Uma matéria recente do National Post girava em torno da cidade de Lac-Etchemin, no Quebec – que se regozijava por ser a primeira cidade canadense a banir comidas “não saudáveis” de sua área.  Frente à pressão pública e aos declínios nas vendas nas lojas de alimentos da região, o banimento de comidas não saudáveis foi revogado. Estas são boas notícias não somente para as pessoas de Lac-Etchemin, mas para todos os canadenses. A guerra contra comidas não saudáveis deve parar. Mais poder ao poutine!

É fácil gargalhar da arrogância de uma cidade do Quebec tentando banir a marca registrada da parte francesa do Canadá, que são as batatas fritas repletas de coalhada de queijo e molho de carne, mas eu não acredito nem por um minuto que o banimento do poutine foi trivial ou engraçado. É meramente mais um exemplo da invasão rasteira do governo no que vai à sua mesa de jantar. Atualmente, precisamos pegar emprestado um slogan de uma era passada e atualizá-lo para encaixar em nossa luta moderna: “O governo não tem nada pra fazer nas cozinhas (e lanchonetes) da nação”.

Tanto quanto qualquer coisa, escolhas alimentares são pessoais. Elas definem nossa identidade tanto quanto as nossas escolhas de vestimenta ou material de leitura. “Comida é amor” é a dito popular que transmite a verdade básica de que comer está muito longe de ser meramente para sobrevivência.

O alimento é aspecto integral da transmissão étnica e cultural. Desde as massas italianas ao curry Indiano, do poutines ao falafel, uma rica variedade de pratos fazem parte da história da sua família e do plano de fundo de quem você é. Muitas vezes, o simples cheiro de um prato enquanto você está andando por um restaurante pode provocar uma inundação de memórias da infância, incluindo receitas e técnicas culinárias que foram passadas de geração pra geração.

A comida também é uma forma de intercâmbio cultural por meio do qual grupos étnicos podem automaticamente apreciar a herança de outros grupos. A apreciação acontece espontaneamente, sem envolver pagadores de impostos, leis ou programas governamentais. Acontece toda vez que alguém escolhe ir a um restaurante chinês ou expressa sua preferência por um estabelecimento judeu. Durante a Segunda Guerra Mundial, o chucrute foi amplamente proibido na América do Norte como “antipatriótico” devido à hostilidade profunda em torno de qualquer coisa alemã. Da mesma forma, a aprovação de uma comida étnica é uma forma de aceitação de uma cultura ou, pelo menos, de um aspecto significativo dela.

A alimentação também é uma escolha moral – como todo vegano sabe. É uma escolha religiosa, como judeus ortodoxos atestarão. Alimentação também é uma afirmação política, como um fazendeiro produtor de leite dirá alegremente para você.

A comida mostra o amor. Quando uma esposa ou uma mãe celebra o seu aniversário, ela pensa em fazer “o seu prato predileto”. Quando um homem propõe uma mulher em casamento, geralmente é em torno de um jantar romântico em um restaurante caro. Quando você manifesta simpatia numa reunião pós-funeral, você o faz enquanto segura uma caçarola que você trouxe. É comum para aqueles que estão emocionalmente aflitos buscar uma comida confortante. Quantas mulheres se recuperaram de um coração partido em potes de sorvete?

Em última análise, a comida também é uma das principais formas de autocontrole que você exerce sobre sua vida. Significa algo diferente para todo mundo e isso é o que faz com que as tentativas do estado em escolher um padrão para todos sejam tão ofensivas. Você escolhe suas prioridades e assume seus próprios riscos. Para uns, a escolha leva a uma dieta de Atkins, para outros, a lentilhas orgânicas. Até as pessoas que fazem “más” escolhas estão se expressando e têm direito de fazê-lo. A abundância e a diversidade de alimentos disponíveis em todas as mercearias demonstra a própria riqueza da sociedade – não somente em questão de prosperidade, mas também em termos de escolha.

Portanto, quando o governo dita o que você pode ou não comer, tirando a sua escolha, ele está restringindo a sua herança, suas escolhas políticas e religiosas, o seu controle sobre o seu próprio corpo, está dizendo a você que uma escolha – tão pessoal quanto a sua liberdade de expressão ou o seu gosto pela arte – não cabe a você fazer. Ele está tomando uma decisão fundamental para você e eles tentam tornar isso melhor dizendo que é para o seu próprio bem.

Imagine se o governo tivesse especialistas literários que decidissem que certos livros não são bons para você. Eles não o fariam mais inteligente ou lhes ensinariam coisa alguma, não eram clássicos da literatura. Ainda que você estivesse feliz em comprar os seus livros com o seu dinheiro e lê-los em sua privacidade, o estado ainda decidiria que não quer que você tenha acesso a eles. As pessoas ficariam indignadas. Porque é de alguma forma diferente quando o governo está contando calorias ao invés de mérito artístico?

O contra-argumento típico é dizer que devido à sociedade pagar por nossos cuidados de saúde, nós devemos levar uma vida saudável pela sociedade. Em resumo, o seu vizinho tem um grande interesse financeiro no que entra no seu corpo. Se você não tomar cuidado com isso, o governo irá fazê-lo por você.

Esta linha de raciocínio – ao invés de justificar um estado-babá ou um vizinho intrometido ditando suas escolhas pessoais – se constitui um argumento potente contra a medicina socializada mas, não faz muito pelo argumento que o governo deveria controlar o que você come. Se a medicina socializada tivesse sido anunciada há décadas atrás como um mandato do governo para controlar cada minúcia da sua vida diária, então provavelmente nunca teria sido implementada.

Obviamente, todos nós deveríamos cuidar de nós mesmos, mas para o nosso próprio bem. Nós somos os arquitetos de nossas próprias vidas e isso inclui a nossa saúde. Não é função do estado julgar e controlar o que podemos comer só porque algumas pessoas tomam decisões erradas. Embora pareça trivial para muitos, é um ponto importante de se ressaltar. A alimentação faz parte de quem somos e como nos relacionamos com o mundo. Devemos chutar o governo para fora de nossas cozinhas.

Tradução de Larissa Guimarães
Revisão por Daniel Chaves Claudino