O IMB apresenta duas entrevistas concedidas por dois titãs dos investimentos, Peter Schiff e Jim Rogers, “austríacos” que previram a atual crise e suas exatas causas. Além de dicas de investimento, ambos dão uma aula sobre o funcionamento da economia. (O link do original está no título da entrevista).
Entrevista de Peter Schiff ao The Gold Report (16/04/2009)
Os investidores podem preservar sua riqueza e lucrar com o que está acontecendo
Em meio a uma “depressão inflacionária” nos EUA, Peter Schiff – presidente e estrategista-chefe da Euro Pacific Capital – enxerga oportunidades em todo esse turbilhão. Prevendo uma maciça redistribuição de riqueza, ele aconselha investidores a agir rapidamente e “livrar-se de ativos denominados em dólares e refugiar-se em metais preciosos, moedas e ativos estrangeiros, longe dos EUA”. Nessa entrevista exclusiva ao The Gold Report, o corretor amplamente citado pela mídia e especialista em dinheiro, teoria econômica e investimento internacional discute o que gerou essa “falsa economia” e diz como os investidores podem lucrar com essa crise.
The Gold Report: Peter, você foi uma das poucas pessoas a prever a crise financeira que os EUA e o mundo agora enfrentam. Em uma recente conferência, você classificou as condições que estamos enfrentando como sendo “uma depressão inflacionária”. Poderia descrever o que isso significa?
Peter Schiff: Bem, basicamente, essa é a condição que o governo está criando aqui nos EUA. Nossa depressão inflacionária será um prolongado período de declínio econômico acompanhado de um rápido aumento nos preços dos bens de consumo. Portanto, será algo como a estagflação da década de 1970, só que com uma estagnação muito maior, ou até mesmo uma contração absoluta da economia, ao mesmo tempo em que o custo de vida irá aumentar ainda mais rapidamente do que aumentou naquela época.
TGR: Vendo algumas das coisas que Obama está tentando implementar, existe alguma coisa que o governo pode fazer agora para evitar a recessão?
PS: Não há nada que o governo possa fazer para evitar uma dor substancial no curto prazo. O país está em sérios problemas por causa de todo o desvario da política monetária, toda a temerária gastança governamental e toda a criação de dinheiro que levou a essa falsa economia.
Passamos muito tempo gastando, esbanjando e desperdiçando riqueza nesse país. Pegamos muito dinheiro emprestado e estupidamente utilizamo-lo para o consumo. Permitimos que nossa base industrial se desintegrasse, o que tornará muito difícil reconstruir uma economia viável. Mas jamais iremos reconstruir uma se o governo ficar no caminho. O que o governo está tentando fazer agora com suas políticas é reinflar a bolha; ele está tentando fazer com que os americanos tomem mais empréstimos e saiam gastando ainda mais dinheiro, fragorosamente ignorando o fato de que estamos nessa crise por termos feito exatamente isso: gastar dinheiro que sequer deveríamos ter pegado emprestado. E o governo está tentando inchar a si próprio. O governo está tentando aumentar seu tamanho exatamente em um momento em que precisamos que ele se contraia, pois estamos muito quebrados para bancar um governo inchado.
Já era ruim no passado – estava nos deixando menos competitivos – mas pelo menos ainda podíamos sustentá-lo. Agora, claramente não podemos. Portanto, precisamos de menos governo. Precisamos de uma política monetária sólida. Precisamos de juros maiores. Precisamos permitir que empresas quebrem, que possam falir ou ser vendidas. Precisamos permitir execuções de hipotecas e arresto de imóveis. Precisamos permitir que as pessoas percam determinados empregos. Não podemos tentar interferir nisso. Quanto mais interferirmos, maior será essa depressão; e se continuarmos imprimindo dinheiro, estaremos recheando toda essa mistura com uma inflação maciça.
TGR: Em suas falas, você sempre diz que imprimir dinheiro irá causar uma enorme inflação e o posterior colapso do dólar. Poderia elaborar melhor?
PS: As pessoas pensam que você simplesmente cria dinheiro e utiliza-o para consumo. Mas quando você cria dinheiro, você não está criando poder de compra. Assim, o que irá acontecer é que você terá de pagar mais pelas coisas; você criou inflação. A maneira de você aumentar o poder de compra é através do aumento da produção; e simplesmente imprimir dinheiro não irá fazer com que os fatores de produção apareçam, não irá fazer com que os bens de consumo apareçam.
Para haver um aumento real do consumo, você precisa ter uma maior produção, o que significa que você precisa ter mais poupança e mais investimento. E o governo americano, com suas políticas, está desestimulando isso – e não promovendo, como ele quer dar a entender.
TGR: Os pacotes de socorro financeiro do governo irão ajudar a aumentar a produção e o poder de compra?
PS: Não, não. Os socorros são destrutivos para a economia porque o governo está socorrendo indústrias e empresas que deveriam estar quebrando. Ele está mantendo ativas empresas não-produtivas, o que, no final, acaba solapando a competitividade e a produtividade da nossa economia.
O processo de falência em uma economia pode ser comparado a um corpo humano que tem uma infecção. O corpo luta contra ela. E é isso que o mercado está fazendo ao tentar eliminar da economia as empresas não-competitivas. As falências são uma força positiva na economia. Talvez não seja positiva para a entidade que está quebrando, mas é positiva para a economia como um todo, pois está removendo do corpo da economia empresas inviáveis que estão desperdiçando nossos recursos.
Precisamos que empresas inviáveis quebrem para que empresas mais prósperas possam ter êxito. Ao manter vivas certas empresas, o governo está impedindo que outras possam surgir, pois essas empresas socorridas estão consumindo recursos, e vivemos em um mundo de recursos escassos. As empresas que surgissem seriam mais produtivas.
TGR: Então se o governo se afastasse e deixasse o livre mercado operar, quanto tempo levaria para que o sistema se recuperasse? O governo não pode ajudar?
PS: Não vamos nos recuperar de maneira alguma se o governo continuar fazendo o que está fazendo. Nós nos recuperaríamos muito mais cedo se eles deixassem o livre mercado operar, mas não seria algo instantâneo. Temos de desmontar essa economia falsa na qual vivemos para então podermos reconstruir uma economia viável. Isso fará com que tenhamos de passar por uma dor transitória. Temos de superar e corrigir todos os estragos decorrentes das frouxas políticas fiscal e monetária do governo. Tivemos uma economia que era apenas uma bolha; uma economia que se baseava em americanos gastando dinheiro que eles não tinham e comprando produtos que eles não podiam bancar ou que eles não haviam produzido. Tivemos uma economia que se baseava no endividamento voltado para o consumo e em esquemas de engenharia financeira. E os lucros de nossas empresas vinham da contabilidade, não da produção. Toda a coisa era falsa; a prosperidade era falsa. Só voltaremos a ter viabilidade e prosperidade econômica quando atacarmos esses problemas.
TGR: Esse é um fenômeno americano ou ele é mundial?
PS: Bem, ele existe em um grau menor em outros países. E certamente os outros países foram afetados porque eram eles que estavam produzindo os bens que consumimos e eram eles que estavam nos emprestando o dinheiro para pagar por isso. E não podemos pagá-los de volta, o que significa que eles vão perder o dinheiro que nos emprestaram. E então suas economias irão sofrer como consequência de toda a riqueza que foi desperdiçada e de todos os recursos que foram gastos na produção de bens para consumidores americanos, pois não podemos mais pagar por eles.
TGR: O governo está imprimindo dinheiro. Qual será o impacto de todo esse dinheiro entrando na economia?
PS: Os preços serão empurrados para cima. Eventualmente, os preços dos imóveis voltarão a subir, assim como os preços das ações; mas os americanos não irão enriquecer porque o custo de vida irá aumentar muito mais rapidamente. O preço dos alimentos e o preço da energia irão subir muito mais rápido do que o preço das ações e dos imóveis.
TGR: Você vê um colapso iminente do dólar?
PS: Sim, eu realmente vejo um colapso do dólar. O dólar já começou a perder valor, mas creio que irá perder muito mais.
TGR: O que os investidores deveriam considerar como sendo um porto seguro para o dinheiro que têm agora?
PS: Bom, eles deveriam considerar os portos tradicionalmente seguros, como o ouro e a prata; eles também deveriam considerar outras commodities e alguns investimentos fora dos EUA. Há muitas oportunidades ao redor do mundo. Há muitas ações que estão extremamente baratas, em minha opinião, particularmente nos mercados asiáticos e na área de recursos naturais.
Há muitas ações sendo vendidas a preços que eu nunca vi; há muito pessimismo nos mercados globais atualmente, e tem ações a preço de liquidação. O mundo reagiu exageradamente aos nossos problemas e ao modo como os nossos problemas afetaram a economia deles. E nesse ambiente de desalavancagem e liquidação de ativos, investidores prudentes que têm dinheiro podem achar enormes barganhas ao redor do mundo. Eles podem manter sua riqueza e ainda lucrar com o que está acontecendo.
TGR: Você poderia compartilhar com a gente alguns setores que as pessoas deveriam levar em consideração?
PS: No geral, os setores produtivos da economia. Esses são aqueles setores que têm empresas que estão fabricando produtos e que possuem um bom balanço patrimonial, empresas que operam com recursos que tenham enormes reservas – sejam reservas minerais ou reservas energéticas – ou empresas que operam com várias formas de agricultura. Existem grandes oportunidades aí. As ações estão muito baratas, com preços claramente abaixo do potencial de ganho dessas empresas. E você tem várias empresas oferecendo dividend yields [relação entre os valores pagos em dividendos por ação de uma empresa e o preço dessa mesma ação] de mais de 10% – e esses são dividendos reais, extraídos dos lucros. Mas, como investidor, você tem de fazer a lição de casa e descobrir essas empresas. Os juros sobre os títulos corporativos estão tão baixos que é possível obter rendimentos incríveis com ações, e essa é uma grande oportunidade, principalmente se esses rendimentos forem pagos em moedas que provavelmente se valorizarão perante o dólar.
TGR: Quais países e moedas você acha que sairão primeiro da recessão?
PS: Basicamente, muitas das moedas que atualmente estão atreladas ao dólar ficarão mais fortes; muitas moedas asiáticas. Já estamos vendo várias moedas de países com amplos recursos (energéticos e naturais) se valorizando. O dólar da Austrália e o dólar da Nova Zelândia se fortaleceram substancialmente nas últimas semanas. Creio que veremos também um fortalecimento do euro, já que o euro parece ser uma boa alternativa ao dólar em termos de moeda de reserva. E a política monetária dos europeus não é, nem de longe, tão ruim quanto a nossa, o que já é um bom estímulo. Essa corrida ao euro provavelmente irá beneficiar outras moedas da zona do euro, como as moedas escandinavas e o franco suíço.
TGR: A China, a Rússia e algumas outras nações da OPEC estão pedindo que o FMI crie uma moeda internacional. Creio que estão chamando-a de direitos especiais de saque.
PS: Sim, a China está falando sobre outras moedas de reserva que não o dólar, e eles estão defendendo a implementação dos direitos especiais de saque emitidos pelo FMI. Não creio que seja uma boa ideia. Em última instância, a China de fato precisa convencer o mundo a adotar um outro padrão. A China de fato precisa encontrar um outro padrão de reserva para si própria e ela pode fazer isso. Os chineses deveriam começar a se livrar do dólar já. Eles podem escolher a moeda que quiserem como sua moeda de reserva. Quando eles começarem a se livrar do dólar, haverá um forte impacto no valor do dólar.
TGR: Veremos um retorno ao padrão-ouro?
PS: As moedas precisam ter valor e o papel não traz valor. Jamais, em toda a história, um papel-moeda de curso forçado sobreviveu por muito tempo. Todos dizem que o atual modelo é bom e durável, porém vale lembrar que só abandonamos completamente o padrão-ouro apenas em 1971. Ou seja, o atual modelo de papel-moeda puro é muito recente. Ainda é cedo para dizer, mas os prospectos certamente não são bons.
TGR: Durante seu tempo de vida, você acha que verá um retorno ao padrão-ouro?
PS: Sim, verei. Tem de acontecer.
TGR: Qual conselho de investimento você dá para os leitores?
PS: Investidores precisam agir rápido e assumir o controle de seu destino financeiro. Estamos hoje enfrentando o maior esquema de redistribuição financeira da história, por meio da inflação.
Os mais duramente atingidos serão os poupadores e investidores que ficarem no dólar. Estes verão sua poupança arrasada pela inflação. Dólares serão roubados dos poupadores para financiar essas imensas políticas de gastos governamentais – gastos com saúde, educação e pacotes de socorro.
Eu me livraria dos ativos em dólares e investiria em metais preciosos, em outras moedas e em ações fora dos EUA, e me concentraria em empresas que são proprietárias de coisas reais para as quais há demanda de fato.