As palavras importam e as definições geralmente se tornam imprecisas e “escorregadias”. Há uma evolução natural da linguagem em que as palavras mudam gradualmente com o tempo, mas muitas vezes um significado elementar se perde e não resta mais uma única palavra para descrever um conceito. Este tem sido o caso da palavra comum “inflação”.
Nos últimos anos, mantive uma lista de citações sobre a definição precisa de inflação (e estou sempre procurando por mais citações). O que inspirou esta lista foi o reconhecimento de que o que a maioria das pessoas quer dizer e entende com a palavra “inflação” é inflação de preços – aumento dos preços ao consumidor. Mas isso não é inflação; é uma consequência da inflação. Na verdade, um ex-colega de trabalho e amigo me perguntou durante a época do covid com gastos maciços do governo: “Onde está a inflação?” – ao que respondi: “Já aconteceu”. Precisamos retornar à verdadeira definição de inflação. Caso contrário, a responsabilidade do governo e do banco central é obscurecida.
Embora tenha havido algum debate dentro da escola austríaca, mesmo distinguindo entre as posições de Ludwig von Mises e Murray Rothbard, a inflação é, de um modo geral, o aumento artificial de moeda e crédito (ou seja, “imprimir dinheiro”). Este ato pode ser perpetrado pelo banco central ou bancos que operam com reservas fracionárias (geralmente com permissão legal concedida pelo governo perante o banco central). Mises escreveu sobre o impacto negativo dessa mudança de definição em seu ensaio “Inflação e Controle de Preços”:
O termo inflação é usado com uma nova conotação. O que as pessoas hoje chamam de inflação não é inflação, isto é, o aumento na quantidade de dinheiro e seus substitutos, mas o aumento geral dos preços das mercadorias e dos salários, que é a consequência inevitável da inflação. Essa inovação semântica não é de forma alguma inofensiva. (enfase adicionada)
Mises novamente se referiu às consequências de tal definição em Ação Humana:
A revolução semântica, que é uma das principais características de nossos dias, também alterou o significado dos vocábulos inflação e deflação. Hoje, muitas pessoas chamam de inflação ou deflação não ao grande aumento ou redução da oferta de moeda, mas à sua inexorável consequência: a tendência generalizada de aumento ou redução dos preços das mercadorias e dos salários. Essa inovação semântica está longe de ser inofensiva. Representa um papel importante no fomento das tendências populares em favor do inflacionismo. (enfase adicionada)
Mises continuou:
Já não existe um termo para designar o que a palavra inflação significa. É difícil combater uma política que não tem nome. Os homens de estado e os escritores não têm mais a possibilidade de recorrer a uma terminologia que seja aceita e compreendida pelo público quando procuram condenar a suposta conveniência de emitir grandes quantidades adicionais de moeda. Torna-se necessário elaborar uma análise detalhada e descrever tal política em todos os seus detalhes, recorrendo a cálculos minuciosos toda vez que a ela se referem; e são obrigados a repetir este fastidioso procedimento sempre que abordam o tema. Como essa política não tem nome, torna-se autoexplanatória e uma questão de fato. Propaga-se sem encontrar resistência. (enfase adicionada)
Da mesma forma, Henry Hazlitt concordou com Mises e escreveu um pequeno ensaio que não é tão conhecido quanto deveria ser – “Inflação em uma página”. Neste resumo magistral, Hazlitt explica:
A inflação é um aumento na quantidade de moeda e crédito. Sua principal consequência é o aumento dos preços. Portanto, a inflação — se usarmos mal o termo para significar os próprios preços em alta — é causada apenas pela impressão de mais dinheiro. A política monetária do governo é inteiramente responsável por isso. (enfase adicionada)
A definição de inflação de Rothbard diferia ligeiramente da de Mises e era sem dúvida um pouco mais precisa, mas com o mesmo espírito. Em um artigo recente no Quarterly Journal of Austrian Economics, “O que é inflação? Esclarecendo e justificando a definição de Rothbard”, Kristoffer Hansen e Jonathan Newman esclarecem e concordam com a definição de inflação de Rothbard, observando que Mises definiu a inflação como o aumento na oferta de moeda não compensado por um aumento na demanda por moeda, mas Rothbard a definiu como a emissão de “pseudo recibos de depósito” ou emissão de moeda em excesso do estoque de espécie (por exemplo, ouro). Rothbard descreveu a inflação da seguinte forma:
O processo de emissão de pseudo recibos de depósito ou, mais exatamente, o processo de emissão de moeda além de qualquer aumento no estoque de espécie, pode ser chamado de inflação [itálico original]. . . . O lucro é praticamente sem custo, porque, enquanto todas as outras pessoas devem vender bens e serviços e comprar ou minerar ouro, o governo ou os bancos comerciais estão literalmente criando dinheiro do nada. Eles não precisam comprá-lo. Qualquer lucro do uso desse dinheiro mágico é um ganho claro para os emissores. (enfase adicionada)
Em The Progressive Era, Rothbard explicou ainda:
Os termos “inflação” e “inflacionário” são usados ao longo deste artigo de acordo com sua definição original – uma expansão da oferta monetária – e não no sentido popular atual de aumento de preço. O primeiro significado é preciso e esclarecedor; o último é confuso porque os preços são fenômenos complexos com várias causas, operando tanto do lado da demanda quanto do lado da oferta. Chamar todo aumento de preço do lado da oferta (digamos, devido a uma praga do café ou um cartel da OPEP) de “inflacionário” só confunde a questão. (enfase adicionada)
Embora Mises e Rothbard discordassem sobre se a inflação deveria incluir ou excluir novas entradas de ouro, ambos concordaram que a inflação não é um aumento nos preços, mas sim um aumento na oferta de moeda e crédito. Ambos também concordaram que as consequências da inflação são (muitas vezes) aumentos assimétricos de preços e ciclos econômicos.
Se a definição era tão simples e incontestada, por que o significado de inflação mudou?
A resposta pode ser encontrada na disputa ideológica e política entre a escola monetária britânica e a escola bancária britânica (e suas contrapartes americanas). A escola monetária, que favoreceu o dinheiro sólido em maior grau, triunfou no início e teve a oportunidade de implementar suas prescrições de política com o Banco da Inglaterra. Naquela época, sua definição de inflação foi aceita. Como o Dr. Joseph Salerno explica em seu livro Money, Sound and Unsound, “O termo ‘inflação’ agora era usado estritamente para denotar um aumento na oferta de moeda que consistia na criação de dinheiro e depósitos bancários sem lastro em ouro.”
Infelizmente, ao contrário de seus colegas americanos, os proponentes da escola monetária britânica, apesar de sua definição precisa de inflação, deixaram de considerar os depósitos à vista como parte da oferta monetária. Por essa razão, suas políticas adotadas na Grã-Bretanha falharam em impedir tanto a inflação de preços quanto o ciclo econômico, e a escola monetária caiu em descrédito. A inflação agora seria sutilmente redefinida como “uma oferta de meio circulante além das necessidades comerciais”.
Com o tempo, a definição seria ainda mais distorcida. Por exemplo, embora pareça tecnicamente correta, a definição de Milton Friedman contém vários pressupostos equivocados: “[A inflação] é sempre e em toda parte um fenômeno monetário. É sempre e em toda parte resultado de muita moeda, de um aumento mais rápido na quantidade de moeda do que na produção”.
Friedman está correto ao dizer que a inflação é sempre um fenômeno monetário; no entanto, os monetaristas têm diferentes definições de “moeda” e “oferta de moeda”, e os monetaristas veem a moeda como um instrumento de política a ser ajustado pela inflação. Finalmente, a revolução keynesiana de 1936 em diante continuaria a mudar a definição de inflação para significar um aumento geral no chamado nível de preços. Salerno escreve:
Antes da Segunda Guerra Mundial, quando os termos “inflação” e “deflação” eram usados no discurso acadêmico ou no discurso cotidiano, eles geralmente significavam um aumento ou uma diminuição no estoque de moeda, respectivamente. Um aumento geral dos preços era visto como uma das várias consequências da inflação da oferta monetária; da mesma forma, um declínio nos preços gerais foi visto como uma consequência da deflação da oferta monetária. Sob a influência da Revolução Keynesiana de meados da década de 1930, no entanto, os significados desses termos começaram a mudar radicalmente. Na década de 1950, a definição de inflação como um aumento geral dos preços e de deflação como uma queda geral dos preços tornou-se firmemente arraigada nos escritos acadêmicos e no discurso popular. (ênfase adicionada)
Como disse Mises , não podemos lutar contra uma política que não podemos nomear. Já é tempo de esclarecermos e implementarmos a verdadeira definição de inflação. Se pudermos convencer as pessoas de que inflação significa “imprimir dinheiro” artificialmente e depois explicar as consequências, isso as ajudará a entender o que o governo fez com nosso dinheiro.
Artigo original aqui
O fato de que os keynesianos deturparam termos como inflação mostra bem o nível intelectual que essa escola de estudo econômico carrega, sempre andando lado à lado com às intenções dos políticos, a inflação de preços das mercadorias é um efeito direto da inflação da quantidade de moeda na economia, inflar significa encher artificialmente, e inflar a economia significa despejar altas quantias de moedas sem lastros bancários. O efeito da inflação sempre é o aumento dos preços e a criação de demandas artificiais, gerando os ciclos econômicos ao longo-prazo. A deturpação do termo ocorreu para reduzir à economia em um jogo de demanda agregada: A inflação de preços deve ser priorizada, pois gera demanda e faz a economia circular, o que os keynesianos sempre ignoraram, porém, é que essa demanda é artificial e cedo ou tarde é corrigida pelos seus emissores quando a situação na economia fica grave e os efeitos da inflação surgem com intensidade.
Desse fracasso em entender a teoria econômica, surgiu a TMM, que de moderna não tem nada, fora ser ainda mais agressiva que os keynesianos, felizmente, ela perdeu força depois do seu último fracasso durante os lockdowns.