Um indivíduo vai ao médico e reclama estar sentindo algumas dores localizadas. O médico examina o paciente e faz um diagnóstico incorreto. Ele receita alguns remédios para o paciente e os sintomas desaparecem. Com o tempo, o indivíduo passa a crer que está curado. Ele pensa que está com mais saúde. Ele pensa que melhorou em definitivo. Mas está ocorrendo justamente o oposto: ele ficou ainda mais doente; mas como os sintomas de sua doença desapareceram, ele supõe que foi curado. Ele não fará mais nada para lidar com sua doença. Mas a doença pode ser fatal.
Conheço um sujeito que durante muito tempo padeceu de uma doença que apresentava sintomas idênticos à doença de Parkinson. Durante 25 anos, seu médico diagnosticou sua condição como sendo mal de Parkinson. Ele foi colocado sob um tratamento voltado para combater o mal de Parkinson. Recentemente, descobriu-se que na realidade ele nunca teve mal de Parkinson. Ele tem uma doença congênita que cria exatamente os mesmos sintomas do mal de Parkinson. Estes sintomas podem ser efetivamente tratados por meio de uma operação. Ele fará esta operação mês que vem. Com certeza, a maioria dos sintomas desaparecerá.
Os tratamentos que ele recentemente passou a fazer, e que foram concebidos para lidar com doenças congênitas, melhoraram acentuadamente seu estado. Em suma, o diagnóstico feito 25 anos atrás levou a uma série de despesas com remédios totalmente desnecessários, o que, por sua vez, levou à falsa conclusão de que os remédios estavam combatendo efetivamente a doença. Mas não estavam. Eles estavam apenas atacando sintomas criados pelo mal de Parkinson. Ele passou 25 anos de sua vida sem ter saúde e incorreu em gastos completamente desnecessários lidando com uma doença que nunca teve.
Por que estou contando esse caso real? Porque ele é uma metáfora perfeita para ilustrar exatamente o que as políticas de Banco Central fazem com uma economia. Um Banco Central lida com sintomas. Pior ainda: lida com sintomas causados justamente por suas políticas anteriores. Explico.
Os dígitos são de graça; a riqueza, não
“Não é possível obter alguma coisa em troca de nada.” Todos os economistas dizem acreditar nesta máxima. Porém, a verdade é que, com a exceção dos economistas seguidores da Escola Austríaca, nenhum economista realmente crê nessa máxima.
Todos os economistas, exceto os seguidores da Escola Austríaca, dizem que uma política monetária mais frouxa, com redução dos juros, gera crescimento econômico sólido. Uma combinação de expansão monetária com gastos do governo é um remédio capaz de reverter recessões e gerar prosperidade.
Somente os austríacos possuem uma metodologia consistente, a qual diz que é logicamente impossível o governo ser a fonte do crescimento econômico. O governo nada mais é do que uma agência que redistribui riqueza à força. O mesmo pode ser dito a respeito de um Banco Central. O Banco Central é uma agência estatal que utiliza seu monopólio da moeda para expandir a base monetária da economia. Tal expansão monetária é utilizada pelo governo para financiar a própria burocracia e demais programas governamentais, como obras realizadas por empresas e empreiteiras com fortes ligações políticas. Esta criação de dinheiro transfere riqueza do setor privado para o setor público. Ela permite que pessoas que nada produziram se apossem de bens e serviços. Ela faz com que pessoas obtenham recursos escassos sem dar nada em troca. Isso não é criação de riqueza, dizem os austríacos; isso é redistribuição de riqueza.
Mas a criação de dinheiro não gera apenas redistribuição de riqueza. Ela gera também destruição de riqueza. A destruição de riqueza ocorre porque o Banco Central, ao criar dinheiro na forma de dígitos eletrônicos e manipular a taxa de juros, gera sinais econômicos distorcidos. Ele sinaliza que há empreendimentos em determinadas áreas que repentinamente se tornaram lucrativos. Isso induz empreendedores e consumidores ao erro. Estes falsos sinais criados pela criação de dígitos geram decisões errôneas e infundadas. E decisões sensatas e sólidas são a alma da teoria empreendedorial. Sendo assim, a expansão monetária feita pelo Banco Central aumenta a quantidade de erros no sistema econômico, e esses erros vão se acumulando ao longo do tempo. Capital e recursos escassos são direcionados para setores cuja demanda é apenas temporária, pois foi artificialmente estimulada. Isso inevitavelmente leva a uma recessão, que é o processo em que tais erros são depurados e expurgados.
Somente os austríacos são consistentes ao afirmar que você não pode obter algo em troca de nada. O “nada” a que os economistas austríacos se referem são os dígitos eletrônicos criados pelo Banco Central, também chamados de dinheiro. Estes dígitos eletrônicos são produzidos pelo Banco Central a um custo marginal zero. Dizer que a simples criação de dígitos gera crescimento econômico, prosperidade e bem-estar é uma afirmação que ainda tem de ser comprovada pela teoria e pela prática. O que já foi explicado pela teoria e comprovado pela prática é que a criação de tais dígitos gera consequências negativas. Eles criam sinais falsos que são utilizados tanto por consumidores quanto por produtores para planejar seu futuro. Esses sinais falsos criam prejuízos, e os prejuízos reduzem a riqueza econômica. Prejuízos produzem contração econômica, e não crescimento econômico. No final, sobram apenas preços mais altos.
Keynesianos exigem que o Banco Central esteja aumentando continuamente a oferta monetária. Economistas da Escola de Chicago também exigem o mesmo, embora queiram que tal aumento seja menor e mais previsível. Os seguidores das expectativas racionais querem que a moeda continue sendo fiduciária e de curso forçado porque são avessos a mudanças na política econômica. Os economistas supply-siders (do lado da oferta) também defendem este arranjo porque são defensores de déficits orçamentários. Eles também acreditam que a expansão monetária é boa para estimular o crescimento econômico.
Se dissermos que, em termos econômicos, dígitos eletrônicos não são nada, e se também dissermos que crescimento econômico é alguma coisa, então temos de concluir, por uma simples questão de lógica, que ou os dígitos eletrônicos não são a causa do crescimento econômico, ou, se eles são a causa, então a velha máxima está errada. Seria sim possível conseguir alguma coisa em troca de nada.
Quando se diz que dinheiro eletrônico não é nada, no sentido de que o custo marginal de se produzir dígitos adicionais é zero, então há apenas uma conclusão inevitável, supondo-se ser verdade que não podemos conseguir algo em troca de nada: o “algo” que o dinheiro digital parece gerar — crescimento econômico — é uma ilusão.
Se o dinheiro pode ser criado ‘do nada’, como gostam de dizer os críticos do sistema bancário de reservas fracionárias, então o crescimento econômico que ocorre em decorrência desta criação de dinheiro tem de ser uma ilusão. Tal crescimento econômico tem inevitavelmente de estar consumido recursos escassos de alguma forma não perceptível, de modo que, em algum momento futuro, haverá perdas e prejuízos econômicos. E preços maiores.
Em outras palavras, o crescimento econômico mensurado por indicadores estatísticos não foi realmente um crescimento econômico. Tudo o que ocorreu foi uma transferência de riqueza de alguns setores da economia — setores estes que não estão devidamente ponderados pelo pessoal que constrói os índices estatísticos utilizados para identificar crescimento econômico — para outros setores, que possuem um peso maior no índice. Os indicadores estatísticos, portanto, estão ignorando os custos associados a essa transferência de riqueza, a qual ocorre por causa das informações falsas geradas pela criação de dígitos eletrônicos.
O diagnóstico errado
Comecei este artigo citando o caso de um sujeito que sofreu em decorrência de um diagnóstico errado. E disse que sua situação era uma metáfora perfeita para ilustrar exatamente o que as políticas de Banco Central fazem com uma economia. Um Banco Central lida com sintomas. Pior ainda: lida com sintomas causados justamente por suas políticas anteriores.
Políticas anteriores de expansão monetária geram um crescimento econômico artificial que inevitavelmente termina em recessão. Para combater esta recessão, o Banco Central volta a colocar em prática exatamente as mesmas políticas que levaram à recessão. Diagnóstico errado. Sendo assim, ano após ano, geração após geração, os bancos centrais expandem a oferta monetária. E eles fazem isso sempre com a justificativa de estarem lidando com recessões. E são estas mesmas políticas que geram os ciclos econômicos. Portanto, os remédios utilizados pelo Banco Central intensificam as doenças futuras. Dígitos gratuitos produzem informações ruins.
Estas informações ruins produzem a ilusão de crescimento econômico. Tudo o que houve foi empreendedores investindo dinheiro onde não deveriam investir, em projetos que não deveriam ter sido lançados. E preços mais altos como consequência.
Conclusão
Não é possível conseguir alguma coisa em troca de nada. Em economia, o que se consegue em troca de nada é apenas informação ruim. E estas informações ruins geram prejuízos. Mas todos os economistas, com a exceção dos seguidores da Escola Austríaca, insistem em dizer que uma expansão monetária feita pelo Banco Central é a base de sustentação para o crescimento econômico. Ao afirmarem isso, jogam no lixo a máxima de que não é possível conseguir algo em troca de nada, máxima essa que eles próprios afirmam ser verdadeira. Eles estão tão iludidos que nem mesmo percebem a inconsistência de sua posição.