A Nova Ordem Mundial está em apuros. A subdivisão europeia está visivelmente em processo de desintegração.
É fácil perceber quando um importante arranjo da NOM entrou em crise. Os representantes da grande mídia perguntam repetidamente aos porta-vozes do alto escalão: “Os atuais eventos ameaçam seus planos?” E eles respondem: “Não, trata-se apenas de uma anormalidade temporária”. E esse mantra é repetido incessantemente. Enquanto isso, os eventos que geraram a pergunta seguem irreprimíveis, tornando-se cada vez mais ameaçadores.
Outro sinal de que há uma verdadeira crise é quando os líderes políticos mundiais fazem sucessivas reuniões em um curto espaço de tempo, algo chamado ‘reunião de cúpula’ ou ‘encontro de líderes’. Uma cúpula significa “o topo do monte”. Os burocratas do mais alto escalão se encontram em privado, mas a reunião é visível para toda a mídia.
Os jornalistas adoram uma reunião de cúpula porque tais encontros sempre ocorrem em hotéis elegantes e em localidades pomposas. Afinal, quem levaria a sério uma reunião ocorrida em, sei lá, Hoboken, Nova Jersey? Ninguém. Por isso, os líderes se encontram apenas em locais extremamente caros e sofisticados. Os jornalistas designados para cobrir o evento se deliciam às expensas de seus jornais. E todos os envolvidos se divertem bastante.
O problema com essa estratégia é que sempre aparecem alguns manifestantes, e eles quase nunca são importunados. Eles não se hospedam no mesmo hotel luxuoso. A mídia jamais relata onde exatamente eles se hospedam. De alguma forma um tanto estranha, milhares deles possuem dinheiro sobrando para gastar com passagens aéreas. Eles provavelmente encontram abrigo em algum subsolo de alguma loja a preços camaradas. E então eles saem para se manifestar em frente ao hotel, carregando cartazes e fazendo muita balbúrdia. “Chega disso! Chega daquilo! Chega disso! Chega daquilo!”. Alguns até carregam um cartaz escrito “Libertem Mumia!”. E tudo segue inalterado até o fim do encontro.
Algumas vezes, as coisas ficam um pouco violentas, e alguns manifestantes são presos.
Os membros da cúpula nunca se manifestam publicamente sobre os protestos. E a mídia educadamente jamais faz perguntas a respeito.
Findado o encontro, os líderes soltam um comunicado à imprensa assegurando ao mundo que a reunião foi repleta de discussões francas. E que novas discussões francas serão mantidas por membros de um comitê permanente que foi criado com a missão de examinar as questões com mais profundidade. Os participantes então se reúnem para uma foto do grupo. E assim termina o encontro.
E Mumia continua preso.
Reuniões seguidas
Quando o grupo se reúne novamente em menos de dois meses para analisar O Problema, podemos ter a certeza de que as pessoas do topo do monte — e aqui me refiro ao topo verdadeiro, aos poderosos que jamais aparecem na mídia, e não aos seus meros representantes eleitos — estão com sérios problemas. O encontro anterior de seus porta-vozes não acalmou a situação. A crise só fez piorar. Assim, uma ordem é emitida do Alto Escalão para os Líderes Oficiais: é melhor agendar outra reunião de cúpula. O comunicado à imprensa emitido pela última reunião não funcionou.
Ato contínuo, os Líderes Oficiais pedem às suas assistentes para agendarem uma reserva em outro hotel garboso. Eles fazem as malas, juntam seu séquito, acionam as turbinas de seus jatos exclusivos para Líderes Oficiais, e voam para outra cidade de prestígio, onde será realizado o próximo encontro. Eles se reúnem em privado, mas desta vez permitem que os fotógrafos da mídia adentrem o recinto para tirar algumas fotos, as quais devem retratar uma ostentosa discussão franca entre os dois mais proeminentes Líderes Oficiais — uma alemã e um francês (ou, o que é mais raro, os três principais, ao qual se inclui um italiano). A fotografia mostra os Líderes sentados em cadeiras de $2.500 e com um semblante de muita preocupação.
E então o grupo solta outro comunicado à imprensa anunciando a criação de uma estrutura permanente para futuras discussões sobre O Problema.
As bolsas de valores ao redor do mundo sobem acentuadamente por um dia. E então, no dia seguinte, elas caem de volta para o nível em que estavam no dia anterior ao comunicado à imprensa.
Eis uma regra inquebrável: se houver uma terceira reunião de cúpula em um período de três meses, é porque o sistema bancário está realmente com sérios problemas. Se, entre a segunda e a terceira reunião, houver algumas falências de bancos ou de corretoras dos quais o público jamais ouviu falar, mas os quais revelaram possuir ativos de dezenas de bilhões de dólares, então o pessoal do topo do monte estará em pânico. Eles estarão se perguntando, “Quem será o próximo?” Cada um deles irá pensar, “Talvez seja o meu banco”. Mas é claro que eles irão mencionar entre si apenas algum grande banco que vem tentando há anos entrar nesse círculo de privilegiados, mas que ainda não logrou êxito.
Múltiplas e seguidas reuniões de cúpula que discutem exatamente o mesmo problema são um sinal de que se trata de um problema que eles não estão conseguindo resolver. O problema só faz piorar.
Reuniões de fim de semana
Uma reunião de cúpula sempre começa em uma sexta-feira e acaba no domingo. O encontro sempre começa após as bolsas de valores localizadas no mesmo fuso horário do hotel elegante já terem encerrado o pregão do dia. Desta forma, o mercado de ações dessa região não irá despencar, o que mandaria um sinal negativo para os outros mercados ainda em funcionamento nas outras zonas horárias.
A reunião de sábado é aquela na qual os líderes decidem quais questões serão abrangidas pelo comunicado à imprensa de domingo. As principais áreas de discussão são as seguintes:
- Qual a quantia de dinheiro de impostos o comunicado à imprensa irá mencionar?
- Quais países ou quais organizações internacionais mais perderão com esse arranjo coletivo? Em que quantia?
- Quanto tempo irá levar para se conseguir o dinheiro emprestado, e de quem?
- Quanto tempo até que a quantia necessária de dinheiro seja coletada?
- Quem irá telefonar para o primeiro-ministro chinês implorando por novas rodadas de compra de títulos?
As discussões são muito francas. “Nem pensem em jogar esse problema pra mim! Quantas vezes vocês acham que eu posso ir aos meus eleitores pedindo compreensão? Minha coalizão já está prestes a se esfacelar!” “Como vamos convencer os eleitores de que não estamos jogando o dinheiro deles no esgoto?” “Qual país cujos três maiores bancos irão necessitar de uma nova rodada de injeção de fundos?” “Qual país cujos bancos poderão vir ao nosso auxílio fornecendo os empréstimos necessários caso ofereçamos algumas garantias?” E por aí vai.
E então chega o domingo. Ninguém da reunião vai à igreja. Como eles não participam de cultos religiosos em seu país natal, qualquer indicação de que estão necessitados de intervenção divina poderia mandar um sinal errado para os mercados na segunda-feira.
No domingo à tarde, eles emitem o comunicado à imprensa.
Se eles esperarem até o final da tarde de domingo, os mercados abrirão na segunda com uma queda de 1%.
Se eles não anunciarem nenhuma decisão, os mercados irão abrir em queda de 3%.
O comunicado à imprensa deve passar a impressão de que está dizendo alguma coisa nova. Haverá um novo arcabouço para as futuras discussões. O grupo prometeu um total de [X] bilhões de euros, a ser pago ao governo de [Y]. Isso significa que os bancos que emprestaram 4X euros a Y não irão à bancarrota. Por enquanto.
O problema enfrentado pela reunião de cúpula deveria ser óbvio. Dado que os grandes bancos fizeram empréstimos estúpidos — baseando-se em informações contábeis falsas fornecidas pelo último governo do país em questão —, ninguém sabe ao certo quais bancos possuem a classificação de crédito e o capital líquido suficiente para fazer os empréstimos prometidos à agência intereuropeia de resgate. Toda a estrutura do sistema bancário está à beira do abismo. Se dois ou três bancos anunciarem que estão quebrados, como aconteceu recentemente com o MF Global e com o Dexia, haverá uma corrida em manada dos hedge funds para realocar seus fundos remanescentes para aqueles bancos que todos julgam ainda estarem saudáveis. Quais bancos seriam esses? Ninguém sabe. “Façam suas apostas. O guichê já vai fechar.”
As reuniões anuais do G-20
O G-20 é uma organização especializada em soltar comunicados anuais à imprensa dizendo que as condições financeiras mundiais estão sempre melhores do que estavam quando da ocasião imediatamente anterior à última reunião. O último encontro agendado ocorreu na França, nos dias 14 e 15 de outubro. Houve uma reunião de emergência na semana passada.
Nunca é demais analisar o website oficial de qualquer organização do alto escalão da Nova Ordem Mundial. Tal tarefa requer uma tradução à parte, para desemaranhar todo aquele palavreado aparentemente inócuo.
O G-20 foi estabelecido em 1999, logo após a Crise Financeira Asiática de 1997, para reunir as principais economias desenvolvidas e emergentes em um esforço de estabilizar o mercado financeiro global. Desde sua criação, o G20 realiza encontros anuais entre ministros das finanças e presidentes de bancos centrais para discutir medidas de promoção da estabilidade financeira mundial e de desenvolvimento e crescimento econômico sustentável.
Tradução: O G-20 foi criado para lidar com a primeira grande ameaça aos planos da Nova Ordem Mundial de lançar o euro em 2000, medida essa que representa o primeiro passo para a criação de uma moeda gerenciável em nível mundial.
Para atacar a crise financeira e econômica que se alastrou por todo o globo em 2008, os membros do G-20 foram chamados a fortalecer ainda mais a cooperação internacional. Consequentemente, as reuniões de cúpula do G-20 ocorreram em Washington em 2008, em Londres e Pittsburgh em 2009, e em Toronto e Seul em 2010.
Tradução: o socorro à Ásia em 1998 manteve o sistema funcionando como deveria, principalmente porque os asiáticos estavam vivenciando um crescimento econômico. Isso tirou os bancos do buraco. Porém, em 2008, uma cepa diferente do vírus da “gripe asiática” contaminou o Ocidente. Isso vem exigindo encontros anuais para tentar manter contidos os eminentes sinais de um colapso.
As ações coordenadas e decisivas do G-20, com sua equilibrada participação de países desenvolvidos e em desenvolvimento, ajudou o mundo a lidar de maneira eficaz com a crise financeira e econômica, de modo que o G-20 já apresentou um número de resultados concretos e significativos:
Tradução: quando uma reunião — da qual participam chefes de estado que entram e saem de seus respectivos cargos em formato de rodízio (no Japão, vários em apenas um ano) — diz solucionar os problemas financeiros mundiais em um encontro de fim-de-semana que ocorre apenas uma vez a cada ano, e do qual só se produz um comunicado à imprensa, pode estar certo de que há várias coisas ocorrendo por trás dos panos entre um encontro e outro. Dentre as quais:
Primeiro, o escopo da regulamentação financeira tem sido enormemente ampliado, e a supervisão e regulamentação prudencial dos bancos tem sido intensificada. Houve também um enorme progresso na coordenação política graças à criação de um arcabouço que permite um crescimento robusto, sustentável e equilibrado, criado para aprimorar a cooperação macroeconômica entre os membros do G-20 e, por conseguinte, mitigar o impacto da crise. Finalmente, a governança global tem sido dramaticamente aprimorada para levar em consideração com mais eficiência o papel e as necessidades de países em desenvolvimento, especialmente por meio de reformas ambiciosas da governança do FMI e do Banco Mundial.
Tradução: a automática solução keynesiana para todos os problemas é uma só: mais regulamentações. Em outros círculos, isso é conhecido como trancar a porta do estábulo após o cavalo já ter fugido. O G-20 possui um arcabouço para um crescimento equilibrado, cuja oferta tem sido escassa desde 2008. O FMI, por sua vez, se endividou pesadamente para poder conceder empréstimos vultosos a ditadores do Terceiro Mundo, os quais utilizaram esse dinheiro para aditivar suas contas bancárias na Suíça.
Baseando-se nos resultados destes importantes progressos, o G-20 tem agora de se adaptar a um novo ambiente econômico. Ele deve comprovar ser capaz de coordenar as políticas econômicas das principais economias mundiais, de modo contínuo.
Tradução: o novo ambiente econômico é este: todo o sistema bancário de reservas fracionárias está se esfacelando, e será necessário um pouco mais do que meros comunicados à imprensa para mantê-lo operante. Por trás do pano, cada governante está tentando jogar as responsabilidades para os outros governantes. “Nossos bancos estão em piores condições do que os seus bancos!”
2011 será a ocasião para se aproveitar os recentes sucessos do G-20 e assegurar uma ativa continuação dos processos já iniciados. Será também o momento para abordar outras questões essenciais que são cruciais para a estabilidade global, como a reforma do sistema monetário internacional e a volatilidade dos preços das commodities.
Tradução: “Estamos penando para conseguir manter o sistema coeso em decorrência de inúmeras quebras. Isso é o máximo de sucesso que podemos apresentar no momento. Enquanto isso, os mercados estão tão voláteis que estão chamando a atenção para o fato de que a combinação de inflação e recessão está se tornando visivelmente perturbadora.”
Realmente acreditamos que os principais desafios econômicos da atualidade requerem uma ação coletiva e ambiciosa, a qual o G-20 é capaz de impulsionar.
Tradução: não sei o que “capaz de impulsionar” significa. Desculpe.
Volatilidade revela instabilidade
As bolsas de valores este ano refletiram a presença de pessimismos relacionados (1) à iminente saída da Grécia da zona do euro, (2) à crescente probabilidade da Grécia dar um calote em suas dívidas baseadas em euro, (3) aos prejuízos de centenas de bilhões de euros sofridos pelos grandes bancos europeus, (4) à ameaça de quebras bancárias na Itália após o governo grego dar seu calote, (5) às trôpegas condições dos bancos portugueses e espanhóis, (6) à crescente probabilidade de uma recessão mundial em 2012, e (7) ao medo de um evento ‘cisne preto‘ resultante de algum colapso à la Dexia.
As bolsas de valores também refletiram otimismos relacionados (1) ao poder relaxante dos comunicados à imprensa emitidos pelas reuniões de cúpula, (2) à esperança de que o banco central da China ainda continuará inflacionando sua moeda para poder comprar títulos lastreados em euro (com isso mantendo sua moeda desvalorizada e estimulando as exportações), (3) à esperança de que o Federal Reserve irá fazer algo novo que, de alguma maneira, irá reverter as coisas, (4) à esperança de que empresas com dinheiro em caixa irão anunciar programas de recompra de ações com o intuito de fazer com que as compras de opções sejam lucrativas para seus altos executivos.
As bolsas de valores hoje estão mais voláteis do que jamais estiveram em épocas recentes. Quem aplica em bolsa já sentiu: ninguém sabe o que está acontecendo. Para o cidadão comum, as coisas não estão melhorando. As girações das bolsas de valores são apenas ruídos. Ele está preocupado com seu emprego — e por uma boa razão.
Conclusão
Os Detentores do Poder estão enfrentando problemas que não desaparecerão. O núcleo do controle deles é o sistema bancário de reservas fracionárias e o mercado para títulos governamentais (dívida soberana). Ambos estão sob enorme pressão. Ambos estão mostrando sinais inéditos de vulnerabilidade.
As reuniões de cúpula do euro estão se transformando em reality shows. Qual time será o dos Sobreviventes? Merkel-Sarkozy? Papandreou-Berlusconi?
Enquanto isso, a Estônia é a única nação no Ocidente que não está com problemas fiscais.
E há também a Islândia.
A Islândia, cujos bancos deram um calote de $85 bilhões em 2008, completou em agosto um programa de 33 meses do Fundo Monetário Internacional. O Fundo projeta que a economia da Islândia irá crescer mais do que a média da zona do euro neste ano e no ano seguinte. De acordo com o mercado de derivativos da dívida, é mais barato fazer seguro contra um calote islandês do que fazer hedge contra um evento qualquer no bloco monetário único europeu.
Islândia e Estônia nunca foram convidadas para as reuniões de cúpula europeias. Ambas não estão no G-20. Há uma lição aí.