Descontadas chegaram a um pico em agosto.
XI. Julho de 1928 a dezembro de 1928. As Notas Compradas tiveram um pico em dezembro, assim como as reservas totais, enquanto as Notas Descontadas e o Crédito do Federal Reserve tiveram um pico em Novembro.
XII. Dezembro de 1928 a junho de 1929. Conclusão do período em estudo.
Usando esses sub-períodos e suas mudanças, podemos agora analisar precisamente o curso da inflação monetária na década de 1920.
No Período I, (junho de 1921 a julho de 1922), um olhar superficial levaria a crer que o principal fator inflacionário foi o forte influxo de ouro, e que o Federal Reserve simplesmente não contrabalançou suficientemente esse influxo. Uma análise mais profunda, porém, mostra que os bancos pagaram seus empréstimos tão rapidamente que os fatores não-controlados caíram US$ 303 milhões. Se o governo tivesse permanecido completamente passivo, portanto, as reservas dos bancos membros teriam caído em US$ 303 milhões. Em vez disso, o governo injetou ativamente US$ 462 milhões em novas reservas, levando a um aumento líquido de US$ 157 milhões. (As diferenças na subtração vêm do arredondamento.) Os principais canais desse aumento foram a compra de Títulos do Governo dos Estados Unidos (US$ 278 milhões), de Moeda do Tesouro (US$ 115 milhões), e Notas Compradas (US$ 100 milhões).
O Período II (julho de 1922 a dezembro de 1922) testemunhou uma rápida aceleração da inflação das reservas. Aumentando a uma taxa média de US$ 12 milhões por mês no Período I, as reservas agora aumentavam a uma taxa de US$ 35 milhões por mês. Mais uma vez, os fatores não-controlados caíram em US$ 295 milhões, mas foram mais do que contrabalançados por aumentos em reservas controladas injetadas na economia. Essas consistiram em Notas Descontadas (US$ 212 milhões), Notas Compradas (US$ 132 milhões) e Moeda do Tesouro (US$ 93 milhões).
Os Períodos III e IV (dezembro de 1922 a junho de 1924) testemunharam como que uma parada da inflação. As Reservas na verdade caíram um pouco (cerca de US$ 4 milhões por mês) no Período III (dezembro de 1922 a outubro de 1923), e subiram só levemente (cerca de US$ 6 milhões por mês) no Período IV. Simultaneamente, os depósitos bancários ficaram mais ou menos no mesmo nível, enquanto os depósitos à vista nos bancos membros permaneceram em cerca de US$ 13,5 bilhões. Os depósitos totais e a oferta monetária total, porém, subiram mais nesse período, porque os bancos foram passando para os depósitos a prazo a fim de permitir aumentos. (Os depósitos à vista subiram US$ 450 milhões de junho de 1923 a junho de 1924, mas os depósitos a prazo subiram US$ 1,5 bilhão). A oferta monetária total subiu US$ 3 bilhões. A economia respondeu à desaceleração da inflação entrando numa recessão menor branda, de maio de 1923 a julho de 1924.
A leve queda nas reservas durante o Período III foi provocada pela venda de Títulos do Governo dos Estados Unidos (-US$ 344 milhões) e pela redução na quantidade de notas guardadas (-US$ 67 milhões). Esse, de fato, foi um declínio positivo, mais do que contrabalançando os fatores não-controlados, que haviam aumentado em US$ 132 milhões. A queda nas reservas teria sido ainda mais eficaz se o Federal Reserve não tivesse aumentado seus descontos (US$ 266 milhões) e a Moeda do Tesouro não tivesse aumentado (US$ 47 milhões).
O Período IV (outubro de 1923 a junho de 1924), porém, começou a repetir o padrão do Período I e a retomar a marcha da inflação. Dessa vez, os fatores não-controlados caíram US$ 149 milhões, mas foram mais do que contrabalançados por um aumento controlado de US$ 198 milhões, puxado pela forte compra de Títulos do Governo (US$ 339 milhões) — a maior média mensal de compras da década de 1920 (US$ 42,4 milhões).
O Período V foi o de mais rápida inflação de reservas até o momento, ultrapassando a máxima anterior, do fim de 1922. As reservas aumentaram US$ 39,8 milhões por mês. Outra vez, a inflação foi deliberada: os fatores não-controlados caíram em US$ 262 milhões, mas foram contrabalançados por um aumento deliberado de US$ 461 milhões. OS fatores inflacionários críticos foram as Notas Compradas (US$ 277 milhões) e os Títulos do Governo (US$ 153 milhões).
O ritmo da inflação foi fortemente desacelerado nos três períodos seguintes, mas continuou mesmo assim. De 31 de dezembro de 1924 a 30 de junho de 1927, as reservas aumentaram em US$ 750 milhões; os depósitos à vista corrigidos, de todos os bancos, subiram US$ 1,1 bilhão. Mas os depósitos a prazo subiram US$ 4,3 bilhões durante o mesmo período, ressaltando a capacidade dos bancos de induzir os consumidores a passar de depósitos à vista para depósitos a prazo, enquanto as cotas de associações de poupança-e-empréstimo e as reservas de companhias de seguros de vida subiram outros US$ 4,3 bilhões. Em 1926, houve uma decidida desaceleração da taxa de inflação da oferta monetária, e isso levou a outra recessão econômica branda durante 1926 e 1927.
No Período VI (novembro de 1924 a novembro de 1925), uma tendência de queda das reservas não-controladas foi outra vez mais do que contrabalançada por um aumento nas reservas controladas; essas foram as Notas Descontadas (US$ 446 milhões) e as Notas Compradas (US$ 45 milhões).
O Período VII (novembro de 1925 a outubro de 1926) foi o primeiro momento após o Período III em que os fatores não-controlados agiram de modo a aumentar as reservas. Mas dessa vez o Federal Reserve, contrariando sua atuação anterior, não contrabalançou esses fatores de modo suficiente, ainda que o grau de inflação tenha sido bastante leve (apenas US$ 2,4 milhões por mês).
No Período VIII (outubro de 1926 a julho de 1927), o grau de inflação ainda era pequeno, mas, funestamente, o Federal Reserve atiçou as chamas da inflação em vez de apaziguá-las; os fatores controlados aumentaram, e também os não-controlados. Os culpados dessa vez foram os Títulos do Governo Americano (US$ 91 milhões) e os Outros Créditos (US$ 30 milhões).
O Período IX (julho de 1927 a dezembro de 1927) foi outro período de inflação forte e acelerada, ultrapassando os picos anteriores, do fim de 1922 e de 1924. O aumento mensal de reservas no fim de 1927 foi de US$ 42 milhões. Outra vez, os fatores não-controlados caíram, mas foram mais do que contrabalançados por um fortíssimo aumento das reservas controladas, emanado das Notas Compradas (US$ 220 milhões), dos Títulos do Governo (US$ 225 milhões) e das Notas Descontadas (US$ 140 milhões).
O Período X foi o período deflacionário mais agudo (em reservas) da década de 1920. Os fatores não-controlados subiram, mas foram mais do que contrabalançados por uma diminuição dos controlados. As Notas Descontadas subiram (US$ 409 milhões), mas a deflação foi maior, puxada pelos Títulos do Governo (-US$ 402 milhões) e pelas Notas Compradas (-US$ 230 milhões). A queda de mais de US$ 200 milhões em reservas gerou uma queda de cerca de US$ 600 milhões em depósitos à vista nos bancos membros. Os depósitos a prazo subiram mais de US$ 1 bilhão, porém, e as reservas das companhias de seguros de vida, US$ 550 milhões, de modo que a oferta monetária total subiu substancialmente, US$ 1,5 bilhões, do fim de 1927 a meados de 1928.
Com o boom já bastante avançado, numa escala de anos, e ganhando ímpeto, era imperativo que o Fed acelerasse sua pressão deflacionária a fim de evitar uma grande depressão. A deflação de reservas na primeira metade de 1928, como vimos, não foi nem sequer suficiente para contrabalançar a mudança para os depósitos a prazo e os outros fatores que estavam aumentando a oferta monetária. Contudo, desastrosamente, o Fed retomou seu curso inflacionário em fins de 1928. No Período XI, uma tendência de decréscimo das reservas não-controladas foi contrabalançada por um aumento positivo e deliberado (US$ 364 milhões de reservas controladas contra -US$ 122 milhões de não-controladas). O culpado nesse programa foram as Notas Compradas, que aumentaram em US$ 327 milhões, enquanto todos os demais ativos de reservas estavam aumentando apenas levemente. De todos os períodos da década de 1920, o Período XI testemunhou o mais forte crescimento médio em Notas Compradas (US$ 65,4 milhões).
No Período XII, o último, a maré finalmente virou de maneira violenta e definitiva. Os fatores não-controlados aumentaram em US$ 390 milhões, mas foram contrabalançados por nada menos do que uma redução de US$ 423 milhões nas reservas controladas, que consistiu quase integralmente numa redução de US$ 407 milhões em Notas Compradas. O total de reservas caiu US$ 33 milhões. Os depósitos à vista nos bancos membros, que também atingiram um pico em dezembro de 1928, caíram cerca de 180 milhões. O total de depósitos à vista caiu cerca de US$ 540 milhões.
Até agora, não vimos qualquer razão por que essa deflação deveria ter tido qualquer efeito maior do que a deflação do Período X. De fato, as reservas totais caíram apenas US$ 33 milhões, contra US$ 228 milhões no período anterior. Os depósitos dos bancos membros caíram menos (US$ 180 milhões contra US$ 450 milhões), e o total de depósitos a prazo caiu mais ou menos na mesma quantidade (US$ 540 milhões contra US$ 470 milhões). A diferença crucial, porém, é esta: no Período X, os depósitos a prazo subiram US$ 1,1 bilhão, assegurando um aumento da moeda corrente e dos depósitos da ordem de US$ 600 milhões. Mas no Período XII, os depósitos a prazo, longe de subir, na verdade caíram quase US$ 70 milhões. O total de depósitos, portanto, caiu US$ 510 milhões, enquanto a oferta monetária total subiu muito pouco, impelida pelo crescimento contínuo das reservas das companhias de seguros. Os depósitos a prazo não trouxeram socorro, como haviam feito em 1923 e em 1928, e a oferta monetária total subiu apenas de US$ 73 bilhões em fins de 1928 para US$ 73,26 bilhões em meados de 1929. Pela primeira vez desde 1921, a oferta monetária parou de aumentar, e permaneceu praticamente constante. O grande boom da década de 1920 havia acabado, e a Grande Depressão havia começado. O país, porém, não chegou realmente a perceber a mudança, até que a bolsa de valores finalmente quebrou em outubro.
Moeda do Tesouro
Um aumento na Moeda do Tesouro desempenhou um papel considerável na inflação nos primeiros anos, entre 1921 e 1923. Que a Moeda do Tesouro mude consideravelmente é algo excepcional, como vemos por seu comportamento ao longo do resto do período que vai de 1921 a 1929. O surpreendente aumento de 1921 a 1923 consistiu quase exclusivamente de certificados de prata, que representavam as barras de prata guardadas no Tesouro, a 100% de seu valor. (Do aumento de US$ 225 milhões de dólares na Moeda do Tesouro durante os Períodos I a III, US$ 211 milhões foram em certificados de prata. Em 1918, o Pittman Act permitira que o governo dos Estados Unidos vendesse prata à Inglaterra como medida de tempo de guerra, e o estoque de prata do Tesouro, assim como os certificados de prata cobertos 100% por eles, foram por conseguinte reduzidos. Em maio de 1920, porém, cumprindo a obrigação estabelecida pelo Pittman Act de comprar barras de prata ao preço inflado de um dólar por uma onça [28,35 gramas] até que seu estoque fosse refeito, o Tesouro começou a comprar barras de prata, e esse subsídio aos mineiros de prata domésticos inchou as reservas bancárias. Essa política de compra de prata terminou efetivamente em meados de 1923. O Tesouro foi forçado a embarcar no programa de compra de prata pelo Pittman Act de 1918, responsabilidade do governo Wilson. O governo Harding, porém, poderia ter anulado o Pittman Act se tivesse desejado, e portanto deve carregar sua parte na culpa pela política de compra de prata.[16]
Notas Descontadas
Vimos o importante papel desempenhado pelas Notas Descontadas no atiçamento da inflação. Em 1923, 1925 e 1928, as Notas Descontadas socorreram os bancos em períodos em que o Fed estava tentando exercer pressão anti-inflacionária vendendo títulos do governo, e, pelo menos em 1923 e em 1928, reduzindo as aceitações guardadas. Nos dois casos, as Notas Descontadas foram responsáveis por perpetuar o crescimento inflacionário. O principal problema estava na presunção de que o Federal Reserve deveria desempenhar o papel de “emprestador de último recurso”, esperando mais ou menos passivamente para conceder descontos a quaisquer bancos que pedissem. Mas isso foi uma política adotada pelo Fed, e ela poderia ter sido alterada em qualquer momento. O Fed se permitiu afetar descontos simplesmente estabelecendo e mudando sua taxa de redesconto.
A maior parte dos descontos consistiu em papéis redescontados das empresas (incluindo comerciais, agrícolas e industriais), e adiantamentos a bancos contra suas notas promissórias, tendo títulos do governo dos EUA como garantia adicional. Quando nosso período começou, a maturidade legal máxima dos descontos era de 90 dias, à exceção dos papéis da agricultura, que poderiam ser descontados por seis meses. Em março de 1923, o Congresso estendeu o privilégio especial dos papéis da agricultura para nove meses, e o Fed também recebeu autoridade para redescontar os papéis da agricultura em posse dos Federal Intermediate Credit Banks [Bancos Federais de Crédito Intermediário]. Mais importante, o Conselho do Federal Reserve mudou sua ideia original de fazer cuidadosas análises de crédito dos mutuários originais, e, em vez disso, confiou na aparente solvência dos bancos que descontavam, ou então socorreu diretamente os bancos em dificuldades.[17] Esse relaxamento permitiu um maior nível quantitativo de redescontos.
Se o Federal Reserve induziu mudanças nos descontos por meio da taxa de redesconto, ele certamente deveria tê-la mantido numa “taxa de penalidade”, isso é, alta o bastante para que os bancos perdessem dinheiro se tomassem emprestado dele. Se um banco ganha 5% em seu empréstimo ou investimento, por exemplo, e o Federal Reserve coloca sua taxa de redesconto acima disso — a 8%, digamos — então um banco só vai tomar emprestado na pior das emergências, quando precisar desesperadamente de reservas. Por outro lado, se a taxa de redesconto fica abaixo do mercado, o banco pode fazer uma linda carreira só tomando emprestado, diga-se, a 4%, e emprestando a 5%. A fim de desincentivar o desconto bancário, então, uma taxa de penalidade permanente acima do mercado é essencial. No começo da década de 1920, era dominante a opinião de que o Conselho do Federal Reserve deveria manter taxas de penalidade que seguissem a tradição do banco central britânico, mas infelizmente os proponentes só queriam taxas acima dos empréstimos menos rentáveis — papéis de primeira linha. Essa taxa de penalidade não teria tido nenhuma eficácia, já que os bancos ainda poderiam lucrar descontando e emprestando a seus mutuários de maior risco. Uma taxa de penalidade verdadeiramente eficaz manteria a taxa de redesconto acima das taxas de todos os empréstimos bancários.
Houve nos primeiros anos um choque de opiniões dentro do governo a respeito de propostas para uma taxa de penalidade branca, acima dos papéis de primeira linha. Os três principais centros de poder monetário eram o Tesouro, o Conselho do Federal Reserve, e o Federal Reserve Bank de Nova York, sendo que as duas últimas instituições entravam em choque por questões de poder e de política ao longo de nosso período. Inicialmente, os líderes do Federal Reserve preferiam as taxas de penalidade, e o Tesouro era contrário; assim, o relatório anual de 1920 do Conselho do Federal Reserve prometia o estabelecimento de taxas altas.[18] Em meados de 1921, porém, o Federal Reserve começou a enfraquecer, e o governador W. P. G. Harding, presidente do Conselho do Federal Reserve, mudou de opinião em grande parte por razões políticas. Benjamin Strong, o poderosíssimo governador do Federal Reserve Bank de Nova York, também mudou de ideia mais ou menos na mesma época, e o resultado foi a ruína das taxas de penalidade, que a partir daquele momento saíram de pauta.
Outro problema da política de descontos foi se o Federal Reserve deveria emprestar continuamente aos bancos ou só em emergências.[19] Se os anti-inflacionistas hão de rejeitar as duas políticas, certamente uma política de empréstimos contínuos é mais inflacionária, porque atiça continuamente a fogueira da expansão monetária. A teoria original do Federal Reserve era promover o crédito contínuo, mas durante algum tempo no começo da década de 1920 o Federal Reserve passou a preferir só o crédito emergencial. De fato, numa reunião em outubro de 1922, as autoridades do Conselho do Federal Reserve aprovaram a proposta de Pierre Jay, autoridade do Federal Reserve Bank de Nova York, de que o Federal Reserve somente ofertaria crédito e moeda de modo temporário e emergencial, e que até isso deveria ser restringido pela necessidade de evitar a inflação do crédito. No começo de 1924, porém, o Federal Reserve abandonou essa doutrina, e seu Relatório Anual de 1923 defendia a seguinte política, desastrosa:
Os bancos do Federal Reserve são a… fonte que os bancos membros buscam quando as demandas da comunidade empresarial superam seus próprios recursos desprovidos de auxílio. O Federal Reserve oferta o crédito adicional necessário em épocas de expansão do crédito, e compensa a falta de atividade em épocas de recessão econômica.[20]
Se o Federal Reserve vai ampliar o crédito durante um boom e também durante uma recessão, segue-se claramente que a política do Federal Reserve era francamente promover uma inflação contínua e permanente.
Finalmente, no começo de 1926, o próprio Pierre Jay repudiou sua doutrina, e a teoria da “emergência” agora estava mais morta do que os dinossauros.
Ao longo da década de 1920, o Conselho do Federal Reserve não apenas manteve as taxas de redesconto abaixo do mercado e emprestou continuamente, como também ficou atrasando aumentos fortemente necessários na taxa de redesconto. Assim, em 1923 e em 1925 o Fed sabotou suas próprias tentativas de restringir o crédito ao não elevar a taxa de redesconto até que fosse tarde demais, e também deixou de elevar a taxa suficientemente em 1928 e em 1929.[21] Uma das razões foi o constante desejo do Federal Reserve de oferecer crédito “adequado” à economia, e seu medo de penalizar as “empresas legítimas” aumentando as taxas de juros. Assim que o Fed foi estabelecido, na verdade, William G. McAdoo, secretário do Tesouro, trombeteou a política que o Federal Reserve manteria ao longo da década de 1920 e durante a Grande Depressão:
O propósito primário do Federal Reserve Act foi alterar e fortalecer nossos sistema bancário, de modo que os maiores recursos de crédito demandados pelas necessidades das empresas e da agricultura passem a existir quase automaticamente e a taxas de juros baixas o suficiente para estimular, proteger e fazer prosperar toda espécie de empresas legítimas.[22]
Assim embarcaram os Estados Unidos no século XX em sua desastrosa política inflacionária e em sua depressão subsequente — por meio de um estímulo à falsificação legalizada para privilégios especiais conferidos pelo governo às empresas e aos grupos agrícolas de sua preferência.
Já em 1915 e em 1916, diversos governadores do Conselho instaram os bancos a descontar do Federal Reserve e a ampliar o crédito, e o Controlador John Skelton Williams instou os fazendeiros a fazer empréstimos e a segurar suas colheitas para conseguir um preço mais alto. Essa política continuou em plena força após a guerra. A inflação da década de 1920 começou, de fato, com o anúncio por parte do Conselho do Federal Reserve, em 1921, de que seria ofertado ainda mais crédito para a colheita e para a venda em quaisquer quantidades legitimamente exigidas. E, no começo de 1921, Andrew Mellon, secretário do Tesouro, estava instando o Fed em privado a estimular a economia e a reduzir as taxas de desconto; os registros mostram que seus conselhos foram plenamente seguidos. O governador James, do Conselho do Federal Reserve, declarou em 1926 a seus colegas que “o propósito mesmo” do Federal Reserve System “era estar a serviço da agricultura, da indústria e do comércio da nação”, e aparentemente ninguém estava disposto a contradizê-lo. Também em 1926, o Dr. Oliver M. W. Sprague, economista e influente conselheiro do Federal Reserve System, profetizou que não haveria progressos imediatos na taxa de redesconto, porque a economia estava presumindo naturalmente desde 1921 que sempre haveria bastante crédito do Federal Reserve à disposição. É claro que não se poderia decepcionar a economia.[23] Em 1928 e em 1929, a causa da política fraquíssima de descontos do Federal Reserve foi seu medo de que uma taxa de juros mais elevada não fosse mais capaz de “acomodar” suficientemente a economia.
A política inflacionária de baixos descontos foi um traço dominante e importante dos governos Harding e Coolidge. Antes mesmo de iniciar seu mandato, o presidente Harding insistiu para que as taxas de juros fossem reduzidas, e repetidas vezes anunciou sua intenção de reduzir as taxas de desconto após eleger-se presidente. E o presidente Coolidge, num famoso discurso pré-eleição em 22 de outubro de 1924, afirmou que “a política desse governo foi reduzir as taxas de desconto” e prometeu mantê-las baixas. Os dois presidentes nomearam membros do Conselho do Federal Reserve que defendiam essa política.[24] Eugene Meyer, presidente da War Finance Corporation, avisou aos bancos que, ao anunciar que eles não descontavam com essa agência de empréstimos agrícolas, eles eram “prejudiciais ao interesse público”.[25] Enquanto uns, como o presidente da Associação Comercial de Nova York, preveniam Coolidge contra o crédito do Federal Reserve, outros pressionavam por mais inflação: um deputado de Nebraska propôs empréstimos em Notas do Tesouro a uma taxa de 1,5% para os fazendeiros, o senador Magnus Johnson insistiu numa taxa máxima de redesconto de 2%, e o National Farmer-Labor Party [Partido Nacional do Trabalho e da Agricultura] pediu a nacionalização de todos os bancos. Movidos por seu desejo geral de oferecer crédito barato e abundante à indústria, e também por sua política (como logo veremos) de ajudar a Inglaterra a evitar as consequências de suas próprias políticas monetárias, o Federal Reserve constantemente se esforçou para evitar subir as taxas de desconto. No fim de 1928 e em 1929, quando essa necessidade era bastante evidente, o Conselho do Federal Reserve refugiou-se na perigosa doutrina qualitativa de “persuasão moral”. A persuasão moral era uma tentativa de manter o crédito abundante para as indústrias “legítimas”, ao mesmo tempo em que o negava aos especuladores “ilegítimos” do mercado de ações. Como vimos, essas tentativas de segregar os mercados de crédito foram inevitavelmente autodestrutivas, e, por colocar etiquetas éticas diferentes em formas igualmente legítimas de atividade econômica, também foram maliciosas.
A persuasão moral surgiu na famosa carta enviada em fevereiro de 1929 pelo Conselho do Federal Reserve aos diversos bancos do Federal Reserve, alertando-os de que os bancos iam além dos seus direitos ao fazer empréstimos especulativos, e aconselhavam que se restringisse a especulação de crédito por parte do Federal Reserve, mantendo, porém, o crédito ao comércio e às empresas. Esse passo foi uma resposta evasiva à insistência do Federal Reserve Bank de Nova York para elevar a taxa de redesconto de 5% para 6%, medida já bastante frágil que foi retardada até o fim de 1929. Se antes de 1927 o Federal Reserve Bank de Nova York era o órgão mais inflacionário (como veremos em breve), depois disso ele seguiu uma política muito mais sensata: restrição geral de crédito, com, por exemplo, elevação da taxa de redesconto, enquanto o Conselho do Federal Reserve caía em falácias de crédito qualitativo num momento particularmente perigoso — 1929. O Conselho do Federal Reserve chegou mesmo ao ponto de mandar o Federal Reserve Bank de Nova York emprestar livre e abundantemente para fins comerciais.[26] O falecido Benjamin Strong sempre afirmara que era impossível demarcar os empréstimos bancários, e que o problema era quantitativo e não qualitativo. O Federal Reserve Bank de Nova York continuou a enfatizar essa perspectiva, e recusou-se a seguir a diretiva do Conselho do Federal Reserve, repetindo que ele não deveria se preocupar com empréstimos bancários, e sim com reservas e depósitos bancários.[27] A recusa do Federal Reserve Bank de Nova York em seguir a diretiva de persuasão moral do Conselho do Federal Reserve acabou provocando uma carta do Conselho em 1 de maio, listando certos bancos membros de Nova York que estavam fazendo contínuos empréstimos do Federal Reserve, e que também tinham “excessivos” empréstimos para o mercado de ações, e pedindo que o Federal Reserve Bank de Nova York cuidasse disso seguindo essa diretriz. A 11 de maio, o Federal Reserve Bank de Nova York recusou-se terminantemente, reiterando que os bancos têm o direito de fazer empréstimos para o mercado de ações, e que não havia modo de determinar quais empréstimos eram especulativos. A 1 de junho, o Conselho sucumbiu, abandonando sua política de persuasão moral. Ele não elevou a taxa de redesconto até agosto, porém.[28]
Excetuando as ações do Federal Reserve Bank de Nova York, a política de persuasão moral fracassou, até segundo seus próprios termos, porque os mutuantes não-bancários usaram os fundos que tiraram dos bancos para tomar o lugar dos mutuantes bancários no mercado de ações. Esse resultado inevitável surpreendeu e deixou perplexos os qualitativistas, e o boom da bolsa continuou alegremente.[29]
Se os empréstimos para o mercado de ações não são piores do que outras formas de empréstimos, e se a persuasão moral era uma fuga falaciosa da necessidade de restrição quantitativa, qualquer apoio governamental especial a algum tipo específico de empréstimo é importante sob dois aspectos: (1) o incentivo governamental de um tipo de empréstimo tende a inchar a quantidade geral de empréstimos bancários; e (2) isso certamente superestimulará aquele empréstimo em particular e agravará suas dificuldades de reajuste na fase de depressão. Cabe-nos portanto examinar os exemplos importantes de estímulo governamental específico ao mercado de ações na década de 1920. Se não é tão importante quanto o aumento de reservas e da oferta monetária, essa ajuda especial serviu para atiçar o aumento quantitativo, e também criou distorções particulares no mercado de ações, as quais causaram dificuldades ainda maiores durante a depressão.
Uma importante ajuda à inflação no mercado de ações foi a política do FRS de manter as taxas de empréstimos para conta margem (ou empréstimos bancários ao mercado de ações) particularmente baixas. Antes do estabelecimento do Federal Reserve System, a taxa de empréstimos para conta margem frequentemente ficava acima de 100%, mas, desde seu começo, a taxa de empréstimos para conta margem nunca subiu acima de 30%, e muito raramente acima de 10%.[30] As taxas para conta margem eram controladas nesses níveis baixos pelo Federal Reserve Bank de Nova York, com a cooperação direta e a assessoria do Comitê Monetário da Bolsa de Nova York. O Fed de Nova York também fazia constantes empréstimos aos bancos de Wall Street com o fim de regular a taxa para conta margem.
Outro importante meio de incentivar o mercado de ações foi uma sequência de declarações públicas feitas para atiçar o boom sempre que ele dava sinais de enfraquecimento. O presidente Coolidge e o secretário do Tesouro Mellon agiram, desse modo, como os principais “capeadores de Wall Street”.[31] Assim, quando o boom emergente do mercado de ações começou a dar maus sinais, em janeiro de 1927, o secretário Mellon fez com que ele continuasse. A subida que se seguiu em fevereiro estabilizou-se em março, e assim Mellon anunciou a intenção do Tesouro de financiar os Liberty Bonds [Títulos da Primeira Guerra Mundial], que estavam em 4,25%, em notas de 3,5% em novembro próximo. Ele previu taxas de juros menores (corretamente, devido à inflação monetária subsequente) e insistiu em taxas menores no mercado. O anúncio fez com que os preços de ações subissem de novo em março. O boom outra vez começou a enfraquecer no fim de março, e Mellon outra vez prometeu contínuas taxas baixas de redesconto e desenhou um linda estrada de dinheiro fácil. Disse ele: “Há uma oferta abundante de dinheiro fácil que deve cuidar de quaisquer contingências que possam aparecer.” As ações continuaram a subir, mas tiveram uma pequena queda em junho. Dessa vez o presidente Coolidge veio ajudar, instando todos ao otimismo. Outra vez o mercado ficou fortemente a seu lado, mas reagiu mal em outubro, quando Coolidge anunciou que não se candidataria à reeleição. Após outra subida e recessão subsequente em outubro, Coolidge outra vez apareceu para dar uma declaração altamente otimista. Outras declarações otimistas de Mellon e de Coolidge, anunciando a “nova era” de prosperidade permanente, injetaram repetidas vezes força no mercado. O New York Times afirmou em 16 de novembro que de Washington vinham notícias de tremenda confiança, e observou que era cada vez maior a “impressão de que talvez o mercado de ações dependa cada vez mais de Washington para novos ímpeto.”
Notas Compradas — Aceitações
As Tabelas 7 e 8 mostram a enorme importância das Notas Compradas na década de 1920. Se a compra de Títulos do Governo dos Estados Unidos foi mais divulgada, as Notas Compradas foram pelo menos tão importantes, e, aliás, mais importantes do que os descontos. As Notas Compradas lideraram o desfile inflacionário de crédito do Federal Reserve em 1921 e em 1922, foram consideravelmente mais importantes do que os títulos no incentivo inflacionário de 1924, e tão importantes quanto o incentivo de 1927. Além disso, as Notas Compradas, por si, continuaram o estímulo inflacionário na fatal segunda metade de 1928.
Essas Notas Compradas eram quase todas aceitações (e quase todas aceitações de banqueiros) e a política do Federal Reserve para aceitações era sem dúvida a mais curiosa e a mais indefensável de todo o catálogo de políticas do Federal Reserve. Como no caso dos títulos, as aceitações eram compradas no mercado aberto, e assim ofereciam diretamente aos bancos reservas sem a obrigação de reembolso (como nos descontos). Contudo, se o FRS preservou sua liberdade de ação quanto à compra ou à venda de títulos do governo dos Estados Unidos, ele amarrou as próprias mãos no caso das aceitações. Ele insistiu em estabelecer uma taxa muito baixa para as aceitações, e desse modo subsidiou e literalmente criou todo o mercado de aceitações do país, e depois prometeu comprar todas as notas oferecidas àquela taxa baixa.[32] O Federal Reserve, assim, arbitrariamente criou e subsidiou um mercado artificial de aceitações nos Estados Unidos, e comprou o que quer que lhe fosse oferecido a uma taxa artificialmente baixa. Essa política foi indesculpável por duas razões — suas consequências altamente inflacionárias, e sua concessão de privilégios especiais a um pequeno grupo às custas do público em geral.
Em contraste com a Europa, onde as aceitações há muito eram amplamente usadas como papéis comerciais, o pequeníssimo mercado para elas nos Estados Unidos e seu subsídio pelo FRS fizeram com que o Federal Reserve se tornasse o comprador dominante de aceitações.[33] Tratava-se de um mercado integralmente criado pelo Federal Reserve, que era usado apenas para o comércio internacional, ou para transações exclusivamente com o estrangeiro. Em 1928 e em 1929, os bancos evitaram fazer empréstimos junto ao Fed ao fazer empréstimos de aceitações em vez de empréstimos diretos, aproveitando-se assim do mercado do FRS e das taxas baratas de aceitações. Quando o Federal Reserve comprava a aceitação, o banco então adquiria uma reserva de modo menos caro do que pelos descontos, e sem ter de fazer o reembolso. Daí o papel inflacionário das aceitações em 1929 e sua sabotagem de outras tentativas do Federal Reserve de restringir o crédito.
Além das aceitações que o FRS mantinha em sua própria conta, ele também comprou uma grande quantidade de aceitações enquanto agente de bancos centrais estrangeiros. Além disso, a taxa de compra para aceitações para contas estrangeiras era mais baixa do que para suas próprias compras, subsidiando assim ainda mais essas compras de governos estrangeiros. Essas aceitações não eram incluídas em “Notas Compradas”, mas eram endossadas pelo FRS e, em tempos de crise, esse endosso poderia se tornar um risco para o Federal Reserve; assim aconteceu em 1931. As aceitações do Federal Reserve foram compradas dos bancos membros, dos bancos não-membros, e de casas privadas de aceitações — e as notas para contas estrangeiras eram compradas inteiramente dos corretores privados.[34]
O primeiro grande investimento em aceitações veio em 1922, coincidindo com a permissão dada pelo Conselho do Federal Reserve ao Reserve Bank de Nova York para controlar a política de aceitações. As aceitações do Federal Reserve subiram de US$ 75 milhões em janeiro para US$ 272 milhões em dezembro daquele ano. Apesar do fato de que o Federal Reserve manteve sua taxa de compra de aceitações abaixo de sua taxa de redesconto, Paul Warburg, principal banqueiro de aceitações dos Estados Unidos, e um dos fundadores do Federal Reserve System, exigia taxas ainda mais baixas para as aceitações.[35] Gilbert, subsecretário do Tesouro, por outro lado, era contra as taxas de aceitação com privilégios especiais, mas o Federal Reserve continuou sua política, dirigida em grande parte pelo Federal Reserve Bank de Nova York.[36]Na verdade, foi apenas na primeira metade de 1929 que o Federal Reserve abandonou parcialmente sua política de subsídios, e pelo menos elevou sua taxa para compras de aceitações acima da taxa de redesconto, provocando assim uma forte redução nas aceitações em seu poder. De fato, a redução nas aceitações foi quase o único fator para a redução de reservas em 1929, colocando um fim à grande inflação da década de 1920.
Por que o Federal Reserve criou do nada e ainda subsidiou de modo ultrajante o mercado de aceitações neste país? A única razão realmente plausível para girar em torno do papel desempenhado por Paul M. Warburg, antigo banqueiro de investimentos alemão que veio para os Estados Unidos a fim de tornar-se sócio de Kuh, Loeb and Company, e que foi um dos fundadores do Federal Reserve System. Warburg trabalhou por anos para trazer as duvidosíssimas bênçãos do sistema de banco central para os até então retrógrados Estados Unidos. Após a guerra e durante a década de 1920. Warburg continuou na presidência do Conselho do International Acceptance Bank [Banco Internacional de Aceitações] de Nova York, o maior banco de aceitações do mundo. Ele também se tornou diretor do importante Westinghouse Acceptance Bank e de diversas outras casas de aceitação, e foi o principal fundador, além de presidente, do Executive Committee of the American Acceptance Council [Comitê Executivo do Conselho Americano de Aceitações], associação comercial fundada em 1919. Sem dúvida, o protagonismo de Warburg no Federal Reserve System estava relacionado com o fato de ele receber a maior parte dos benefícios de sua política de aceitações. E com certeza é difícil achar qualquer outra explicação adequada para a adoção desse curioso programa. De fato, o próprio Warburg proclamava o sucesso de sua influência para convencer o Federal Reserve a afrouxar as regras de elegibilidade para a compra de aceitações, e a estabelecer taxas subsidiadas pelas quais o Federal Reserve comprava todas as aceitações oferecidas.[37] E, por fim, Warburg era amigo íntimo de Benjamin Strong, o poderoso senhor do Federal Reserve Bank de Nova York, que praticava a política de subsídios.[38]
O governo federal ampliou progressivamente o escopo do mercado de aceitações desde o princípio mesmo do Federal Reserve Act. Antes disso, os bancos nacionais eram proibidos de comprar aceitações. Após o Act, os bancos tiveram permissão para comprar aceitações de comércio exterior até o limite de 50% do capital e dos excedentes de um banco. Emendas subsequentes elevaram o limite para 100% de capital e excedentes, e depois para 150%, e permitiram outros tipos de aceitações — “câmbio de dólares” e aceitações domésticas. Além disso, a prática inglesa de aceitações era estritamente limitada à troca de papéis, representando movimentações definidas de bens. O Conselho do Federal Reserve inicialmente tentou limitar as aceitações a essas trocas, mas em 1923 ele sucumbiu à pressão do Federal Reserve Bank de Nova York e permitiu “notas financeiras” sem documentos. Os bancos do Federal Reserve de Nova York e de outros estados também receberam poderes em 1921 e em 1922 para comprar aceitações puramente estrangeiras, cuja maturidade permissível foi elevada de três para seis meses. Em 1923, como parte do programa de crédito agrícola, o Fed recebeu permissão para redescontar aceitações de base agrícola de até seis meses.[39] Em 1927, as notas foram consideradas elegíveis ainda que fossem retiradas após a movimentação dos bens.[40]
Com o relaxamento das regras, as aceitações puramente estrangeiras, que representavam bens armazenados em pontos do estrangeiro ou deles enviados, subiram do nada para o protagonismo nas aceitações em posse do Federal Reserve durante o período crucial de 1928 e 1929. As compras de aceitações estrangeiras foram muito importantes, sobretudo na segunda metade de 1929, para frustrar todas as tentativas de frear o boom. Restrições anteriores de crédito estavam a caminho para encerrar o boom inflacionário em 1928. Mas em agosto o Federal Reserve deliberadamente inverteu sua política de dinheiro curto para o mercado de aceitações, e o Conselho autorizou os bancos do Federal Reserve a comprar pesadamente a fim de acomodar as necessidades de crédito.[41] As razões para essa infeliz inversão foram gerais em grande parte: a pressão política para facilitar o crédito em ano de eleição, e o medo das repercussões na Europa de taxas altas de juros nos Estados Unidos foram as mais importantes. Mas também houve uma razão mais específica, relacionada ao mercado de aceitações estrangeiras.
Ao contrário dos tipos mais antigos de aceitações, as aceitações puramente estrangeiras eram notas que representavam bens que aguardavam a venda, e não bens em trânsito entre compradores e vendedores específicos.[42] A maioria delas era usada para financiar a armazenagem de bens não-vendidos na Europa central, especialmente na Alemanha.[43] Como surgiu esse aumento da posse de aceitações alemãs? Ele foi o resultado de um espetacular boom americano em empréstimos estrangeiros, financiado por novas emissões de títulos estrangeiros. Esse boom floresceu a partir de 1924, e atingiu seu pico em meados de 1928. Foi um reflexo direto da expansão de crédito americano, e particularmente das taxas de juros baixas geradas por essa expansão. Como veremos mais adiante, esse resultado foi deliberadamente nutrido pelas autoridades do Federal Reserve. A Alemanha era um dos principais mutuários do mercado americano durante o boom. A Alemanha sem dúvida tinha pouco capital, privada dele pela guerra e depois por sua ruinosa inflação, que culminou em 1923. Contudo, os títulos alemães que circulavam nos Estados Unidos não estavam reconstruindo, como pensava a maioria das pessoas, o capital alemão, porque esses empréstimos eram em grande parte concedidos aos governos dos municípios e dos estados alemães, e não às empresas privadas alemãs. Os empréstimos tornavam o capital ainda mais escasso na Alemanha, porque os governos locais agora podiam competir ainda mais fortemente com as empresas privadas por fatores de produção.[44] Para seu grande crédito, muitas autoridades alemãs, e especialmente o dr. Hjalmar Schacht, presidente do Reichsbank, compreenderam a insustentabilidade desses empréstimos, e, junto com o sr. S. Parker Gilbert, Agente Americano de Reparações, instaram a comunidade bancária de Nova York a parar de fazer empréstimos aos governos locais da Alemanha.[45] Mas os banqueiros de investimento americanos, atraídos pelas gordas comissões sobre os empréstimos a governos estrangeiros, enviaram centenas de agentes ao exterior para instar os mutuários prospectivos a fazer empréstimos no mercado americano. O centro de suas atenções foi a Alemanha.[46]
A maré de empréstimos ao estrangeiro virou fortemente após meados de 1928. O crescimento das taxas de juros nos Estados Unidos, combinado com o forte boom do mercado de ações, desviou os fundos dos títulos estrangeiros para as ações domésticas. As dificuldades econômicas alemãs agravaram a queda nos empréstimos ao estrangeiro no fim de 1928 e em 1929. A consequência foi que os bancos alemães, vendo que seus clientes não conseguiam vender novos títulos nos Estados Unidos, obtinham empréstimos na forma de crédito de aceitação no Federal Reserve Bank de Nova York, a fim de cobrir os custos de guardar estoques não-vendidos de algodão, de cobre, de farinha e de outras commodities nos armazéns alemães.[47] Os bancos americanos que serviram de agentes de bancos estrangeiros venderam vastas quantidades de aceitações estrangeiras (em grande parte alemãs) para outros bancos americanos e para o Federal Reserve System.[48]Isso explica o aumento das aceitações alemãs em posse do Federal Reserve.
Outras aceitações que floresceram em 1928 e em 1929 representavam o algodão e o trigo domésticos que esperavam exportação, e notas de câmbio que forneciam dólares à América do Sul. No começo de 1929, houve também uma erupção de aceitações baseadas na importação de açúcar de Cuba, por causa da expectativa de uma tarifa americana mais pesada sobre o açúcar.[49]
Não apenas o Federal Reserve — efetivamente, o Federal Reserve Bank de Nova York — subsidiou o mercado de aceitações, como também restringiu seus subsídios a algumas grandes casas de aceitação. Ele se recusava a comprar quaisquer aceitações diretamente das empresas, insistindo em comprá-las de corretores de aceitações que funcionavam como intermediários — subsidiando assim os corretores. Além disso, ele só comprava aceitações de uns poucos corretores com capital de no mínimo um milhão de dólares. Outro privilégio especial foi o crescimento na compra de aceitações por parte do Federal Reserve em acordos de recompra. Nesse procedimento, o Federal Reserve Bank de Nova York concordava em comprar aceitações de alguns poucos corretores grandes e conhecidos que tinham a opção de recomprá-las em quinze dias a um preço fixado correntemente. Os acordos de recompra variaram entre um décimo a quase dois terços das aceitações.[50] Tudo isso tende a confirmar nossa hipótese sobre o papel de Warburg.
Em suma, o Federal Reserve na prática deu empréstimos de conta margem aos corretores de aceitações, assim como acesso irrestrito a taxas subsidiadas, e deu esses privilégios a corretores que, naturalmente, não eram membros do Federal Reserve System. De fato, sendo banqueiros privados não-incorporados, os corretores nem sequer faziam relatórios públicos. O Federal Reserve Bank de Nova York tinha um ciúme tão curioso do segredo de seus favoritos que arrogantemente recusou-se a dar a um comitê de investigação do Congresso tanto uma lista dos corretores de aceitações de quem havia comprado notas quanto uma lista detalhada de aceitações estrangeiras por país. As autoridades do Federal Reserve Bank de Nova York não foram citadas judicialmente por desrespeito pelo comitê.[51]
Títulos do Governo dos Estados Unidos
As reservas dos bancos membros aumentaram durante a década de 1920 principalmente em três grandes ondas — a primeira em 1922, a segunda em 1924 e a terceira na segunda metade de 1927. Em cada uma dessas ondas, as compras do Federal Reserve de títulos do governo desempenharam um papel fundamental. As operações de compra e de venda “de mercado aberto” de títulos do governo só se tornaram um fator crucial do controle monetário pelo Federal Reserve durante a década de 1920. O processo começou quando o Federal Reserve triplicou seu estoque de títulos do governo, entre novembro de 1921 e junho de 1922 (os títulos em seu poder somavam US$ 193 milhões ao fim de outubro, e US$ 603 milhões ao fim de maio no ano seguinte). Ele não fez isso para tornar a moeda mais fácil e para inflar a oferta monetária, porque essas relações eram pouco entendidas naquela época, mas simplesmente para aumentar os rendimentos do Federal Reserve. O resultado inflacionário dessas compras veio como uma consequência inesperada.[52] Essa lição foi compreendida aos poucos e aplicada desde então.
Se as autoridades do Federal Reserve eram inocentes quanto às consequências de sua política inflacionária em 1922, elas não eram inocentes quanto à intenção, porque todos os indícios apontam que o resultado inflacionário foi muito bem-vindo pelo Federal Reserve. A inflação parecia justificada enquanto meio de promover a recuperação da queda de 1920—1921, de aumentar a produção e de diminuir o desemprego. O governador Adolph Miller, do Conselho do Federal Reserve, que se opôs firmemente às políticas inflacionárias posteriores, defendeu a inflação de 1922 em audiências no Congresso. Foi bastante representativa da opinião do Federal Reserve naquele momento a apologia subsequente do professor Reed, que, com toda a complacência, escreveu que o crédito bancário “estava sendo empregado de maneira produtiva e que os bens estavam sendo preparados para o consumidor ao menos com a mesma rapidez com que sua renda monetária se expandia”[53].
A política de mercado aberto foi então iniciada, e ela desempenhou um dos principais papéis nas ondas inflacionárias de 1924 e de 1927, e portanto na inflação geral da década de 1920.
Os bancos individuais do Federal Reserve inicialmente compravam os títulos por iniciativa própria, e o Tesouro melindrou-se com essa política descentralizadora. Por iniciativa do Tesouro, e com o apoio de Benjamin Strong, os governadores dos vários Reserve Banks formaram um Comitê de Mercado Aberto para coordenar as operações de compra e de venda do Federal Reserve. O Comitê foi estabelecido em junho de 1922. Em abril de 1923, porém, esse Comitê de Governadores foi dissolvido e um novo Comitê de Investimento de Mercado Aberto foi nomeado pelo Conselho do Federal Reserve. Originalmente, isso era um golpe do Conselho para exercer a liderança sobre a política de mercado aberto, no lugar do poder cada vez maior de Strong, governador do Federal Reserve Bank de Nova York. Strong passou o ano de 1923 doente, e foi durante esse ano que o Conselho conseguiu vender a maioria dos títulos do governo em sua posse. Assim que Strong voltou ao trabalho em novembro, porém, sendo presidente do Comitê de Investimento de Mercado Aberto, insistiu em comprar títulos sem hesitação, para evitar a mera ameaça de recessão econômica.
Como resultado da nova subida ao poder de Strong, o Federal Reserve retomou em dois meses uma pesada compra de títulos do governo, e a economia ficou firme em seu caminho inflacionário. Como diz o biógrafo de Strong, e seu admirador: “Dessa vez o Federal Reserve sabia o que estava fazendo, e suas compras não eram para rendimentos, mas para amplos fins de política monetária”, isso é, para a inflação. Ironicamente, Benjamin Strong agora estava mais poderoso do que nunca, e de fato, até sua aposentadoria, a política do FRS de mercado aberto foi na prática governada pelo governador Strong.[54] Um dos primeiros dispositivos de controle do governador Strong foi estabelecer uma “Conta de Investimento de Sistema Especial”, em que, como no caso das aceitações, as compras que o Federal Reserve fizesse de governos eram feitas em sua maioria pelo Federal Reserve Bank de Nova York, que então as distribuía pro rata aos demais bancos do Federal Reserve que quisessem os títulos.
Outro traço novo e importante da década e 1920 foi a manutenção de um grande volume de dívida governamental flutuante de curto prazo. Antes da guerra, quase toda a dívida dos Estados Unidos estava consolidada em títulos de longo prazo. Durante a guerra, o Tesouro emitiu inúmeras notas de curto prazo, consolidadas apenas parcialmente numa data posterior. A partir de 1922, entre meio e um bilhão de dólares de dívida de curto prazo do Tesouro ficou em circulação nos bancos, tendo de ser refinanciada periodicamente. Os bancos membros eram incentivados a manter o máximo que podiam desses títulos: o Tesouro mantinha depósitos nos bancos, e eles podiam fazer empréstimos junto ao Federal Reserve, usando os certificados como garantia adicional. As compras de mercado aberto do governo federal também ajudaram a manter baixas as taxas no mercado de títulos do governo. O resultado foi que os bancos possuíam mais dívida do governo em 1928 do que possuíam durante a guerra. Assim, o Federal Reserve, ao usar diversos meios para estimular o mercado a receber a dívida flutuante do governo federal, contribuiu para aumentar o ímpeto inflacionário.[55]
[1] Ver Lin Lin, “Are Time Deposits Money?”, American Economic Review (março de 1937): 7686. Lin observa que a demanda e os certificados de depósitos bancários são intercambiáveis em valor nominal e em dinheiro, e assim são vistos pelo público. Ver também Gordon W. McKinley, “The Federal Home Loan Bank System and the Control of Credit”, Journal of Finance (setembro de 1957): 319?32, e idem, “Reply”, Journal of Finance (dezembro de 1958): 545.
[2] O governador George L. Harrison, presidente do Federal Reserve Bank do estado de Nova York, num testemunho em 1931, afirmou que qualquer banco que enfrente uma corrida tem de resgatar imediatamente tanto seus depósitos à vista quanto de poupança. Qualquer pedido de aviso prévio de trinta dias provavelmente faria com que o Comptroller of Currency [Autoridade de Controle da Moeda] fechasse o banco imediatamente. Harrison concluiu: “essas contas [a prazo] são substancialmente, e para todos os efeitos, depósitos à vista”. Charles E. Mittchell, presidente do National City Bank of New York, concordou que “nenhum banco comercial poderia se dar ao luxo de invocar o direito de atrasar o pagamento desses depósitos”. E, de fato, as fortes corridas bancárias de 1931?1933 estiveram relacionadas a depósitos a prazo assim como a depósitos à vista. Senate Banking and Currency Committee, Hearings on Operations of National and Federal Reserve Banking Systems, Part I (Washington, D.C., 1931), pp. 36, 321?22; e Lin Lin, “Are Time Deposits Money?”
[3] Os depósitos a prazo, além disso, são muitas vezes usados diretamente para fazer pagamentos. Os indivíduos podem obter cheques do banco, e usá-los diretamente como moeda. Mesmo D. R. French, que tentou negar que depósitos a prazo são moeda, admitiu que algumas empresas usavam depósitos a prazo para “grandes pagamentos em particular, como os de impostos, após notificar o banco”. D. R. French, “The Significance of Time Deposits in the Expansion of Bank Credit, 1922?1928”, Journal of Political Economy (dezembro de 1931): 763. Ver também Senate Banking?Currency Committee, Hearings, pp. 321?22; Committee on Bank Reserves, “Member Bank Reserves”, em Federal Reserve Board, 19th Annual Report, 1932 (Washington, D.C., 1933), pp. 27ss; Lin Lin, “Are Time Deposits Money?” e Business Week (16 de novembro de 1957).
[4] Ver Lin Lin, “Professor Graham on Reserve Money and the One Hundred Percent Proposal”, American Economic Review (março de 1937): 112?13.
[5] Como observou Frank Graham, a tentativa de manter os depósitos à vista simultaneamente como ativos plenamente líquidos e como investimento gerador de juros é a mesma coisa que tentar comer a torta e guardá-la. Isso vale para os depósitos à vista, para as cotas das associações de poupança e empréstimo, e também para os valores de resgate das companhias de seguros de vida. Ver Frank D. Graham, “One Hundred Percent Reserves: Comment”, American Economic Review (junho de 1941): 339.
[6] Ver McKinley, “The Federal Home Loan Bank System and the Control of Credit”, pp. 323?24. Sobre os economistas que consideram e os que não os depósitos a prazo moeda, ver Richard T. Selden, “Monetary Velocity in the United States”, em Milton Friedman, ed., Studies in the Quantity Theory of Money (Chicago: University of Chicago Press, 1956), pp. 179?257.
[7] Em sua exposição mais recente do assunto, McKinly aborda o reconhecimento do valor de resgate das apólices de seguros de vida como parte da oferta monetária em sentido mais amplo. Gordon W. McKinley, “Effects of Federal Reserve Policy on Nonmonetary Financial Institutions”, em Herbert V. Prochnow, ed., The Federal Reserve System (Nova York: Harper and Bros., 1960), pp. 217n, 222.
Atualmente, os títulos do governo teriam de ser incluídos na oferta monetária. Por outro lado, os fundos de pensão não são parte da oferta monetária, uma vez que são simplesmente poupados e investidos, sem ser resgatáveis à vista, e
[8] Os dados para cotas de associações de poupança-e-empréstimos e de reservas de seguros de vida só são confiáveis para o fim de cada ano; os dados do meio de cada ano são estimados pelo autor por meio de interpolação. Estritamente falando, a oferta monetária do país é igual aos dados acima menos a quantidade de papel-moeda e de depósitos a prazo em poder das companhias de poupança e empréstimo e de seguros de vida. Essas últimas cifras não estão disponíveis, mas sua ausência não altera excessivamente os resultados.
[9] Sobre a relutância dos bancos em emprestar ao consumidor durante essa época, ver Clyde W. Phelps, The Role of the Sales Finance Companies in the American Economy (Baltimore, Maryland: Commercial Credit, 1952).
[10] Como diz McKinley:
Assim como a fonte última de reservas para os bancos comerciais consiste em obrigações de depósitos dos bancos do Federal Reserve, também a fonte última de reservas das instituições não-bancárias consiste em obrigações de depósitos dos bancos comerciais. A oferta monetária [são]? duas pirâmides invertidas, uma em cima da outra. O Federal Reserve fica na base da pirâmide inferior, e? por controlar o volume de suas próprias obrigações de depósito, os bancos do FR influenciam não apenas as obrigações de depósito dos bancos comerciais, mas também as obrigações de depósitos de todas aquelas instituições que usam como reservas em espécie as obrigações de depósitos dos bancos comerciais.
[11] Pode-se perguntar, em desespero: se as instituições supostamente “de poupança” (caixas econômicas, companhias de seguros, associações de poupança e empréstimos etc.) estão obrigadas por lei a manter 100% de reservas, que poupança seria permitia numa sociedade libertária? A resposta é: poupança verdadeira, como por exemplo a emissão de cotas numa empresa de investimentos, ou a venda de títulos ou de outras debêntures ou de títulos a prazo para os poupadores, que venceriam em uma certa data no futuro. Esses fundos verdadeiramente poupados seriam, por sua vez, investidos nas empresas.
[12] Banking and Monetary Statistics, pp. 370?71. O excesso listado para 1929 fica na média de quarenta milhões de dólares, ou cerca de 2% do total dos saldos em reserva.
[13] Banking and Monetary Statistics, pp. 34 e 75. Os depósitos computados são os “depósitos à vista corrigidos” mais depósitos do governo dos Estados Unidos. Uma transferência de depósitos bancários de membros para não-membros tenderia a reduzir as reservas mínimas reais e aumentar o excesso de reservas e a oferta monetária, uma vez que os bancos não-membros usam os depósitos nos bancos membros como base para suas reservas. Ver Lauchlin Currie, The Supply and Control of Money in the United States (2a ed, Cambridge, Mass: Harvard University Press, 1935), p. 74.
[14] Sobre os depósitos a prazo na década de 1920, ver Benjamin M. Anderson, Economics and the Public Welfare (Nova York: D. Van Nostrand, 1949), pp. 128?31; ver também C. A. Phillips, T. F. McMAnus, e R. W. Nelson, Banking and the Business Cycle (Nova York: MacMillan, 1937), pp. 98?101.
[15] A conhecida categoria de “Crédito do Federal Reserve” consiste em Ativos Comprados do Federal Reserve e em Notas Descontadas.
[16] Para o Pittman Act, ver Edwin W. Kemmerer, The ABC of the Federal Reserve System (9a ed., Princeton, NJ: Princeton University Press, 1932), pp. 258?62.
[17] H. Parker Willis, “Conclusions”, em H. Parker Willis, et al., “Report of an Inquiry into Contemporary Banking in the United States” (manuscrito datilografado, Nova York, 1925), vol. 7, pp. 16?18.
[18] Ver Seymour E. Harris, Twenty Years of Federal Reserve Policy (Cambridge, Mass: Harvard University Press, 1933), vol. 1, pp 3?10, 39?48.
[19] Ibid, pp. 108ss.
[20] Federal Reserve, Annual Report, 1923, p. 10; citado em ibid., p. 109.
[21] Ver Philips, et al., Banking and the Business Cycle, pp. 93?94.
[22] Harris, Twenty Years, p. 91.
[23] Oliver M. W. Sprague, “Immediate Advances in the Discount Rate Unlikely”, The Annalist (1926): 493.
[24] Ver H. Parker Willis, “Politics and the Federal Reserve System”, Banker’s Magazine (janeiro de 1925): 13?20; idem, “Will the Racing Stock Market Become a Juggernaut?”, The Annalist (24 de novembro de 1924): 541?42; e The Annalist (10 de novembro de 1924): 477.
[25] A War Finance Corporation [Corporação de Financiamento da Guerra] havia sido dominante até 1921, quando o congresso expandiu sua capacidade autorizada de empréstimos e reorganizou-a para que ela desse empréstimos a associações agrícolas. Além disso o sistema do Federal Land Bank, criado em 1916 para fazer empréstimos hipotecários a associações agrícolas, voltou a conceder empréstimos, e mais fundos do Tesouro foram autorizados para bens de capital. E, por fim, o farm bloc [o lobby agrícola, com democratas e republicanos] conseguiu aprovar o Agricultural Credits Act [Lei dos Créditos Agrícolas] de 1923, que estabeleceu doze Federal Intermediate Credit Banks [Bancos Federais Intermediários do Crédito] a fim de conceder empréstimos a associações agrícolas. Ver Theodore Saloutos e John D. Hicks, Agricultural Discontent in the Middle West, 1900?1939 (Madison: University of Wisconsin Press, 1951), pp. 324?40.
[26] Ver Harris, Twenty Years, p. 209.
[27] Charles E. Mitchell, à época presidente do National City Bank de Nova York, é atacado há anos por ter supostamente desafiado o Conselho do Federal Reserve e frustrado a política de persuasão moral ao ter ousado emprestar ao mercado de ações durante a emergente crise do mercado no fim de março. Mas agora parece que Mitchell e os demais principais bancos de Nova York somente agiram com a aprovação do Governador do Federal Reserve Bank de Nova York e do Conselho inteiro do Federal Reserve, que, assim, claramente nem sequer teve a coragem de manter suas convicções. Ver Anderson, Economics and the Public Welfare, p. 206.
[28] Ver Charles O. Hardy, Credit Policies of the Federal Reserve System (Washington, D.C.: Brookings Institution, 1932), pp. 122?38. O dr. Lawrence E. Clark, seguidor de H. Parker Willis, afirmou que o sr. Gates McGarrah, presidente do Federal Reserve Bank de Nova York à época, era contrário à persuasão moral porque ele mesmo especulava no mercado de ações e nos empréstimos bancários com aquele propósito. Se essa fosse a razão, porém, McGarrah dificilmente teria sido ? como foi ? a principal força a insistir num aumento da taxa de redesconto. Ao contrário, ele teria sido contra qualquer freio à inflação. Ver Lawrence E. Clark, Central Banking Under the Federal Reserve System (Nova York: Macmillan, 1935), p. 267n.
[29] A política de persuasão moral foi perspicazmente criticada por W. P. G. Harding, antigo presidente do Conselho do Federal Reserve. A política continuou, porém, provavelmente por causa da insistência de Mellon, secretário do Tesouro, que se opunha fortemente a qualquer aumento na taxa de redesconto. Ver Anderson, Economics and the Public Welfare, p. 210.
[30] Ver Clark, Central Banking, p. 382. A taxa de empréstimos de conta margem raramente ficou acima de 8% em 1928, ou acima de 10% em 1929. Ver Adolph C. Miller, “Responsibility for Federal Reserve Policies: 1927?1929”, American Economic Review (setembro de 1935).
[31] Ralph W. Robey, “The Capeadores of Wall Street”, Atlantic Monthly (setembro de 1928). [N. do T.: capeador é encarregado de distrair o touro com uma capa vermelha para que o toureiro o ataque; vale lembrar que touro em inglês é bull, e que a expressão bull market significa “a alta do mercado”.]
[32] As aceitações são vendidas pelos mutuários a corretores de aceitações ou “bancos de aceitações”, que por sua vez vendem as notas aos investidores últimos ? nesse caso, o Federal Reserve System.
[33] Assim, em 30 de junho de 1927, mais de 26% do total de aceitações dos banqueiros em circulação estavam em poder do FRS em sua própria conta, e outros 20% estavam em suas contas estrangeiras (bancos centrais estrangeiros). Assim, 46% de todas as aceitações de banqueiros estavam em poder do Federal Reserve, e a mesma proporção se mantinha em junho de 1929. Ver Hardy, Credit Policies, p. 258.
[34] Ver Senate Banking and Currency Committee, Hearings on Operation of National and Federal Reserve Banking Systems (Washington, D.C., 1931), Apêndice, Parte 6, 884.
[35] Ver Harris, Twenty Years, p. 324n.
[36] Cerca de metade das aceitações do Federal Reserve System estavam em poder do Federal Reserve Bank de Nova York; mais importante, quase todas as compras de aceitações foram feitas pelo Federal Reserve Bank de Nova York, e depois foram distribuídas em proporções definidas aos demais bancos do Federal Reserve. Ver Clark, Central Banking, p. 168.
[37] Ver um pronunciamento de Warburg como presidente diante do American Acceptance Council em 19 de janeiro de 1923, em Paul M. Warburg, The Federal Reserve System (Nova York: Macmillan, 1930), vol. 2, p. 822. Claro que Warburg teria preferido um subsídio ainda maior. Até o perceptivo aviso de Warburg quanto à inflação que se desenvolvia em março de 1929 foi desfigurado por sua reclamação simultânea de que “não conseguimos desenvolver um mercado nacional de notas”. Commercial and Financial Chronicle (9 março de 1929): 1443?44; ver também Harris, Twenty Years, p. 324.
[38] Ver Lester V. Chandler, Benjamin Strong, Central Banker (Washington, D.C.: Brookings Institution, 1958), p. 39 e passim. Foi somente por insistência de Warburg e de Henry Davison, da J. P. Morgan and Company, que Strong aceitou o cargo.
[39] Ver H. Parker Willis, “The Banking Problem in the United States”, em Willis, et al., “Report of an Inquiry into Contemporary Banking in the United States”, pp. 1, 31?37.
[40] Ver A. S. J. Baster, “The International Acceptance Market”, American Economic Review (junho de 1937): 298.
[41] Ver Charles Cortez Abbott, The New York Bond Market, 1920?1930 (Cambridge, Mass: Harvard University Press, 1937), pp. 124ss.
[42] Ver Hardy, Credit Policies, pp. 256?57. Também Hearings, Operation of Banking Systems, Apêndice, Parte C, pp. 852ss.
[43] O Fed também comprou libras esterlinas para ajudar a Grã-Bretanha, no valor de US$16 milhões no fim de 1929 e de US$ 10 milhões no verão de 1927. Ver Hardy, Credit Policies, pp. 100ss.
[44] O boom em empréstimos à Alemanha começou com o “empréstimo Dawes”, parte das reparações do Plano Dawes, com um empréstimo de US$ 110 milhões à Alemanha dado por um consórcio de bancos de investimentos liderado pela J. P. Morgan and Company.
[45] Shacht visitou pessoalmente Nova York no fim de 1925 a fim pressionar os bancos nesse sentido, e ele, Gilbert, e também as autoridades do Tesouro alemão telegrafaram para os bancos de Nova York com o mesmo fim. A afiliada de seguros do Chase National Bank atendeu aos pedidos. Ver Anderson, Economics and the Public Welfare, pp. 150ss. Ver também Garet Garrett, A Bubble That Broke the World (Boston: Little, Brown, 1932), pp. 23?24, e Lionel Robbins, The Great Depression (Nova York: Macmillan, 1934), p. 64.
[46] “No final de 1925, os agentes de quatorze bancos de investimento americanos foram à Alemanha pedir empréstimos aos estados e municípios alemães.” Anderson, Economics and the Public Welfare, p. 152. Ver também Robert Sammons, “Capital Movements”, em Hal B. Lary and Associates, The United States in the World Economy (Washington, D.C.: U.S. Government Printing Office, 1943), pp. 95?100; e Garrett, A Bubble that Broke the World, pp. 20, 24.
[47] Ver Clark, Central Banking, p. 33. Já em 1924 o Conselho do Federal Reserve haveria sugerido que créditos de aceitação americanos financiassem a exportação de algodão para a Alemanha.
[48] Ver H. Parker Willis, The Theory and Practice of Central Banking (Nova York: Harper and Bros, 1936), pp. 210?12, 223.
[49] Hearings, Operation of Banking Systems, pp. 852ss.
[50] Clark, Central Banking, pp. 242?48, 376?78; Hardy, Credit Policies, p. 248.
[51] Hearings, Operation of Banking Systems, Apêndice, Parte 6, pp. 847, 922?23.
[52] Mas não inteiramente inesperada, porque em abril de 1922 vemos o governador Strong escrevendo que uma de suas principais razões para fazer compras de mercado aberto era “estabelecer um nível de taxas de juros… que facilitasse os empréstimos estrangeiros neste país… e facilitasse o progresso econômico.” Benjamin Strong a S. Parker Gilbert, subsecretário do Tesouro, em 18 de abril de 1922. Chandler, Benjamin Strong, Central Banker, pp. 210?11.
[53] Harold L. Reed, Federal Reserve Policy, 1921?1930 (Nova York: McGraw-Hill, 1930), pp. 20, e 14?41. O governador Miller concordou que “ainda que os preços estivessem subindo, a produção e o comércio também estavam, e logo a produção ultrapassaria a subida de preços”. Ibid., pp. 40?41.
[54] Ver Chandler, Benjamin Strong, Central Banker, pp. 222?33, sobretudo p. 233. Ver também Hardy, Credit Policies, pp. 38?40; Anderson, Economics and the Public Welfare, pp. 82?85, 144?47.
[55] Ver H. Parker Willis, “What Caused the Panic of 1929?”, North American Review (1930): 178; e Hardy, Credit Policies, p. 287. A isenção de imposto de renda sobre títulos de governo também incentivou as compras dos bancos. Ver Esther Rogoff Taus, Central Banking Functions of the United States Treasury, 1789?1941 (Nova York: Columbia University Press, 1943), pp. 182ss.