Thursday, November 21, 2024
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Um sistema monetário de livre mercado

coinlady (1)[Palestra realizada durante a assembléia Gold and Monetary Conference, em Nova Orleans, 10 de novembro de 1977].

Há pouco mais de dois anos, durante a segunda Conferência de Lausanne, realizada por esse mesmo grupo, eu havia dito, meio que num tom de piada amarga, que já não mais havia esperanças de termos novamente um padrão monetário decente, a menos que tirássemos do governo o monopólio da emissão monetária e entregássemos essa função à iniciativa privada. Mas nem eu mesmo havia levado essa piada muito a sério. Mas essa sugestão se mostrou extraordinariamente fértil. Aprofundando-me um pouco mais nela, descobri que eu havia aberto uma possibilidade que em dois mil anos nenhum economista jamais havia estudado. Desde então, tem havido um bom número de pessoas que assumiram essa tarefa, dedicando-se a estudos e análises vastas dessa possibilidade.

Como resultado, estou mais convencido do que nunca de que, se formos ter novamente uma moeda decente, esta não virá do governo: ela será emitida pela iniciativa privada, porque fornecer ao público um dinheiro bom no qual ele pode confiar e utilizar não apenas pode ser um negócio extremamente lucrativo, como também irá impor ao emissor uma disciplina à qual o governo nunca esteve e nunca poderá estar submetido. É um empreendimento no qual a livre concorrência pode se manter apenas se der ao público um dinheiro tão bom quanto seus competidores.

Porém, para entendermos completamente essa questão, devemos nos livrar de uma crença já muito difundida, porém completamente errada. Sob o padrão-ouro, ou sob qualquer outro padrão metálico, o valor do dinheiro não é realmente derivado do ouro. O fato é que é a necessidade de se redimir em ouro o dinheiro emitido que impõe aos emissores uma disciplina que os obriga a controlar adequadamente a quantidade de dinheiro emitida; penso que seria bastante legítimo dizer que, sob um padrão-ouro, é a demanda por ouro para propósitos monetários que determina o valor do ouro, em oposição à crença comum de que é o valor que o ouro tem em suas outras aplicações que determina o valor do dinheiro. O padrão-ouro é o único método já descoberto que impõe alguma disciplina sobre o governo, e o governo só irá se comportar sensatamente se for forçado a isso.

Mas temo estar convencido de que a esperança de impor novamente ao governo essa disciplina já se foi. O público em geral foi adestrado a entender – e receio que toda uma geração de economistas ajudou nisso – que o governo tem o poder de, no curto prazo, aumentar rapidamente a quantidade de dinheiro para aliviar todos os tipos de mazelas econômicas, principalmente para reduzir o desemprego. Infelizmente, isso pode ser verdade apenas no curto prazo. O fato é que tal expansão da quantidade de dinheiro, que parece gerar um efeito benéfico no curto prazo, se torna a causa de um desemprego muito maior no longo prazo. Mas qual político irá se preocupar com os efeitos de longo prazo se no curto prazo ele pode arregimentar apoio?

Minha convicção é que a esperança de retornarmos ao tipo de padrão-ouro que funcionou razoavelmente bem durante um longo período é absolutamente ilusória. Mesmo que, por algum tipo de acordo internacional, o padrão-ouro seja restabelecido, não há a mínima esperança de que os governos irão jogar o jogo de acordo com as regras. E o padrão-ouro não é algo que você pode restaurar por meio de um decreto legislativo. O padrão-ouro requer que os governos sigam constantemente algumas regras, as quais incluem uma ocasional restrição da circulação total de dinheiro, o que irá causar uma recessão local ou nacional. E nenhum governo irá fazer isso atualmente, uma vez que todo o público e, principalmente, aqueles economistas keynesianos que foram educados nos últimos trinta anos, irão dizer que é mais importante aumentar a quantidade de dinheiro do que manter o padrão-ouro.

Como havia dito, é uma crença errônea dizer que é o valor do ouro – ou de qualquer outra base metálica – que determina diretamente o valor do dinheiro. O padrão-ouro é um mecanismo que foi criado para – e durante um longo período de fato conseguiu – obrigar os governos a controlar a quantidade de dinheiro de maneira tal a manter seu valor igual ao do ouro. Mas existem muitos exemplos históricos que provam que é seguramente possível, caso seja do próprio interesse do emissor, controlar a quantidade de qualquer papel-moeda de maneira que seu valor seja mantido constante.

Há três interessantes exemplos históricos que ilustram essa situação e que foram enormemente responsáveis por ensinar aos economistas que, em última instância, o que interessa de fato é o controle apropriado sobre a quantidade de dinheiro, e não o fato de ele ser redimível em alguma outra coisa. O dinheiro ser redimível em ouro era algo necessário apenas para obrigar os governos a controlar adequadamente a quantidade de dinheiro. E isso, penso eu, seria feito de maneira muito mais efetiva não por meio de alguma lei judicial que obrigasse o governo a proceder dessa maneira, mas, sim, se fosse do interesse próprio do emissor agir dessa forma, de modo que ele somente poderia se manter na ativa caso ele desse às pessoas um dinheiro estável.

Deixem-me contar-lhes em poucas palavras sobre esses importantes exemplos históricos. Devo mencionar que os dois primeiros não se referem diretamente ao padrão-ouro como o conhecemos. Eles ocorreram quando várias partes do mundo ainda estavam sob um padrão-prata e quando, na segunda metade do século XIX, a prata repentinamente começou a perder valor. A queda no valor da prata levou a uma queda no valor de várias moedas nacionais, e em duas ocasiões uma medida interessante foi tomada. A primeira, que produziu a experiência que creio ter inspirado a teoria monetária austríaca, aconteceu no meu país natal em 1879. Por sorte, o governo tinha um ótimo conselheiro de política monetária, Carl Menger, que lhes disse, “Bem, se vocês quiserem fugir do efeito da depreciação da prata contida em sua moeda, parem com a cunhagem de prata, parem de aumentar a quantidade de moedas de prata, e daí vocês verão que essas moedas de prata passarão a valer mais do que seu próprio conteúdo de prata”. E foi isso que o governo austríaco fez, e o resultado foi exatamente o que Menger havia previsto. Daí começaram a falar sobre o “Florim” austríaco – que então era a unidade de circulação – passar a ser formado por cédulas impressas sobre a prata, já que as moedas em circulação continham em prata um valor muito menor do que o valor efetivo da moeda. Ou seja: com a desvalorização da prata, o valor do Florim passou a ser controlado inteiramente pela limitação da quantidade de moeda em circulação.

Exatamente o mesmo foi feito quatorze anos depois pela parte britânica da Índia. Lá, eles também estavam sob um padrão-prata e a depreciação da prata foi derrubando a rúpia seguidamente, até que o governo indiano decidiu parar com a cunhagem; e, mais uma vez, as moedas de prata começaram a valer bem mais do que o valor da prata contida nelas. Não obstante, não havia naquela época, tanto na Áustria quanto na Índia, qualquer expectativa de que essas moedas seriam, em última instância, redimidas em prata ou ouro a uma determinada taxa. A decisão quanto a isso só veio a ser tomada muito tempo depois. Porém, ambos os exemplos são uma demonstração perfeita de que mesmo um dinheiro metálico em circulação pode ter seu valor derivado do controle efetivo de sua quantidade, e não diretamente do seu conteúdo metálico.

Meu terceiro exemplo é ainda mais interessante, ainda que o evento tenha sido mais efêmero, porque ele se refere diretamente ao ouro. Durante a Primeira Guerra Mundial, a grande inflação de papel-moeda ocorrida nos países beligerantes derrubou não apenas o valor dos papéis-moeda como também o valor do ouro, uma vez que o ouro foi largamente substituído por papel-moeda, o que consequentemente fez diminuir sua demanda. Assim, o valor do ouro caiu e os preços cotados em ouro dispararam por todo o mundo. E isso afetou até mesmo os países neutros. A Suécia, em particular, estava muito preocupada: como ela havia aderido ao padrão-ouro, ela foi inundada por ouro advindo de todo o resto do mundo, ouro esse que se moveu pra Suécia justamente por ela ter mantido seu padrão-ouro; e os preços na Suécia subiram quase tanto quanto os preços do resto do mundo. Entretanto, a Suécia por sorte também tinha um ou dois economistas muito bons à época, e eles repetiram o conselho que os economistas austríacos haviam dado em relação à prata na década de 1870: “Parem com a cunhagem de ouro e o valor de suas atuais moedas de ouro irá subir acima do valor do ouro contido nas moedas”. O governo sueco assim procedeu em 1916, e o que aconteceu foi exatamente o que os economistas haviam predito: o valor das moedas de ouro começou a flutuar acima do valor do ouro contido nelas, e a Suécia, pelo resto da guerra, escapou dos efeitos da inflação do ouro.

Cito esses exemplos apenas como ilustração daquilo que, entre os economistas que de fato entendem sua área, é hoje um fato indubitável, a saber: o padrão-ouro é um mecanismo parcialmente efetivo para obrigar os governos a controlar adequadamente a oferta monetária, e é o único mecanismo que tem sido toleravelmente efetivo para o caso de um monopolista que pode fazer o que quiser com o dinheiro. Fora esses dois objetivos, o ouro não é realmente necessário para assegurar uma boa unidade monetária. Creio ser inteiramente possível a iniciativa privada emitir um papel-moeda que seja capaz de convencer o público de que irá manter seu valor. Para isso, é necessário que tanto o emissor quanto o público entendam que a demanda por esse dinheiro irá depender do fato de o emissor ser forçado a manter seu valor constante; porque se ele assim não o fizer, o público iria parar de utilizar seu dinheiro e mudaria para um concorrente.

Desde que dei essa sugestão durante a Conferência de Lausanne, passei a trabalhar com mais afinco nessa idéia e o resultado saiu num pequeno livro lançado ano passado, chamado Desestatização do Dinheiro. Desde então, minhas idéias se desenvolveram bastante. Tinha a esperança de poder trazer para essa conferência a segunda edição do livro, já bem maior, que a essa altura já deve ter sido publicada em Londres pelo Institute of Economic Affairs, mas que infelizmente ainda não chegou a esse país. Tudo o que tenho aqui comigo são algumas partes que foram adicionadas.

Nessa segunda edição cheguei a uma ou duas novas conclusões bastante interessantes, as quais não havia percebido antes. Durante o meu primeiro discurso dado há dois anos, eu estava pensando apenas no efeito da seleção do emissor: que somente aquelas instituições financeiras que controlassem o dinheiro emitido – dinheiro esse que seria aquele utilizado pelo público, que teria um valor estável e que seria uma unidade de cálculo efetiva para os registros contábeis – seriam preservadas. Porém agora percebi que há uma situação muito mais complexa: haverá, na realidade, dois tipos de concorrência: uma, que levará à escolha do padrão que virá a ser aceito generalizadamente; a outra, que levará à seleção das instituições particulares às quais serão confiadas a tarefa de emitir o dinheiro sob aquele padrão.

Eu realmente creio que hoje, se todos os obstáculos legais que impedem a emissão privada de moedas de nomes distintos fossem removidos, todas as pessoas iriam, por causa de sua própria experiência, correr para a única coisa que elas conhecem e entendem: ou seja, elas começariam a utilizar o ouro. Porém, após algum tempo, esse mesmo fato levaria à dúvida sobre se o ouro é, para a finalidade do dinheiro, um bom padrão. O ouro acabaria se revelando, é verdade, um ótimo investimento – já que, como conseqüência do aumento de sua demanda, seu valor aumentaria muito; porém, exatamente esse mesmo fato faria com que o ouro fosse muito inapropriado para ser utilizado como dinheiro. Você não vai querer contrair dívidas em termos de uma unidade monetária cujo valor sobe constantemente, como no caso do ouro. Assim, as pessoas começariam a procurar por algum outro tipo de dinheiro. E se elas fossem livres para escolher seu dinheiro – em termos dos quais vão fazer seus cálculos, registrar sua contabilidade, contrair dívidas e fazer empréstimos -, elas iriam preferir um padrão cujo poder de compra se mantivesse estável.

Não terei tempo aqui para descrever em detalhes o que quero dizer com poder de compra estável. Porém, em termos sucintos, refiro-me a um tipo de dinheiro em termos do qual será igualmente possível que o preço de qualquer commodity escolhida ao acaso aumente ou diminua. Um padrão estável reduz a um mínimo o risco de mudanças imprevistas nos preços de algumas commodities, pois sob tal padrão é igualmente provável que qualquer commodity aumente ou diminua de preço, e os erros que as pessoas em geral irão cometer em suas antecipações dos preços futuros irão se cancelar mutuamente, uma vez que haverá erros tanto para as sobrestimações quanto para as subestimações. Se tal dinheiro fosse emitido por alguma instituição bem conceituada, o público provavelmente iria a princípio escolher definições diferentes do padrão a ser adotado, bem como diferentes tipos de índices de preços em termos dos quais tal padrão será mensurado; mas o processo de concorrência iria gradualmente ensinar, tanto os bancos emissores quanto o público, qual o tipo de dinheiro seria o mais vantajoso.

O fato interessante é que o monopólio do governo na emissão monetária não apenas nos privou de termos um bom dinheiro, como também nos privou do único processo através do qual podemos descobrir o que seria um bom dinheiro. Nem mesmo sabemos quais as qualidades que queremos, pois nos dois mil anos que estivemos usando moedas metálicas e outros tipos de dinheiro, nunca nos foi dada a chance de fazer experimentos concorrenciais, nunca nos foi dada a chance de descobrirmos qual seria o melhor tipo de dinheiro.

Permitam-me nesse ponto fazer brevemente uma observação: em minhas publicações e em minhas palestras, incluindo essa de hoje, tenho falado constantemente sobre o monopólio do governo sobre a emissão monetária. Entretanto, isso é apenas parcialmente verdade para a maioria dos países. Nós de fato demos ao governo, e por motivos razoavelmente bons, o direito exclusivo de emitir moedas de ouro. E após termos dado ao governo esse direito, creio ser igualmente compreensível também termos dado ao governo o controle sobre todo o dinheiro emitido sob uma dada denominação. Se o governo emite dólares, o fato de outras pessoas não terem a permissão de também emitir dólares é um arranjo perfeitamente sensato, mesmo que tal arranjo não tenha se mostrado benéfico. E eu não estou sugerindo que outras pessoas possam ter o direito de emitir dólares. Toda a discussão havida no passado sobre o sistema bancário livre (free banking) era sobre essa idéia de que, não apenas o governo ou as instituições governamentais, mas também outras pessoas deveriam ter a permissão de emitir cédulas de dólar. Isso, obviamente, não iria funcionar.

Porém, se instituições privadas começassem a emitir cédulas com outras denominações e sem uma taxa de câmbio fixa em relação à moeda oficial ou a qualquer outra moeda, até onde sei isso ainda não é proibido por lei em nenhum grande país. Creio que a razão por que isso ainda não foi tentado é que, como obviamente sabemos, se alguém tentasse isso, o governo iria colocar tantos obstáculos no caminho, que o uso de tal dinheiro seria impraticável. Por exemplo, nos EUA, enquanto as dívidas em termos de qualquer outra moeda que não seja o dólar não puderem ser reforçadas em termos jurídicos, tal sistema é claramente impraticável. É claro que seria ridículo tentar emitir qualquer outro tipo de dinheiro se as pessoas não puderem fazer contratos em termos dele. Mas esse obstáculo em particular felizmente foi removido em muitos países, de modo que o caminho deverá estar livre para a emissão de moedas privadas.

Se eu fosse o responsável pela política de qualquer um dos grandes bancos desse país, eu começaria a oferecer ao público empréstimos e contas-correntes em uma unidade cujo valor eu prometesse manter estável em termos de algum índice definido. Não tenho dúvidas, e creio que a maioria dos economistas concorda comigo nesse quesito em particular, de que é tecnicamente possível controlar o valor de qualquer moeda que seja usada concorrencialmente com outras moedas de modo a cumprir a promessa de manter seu valor estável. O ponto essencial – cuja importância não dá pra ser suficientemente enfatizada – é que nós teríamos pela primeira vez um sistema monetário no qual todo o empreendimento de se emitir dinheiro poderia ser mantido apenas se o emissor emitisse dinheiro de qualidade. Ele saberia que iria perder rapidamente seu negócio extremamente lucrativo caso houvesse rumores de que seu dinheiro esteja ameaçando se depreciar. Ele perderia mercado para um concorrente que oferecesse um dinheiro melhor.

Como já disse antes, creio ser essa a nossa única esperança no momento atual. Não vejo a mínima perspectiva de que o governo – sob o atual tipo de, e eu enfatizo, sob o atual de tipo de governo democrático, no qual vários pequenos grupos podem forçar o governo a satisfazer suas vontades particulares -, mesmo se estivesse sob o jugo estrito da lei, possa nos dar novamente um dinheiro bom. No momento atual, temos apenas uma escolha entre duas alternativas: continuar uma inflação monetária acelerada – a qual, como todos vocês sabem, destrói completamente um sistema econômico – ou adotarmos uma ordem de mercado; mas acho que a mais provável é uma alternativa ainda pior: o governo não vai parar de inflar a moeda, mas irá, como já tem feito, tentar suprimir todos os efeitos inevitáveis dessa inflação; ele será levado pela inflação contínua a adotar um controle de preços, o que acabará levando a um comando sobre toda a economia. Portanto, agora não é apenas uma questão de nos dar um dinheiro melhor, sob o qual o sistema de mercado irá funcionar infinitamente melhor do que jamais funcionou antes, mas sim de impedir o gradual declínio em direção a um sistema totalitário e planejado, que surgirá, pelo menos nesse país, não porque alguém quer implantá-lo, mas como conseqüência inevitável do esforço direcionado à supressão dos efeitos da inflação que está ocorrendo.

Gostaria de poder dizer que isso que eu proponho é um plano para um futuro distante, um plano que podemos esperar. Houve um comentarista do meu primeiro livreto, um homem muito inteligente, que disse, “Bom, há trezentos anos ninguém acreditaria que o governo algum dia iria abrir mão de seu controle sobre a religião, portanto talvez daqui a trezentos anos poderemos ver o governo abrir mão de seu controle sobre o sistema monetário”. Mas não temos todo esse tempo. Estamos agora flertando com a possibilidade de vivenciarmos o mais desagradável dos acontecimentos político, em grande parte resultado de uma política econômica que deixamos ir muito longe.

Minha proposta não é, como gostaria que fosse, meramente um tipo de arranjo auxiliar, um tipo de arranjo que pode ficar sendo trabalhado intelectualmente por um bom tempo para ser implantado apenas quando o atual sistema entrar em completo colapso. Não é meramente um plano de emergência. Creio ser muito urgente se tornar rapidamente sabido por todos que não há justificativa alguma na história para a atual situação: um monopólio governamental sobre a emissão de dinheiro. Tal monopólio nunca foi proposto sob o argumento de que o governo sempre nos daria um dinheiro melhor do que qualquer outra instituição. Desde que o privilégio de emitir dinheiro foi primeira e explicitamente apresentado como sendo uma prerrogativa da realeza, o monopólio sempre foi defendido ferrenhamente porque o poder de emitir dinheiro era essencial para o financiamento do governo – não com o intuito de nos dar um bom dinheiro, mas com o intuito de dar ao governo livre acesso à torneira de onde ele pode tirar o dinheiro de que precisa simplesmente criando-o. E isso, senhoras e senhores, não é um método que nos dá a esperança de algum dia termos um bom dinheiro. Colocar o sistema monetário nas mãos de uma instituição que está protegida contra qualquer concorrência, que tem o poder de nos obrigar a aceitar seu dinheiro e que está sujeita a uma incessante pressão política, jamais irá nos dar novamente um bom dinheiro.

Creio que devemos começar essa mudança o mais logo possível, e devemos ter a esperança de que alguns dos mais inteligentes e arrojados homens das finanças comecem rapidamente a experimentar tal modelo. O grande obstáculo é que tal empreendimento envolve mudanças tão grandes em toda a estrutura financeira que – e digo isso por causa de minha experiência em várias discussões – nenhum banqueiro veterano, que entende apenas do atual sistema bancário, pode de fato imaginar como que esse sistema proposto iria funcionar. E ele não iria ousar arriscar e fazer experiências com tal sistema. Creio que teremos de contar com alguns cérebros mais jovens e mais flexíveis para tomar essa iniciativa e mostrar que tal coisa pode ser feita.

Com efeito, isso já está sendo tentado de uma forma limitada. Como resultado de minha publicação, tenho recebido, dos cantos mais inesperados, cartas de pequenas instituições bancárias dizendo que estão tentando emitir contas-correntes lastreadas em ouro e em prata, e que há um considerável interesse por essa iniciativa. Receio que eles terão de ir mais além, pelas razões que esbocei no início. No decorrer dessa revolução do nosso sistema monetário, os valores dos metais preciosos, incluindo o valor do ouro, irão flutuar bastante, geralmente para cima. Portanto, aqueles de vocês que estão interessados nisso do ponto de vista do investidor não precisam se preocupar. Mas aqueles de vocês que estão interessados principalmente em um bom sistema monetário devem manter a esperança de que, em um futuro não muito distante, iremos encontrar, generalizadamente aplicado, um outro sistema de controle da circulação monetária, outro que não seja um dinheiro redimível em ouro. O público terá de aprender a escolher entre uma variedade de moedas, e escolher aquelas que são boas.

Se começarmos logo com isso, poderemos de fato atingir uma posição na qual finalmente o capitalismo estará numa posição de prover a si próprio o dinheiro do qual precisa para funcionar adequadamente, algo que sempre lhe foi negado. Desde o desenvolvimento do capitalismo, nunca lhe foi permitido produzir para si próprio o dinheiro de que precisa; e se eu tivesse mais tempo, poderia mostrar para vocês como que toda essa estrutura maluca que temos como resultado, esse monopólio que foi originalmente concebido apenas para a emissão de moeda-ouro, é enormemente responsável pelas grandes flutuações no crédito, pelas grandes flutuações na atividade econômica, e, em última instância, pelas recorrentes depressões. Creio que se aos capitalistas fosse permitido proverem a si próprios o dinheiro de que precisam, o sistema de concorrência já teria há muito acabado com as grandes flutuações da atividade econômica e com os prolongados períodos de depressão. Na presente situação, a política monetária oficial nos levou a uma situação que produziu tantas más alocações de recursos, que não devemos esperar por nenhuma solução rápida que nos livre dos atuais problemas, mesmo que adotássemos um novo sistema monetário.

____________________________________________

Tradução de Leandro Augusto Gomes Roque

Friedrich A. Hayek
Friedrich A. Hayek
Friedrich A. Hayek foi um membro fundador do Mises Institute. Ele dividiu seu Prêmio Nobel de Economia, em 1974, com seu rival ideológico Gunnar Myrdal 'pelos seus trabalhos pioneiros sobre a teoria da moeda e das flutuações econômicas e por suas análises perspicazes sobre a interdependência dos fenômenos econômicos, sociais e institucionais'. Seus livros estão disponíveis na loja virtual do Mises Institute.
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Caterina Mantuano on O Caminho da Servidão
Maurício J. Melo on Mais sobre Hiroshima e Nagasaki
Pedro Lopes on A realidade na Ucrânia
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José Olimpio Velasques Possobom on Precisamos de verdade e beleza
Ex-microempresario on A OMS é um perigo real e presente
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Maurício J. Melo on Rothbard sobre o utilitarismo
LUIZ ANTONIO LORENZON on Papa Francisco e a vacina contra a Covid
Juri Peixoto on Entrevistas
Maurício J. Melo on Os Incas e o Estado Coletivista
Marcus Seixas on Imposto sobre rodas
Samuel Jackson on Devemos orar pela Ucrânia?
Maurício J. Melo on Imposto sobre rodas
Lucas Q. J. on Imposto sobre rodas
Tony Clusters on Afinal, o agro é fascista?
Joaquim Saad on A justiça social é justa?
Caterina on Mercado versus estado
Fernando Chiocca on A ética da liberdade
Fernando Chiocca on A verdadeira tragédia de Waco
Carlos Eduardo de Carvalho on Ação Humana – Um Tratado de Economia
João Marcos Theodoro on Ludwig von Mises: um racionalista social
Maurício José Melo on Lacrada woke em cima de Rothbard?
José Carlos Munhol Jr on Lacrada woke em cima de Rothbard?
Fernando Chiocca on Lacrada woke em cima de Rothbard?
Matador de onça on Os “direitos” dos animais
Micael Viegas Alcantara de Souza on Em defesa do direito de firmar contratos livremente
Adversário do Estado on Lacrada woke em cima de Rothbard?
Maurício José Melo on Nações por consentimento
Nairon de Alencar on Precisamos do Estado?
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Nairon de Alencar on O Governo Onipotente
Demetrius Giovanni Soares on O Governo Onipotente
Nairon de Alencar on A economia da inveja
Nairon de Alencar on Leitura de Sima Qian
Nairon de Alencar on O que sabíamos nos primeiros dias
Cândido Martins Ribeiro on A Mulher Rei dá ‘tilt’ na lacração
Robertodbarros on Precisamos de verdade e beleza
Cândido Martins Ribeiro on Precisamos de verdade e beleza
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Marcus Seixas on O problema da democracia
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Cândido Martins Ribeiro on O problema da democracia
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Nikus Janestus on Os “direitos” dos animais
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