O insight básico do populista de direita é que vivemos em um país estatista e em um mundo estatista dominado por uma elite que consiste de uma coalizão do Estado Gigante, Grandes Empresas e diversos grupos de interesses especiais influentes. Sendo mais específico, o velho Estados Unidos da liberdade individual, propriedade privada e estado mínimo foi substituído por uma coalizão de políticos e burocratas aliados com (ou dominados por) poderosas elites corporativas e elites financeiras dos tradicionais banqueiros (e.g., os Rockefellers, os trilateralistas); e a Nova Classe de tecnocratas e intelectuais, que inclui as elites acadêmicas e midiáticas da Liga Ivy, que constituem a classe formadora de opinião da sociedade. Em resumo, somos governados por uma versão atualizada da coalizão de Trono e Altar, onde o Trono é formado por diversos grupos de grandes empresas e o Altar por intelectuais estatistas seculares, embora misturados com os secularistas esteja uma judiciosa infusão de cristãos do Evangelho Social maisntream. A classe dominante do estado sempre necessitou de intelectuais para justificar seu domínio e para ludibriar as massas ao servilismo, i.e., ao pagamento dos impostos e a obedecer os desmandos do estado. Antigamente, na maioria das sociedades, um tipo de clericalismo ou Igreja Estatal constituído de formadores de opinião justificavam aquele domínio. Hoje, nesta era mais secular, temos tecnocratas, “cientistas sociais”, e intelectuais da mídia que justificam o sistema estatal e são recrutados para posições de sua burocracia.
Os libertários sempre enxergaram o problema claramente, porém, como estrategistas de mudanças sociais eles dormiram no ponto. No que podemos chamar de “modelo de Hayek”, eles recomendaram a divulgação das ideias corretas, e através disso converter as elites intelectuais a liberdade, começando com os principais filósofos e então lentamente se espalhando para baixo durante décadas, convertendo jornalistas e outros formadores de opinião da mídia. E, obviamente, ideias são a chave, e espalhar a doutrina correta é uma parte necessária de qualquer estratégia libertária. Pode-se dizer que o processo leva muito tempo, porém, uma estratégia de longo prazo é importante e contrasta com a futilidade trágica do conservadorismo oficial, que se interessa apenas pelo menos pior da próxima eleição e, portanto, é derrotado no médio prazo; sem falar no longo. Mas o verdadeiro erro não é exatamente a ênfase no longo prazo e sim o de ignorar o fato fundamental de que o problema não é apenas um erro intelectual. O problema é que as elites intelectuais se beneficiam do sistema atual; num sentido crucial, elas são parte da classe dominante. O processo da conversão hayekiana assume que todos, ou ao menos todos os intelectuais, estejam interessados somente na verdade, e que interesses econômicos próprios nunca entram na jogada. Qualquer um que conheça intelectuais e acadêmicos tem noção de que isto não procede. Qualquer estratégia libertária deve reconhecer que intelectuais e formadores de opinião são parte fundamental do problema, não somente por causa de erros, mas porque seus próprios interesses estão vinculados ao sistema dominante.
Por que o comunismo implodiu? Porque no final o sistema estava funcionando tão mal que até a nomenklatura se encheu e jogou a toalha. Os marxistas apontaram corretamente que um sistema social colapsa quando a classe dominante é desmoralizada e perde seu poder; o evidente fracasso do sistema comunista produziu esta desmoralização. Mas não fazer nada, ou confiar apenas em educar as elites sobre as ideias corretas, fará com que o nosso próprio sistema estatista não acabe até que toda a nossa sociedade, como a da União Soviética, esteja em ruínas. Com certeza não devemos ficar sentados esperando isso acontecer. Uma estratégia para a liberdade deve ser muito mais ativa e agressiva.
Daí a importância, para libertários e para conservadores defensores do estado mínimo, de se ter uma arma dupla em seu arsenal: não apenas espalhar as ideias corretas, mas também expor as elites dominantes corruptas e a forma que elas se beneficiam do atual sistema, mais especificamente, de como elas estão nos depenando. Arrancar a máscara das elites é pura e fundamentalmente uma “campanha de difamação”.
Esta estratégia dupla consiste em (1º) formar um núcleo de nossos próprios formadores de opinião libertários e de estado-mínimo, baseado nas ideias corretas; e (2º) atingir diretamente as massas, dar um curto-circuito nas elites intelectuais e na mídia dominante, incitar as massas contra as elites que as estão pilhando, enganando e oprimindo, tanto socialmente quanto economicamente. Mas essa estratégia deve fundir o abstrato e o concreto; não deve somente atacar as elites no abstrato, mas deve focar especificamente no sistema estatista existente, focar naqueles que constituem neste momento as classes dominantes.
Faz tempo que os libertários tentam descobrir quem, qual grupo, devem alcançar. A resposta simples, todos, não satisfaz, porque para ser relevante politicamente, devemos concentrar estrategicamente naqueles grupos que são mais oprimidos e que também possuem maior influência social.
A realidade do atual sistema é que ele constitui uma aliança profana do “progressista corporativo” das Grandes Empresas e das elites da mídia que, através do Estado Gigante tem se privilegiado e causado o florescimento de uma subclasse parasitária que, entre elas, estão pilhando e oprimindo quase toda a classe média e a classe trabalhadora do país. Portanto, a estratégia apropriada dos libertários e dos paleos é uma estratégia de “populismo de direita”, isto é: expor e denunciar esta aliança profana, e exigir que esta aliança de mídia progressista subclasse almofadinha saia das costas do resto de nós: a classe média e trabalhadora.
Um programa populista de direita
Um programa populista de direita, então, deve se concentrar no desmantelamento de áreas existentes cruciais de domínio do estado e da elite, e na libertação do cidadão médio dos mais flagrantes e opressivos traços desta dominação. Em resumo:
- Cortar Impostos. Todos os impostos, sobre vendas, empresas, propriedade etc., mas mais especificamente o mais opressivo politicamente e pessoalmente: o imposto de renda. Devemos trabalhar pela revogação do imposto de renda e abolição da Receita Federal.
- Cortar Assistencialismo. Se livrar do domínio da subclasse abolindo o sistema de bem-estar social, ou, não sendo viável a abolição, cortar e restringir severamente.
- Abolir Privilégios de Raça ou Grupos. Abolir ações afirmativas, acabar com cotas raciais, etc., e mostrar que a raiz destas cotas está em toda a estrutura de “direitos civis”, que corrói os direitos de propriedade de todo cidadão.
- Tomar de Volta as Ruas: Acabar com os Criminosos. E por isso eu não quero dizer, obviamente, “criminosos do colarinho branco” ou “corruptos”, mas criminosos violentos de rua – ladrões, assaltantes, estupradores, assassinos. Deve se tirar as amarras da polícia e permitir que ela administre punição instantânea, responsabilizando-a legalmente, claro, quando ela estiver errada.
- Tomar de Volta as Ruas: Se Livrar dos Indigentes. Novamente: permitir que a polícia limpe as ruas retirando mendigos e vagabundos. Para onde eles vão? Quem se importa? Espero que eles desapareçam, ou seja, que sejam retirados da zelada classe de indigentes e passem a pertencer a classe dos membros produtivos da sociedade.
- Abolir o Banco Central; Atacar os Banksters. Moeda e atividade bancária são assuntos obscuros. Mas a realidade pode ser exposta: o Banco Central é um cartel organizado de gangster banqueiros que estão criando inflação, fraudando o povo, destruindo as economias do cidadão médio. As centenas de bilhões que vão dos pagadores de impostos para os S&L banksters serão uma ninharia se comparados ao futuro colapso dos bancos comerciais.
- EUA em Primeiro Lugar. Um ponto chave, e não a sétima prioridade. A economia americana não está apenas em recessão; está estagnada. A família média está pior hoje do que há duas décadas. Retorne para casa América. Cesse a ajuda a indigentes estrangeiros. Cesse toda a ajuda internacional, que é uma ajuda a banksters e suas ligações e suas indústrias de exportações. Cesse o disparate global, e vamos resolver nossos problemas domésticos.
- Defender os Valores Familiares. Que significa tirar o estado dos assuntos familiares e substituir o controle estatal pelo controle dos pais. No longo prazo, isto significa acabar com as escolas públicas e as substituir por escolas privadas. Mas temos que entender que vouchers e mesmo esquemas de crédito de impostos não são, a despeito de Milton Friedman, demandas transitórias no caminho para a privatização da educação; ao invés disso, eles vão piorar a questão ao concretizar o controle do governo mais integralmente sobre as escolas privadas. Dentro das alternativas consistentes está a descentralização, e o retorno do controle das escolas pelas comunidades e vizinhanças locais.
Além disso: Devemos rejeitar de uma vez por todas a visão libertária-esquerdista de que todos os recursos operados pelo governo devem ir pra latrina. Devemos tentar, na falta de uma privatização total, fazer com que as instalações estatais funcionem de uma maneira mais conducente a de uma empresa, ou de um controle de vizinhança. Mas isto significa: que em todas as escolas públicas deve ser permitida a oração, e devemos abandonar a absurda interpretação esquerdista-ateísta da Primeira Emenda de que o não “estabelecimento de uma religião” significa não permitir orações em escolas públicas, ou um presépio no pátio da escola ou numa praça no Natal. Devemos retornar ao senso comum, e as originais intenções, na interpretação constitucional.
Até aqui, cada um desses programas populistas de direita é totalmente consistente com uma posição hard core libertária. Mas toda política do mundo real é política de coalizão, e existem outras áreas onde libertários podem muito bem chegar a um termo comum com paleos ou tradicionalistas ou outros parceiros em uma coalizão populista. Por exemplo, nos valores familiares, problemas controversos como pornografia, prostituição e aborto. Aqui, libertários a favor da legalização e da escolha deveriam estar dispostos a acordar uma posição de descentralização; ou seja, a acabar com a tirania dos supremos tribunais e deixar que esses problemas sejam resolvidos pelos tribunais estaduais, ou melhor ainda, pelas comunidades e vizinhanças, isto é, pelos “padrões da comunidade”.
Artigo original aqui.
Tradução Fernando Chiocca
Eu discordo do Rothbard quando ele fala que é possível fazer uma política de coalizão com setores da sociedade que estão aproximadamente alinhados com a agenda libertária purista. A grande verdade é que essa estratégia têm problemas muito sérios, que são o “problema da contenção” e o problema dos fins ou meios equivocados. Os setores da sociedade, sobretudo aqueles mais próximos do poder ou potenciais candidatos a ele frequentemente incorrem em falhas do tipo: (1) estar certo pelas razões erradas (meios inválidos para fins válidos); (2) estar errado pelas razões certas (meios válidos para fins inválidos); e (3) dada uma cesta de visões de mundo para um dado setor, pode-se ter algumas visões válidas e outras inválidas, de modo que uma aliança com aquele grupo baseada apenas nas similaridades implicaria na conivência dos princípios errados (o famoso engolir sapos: para atingir aquele fim desejado teria de ser conivente com outros fins errados).
De modo que o que me parece mais sensato para o Austrolibertarianismo, a fim de se preservar a autenticidade das ideias que nos movem é se unir cada vez mais porém em torno de si mesmo, se estabelecer, dessa forma criar sua própria agenda para então se distinguir cada vez mais de todos os outros grupos da sociedade, e pouco importa as uma ou outras similaridades que o Austrolibertarianismo tenha com outros grupos. O papel do libertário Austríaco nesse contexto é o de denunciar publicamente todos os outros grupos de acordo com o que eles realmente são: equívocos e/ou fraudes intelectuais que atentam contra a propriedade privada.
Eu estou ciente de que isso vai provocar uma relativa diminuição de janelas de oportunidade para os libertários Austríacos, mas um pouco de análise prática a respeito de um dos aspectos da mecânica de funcionamento do próprio poder estatal se faz necessária para a devida justificação: nós somos um dos pouquíssimos (talvez o único) grupos que carregam a Verdade e a Justiça e que seus seguidores pensam de forma logicamente coerente e não-contraditória, de modo que os outros setores da sociedade, na sua sanha pelo poder estatal, perseguem e tentam interferir a partir de dentro o ideário Austrolibertário (vide as sucessivas tentativas de subversão do movimento Austríaco brasileiro que estão acontecendo de maneira praticamente velada).
Portanto, mais e mais independência teórica e o estabelecimento como um grupo único e indestrutível de formadores de opinião dentro da sociedade me parece o mais prudente a se fazer sempre.
Teu comentário acerta na questão da pureza intelectual, que o Rothbard não nega por sinal, mas erra em achar que pureza se perde no momento que se faça coalizaçoes com outros grupos. Por ex: quando vc se alia ao movimento de esquerda pacifista anti guerra, o que se estaria fazendo é unir forças para forçar a opinião pública a deslegitimar Guerras belicosas e assim evitar que políticos envolvam uma população inteira num empreendimento sem sentido. Em nenhum momento nós libertários temos que voltar um milímetro atrás nos nossos princípios, e independente do pessoal de esquerda ser contra a guerra de forma muito menos coerente que os libertários, o apoio deles acaba por ajudar no alcance de uma pauta cara aos libertários, e o mesmo vale para casos análogos. O que não se pode fazer, como Rothbard sustenta em outros textos sobre o assunto, é ceder pontos no curto prazo, ou evitar um discurso inflamado em favor de um discursos moderado para se acomodar ao establishment do momento, o que aí assim iria dificultar, ao invés de ajudar, a ficar mais perto do objetivo de eliminaçao do estado.