[N. do T: a validade do texto a seguir é perene e independente do lugar em que se passa. A empresa citada pode ser facilmente trocada por qualquer outra que esteja fazendo o mesmo serviço em qualquer ponto do mundo. O mesmo raciocínio é válido também para as situações descritas. A conclusão será sempre a mesma. E essa conclusão é ainda mais válida para a iniciativa privada brasileira, que enfrenta asfixiantes regulamentações e carga tributária.]
Enquanto os políticos giram pelo país garbosamente contando-nos seus planos para melhorar nossas vidas — seja falando da magia que eles possuem para resolver problemas, ou seja meramente fazendo discursos, aprovando leis ou imprimindo papéis que eles juram que nos farão mais prósperos e seguros —, a iniciativa privada está ocupada em realizar de fato este objetivo, e faz isso com pouca ou nenhuma fanfarra.
Foi exatamente essa a reflexão que me ocorreu quando vi a notícia de que 43.000 pessoas se inscreveram para concorrer às vagas que a nova fábrica automotiva da KIA Motors irá disponibilizar logo que inaugurar suas instalações no estado da Geórgia. Quando a fábrica abrir, haverá 2.500 postos de trabalho — portanto, muitas das pessoas que se inscreveram ficarão desapontadas. A conclusão simples é de que precisamos de mais e mais e mais dessas fábricas.
Mas isso só vai acontecer quando as atividades dos políticos forem restringidas de modo que a iniciativa privada possa fazer desimpedidamente seu trabalho — que, afinal, nada tem a ver com eleições, financiamento de campanha e lobistas. A livre iniciativa ocorre em uma escala completamente humana, de pessoa para pessoa; e a cada troca, a cada investimento vitorioso, a sociedade se torna mais próspera.
Já faz seis meses que venho passando de carro pelas instalações, e digo que ela representa uma maravilha de engenhosidade e audácia. Na realidade, é uma tremenda inspiração. Uma coisa belíssima. Olho para o lado da rodovia e vejo o que parece ser milhas e milhas de terreno desabitado, com tratores urrando, poeira, aço e madeira sendo removidos de cá pra lá. Ainda estão na fase inicial da construção. Mas o que se vê ali são sonhos indômitos se realizando. Ah, a civilização!
Foi apenas alguns meses atrás que apareceu uma simples placa anunciando que ali seria o terreno de uma nova planta automotiva da KIA.
É de arrepiar se formos imaginar todos os cheques que já tiveram de ser assinados até o momento. Cada motorista de cada trator tem que ser pago. Os próprios 3.300 acres de terra devem ter sido inacreditavelmente caros. Fora o fato de que toda a planta representa um investimento de incríveis $1,2 bilhões. Além disso, estão construindo também cinco plantas fornecedoras ao redor. Ou seja: a empresa só vai pagar, pagar, pagar e pagar — despejando somas fabulosas de dinheiro por anos.
E por quê? A troco de quê?
Os ganhos para a empresa ainda são puramente especulativos. Não há garantia nenhuma. A planta só abrirá em novembro de 2009. E mesmo assim, só quando o primeiro carro for comprado na sala de exposição é que os gastos terão gerado a primeira receita. Pense nisso. Ao final, tudo se resume a um vendedor conversando com um comprador. E principalmente: depende apenas do consumidor se ele vai querer trocar seu dinheiro por um carro. Ele pode simplesmente ir embora sem comprar nada. Se todos fizerem isso, a empresa irá quebrar. Todo o planejamento, todas as compras, todo o vasto aparato, todos os gastos teriam se revelado um completo desperdício.
Por falar em viver na incerteza! E por quê? Existem duas possíveis respostas. A primeira é: simplesmente para ganhar dinheiro. Algumas pessoas dizem que isso é algo ganancioso e repulsivo. Tanto esforço, tantos recursos e tempo despendidos na odiosa tarefa de ganhar dinheiro. Verdade? Digamos que a ganância pura e crua seja o motivo básico. Como isso funciona na prática? Funciona através de um incrível e indelével ato de serviço humano, um que se baseia em oferecer voluntariamente para toda a sociedade uma gama de bens e serviços que podem ser aceitos ou não, de tal maneira que qualquer um que aceite o estará fazendo por vontade própria.
Conquanto seja impossível saber com certeza o que motiva os outros — algumas vezes é difícil saber até mesmo quais são as nossas próprias motivações —, a ganância por si só não pode explicar o nível de fanatismo empresarial que está por trás deste tipo de empreendimento. É mais plausível imaginar que se trata de um simples ímpeto em se fazer algo de espetacular. Mais ainda: os motivos podem até mesmo ser puramente altruístas — o desejo de dar às pessoas bons empregos e bons carros. Qual a verdadeira motivação é algo que realmente não importa aqui; a explicação que interessa é a realidade. E a realidade é que KIA está fazendo coisas magníficas e incorrendo em enormes riscos apenas para que você e eu, ao final, possamos ter um carro prazeroso de ser dirigido.
Também é notável o fato de essa ser uma empresa da Coréia do Sul. Portanto, aqui vemos também a livre iniciativa derrubando fronteiras, unindo as pessoas ao redor do mundo em torno de uma causa comum, estendendo-se sobre as barreiras culturais e lingüísticas com o intuito de realizar maravilhas para o maior número possível de famílias humanas. E tudo isso é feito sem que haja um planejador central. O que motiva a livre iniciativa não é um calendário eleitoral, ou uma legislação federal, ou as ambições dos poderosos e influentes, mas simplesmente a mão hábil e coordenadora do livre mercado.
Enquanto políticos pavoneiam-se por aí, falando bem de si próprios, ninguém, além daqueles que observam a indústria automotiva de perto, sabe sequer os nomes dos principais agentes desta indústria.
Comparar políticos a empreendedores é como comparar dois atletas em uma maratona, sendo que um fica parado na linha de partida fazendo discursos, e o outro corre a distância completa sem dizer uma só palavra.
Como não foi preciso perguntar a eleitores se essa fábrica poderia ser construída, o presidente da empresa — ao contrário dos políticos — não teve que adular ninguém, não teve que sair contando fábulas sobre todas as coisas maravilhosas que ele faria com o dinheiro dos outros, e tampouco precisou se reinventar como sendo algum tipo de salvador da humanidade. Ele não precisou participar de comícios políticos ou pedir que alguém lhe desse dinheiro. Todas as decisões referentes a este investimento envolveram propriedade privada sendo voluntariamente utilizada para benefício público.
Agora, você pode estar curioso sobre como uma fábrica deste tamanho pôde ser construída sem auxílio governamental. Algumas vezes é comum ocorrem “arranjos tenros” por detrás dos panos. Por isso, resolvi investigar. E descobri que o estado da Geórgia de fato forneceu consideráveis incentivos fiscais. Estes incentivos envolvem um certo nível de isenção para o imposto de renda estadual, para o imposto sobre vendas e para o imposto sobre propriedade. Mas observe que toda a ação do estado consistiu unicamente em remover obstáculos que, em primeiro lugar, nem deveriam estar lá. Tais isenções deveriam ser disponibilizadas a todas as empresas, e o fato de elas terem sido disponibilizadas apenas para a KIA é uma questão a ser resolvida pelo judiciário. No entanto, um corte de impostos de fato não extrai um único centavo dos cidadãos, e por isso é bem mais facilmente justificável do que qualquer subsídio.
As pessoas por trás de todo esse investimento provavelmente não entrarão em nenhum livro de história. Elas mal chegam ao noticiário atual. Elas sequer ganham algum reconhecimento, mesmo das pessoas que compram seus carros ou que trabalham em suas fábricas. Pelo contrário, elas são responsabilizadas até mesmo pela mais mínima insatisfação que por ventura venha a ocorrer. E suas responsabilidades não se refletem apenas em suas reputações. Existe algo ainda mais obscuro que elas precisam enfrentar: a verdade refletida pelos números que indicam lucros ou prejuízos — este teste destruidor e ao mesmo tempo estimulante. Teste este ao qual os políticos nunca precisam se submeter.
Pensar em tudo isso me fez querer colocar uma placa da KIA no meu quintal. Ih, espere! Acho que isso viola leis de zoneamento. Apenas placas de propaganda política desfrutam de cláusulas especiais.