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O desastre não é natural

N. do T.: o texto a seguir apresenta um dos melhores, mais claros e mais completos relatos já publicados sobre o funcionamento dos ciclos econômicos. 

 

Aceita-se como um fato econômico inevitável que os tempos de bonança sempre serão seguidos por tempos de privação.  Assim com a lua tem suas fases, a economia também passa por períodos de expansão e recessão.

Por exemplo, nos EUA, os preços dos imóveis aumentaram 150% de agosto de 1998 até agosto de 2006.  Nos dois anos seguintes, esses preços caíram mais de 23%.  As execuções de hipotecas dispararam.

A bolsa de valores seguiu um caminho similar.  Quando a New York Stock Exchange encerrou o pregão do dia 9 de outubro de 2007, o Dow Jones estava em 14.164,53, o índice mais alto da história.  Treze meses depois, esse mesmo índice fechou em 7.552,29, uma queda de 46,7%.  As carteiras de aposentadorias foram evisceradas.  O desemprego aumentou.  Utilizando a metodologia que o governo americano aplicava até a década de 1970, a taxa de desemprego de fevereiro de 2009 foi de 19%.  (Veja um relato sobre o Brasil aqui).

Essas dimensões, comuns nas recessões, são utilizadas para se justificar todos os tipos de intervenções governamentais, desde a criação de uma rede de proteção social até a criação de mais regulamentações voltadas à suavização dos ciclos econômicos, que supostamente são inerentes ao livre mercado.  Mas será que são mesmo?  Será que tudo isso é de fato inevitável?  Será que a economia de mercado é mesmo propensa a repentinos e inexplicáveis surtos de erros empreendedoriais, volumosos e dispersos por todos os setores da economia?  Ou será que há um fator exógeno ao mercado que causa tudo isso?

Se os políticos fossem honestos em sua procura por culpados, descobririam que este não é o capitalismo.  Também não é a desregulamentação (que não houve).  O culpado é uma instituição criada pelos próprios governos.

Ninguém se surpreende quando uma determinada empresa quebra e tem de fechar suas portas.  Esses empreendedores podem ter cometido erros ao avaliarem seus custos de produção, ou não previram corretamente quais seriam os padrões de consumo ou simplesmente subestimaram os recursos necessários para satisfazer as inúmeras e inconstantes regulamentações governamentais.  Porém, quando várias empresas de diferentes áreas quebram ao mesmo tempo, isso sim deveria nos surpreender.  Afinal, o mercado gradualmente elimina aqueles que não gerenciam seu capital satisfatoriamente ou que não prevêem corretamente a demanda dos consumidores.  Sendo assim, uma resposta para a seguinte questão é imperativa:  por que repentinamente todos os empreendedores e empresários, mesmo aqueles acostumados a serem aprovados ano após ano nesse teste de mercado, repentinamente cometem o mesmo tipo de erro?

O economista Lionel Robbins argumentou que esse “conjunto de erros” exigia uma explicação:  “Por que os líderes empresariais das várias indústrias que produzem bens de capital cometeriam erros de julgamento ao mesmo tempo e na mesma direção?”  A esse padrão de aparente prosperidade seguida de uma depressão generalizada damos o nome de ciclos econômicos, ou ciclos de negócios ou ciclo de expansão e recessão (boom and bust).  Teria esse fenômeno uma causa ou seria ele, como Marx argumentava, uma característica inerente à economia de mercado?

F.A. Hayek ganhou o Nobel em economia por ter apresentado uma teoria dos ciclos econômicos que possui um grande poder de explicação – especialmente à luz da atual crise financeira, que deixou vários economistas completamente perdidos e incapazes de entendê-la.  O trabalho de Hayek, que expande a teoria desenvolvida por Ludwig von Mises, identifica o banco central como a causa dos ciclos de expansão e recessão – exatamente a mesma instituição que posa de protetora da economia e de fonte de alívio para os ciclos econômicos.

Analisar a variação da oferta monetária é algo sensato quando se está procurando a raiz de um problema que abrange toda a economia, pois o dinheiro é a única coisa presente em todos os cantos do mercado, como Robbins apontou em seu livro de 1934, The Great Depression.  “Não seria provável”, perguntou ele, “que distúrbios afetando ao mesmo tempo vários setores da economia tenham suas origens na área monetária?”

Em particular, o culpado de tudo é a interferência do banco central nas taxas de juros.  As taxas de juros funcionam como um preço.  O capital emprestado é um bem, e você paga um preço para obter esse empréstimo.  Quando você coloca seu dinheiro no banco ou quando você compra um título, você é o emprestador, e a taxa de juros que você ganha é o preço que lhe é pago pelo seu dinheiro.

Assim como ocorre com todos os outros bens, a oferta e a demanda de capital determinam seu preço.  Se mais famílias estão poupando ou se mais bancos estão emprestando, os tomadores de empréstimo não terão de pagar tanto pelo empréstimo, e as taxas de juros vão cair.  Se, por outro lado, houver uma demanda intensa por empréstimos ou uma escassez de capital a ser emprestado, as taxas de juros subirão.

Essa dinâmica produz alguns resultados que contribuem para a saúde da economia.  Comecemos pelo caso em que as pessoas estão poupando mais, o que leva a um aumento do capital disponível para empréstimos e à queda da taxa de juros.  Nesse cenário, as empresas e os negócios vão reagir investindo em projetos voltados para o aumento da sua capacidade produtiva no futuro – expandindo suas instalações ou adquirindo novos bens de capital.

Também consideremos a perspectiva do poupador.  Poupar indica um desejo menor de consumir no presente.  Esse é mais um incentivo para que as empresas invistam no futuro ao invés de produzirem e venderem coisas agora, no presente.  Por outro lado, se as pessoas estiverem tomadas por um intenso desejo de consumir imediatamente, elas pouparão menos, fazendo com que seja mais custoso para as empresas embarcarem em projetos de longo prazo.  A grande oferta de dinheiro presente – isto é, dinheiro para consumo imediato – faz com que este seja um bom momento para se produzir bens de venda imediata (bens de consumo final).

E é desta forma que a taxa de juros coordena a produção através do tempo.  Ela garante uma mescla compatível entre as forças de mercado: se as pessoas querem consumir agora, as empresas e os negócios vão reagir de acordo; se as pessoas querem consumir no futuro, as empresas e os negócios irão alocar recursos para satisfazer esse desejo.  Porém, a taxa de juros irá desempenhar essa função coordenadora somente se ela puder se mover livremente em resposta a mudanças na oferta e na demanda.  Se o banco central manipular essa taxa de juros, não será surpresa alguma se ocorrerem descoordenações em escala substancial.

Assim, suponha que o banco central diminua a taxa básica de juros de modo que ela não mais reflita a verdadeira demanda por consumo e nem as reais condições econômicas.  Taxas de juros artificialmente baixas iludem os investidores a pensar que agora é um bom momento para se investir em projetos de longo prazo.  Porém, o público em momento algum indicou qualquer intenção de adiar seu consumo e com isso liberar recursos para as empresas empregarem em seus projetos.  Ao contrário, as baixas taxas de juros irão estimular o público a poupar menos e a consumir mais.  Portanto, ainda que alguns desses projetos possam ser finalizados, a poupança relativamente baixa do público irá fazer com que o poder de compra necessário não esteja disponível mais tarde, justamente quando as empresas esperam poder lucrar com seus investimentos.

E à medida que uma empresa vai levando seu projeto até o fim sob essas condições, em determinado momento ela descobrirá que os recursos de que precisa – mão-de-obra, materiais, peças de reposição – não estão disponíveis em quantias suficientes.  Os preços portanto serão mais altos, e as empresas terão de obter mais empréstimos para financiar esse inesperado aumento nos preços dos insumos.  Esse aumento na demanda por empréstimos irá aumentar as taxas de juros.  A realidade agora começa a se impor: alguns desses projetos não poderão ser finalizados.

Mais ainda: os tipos de projetos que foram iniciados são diferentes daqueles que teriam sido levados a cabo em um livre mercado.  Mises faz uma analogia entre uma economia sob a influência de taxas de juros artificialmente baixas e um mestre-de-obras que acredita ter mais recursos – mais tijolos, por exemplo – do que ele de fato possui.  Ele dará início à construção de uma casa bem diferente (maior) daquela que ele teria construído caso de fato soubesse seu real estoque de tijolos.  Mas como ele não conseguirá finalizar essa casa (afinal, faltarão tijolos), quanto mais cedo ele descobrir qual o seu real estoque de tijolos, melhor, porque assim ele poderá reajustar seus planos de produção antes que boa parte de seus recursos tenha sido desperdiçada.  Se ele descobrir a encrenca apenas nos estágios finais da construção, ele terá de destruir tudo, exceto as fundações, e estará mais pobre por causa desse investimento errôneo.

No curto prazo, o resultado do corte de juros feito pelo banco central é a aparente prosperidade do período da expansão econômica artificial.  As ações e os imóveis se valorizam.  Novas construções surgem por todos os lados, os negócios estão se expandindo e as pessoas estão desfrutando um maior padrão de vida.  Mas esse crescimento é artificial e insustentável, aditivado apenas por crédito barato, que não existe; e a realidade inevitavelmente irá se impor.  E alguns desses investimentos se comprovarão insustentáveis.

Essa é uma das razões por que o banco central não pode simplesmente injetar mais crédito na economia e manter a expansão continuamente.  Entretanto, o economista John Maynard Keynes – de volta à moda, embora seu sistema tenha sucumbido no início da década de 1970, quando se mostrou incapaz de explicar a estagflação – propôs exatamente isso:  “O remédio para o boom econômico não é uma maior taxa de juros, mas uma menor!  Pois isso pode fazer com que o chamado boom prossiga.  O remédio correto para o ciclo econômico não é a abolição dos booms, o que irá nos manter em um permanente estado de semi-depressão; mas sim a abolição das depressões, o que irá nos manter em um permanente estado de quase-boom”.

Keynes estava tendo fantasias, é claro.  Quanto mais o banco central inflacionar, pior será o acerto de contas.  Cada nova onda de crédito artificial deforma ainda mais a estrutura do capital, fazendo com que a inevitável recessão seja mais severa, pois uma quantidade maior de capital foi desperdiçada e uma quantidade maior de recursos foi mal direcionada.

À medida que vai se tornando claro que a maior parte desse boom é insustentável, aumenta a pressão pela liquidação dos maus investimentos.  O capital que foi mal alocado, caso seja aproveitável, deve ser liberado.  Se o banco central ignorar esses sinais e simplesmente sair inflacionando a oferta monetária, avisou Mises, haverá o risco de uma hiperinflação – uma inflação galopante e severa capaz de destruir a unidade monetária.

Escrevendo durante a Grande Depressão, Hayek deu uma bronca naqueles que imaginavam ser possível evitar um desastre recorrendo à inflação:

“Ao invés de facilitar a inevitável liquidação dos investimentos errôneos que foram induzidos pela expansão econômica dos últimos três anos, todos os meios imagináveis têm sido utilizados para impedir que o processo de reajustamento ocorra; e um desses meios – que tem sido repetidamente tentado, ainda que sem sucesso, desde os primórdios até os mais recentes estágios da depressão – é justamente a política da expansão deliberada do crédito…“Combater a depressão por meio de uma forçosa expansão do crédito é tentar curar o mal fazendo uso do próprio meio que o criou; por estarmos sofrendo de uma crise oriunda de uma má alocação da produção, estamos querendo criar ainda mais más alocações – um procedimento que servirá apenas para levar a uma crise muito mais severa assim que a expansão creditícia acabar…. É provavelmente por causa desse experimento, bem como por causa das tentativas de se impedir quebradeiras logo que a crise surgiu, que estamos vivenciando uma depressão de duração e severidade excepcionais.”

Embora dolorosa, a recessão ou depressão não é a fase do ciclo em que o estrago é feito.  A recessão é o período em que a economia descarta todo o capital que foi mal alocado, restabelecendo uma estrutura de produção sustentável e voltando à normalidade.  O estrago é feito durante a fase do boom, que é o período da falsa prosperidade.  É nessa fase que a diminuição artificial das taxas de juros provoca a má alocação de capital e o início dos investimentos insustentáveis.  É nessa fase que os recursos que teriam satisfeito genuinamente as demandas dos consumidores foram desviados para projetos que só faziam sentido sob condições econômicas artificiais.  No caso do mestre-de-obras iludido, o estrago não ocorreu quando ele teve de derrubar a casa que ele não pôde completar; o estrago ocorreu quando ele iniciou o projeto pensando ter uma quantidade maior de tijolos do que de fato tinha.

O analista de investimentos Peter Schiff faz uma analogia entre o crescimento econômico artificial e um circo que chega a uma cidade para se apresentar por algumas semanas.  Quando o circo chega, seus membros e todo o público que ele atrai se tornam clientes das empresas locais.  Nesse caso, suponha que o dono de um restaurante erroneamente conclui que esse boom econômico será permanente e reaja expandindo seu restaurante.  Tão logo o circo deixe a cidade, ele perceberá que cometeu um erro trágico de cálculo.

Faz algum sentido imprimir dinheiro na esperança de que isso vá tirar esse pobre empreendedor dessa situação difícil?  Criar dinheiro novo não vai criar coisas novas.  Portanto, emprestar a ele esse dinheiro recém-criado irá meramente permitir que ele absorva mais recursos da economia para ele próprio, em detrimento dos genuínos empreendedores que estão atendendo os reais desejos dos consumidores.  Esse restaurante é uma bolha capaz de sobreviver somente sob as falsas condições que existiam durante o boom propiciado pela vinda do circo.  Essa bolha precisa ser estourada para que os recursos que ela utiliza possam ser realocados para linhas de produção mais sensatas.

Um outro ponto importante precisa ser mencionado: todas as empresas são afetadas pelo boom artificial, e não apenas aquelas que incorreram em novos projetos ou que surgiram graças ao crédito artificialmente barato.  Como Mises observou: “Para poderem continuar a produção nessa escala que foi alargada pela expansão do crédito, todos os empreendedores, tanto aqueles que expandiram suas atividades como aqueles que continuaram produzindo estritamente dentro dos limites em que produziam antes, precisam de financiamento adicional, uma vez que os custos da produção agora estão mais altos.”

Observe que o fator que perturbou a harmonia do sistema nada tem a ver com a economia de mercado.  Foi a política do governo de cortar os juros para baixo do seu nível de livre mercado que gerou todo esse distúrbio.  O banco central é uma instituição do governo, criada por uma legislação governamental, cujos funcionários são apontados pelo governo e que desfruta de privilégios monopolistas garantidos pelo governo.  Vale repetir: são as intervenções do banco central na economia que provocam os ciclos econômicos, e o banco central não é uma instituição que existiria em um livre mercado.

Mas por que os empreendedores e empresários simplesmente não aprendem a distinguir entre as baixas taxas de juros que são reflexo de um aumento na poupança genuína e as baixas taxas de juro que são resultado único da manipulação do banco central?  Por que eles não se abstêm de expandir quando o banco central começa a inflacionar a economia?

Não é tão fácil assim.  Mesmo os empreendedores e empresários que sabem que o banco central está mantendo taxas de juros artificialmente baixas ainda podem achar que é de seu interesse contrair empréstimos e dar início a novos projetos, na esperança de que poderão obter algum lucro e sair de cena antes que a recessão comece.  E mais: se eles não reagirem aos juros baixos, seus concorrentes certamente irão, o que os permitirá abocanhar uma maior fatia de mercado às suas custas.  Alguém inevitavelmente vai morder a isca.

Essa explicação, entretanto, não pretende explicar a duração de uma depressão, pois isto é impossível.  Trata-se de uma teoria para explicar o boom artificial, que culmina na recessão.  O período recessivo será tanto mais longo quanto mais o governo impedir que a economia rearranje a mão-de-obra e o capital em um padrão sustentável de produção.  As interferências do governo, na forma de controles de preços ou salários, socorros financeiros, empréstimos emergenciais ou inflação monetária – todos com a intenção de aliviar dores de curto prazo – acabam por exacerbar a agonia de longo prazo.  Os investimentos errôneos precisam ser interrompidos e liquidados – e não estimulados e subsidiados – caso se queira que a estrutura do capital da economia retorne a uma condição sustentável.

Sempre haverá aqueles que, completamente alheios à realidade da situação, irão clamar por injeções monetárias cada vez maiores para tentar manter o boom indefinidamente – e o número desses indivíduos explodiu desde meados de 2008.  Já em dezembro, nos EUA, o Fed derrubou os juros para o menor nível da sal história, um valor variável entre 0 e 0,25%, o sonho keynesiano.  Cegado pela mesma insensatez, o presidente do Bank of England (o banco central da Inglaterra), Mervyn King, disse que estava pronto para reduzir os juros para “qualquer que seja o nível necessário”, inclusive zero – uma medida que certamente irá perpetuar as más alocações originadas durante o boom e armar o cenário para uma crise muito pior no futuro. (Para mais detalhes sobre o desenvolvimento dessas medidas, veja aqui).

Os “estímulos” keynesianos, através dos quais os governos bancam projetos de obras públicas, frequentemente financiados por déficits, são apenas mais um procedimento destrutivo e inexplicavelmente badalado que se baseia na moderna superstição de que o próprio ato de se gastar é o caminho certo para a saúde econômica.  Tirar recursos de toda a economia e jogá-los em alguns setores específicos: é isso que vai nos enriquecer!  O historiador econômico Robert Higgs comparou planos como esse ao ato de tirar água da parte funda de uma piscina, despejá-la na parte rasa e esperar que o nível da água vá subir.

Gastos adicionais em obras públicas não apenas retiram recursos do setor privado – as pessoas são tributadas para financiar esses projetos -, como também desviam recursos para empresas cuja liquidação é necessária.  Além disso, esses gastos também irão aumentar as taxas de juros caso os projetos sejam financiados por empréstimos contraídos pelo governo, o que irá fazer com que o crédito bancário fique mais escasso e mais caro para as empresas privadas.

Esses projetos são exatamente o oposto daquilo que uma economia fragilizada pela recessão necessita.  A economia precisa que se aloque rapidamente recursos para a produção dos bens que estão sendo demandados pelo consumidor, com o mínimo possível de desperdício de recursos.  O governo, por outro lado, não tem como saber quanto deve produzir de alguma coisa, nem quais materiais e quais métodos de produção utilizar.  As empresas privadas utilizam o teste dos lucros e prejuízos para mensurar como estão se saindo na satisfação dos desejos do consumidor.  Se elas estão lucrando, é porque o mercado ratificou suas decisões de produção.  Se elas estão tendo prejuízos, é porque elas desperdiçaram recursos que poderiam estar sendo empregados mais efetivamente por outros setores da economia, que estariam satisfazendo com mais competência os desejos dos consumidores.

Já o governo não possui esse mecanismo de informação, pois ele não adquire seus recursos através de meios voluntários, mas sim pelo confisco direto dos cidadãos – e ninguém tem a opção de não comprar aquilo que o governo produz.  Sendo assim, o governo não se guia pelo mecanismo de lucros e prejuízos.  E é por isso que seus projetos desperdiçam riqueza em um momento em que o padrão de vida está caindo, exatamente quando mais se precisa extrair a maior eficiência possível dos recursos existentes.

Tampouco parece ser o estado capaz de resistir à tentação de estender créditos emergenciais para empresas insolventes.  Se essas empresas fossem genuinamente sólidas, o crédito certamente viria do setor privado.  Se elas não são, então elas simplesmente deveriam quebrar, liberando seus recursos para serem utilizados por gestores mais capacitados.  Mas o governo sempre escolhe o caminho oposto ao da sensatez.  E confiscar os recursos daqueles que tiveram sucesso na satisfação das demandas dos consumidores e redirecioná-los para aqueles que fracassaram nessa tarefa irá apenas debilitar a economia e fazer com que a recuperação seja muito mais difícil.

Há um argumento que diz que as bolhas econômicas – setores da economia em que os preços estão artificialmente altos – são causadas por fatores psicológicos que fazem com que as pessoas se tornem irracionalmente comprometidas com a produção de determinados tipos de bens.  Tal explicação pode até ter alguma função em determinar exatamente qual caminho o ciclo econômico irá percorrer e quais ativos estarão supervalorizados, mas ela não pode por si só explicar a ocorrência da bolha.  Manias podem direcionar os investimentos para uma direção ou para outra, mas quem está pisando no acelerador é o banco central.

Mises nos lembra que uma febre repentina por um tipo particular de investimento irá aumentar os preços dos fatores de produção complementares, bem como a própria taxa de juros.  Para que um boom guiado por alguma mania prossiga, é necessário haver uma oferta crescente de crédito para financiá-lo, uma vez que os investimentos naquele setor estariam encarecendo constantemente ao longo do tempo.  Isso certamente não poderia ocorrer na ausência de uma expansão de crédito.

A melhor maneira de evitar o estouro de bolhas econômicas e de limpar os estragos causados pelos booms artificiais é, obviamente, não iniciar os booms artificiais.  Isso significa que teríamos de abandonar a crença na perícia dos funcionários do banco central e na sua capacidade de gerenciar o sistema monetário.  Já é hora de darmos ouvidos às pessoas que previram essa crise, que têm uma teoria coerente para explicar por que essas crises ocorrem e que têm algo a sugerir além das fantasias juvenis que dizem que o gasto e a inflação são o caminho certo para a prosperidade.  A escolha é inflexível: ou seguimos as sugestões que prolongaram a Grande Depressão ou podemos tentar uma abordagem diferente e que realmente explica o que está acontecendo.

Isso sim seria uma verdadeira revolução.

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