A ciência econômica é uma ciência teórica cujo objetivo é analisar as consequências econômicas de todas as modalidades da ação humana. Ela examina os preços dos bens, os salários e as taxas de juros, e faz indagações sobre os fundamentos da produção, da distribuição e do consumo. Ela busca os meios mais diretos de se alcançar os fins desejados. Ela não justifica nem condena as motivações de qualquer ação econômica; ela é uma ciência livre de juízo de valor.
A política é a arte da governança estatal, incluindo-se aí as políticas do governo, seus objetivos e suas relações, seus métodos e suas táticas, além das ambições e ações dos partidos envolvidos. Ela apela a várias causas e intenções, e é guiada por preferências individuais que nada mais são do que escolhas morais feitas por indivíduos em suas relações com terceiros. A política também já foi definida como sendo “quem consegue o quê, quando e como”. Nas palavras de John F. Kennedy, “a ação política é a mais alta responsabilidade de um cidadão”.
A conexão entre ciência econômica e política é claramente visível. A produção econômica sustenta a vida humana, função esta que, para a maioria das pessoas, é a tarefa mais importante de nossas vidas. O prestígio de governos democráticos, sua ascensão e queda, normalmente depende de seu desempenho econômico. Políticas econômicas devem agradar ao maior número de pessoas possível, pois são elas que decidem o resultado de eleições e reeleições democráticas. Porém, os eleitores, bem como os representantes que eles escolhem, podem também ser guiados por noções e doutrinas econômicas que são populares mas que não são necessariamente corretas e apropriadas. A opinião pública pode ser influenciada por populismos e apelos emotivos em vez de pela razão e bom senso. Comentaristas políticos podem preferir concentrar-se em controvérsias e conflitos em vez de em teorias sólidas e corretas; jornais, revistas, programas de televisão e de rádio ou quaisquer outras formas de comunicação podem igualmente cometer o mesmo erro. Políticos bem articulados normalmente colaboram para a confusão acrescentando suas próprias explicações e interpretações. Eles podem preferir ser populares a estarem corretos.
Como vivemos em um mundo de escassez, no qual não há abundância de nenhum bem econômico, a oferta destes é algo por natureza limitado, e isto obviamente tende a criar um conflito de interesses. Porém, a cooperação humana e divisão do trabalho aumentam enormemente a produtividade e a oferta de bens, o que remove este conflito natural. A produção em larga escala efetuada por um grande número de trabalhadores diminui os custos unitários de produção e reduz os preços reais dos bens de consumo. Ela cria uma harmonia de interesses entre todos os membros da sociedade. Similarmente, a utilização de bens de capital na produção aumenta a produtividade. A simples utilização de mão-de-obra humana irá produzir muito pouco; a produtividade só aumenta se ela for auxiliada pelo emprego de máquinas e ferramentas. Estas, por sua vez, são fornecidas por poupadores, investidores e empreendedores que são tão indispensáveis quanto os trabalhadores que estão utilizando as ferramentas e operando as máquinas. Embora seja muito mais popular atribuir toda a produtividade aos trabalhadores, é totalmente incorreto ignorar as contribuições feitas pelos fornecedores das ferramentas e pelos gerenciadores de todo o processo produtivo.
Sem nenhuma dúvida, o mais influente escritor político do século XIX foi Karl Marx, cujos textos popularizaram doutrinas sobre conflitos sociais e confrontos de classe. Suas obras O Manifesto Comunista [1848] e O Capital[1867] se transformaram em bases para o socialismo internacional. Ele não criou a ideologia do conflito, mas ela deve sua fama principalmente aos escritos de Marx e aos de seus sucessores. Tal ideologia permeia o pensamento das massas e as políticas econômicas até hoje, 150 anos depois de ele tê-la explicitado pela primeira vez. Embora Marx não fosse favorável a legislações trabalhistas, inúmeras leis e regulamentações hoje têm a clara intenção de proteger os empregados da avareza de seus empregadores. Todos os governos democráticos, independentemente de suas supostas ideologias, procuram aumentar esta rede de proteção, criando novos benefícios trabalhistas e previdenciários. A maioria dos debates políticos sobre questões econômicas concentra-se em noções de conflitos de classe; apenas ouça qualquer político fazendo um discurso e você constatará o quão surpreendente é que, apesar de todas estas incitações ao conflito de classe, ainda consigamos viver relativamente em paz.
O valor de um bem econômico, de acordo com Marx, é determinado pela quantidade de trabalho requerida para sua manufatura. Qualquer preço maior do que o custo da mão-de-obra — isto é, qualquer excedente ou “mais valia” — representa um lucro para os capitalistas; representa uma grotesca exploração do trabalhador. Para colocar um fim a esta injustiça, acreditava Marx, todos os instrumentos de produção deveriam ser concentrados nas mãos do estado. O governo deveria ou ser o dono exclusivo dos meios de produção ou, no mínimo, controlá-los rigidamente, delegando a gerência a algum grupo exclusivo. Atualmente, governos socialistas ao redor do globo controlam diretamente os meios de produção de vários setores de suas economias, ao passo que governos social-democratas tendem a se contentar “apenas” em regular o uso dos meios de produção.
Economistas sucintamente negam que o trabalho represente o padrão de medida do valor de todos os bens econômicos, e negam também que a “mais valia” represente uma grotesca exploração do trabalhador. O determinante final do valor de um bem é o juízo de valor que os consumidores fazem deste bem; é a valoração atribuída a ele pelos consumidores. Sua decisão de comprar ou de se abster de comprar determina a formação dos preços de mercado de todos os bens econômicos, inclusive o preço da mão-de-obra, que nada mais é do que um bem econômico. Os próprios salários são o resultado das valorações feitas pelos compradores da mão-de-obra. Não importa se os empregadores e capitalistas são piedosos e compassivos ou se são cruéis e inclementes: todos estão sujeitos às ordens dos consumidores, cuja maioria é também formada por assalariados. Empregadores, portanto, têm de pagar o salário que o mercado determina. Se eles se arriscarem a oferecer salários menores, eles irão perder sua mão-de-obra. Se eles forem forçados a pagar salários maiores, seus consumidores irão obrigá-los a dispensar parte de sua mão-de-obra. Tanto empregadores quanto empregados são guiados por salários de mercado, os quais oferecem emprego a todos os trabalhadores que estão dispostos a trabalhar pelo valor oferecido.
A doutrina marxista do conflito de classes encontrou pronta aceitação em vários países europeus. Quando Marx morreu (1883), seus ensinamentos já haviam se espalhado por toda a Europa e criado todo um maciço movimento político. Na Alemanha, a doutrina marxista fez com que o governo criasse o Sistema de Seguridade Social (1884), começando com o seguro compulsório para acidentes de trabalho, seguido por seguro- doença e depois pela pensão para idosos. Os pagadores de impostos deveriam subsidiar todos estes programas. Tudo isso levou os trabalhadores a acreditar que Marx estava certo e que era função do governo atenuar a “exploração”.
Nos EUA, Karl Marx indubitavelmente pavimentou o caminho para o surgimento de várias escolas de pensamento econômico baseadas na ideia do conflito de classes, as quais fizeram interpretações peculiares das condições americanas. A Economia Institucional foi essencialmente um movimento acadêmico americano que, durante algum tempo (1933-1937), teve grande influência sobre as políticas do governo americano. Sua figura central eraThorstein Veblen, cujos livros The Theory of the Leisure Class [1899], The Theory of Business Enterprise [1904], The Engineers and the Price System [1921], and Absentee Ownership and Business Enterprise in Recent Times [1923] centravam-se no conflito entre aqueles que produziam os bens econômicos — isto é, os operários, os capatazes e os gerentes de produção — e aqueles que eram os proprietários das empresas. Segundo esta teoria, os capitalistas buscavam ganhos pecuniários que podiam não ser benéficos para a sociedade. Eles apenas se ocupavam de um “consumismo conspícuo”, de um “lazer conspícuo” e de um “desperdício conspícuo”. Eles usufruíam poderes monopolísticos — a concorrência não os restringia.
Outros críticos do sistema empreendedorial fizeram da concorrência monopolística e imperfeita o foco de suas teorias. Houve o economista inglês Alfred Marshall, que exerceu grande influência no pensamento econômico de todos os países anglófonos. Seu livro Princípios de Economia [1890] foi, durante muitos anos, o livro-texto utilizado nas faculdades e universidades americanas. Outros economistas ingleses seguiram o mesmo caminho. Em seu The Economics of Imperfect Competition, Joan Violet Robinson foi especialmente franca e direta em suas críticas às injustiças econômicas e sociais nas nações em desenvolvimento. No mesmo ano, Edward Chamberlainpublicou The Theory of Monopolistic Competition, que sugeria que a maioria das situações econômicas é composta tanto por monopólios quanto por concorrência. A ênfase dada às tendências monopolísticas e às imperfeições da concorrência, bem como às acusações de desperdício e exploração, obviamente geraram demandas por mais controle e regulamentações governamentais.
Desde Veblen, o mais ruidoso crítico do mercado tem sido John Kenneth Galbraith. Baseando-se na análise de Veblen sobre o consumismo conspícuo, Galbraith em seu livro A Sociedade Afluente [1958] argumentou que existiam desequilíbrios econômicos e sociais. A concorrência havia se tornado obsoleta e havia sido substituída por poderes contrapostos. O crescimento das grandes corporações havia levado ao crescimento de grandes e poderosos sindicatos. Adicionalmente, a sociedade agora produzia e consumia enormes quantidades de bens de consumo de alta qualidade, mas as pessoas se contentavam com uma baixa quantidade de bens públicos, todos de qualidade inferior. A sociedade, portanto, usufruía um conspícuo consumismo privado, mas silenciosamente sofria com declinantes e decadentes serviços públicos.
Durante a Grande Depressão, a doutrina do conflito de classes foi reforçada e escorada pelo pensamentokeynesiano, o qual afirma que uma ordem de livre mercado tende a gerar desemprego em massa e que, logo, a manutenção do pleno emprego é o objetivo apropriado e factível do governo. Os dolorosos defeitos do capitalismo, de acordo com John Maynard Keynes, “são sua incapacidade de fornecer pleno emprego, riqueza e renda” [A Teoria Geral, 1936, p. 372.] Keynes aparentemente acreditava na economia capitalista; ele queria que o governo a estimulasse, e não que a eliminasse. Políticos e burocratas indubitavelmente adotam esta linha de raciocínio e jubilosamente se entregam ao contínuo aumento dos gastos governamentais e, consequentemente, dos déficits orçamentários. Com efeito, a economia keynesiana foi a formulação econômica mais influente do século XX, tendo grande apelo tanto junto aos políticos quanto aos acadêmicos. Ela gerou uma era inflacionista cujo fim ainda está longe de ser vislumbrado.
A popularidade política de hoje se baseia exclusivamente no pensamento e nas políticas keynesianas. As ideias keynesianas permitem que os governos manipulem suas políticas de tal maneira que as condições econômicas estejam especialmente favoráveis às vésperas de uma eleição. Assim como os ciclos econômicos, políticos e burocratas podem, por meio de manipulações monetárias e fiscais, criar também um “ciclo político” acelerando seus gastos, déficits e expansões creditícias bem antes da data de uma eleição. A expansão econômica artificial, porém febril, que tal medida irá gerar pode ser suficiente para garantir a reeleição. Após tal feito, eles terão de lidar com as consequências indesejáveis desta tática, como a elevação acentuada dos preços dos bens de consumo e quedas nos salários reais. Eles podem até optar por reduzir os déficits e restringir novas expansões do crédito — até que uma nova eleição se aproxime.
A doutrina do conflito social estimulou a formação de “grupos de interesse” que, por meio de lobbies, tentam garantir privilégios e proteção aos seus membros. Ansiosos para promover seus interesses econômicos, estes grupos podem influenciar os partidos políticos e até mesmo a opinião pública geral. Seu principal alvo, a área em que concentram os seus esforços, é o Congresso. Ao prometerem generosas doações para congressistas simpáticos às suas causas ou ao garantirem os votos de toda a sua classe nas próximas eleições, estes grupos de interesse conseguem persuadir legisladores, deputados e senadores a criarem projetos de lei que nada mais são do que agressões à propriedade privada e a defenderem sua aprovação. Muita pressão também é feita sobre burocratas que comandam agências reguladoras, como as do setor de telefonia, do setor aéreo, do setor farmacêutico/sanitário, do setor de transportes terrestres, do setor energético etc. Seus diretores são extremamente vulneráveis às influências das pessoas que eles regulam.
Existem inúmeras categorias de grupos de interesse que tentam moldar e comandar a opinião pública: algumas são nacionalistas, outras são raciais, ocupacionais e profissionais. Algumas utilizam com maestria a mídia; outras tentam ocultar do público todo o seu real poder de influência. Grupos de interesse bem conhecidos — como as associações nacionais de indústrias, de agricultores, de comerciantes, de montadoras, de sindicatos, de produtores calçadistas, têxteis etc. — utilizam ambas as abordagens.
Sempre existiu um objetivo básico que mantém um grupo de interesse coeso. Tal objetivo é a promoção de seus interesses especiais, a manutenção de privilégios adquiridos no passado, a obtenção de novos favores, e a proteção contra outros grupos concorrentes empenhados em privá-los dos favores adquiridos e em conquistar sua fatia de mercado, sua receita e sua riqueza. Os políticos procuram liderar todos estes grupos de interesses por meio do apaziguamento e fazendo lisonjas a seus membros, prometendo a eles benefícios futuros cada vez mais generosos.
A política é a atividade dos homens comuns. Quando eles são bem sucedidos, eles se tornam importantes líderes aos olhos de seus seguidores. Mas a maioria deles meramente faz eco à opinião pública que já foi formada e moldada por eminentes teóricos, como aqueles mencionados acima. Políticos podem, no máximo, narrar os ensinamentos de seus professores de ciência política e de economia, ou relatar as lições e as histórias contadas por famosos escritores e comentaristas. No final, a opinião pública e as políticas públicas são moldadas por escritores e intelectuais. Foram eles que criaram e disseminaram a doutrina dos conflitos sociais e de classe que norteia as decisões de nossos políticos e burocratas. Eles são os responsáveis supremos por esta guerra econômica na qual os triunfos de alguns grupos específicos representam a derrota de outros.
Dado que o conflito econômico se origina na mente dos homens, é na mente dos homens que a paz deve ser restaurada. É obrigação daqueles intelectuais e professores interessados na liberdade analisar com profundidade as consequências econômicas da ação humana e iluminar o público a respeito da inevitável harmonia de interesses que existe em uma economia livre. Infelizmente, são poucos aqueles que estão propensos a explicar o funcionamento desta harmonia e a mostrar o caminho da paz. E eles mal podem ser ouvidos em meio a todo este ruído e algazarra gerados pela doutrina do conflito de classes.