Já ouviram as boas novas sobre a economia americana? A recessão acabou! É verdade, eu vi na TV. Por que se preocupar com o aumento no desemprego quando se sabe que os bancos voltaram a pagar bônus polpudos a seus executivos?
A prova da recuperação aparentemente foi revelada pelos números do PIB do segundo trimestre, que mostravam que a economia americana havia encolhido apenas 1%. Após quatro trimestres consecutivos de PIB negativo, os otimistas agora garantem que o crescimento estará de volta no terceiro trimestre. Mas antes de estourarmos o champanhe, seria interessante perguntar, “o que realmente mudou, e o que é responsável por essa nova perspectiva de vida?”
Em verdade vos digo que, por causa da contínua devassidão fiscal do governo americano e da impressão monetária desmesurada do Federal Reserve, os desequilíbrios que causaram a atual recessão na verdade foram piorados. Os EUA estão agora em um buraco ainda mais fundo do que estavam antes de a crise começar. Ao invés de estar saindo da recessão, o país na realidade está se afundando em uma depressão. Se as coisas parecem melhores agora, é apenas porque estamos no olho do furacão.
É válido lembrar que períodos de crescimento econômico artificial inevitavelmente são seguidos de recessões. Durante esse período de “crescimento”, vários investimentos errôneos são empreendidos; e justamente por causa dessa natureza errônea, esses investimentos inevitavelmente precisarão ser liquidados. Temos aí o período da recessão. Ou seja, os erros cometidos durante os booms artificiais são corrigidos durante as recessões – e, em seu último boom, os EUA capricharam em seus erros. Os americanos se endividaram e gastaram excessivamente, compraram bens que não podiam bancar, construíram casas que não podiam manter, e criaram uma economia baseada no setor de serviços que era totalmente dependente de crédito farto e de ativos com preços crescentes. Ao mesmo tempo, o fato de o dólar ser a moeda internacional de troca – e o banco central americano poder imprimi-la sem restrições – fez com que a base industrial do país fosse aniquilada, uma vez que era possível importar algo em troca de nada.
Se o país quiser realmente criar as bases para uma recuperação real e duradoura, só há uma solução: as forças de mercado devem ser liberadas para reparar o estrago. Entretanto, a atual política do governo Obama vai contra esse objetivo. Trilhões de dólares em estímulo permitiram que a farra se prolongasse, mas e agora? Como os déficits governamentais irão corrigir os problemas que criaram o atual colapso? Não irão; os déficits irão apenas atrasar e piorar a ressaca – e esperemos que o país não morra de coma alcoólico.
A recessão é um período doloroso, porém necessário, de correção econômica. É ela quem “limpa” todos os excessos cometidos durante o boom artificial, que foi gerado pela política de juros baixos do Fed. Ao interferir no funcionamento desses desagradáveis sintomas da recessão, os EUA estão simplesmente obtendo alguns benefícios de curto prazo em troca de um maior sofrimento de longo prazo.
Ao socorrer empresas ineficientes que deveriam quebrar, o governo está impedindo que o capital utilizado ineficientemente por essas empresas possa ser alocado para outras empresas mais eficazes, o que permitiria seu crescimento. Ao impedir que os ativos que estão sobrevalorizados possam ter seu preço determinado realisticamente pelo mercado, o governo está impedindo que os mais prudentes – ou mesmo os mais pobres – possam adquiri-los, o que acabaria criando um novo equilíbrio de preços, desta vez baseado na realidade. Ao manter os juros artificialmente baixos, o governo está desestimulando a poupança – exatamente aquilo que é tão necessário para a formação de capital, que é o que possibilita o crescimento econômico. (Ademais, os falsos sinais econômicos que uma taxa de juros artificialmente baixa emite para o mercado impedem que haja uma eficiente realocação de recursos, o que gera ainda mais decisões econômicas insensatas). Ao incorrer em déficits gigantescos, o governo sobrepuja a iniciativa privada, sugando-lhe recursos e fazendo com que seja ainda mais difícil para as empresas contratarem ou investirem.
O programa “cash for clunkers”[*], recentemente implantado pelo governo americano, é um perfeito exemplo de como uma política governamental pode piorar a economia. Ao incentivar os americanos a destruírem os carros pelos quais pagaram integralmente – para que possam se endividar ainda mais para comprar modelos novos -, o governo está debilitando uma já estropiada economia. A última coisa de que precisamos é subsidiar os americanos para que eles se endividem ainda mais e saiam comprando mais coisas. Será que eles não percebem que foi exatamente esse comportamento que criou toda a atual confusão?
Pense dessa forma: se seu amigo estivesse em apuros porque se endividou muito, você o encorajaria em se endividar ainda mais, falando que isso seria bom para ele? Será que um real sinal de progresso não seria uma redução da dívida, mesmo que para isso ele tivesse que cortar várias despesas? O que é válido para um indivíduo também é válido para um coletivo de indivíduos, mesmo que estes se chamem a si próprios de “governo”. Se um país está mais endividado hoje do que antes, ele está em piores condições. Ponto. O fato de que uma dívida adicional pode elevar no curto prazo os números do PIB, torna-se algo negativo no longo prazo.
Um outro ponto que vale a pena mencionar sobre esse programa “Cash for Clunkers” é como ele piora a vida dos mais pobres. A intenção do programa é tirar os “clunkers” (carroças) das ruas e entregá-los para o governo, que os destruirá. Mas esses tipos de carro são exatamente aqueles que os pobres ou as pessoas de renda fixa tendem a comprar. Essas “carroças” estão, em sua maioria, em ótimo estado, porém não são “verdes” o suficiente de acordo com as determinações governamentais. Assim, as pessoas mais pobres, que não podem se dar ao luxo de comprar os novos automóveis aprovados pelo governo (e, por isso, artificialmente caros), terão de ir passear – literalmente!
Como o governo irá destruir essas “carroças”, o mercado de carros usados e baratos irá secar, levando a um aumento dos preços e, consequentemente, dificultando ainda mais a vida dos pobres e de todas as pessoas – trabalhadoras e aposentadas – que vivem de renda fixa. O aposentado que precisa apenas de um carro velho e barato para ir à farmácia comprar seus remédios será forçado a ir a pé ou de táxi. E se ele quiser comprar um carro novo, as financeiras irão dar uma olhada em sua renda previdenciária e simplesmente dizer “próximo!”. Esse programa é apenas mais um exemplo de ataque governamental aos pobres em benefício das montadoras politicamente poderosas e de suas financeiras. Como em todos os programas estatais, os pobres ganham apenas a conta final.
Em resumo: como não aprendemos nada com os erros do passado, estamos condenados a repeti-los. Como se ainda não tivéssemos sofrido o suficiente por conta dos estímulos da dupla Bush/Greenspan, a dupla Obama/Bernanke está ministrando doses cada vez maiores, que provavelmente mostrar-se-ão letais para qualquer recuperação.
A recessão acabou; vida longa à depressão!
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[*] N. do T.: Mais uma estupidez criada pelo governo Obama, em que o governo promete pagar 4 mil dólares para cada cidadão que der seu carro para o ferro-velho e comprar um outro mais “ecologicamente correto”. Um negócio e tanto para as revendedoras com conexões políticas, que obviamente estão atrás do lobby. Porém, como tudo que é gerido pelo estado, o projeto revelou-se mal dimensionado, os fundos acabaram e o programa encontra-se temporariamente suspenso – até que o governo consiga a aprovação do Congresso para aumentar os fundos destinados ao programa, algo que certamente não demorará a ocorrer.