Thursday, November 21, 2024
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As duas ideologias dominantes na Europa

euroDesde o início da União Europeia, tem havido um conflito entre os defensores de dois ideais diferentes.  Qual postura o continente europeu deve adotar: a visão liberal-clássica ou visão socialista?  A introdução do euro teve um papel decisivo sobre as estratégias dessas duas visões.[1] Para se entender melhor os problemas causados pela adoção de uma moeda única, bem como a história por trás de sua adoção, é importante estar familiarizado com essas duas visões divergentes e essenciais, assim como as subsequentes tensões que vieram à tona em decorrência de uma moeda única.

A visão liberal-clássica

Os pais fundadores da União Europeia, Maurice Schuman (França [nascido em Luxemburgo]), Konrad Adenauer(Alemanha) e Alcide de Gasperi (Itália), todos católicos que falavam alemão, eram adeptos da visão liberal-clássica para a Europa.[2] Eles também eram democratas-cristãos.  A visão liberal-clássica considera a liberdade individual como sendo o mais importante valor cultural dos europeus e do cristianismo.  De acordo com essa visão, a função dos estados soberanos europeus é proteger os direitos de propriedade e a economia de livre mercado em uma Europa de fronteiras abertas, permitindo desta forma o livre comércio de bens, serviços e ideias.

O Tratado de Roma, assinado em 1957, foi a principal realização para a criação de uma Europa baseada no liberalismo clássico.  O tratado estabeleceu quatro liberdades básicas: livre circulação de bens, livre oferta de serviços, livre movimentação de capital financeiro e livre migração.  O tratado também restaurou direitos que haviam sido essenciais para a Europa durante a vigência do período liberal-clássico no século XIX, mas que haviam sido abandonados durante a era do nacionalismo e do socialismo.  O tratado representou a rejeição da era do socialismo, período esse que havia gerado conflitos entre as nações européias, culminando em duas guerras mundiais.

A visão liberal-clássica visa à restauração das liberdades do século XIX.  A livre concorrência, sem barreiras à entrada nos mercados, deveria prevalecer em um mercado comum europeu.  De acordo com essa visão, ninguém poderia proibir um cabeleireiro alemão de cortar cabelos na Espanha, e ninguém poderia tributar um inglês que quisesse transferir dinheiro de um banco alemão para um banco francês, ou que quisesse investir no mercado de ações da Itália.  Ninguém poderia impedir, por meio de regulamentações, que uma cervejeira francesa vendesse suas cervejas na Alemanha.  Nenhum governo poderia dar subsídios, algo que distorce e corrompe o sistema de livre concorrência.  Ninguém poderia impedir que um dinamarquês fugisse de seu estado assistencialista e de sua alta carga tributária e migrasse para um estado com uma carga tributária mais baixa, como a Irlanda.

Para atingir esse ideal de cooperação pacífica e prosperidade comercial, o único pré-requisito necessário seria a liberdade.  De acordo com essa visão, não haveria nenhuma necessidade de se criar um superestado europeu.  Com efeito, a visão liberal-clássica é completamente cética no que concerne a um estado central europeu; tal criação é considerada prejudicial e perniciosa para as liberdades individuais.  Filosoficamente falando, muitos defensores dessa visão são inspirados pelo catolicismo, e as fronteiras da comunidade europeia são definidas pelo cristianismo.

De acordo com a doutrina social católica, o princípio da subsidiariedade deveria prevalecer: os problemas deveriam ser resolvidos no nível mais baixo e menos concentrado possível dos arranjos.  A única instituição centralizada europeia aceitável seria uma Corte de Justiça Europeia, com suas atividades sendo restritas à resolução de conflitos entre os estados-membros e à garantia das quatro liberdades básicas.

Do ponto de vista liberal-clássico, deveria haver vários sistemas políticos concorrentes, como ocorreu na Europa durante séculos.  Desde a Idade Média até o século XIX, existiram sistemas políticos muito diferentes, tais como as cidades independentes de Flandres (região no noroeste da Europa, que inclui partes da Bélgica, França e Holanda), da Alemanha e do norte da Itália.  Havia reinados, como os da Bavária e da Saxônia, e havia repúblicas, como a de Veneza.  A diversidade política era demonstrada de modo mais explícito na fortemente descentralizada Alemanha.  Sob essa cultura de diversidade e pluralismo, a ciência e a indústria se desenvolveram e prosperaram.[3]

A concorrência em todos os níveis é essencial para a visão liberal-clássica.  Ela gera uma congruência, uma vez que a qualidade dos produtos, os preços dos fatores de produção e, principalmente, os salários tendem a convergir.  O capital vai para os locais onde os salários são menores, o que provoca sua elevação; os trabalhadores, por outro lado, vão para onde os salários são mais altos, o que faz com que essa maior oferta de mão-de-obra os reduza.  Os mercados oferecem soluções descentralizadas para os problemas ambientais, baseando-se na propriedade privada.  A concorrência política assegura o mais importante valor europeu: a liberdade.

A concorrência tributária promove alíquotas de impostos mais baixas, bem como a responsabilidade fiscal.  As pessoas “votam com seus pés”, saindo dos países com carga tributária abusiva, como fazem as empresas.  Nações soberanas concorrendo entre si com diferentes cargas tributárias são vistas como a melhor proteção contra a tirania.  A concorrência também se dá na questão das moedas.  Diferentes autoridades monetárias competem para oferecer a moeda de maior qualidade.  As autoridades que oferecem moedas mais estáveis exercem pressão sobre as autoridades mais displicentes, e estas são obrigadas a se adequar e seguir o exemplo daquelas.

A visão socialista

Em direta oposição à visão liberal-clássica tem-se a visão socialista ou imperial da Europa, defendida por políticos como Jacques Delors e François Mitterrand.  Uma coalizão de interesses estatistas entre grupos nacionalistas, socialistas e conservadores faz o que pode para promover e avançar sua agenda.  Tal coalizão quer ver a União Europeia como um império ou uma fortaleza: protecionista para quem está de fora e intervencionista para quem está dentro.  Esses estatistas sonham com um estado centralizado e controlado por tecnocratas eficientes — atributo este que todos os tecnocratas estatistas imaginam ter.

Dentro desse ideal, o centro do Império deveria governar toda a periferia.  Haveria uma legislação comum e centralizada.  Os defensores da visão socialista para a Europa querem erigir um megaestado europeu, reproduzindo as nações-estado em um nível continental.  Eles querem um estado assistencialista europeu que garanta a redistribuição de riqueza, a regulamentação econômica e a harmonização das legislações dentro da Europa.  A harmonização dos impostos e as regulamentações sociais seriam executadas pelo mais alto escalão da burocracia.  Se o imposto sobre valor agregado estiver variando entre 15 e 25% dentro União Europeia, os socialistas iriam harmonizá-lo em 25% para todos os países.  Tal harmonização das regulamentações sociais é do interesse dos mais protegidos, mais ricos e mais produtivos trabalhadores, que podem “arcar” com os custos dessas regulamentações — ao passo que seus concorrentes não podem.  Por exemplo, se as regulamentações sociais alemãs fossem aplicadas aos poloneses, estes teriam grandes problemas para concorrer com aqueles.

A intenção desse ideal socialista é conceder cada vez mais poderes para o estado central — isto é, para Bruxelas.  A visão socialista para a Europa é a ideal para a classe política, para os burocratas, para os grupos de interesse, para os privilegiados e para os setores subsidiados que querem criar um poderoso estado central visando ao seu próprio enriquecimento.  Partidários dessa visão apresentam um megaestado europeu como uma necessidade, e consideram sua total implementação apenas uma questão de tempo.

Ao longo desse caminho socialista, o estado central europeu iria se tornar um dia tão poderoso, que os estados soberanos passariam a lhe prestar total subserviência.  (Já podemos ver os primeiros indicadores de tal subserviência no caso da Grécia.  A Grécia se comporta hoje como um protetorado de Bruxelas, que diz ao governo grego como ele deve lidar com seu déficit orçamentário.)

A visão socialista não fornece nenhuma limitação geográfica explícita para o estado europeu — ao contrário da visão liberal-clássica inspirada no catolicismo.  A concorrência política é vista como um obstáculo para o estado central, o qual, no ideário socialista, deve sair completamente de qualquer controle por parte do público.  Nesse sentido, o estado central na visão socialista se torna cada vez menos democrático à medida que o poder vai sendo deslocado para burocratas e tecnocratas. (Um bom exemplo disso é a Comissão Europeia, o corpo executivo da União Europeia.  Os membros da comissão não são eleitos, mas sim designados pelos governos dos estados-membros.)

Historicamente, os precedentes para esse velho plano socialista de criar um estado central controlador na Europa foram estabelecidos por Carlos Magno, Napoleão, Stalin e Hitler.  A diferença, entretanto, é que dessa vez nenhum meio militar seria necessário.  Seria a mera coerção do poder estatal a mola propulsora para a criação de um poderoso estado central europeu.

De um ponto de vista tático, situações específicas de crise seriam utilizadas pelos partidários da visão socialista para criar novas instituições (tais como o Banco Central Europeu (BCE), ou, possivelmente no futuro, um Ministério Europeu das Finanças), bem como para ampliar os poderes das atuais instituições, como a Comissão Europeia ou o próprio BCE. [4]

A visão liberal-clássica e a visão socialista para a Europa são irreconciliáveis.  Com efeito, o aumento no poder de um estado central — como proposto pela visão socialista — implica uma redução das quatro liberdade básicas, e certamente liberdades civis cada vez menores.

A história de uma batalha entre duas visões

Essas duas visões têm travado batalhas entre si desde os anos 1950.  No início, o projeto das Comunidades Europeias era mais fiel à visão liberal-clássica[5].  A Comunidade Europeia era composta por estados soberanos e assegurava as quatro liberdades básicas.  Do ponto de vista do liberalismo clássico, um dos principais defeitos de nascença do projeto eram os subsídios e as intervenções da política agrícola.  Da mesma forma, desde seu nascimento, o único poder legislativo pertencia à Comissão Europeia.  Assim, uma vez que a Comissão fizesse uma proposta legislativa, o Conselho da União Europeia poderia sozinho, ou em conjunto com o Parlamento Europeu, aprovar a proposta.[6]

Esse arranjo já continha em si as sementes da centralização.  Consequentemente, o arranjo institucional, desde seu início, havia sido projetado para acomodar a centralização e o controle sobre as opiniões minoritárias, uma vez que a unanimidade não era necessária para todas as decisões, e as áreas em que a regra da unanimidade se fazia necessária foram sendo reduzidas ao longo dos anos.[7]

O modelo liberal-clássico é defendido tradicionalmente pelos democratas-cristãos e por países como Holanda, Alemanha e Reino Unido.  Porém, os social-democratas e socialistas, normalmente liderados pelo governo francês, defendem a versão imperialista da Europa.  Com efeito, em decorrência de sua rápida queda em 1940, dos anos da ocupação nazista, de seus fracassos na Indochina, e da perda de suas colônias africanas, a classe dominante francesa utilizou a Comunidade Europeia para readquirir sua influência e seu orgulho, e para se recuperar da perda de seu império.[8]

Com o passar dos anos, houve uma lenta porém contínua tendência rumo ao ideal socialista — com orçamentos cada vez maiores para a União Europeia e uma nova política regional que efetivamente redistribui riquezas por toda a Europa.[9]  Inúmeras regulamentações e harmonizações também estão empurrando o arranjo para essa direção.

A visão liberal-clássica sobre estados soberanos e independentes de fato parecia ter readquirido um novo vigor após o colapso da União Soviética e a reunificação da Alemanha.  Primeiro porque a Alemanha, tendo tradicionalmente sempre defendido essa visão, se tornou mais forte após a reunificação.  Segundo porque os novos países emergindo das cinzas do comunismo, tais como a Tchecoslováquia (sob a liderança do misesiano Václav Klaus), a Polônia, a Hungria etc., também apoiavam a visão liberal-clássica para a Europa.  Esses novos países queriam usufruir sua nova e recém-conquistada liberdade.  Eles já estavam fartos de socialismo, impérios e centralizações.

A influência do governo francês estava agora reduzida.[10] O campo socialista viu sua derrota se aproximando.  Uma rápida ampliação da União Europeia, com a incorporação dos novos estados do Leste Europeu e a consequente ampliação do mercado comum, tinha de ser impedida.  Um passo rumo à criação de um estado centralizador tinha de ser rapidamente feito.  A moeda única seria o veiculo que permitiria a realização desse objetivo.[11]

De acordo com os jornais alemães, o governo francês temia que a Alemanha, após sua reunificação, criasse “uma área de livre comércio dominada pelo marco alemão, estendendo-se de Brest [litoral noroeste da França] até Brest-Litowsk [no sul da Bielorrúsia]”.[12] Os socialistas europeus (franceses) precisavam urgentemente de adquirir poder sobre a unidade monetária.

Como argumentou Charles Gave[13] a respeito dos eventos ocorridos após a queda do Muro de Berlim:

Para os proponentes do “Império Romano” [a visão socialista], o Estado Europeu tinha de ser organizado imediatamente, não importasse os riscos, e se tornar algo inevitável.  Caso contrário, os proponentes de uma “Europa Cristã” [a visão liberal-clássica] venceriam a batalha por ausência de rivalidade, e a história provavelmente jamais reverteria seu curso.  O colapso da União Soviética foi a crise que deu a oportunidade, bem como a força-motriz, para que o Império Romano levasse a cabo um programa ostensivamente ambicioso.  Com a balança pendendo para o lado da Europa Cristã, o Império Romano precisava urgentemente desequilibrá-la para o seu lado; e a criação do euro, mais do que qualquer outra coisa, veio para simbolizar a investida do campo Romano rumo a uma superestrutura centralizada.

O argumento oficial utilizado pelos defensores de uma moeda única e de curso forçado era o de que o euro iria reduzir os custos de transação — facilitando o comércio, o turismo e o crescimento econômico na Europa.  Mais implicitamente, entretanto, a moeda única era vista como o primeiro e essencial passo rumo à criação de um estado europeu.  Foi presumido que o euro iria criar a pressão necessária para a introdução desse estado.

O real motivo de o governo alemão, tradicionalmente oposto à visão socialista, ter finalmente aceitado o euro tinha a ver com a reunificação alemã.  O acordo era o seguinte: a França construía seu império europeu e, em troca, dava o apoio que faltava para a reunificação das duas Alemanhas.[14] Afirmava-se que, de outra forma, a Alemanha iria se tornar excessivamente poderosa.  Consequentemente, sua arma mais pujante, o marco alemão, tinha de ser abolido — em outras palavras, um desarmamento.

A etapa seguinte nos planos do campo socialista foi redigir o esboço de uma constituição europeia (feito pelo ex-presidente francês Valery Giscard d’Estaing Ginard), estabelecendo um estado central.  Porém, esse projeto constitucional fracassou completamente; ele foi rejeitado nas urnas pelos eleitores da França e da Holanda em 2005.  Como sempre, a Alemanha sequer foi consultada.  Os alemães também não foram perguntados se queriam fazer parte do euro.  Porém, os políticos geralmente não desistem até que todas as suas ideias sejam aceitas.  No caso da constituição europeia, eles simplesmente renomearam a constituição; e não mais foi necessário submetê-la à votação popular em muitos países.

Como consequência, o Tratado de Lisboa foi aprovado em dezembro de 2007.  O Tratado está cheio de palavras como pluralismo, não discriminação, tolerância e solidariedade, todas elas podendo ser interpretadas como clamores para se violar os direitos de propriedade de terceiros, bem como toda e qualquer liberdade de contrato.  No Artigo Três, a União Europeia promete lutar contra a exclusão social e a discriminação, desta forma abrindo as portas para intervencionismos de todos os tipos.  Deus não é mencionado uma única vez no Tratado de Lisboa.

Na realidade, o Tratado de Lisboa acabou sendo uma derrota para o ideal socialista.  Não se trata de uma genuína constituição, mas apenas de um tratado.  Isso deixou os proponentes de um Império Europeu em um beco sem saída, e eles foram obrigados a se reagrupar e centrar seus esforços na única ferramenta que restou — o euro.  Mas como, exatamente, o euro provoca a centralização de Europa?

O euro gera os tipos de problemas que podem ser encarados como um pretexto para que haja uma centralização de poder coordenada por políticos.  Com efeito, a construção e a implantação do euro provocaram uma corrente de crises severas: os estados-membros podem utilizar as impressoras do Banco Central Europeu para financiar suas dívidas; essa característica da União Monetária Europeia invariavelmente gera crises da dívida soberana para os países-membros que se endividam em excesso.  Essa crise, por sua vez, pode ser utilizada para centralizar o poder e as políticas fiscais.  A centralização das políticas fiscais pode então ser utilizada para unificar a tributação e com isso abolir a guerra tributária entre os países.

Com a atual crise da dívida soberana de países como Grécia, Espanha, Portugal e Irlanda, o único meio que restou aos socialistas para fortalecer seu plano de implementar um estado central está em risco.  Portanto, é algo totalmente irrealista dizer que o fim do euro significaria o fim da Europa ou do ideal europeu; o fim do euro seria apenas o fim da versão socialista da Europa.

Naturalmente, é perfeitamente possível ter uma Europa economicamente integrada, com suas quatro liberdades básicas, sem que haja uma moeda única de curso forçado.  O Reino Unido, a Suécia, a Dinamarca e a República Tcheca não utilizam o euro, mas pertencem ao mercado comum e usufruem essas quatro liberdades.  Se a Grécia abandonar o euro e se juntar a esses países, a visão liberal-clássica permaneceria intacta.  Com efeito, uma livre escolha entre várias moedas é algo mais relacionado ao valor europeu de liberdade do que a obrigação de utilizar uma moeda continental de curso forçado criada por um banco central que possui o monopólio de sua produção.

____________________________________________

Esse artigo foi extraído do livro The Tragedy of the Euro. (Ludwig von Mises Institute, 2010).

Notas

[1] Ver Jesús Huerta de Soto, “Por una Europa libre,” in Nuevos Estudios de Economía Política (2005), pp. 214-216. Ver Hans Albin Larsson, “National Policy in Disguise: A Historical Interpretation of the EMU,” in The Price of the Euro, ed. Jonas Ljundberg (New York: Palgrace MacMillan, 2004), pp. 143-70, sobre as duas alternativas para a Europa.

[2] Uma base teórica para esse visão explicitada em Hans Sennholz, How can Europe Survive (New York: D. Van Nostrand Company, 1955).  Sennholz critica os planos para uma cooperação governamental criados por diferentes políticos, e mostra que apenas a liberdade pode eliminar a causa dos conflitos na Europa.

[3]  Roland Vaubel, “The Role of Competition in the Rise of Baroque and Renaissance Music,” Journal of Cultural Economics 25 (2005): pp. 277-97, argumenta que o surgimento da música barroca e renascentista na Alemanha e na Itália resultou da descentralização desses países e da subsequente concorrência entre eles.

[4] Em consonância com essa teoria, o presidente Frances Nicolas Sarkozy tentou introduzir um fundo de resgate europeu durante a crise de 2008 (ver Patrick Hosking, “France Seeks ?300 bn. Rescue Fund for Europe.”Timesonline. Dois de outubro, 2008, http://business.timesonline.co.uk).  A chanceler alemã Angela Merkel, entretanto, resistiu à ideia, e passou a ser conhecida como a “Madame Não”.  A recente crise também foi utilizada para estabelecer a European Financial Stability Facility (Linha de Crédito para a Estabilidade Financeira Europeia), com a qual o BCE ampliou suas operações e, consequentemente, a base monetária.  Outras instituições, como a European Systemic Risk Board (Conselho de Risco Sistêmico Europeu), também foram criadas durante a crise.  Sobre a tendência de os estados expandirem seu poder em situações de emergência, ver Robert Higgs, Crisis and Leviathan: Critical Episodes in the Growth of American Government (Oxford: Oxford University Press, 1987).

[5] As Comunidades Europeias eram formadas pela Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, que criava um mercado comum para carvão e aço; pela Comunidade Econômica Europeia, que promovia a integração econômica; e pela Comunidade Europeia da Energia Atômica, que criava um mercado especial para energia nuclear, fazendo sua distribuição pela Comunidade.

[6] O Conselho da União Europeia, frequentemente chamado de “O Conselho” ou “Conselho dos Ministros”, é formado por um ministro de cada estado-membro e não deve ser confundido com o Conselho Europeu.  O Conselho Europeu é formado pelo presidente do “Conselho dos Ministros”, pelo presidente da Comissão, e por um representante de cada estado-membro.  O Conselho Europeu orienta a União Europeia ao definir sua agenda política.

[7] Esses importantes defeitos de nascença reduzem o crédito dado aos pais fundadores, como Schuman, Adenauer e outros.

[8] Larsson, Hans Albin. 2004. “National Policy in Disguise: A Historical Interpretation of the EMU.”, p. 162.  Como escreve Larsson: “A arena na qual a França buscou ressuscitar sua honra e influência internacional foi a Europa Ocidental.  Como principal país da Comunidade Econômica Europeia, a França recuperou influência e, com isso, recompensou a perda de seu império — e tudo isso dentro de uma área onde a França, tradicionalmente e de diversas maneiras, sempre procurou ter domínio e influência”.

Já em 1950, o premiê francês René Pleven, propôs criar um Exército Europeu como parte da Comunidade de Defesa Europeia (sob a liderança da França).  Ainda que o plano tenha fracassado, ele fornece evidências de que, desde o início, os políticos franceses pressionaram pela centralização e pela visão imperial da Europa.  Uma exceção foi o presidente Charles de Gaulle, que se opunha a um estado europeu supranacional.  Durante a “crise da cadeira vazia“, em junho de 1965, a França abandonou seu assento no Conselho dos Ministros por seis meses em protesto contra um ataque à sua soberania.  A Comissão havia pressionado por uma centralização do poder.  Entretanto, de Gaulle também estava tentando melhorar a posição e liderança da França nas negociações acerca da Política Comum Agrícola.  A Comissão havia proposto a criação de uma decisão por maioria de votos nesse quesito.  Os agricultores franceses eram os principais beneficiários dos subsídios, ao passo que a Alemanha era a principal contribuinte.  A decisão por maioria de votos poderia ter privado os agricultores franceses de seus privilégios.

[9] Roland Vaubel, “The Political Economy of Centralization and the European Community,” Public Choice 81 (1—2 1994): pp. 151—190, explica a tendência rumo à centralização na Europa utilizando argumentos oriundos da Teoria da Escolha Pública.

[10] Larsson, “National Policy in Disguise,” p. 163.

[11] Como escreveu Arjen Klamer a respeito da estratégia de se utilizar a moeda única como veículo para a centralização: “A suposição era a de que, tão logo a unidade monetária fosse uma realidade, seria necessário algum tipo de construção federal — ou ao menos uma união política mais forte — para que a união monetária pudesse funcionar. Assim, a carroça foi colocada na frente dos bois.  Foi tudo um experimento.  Nenhum político ousaria lidar com as consequências do fracasso — ou do que poderia acontecer — caso uma forte união política não fosse realizada.  Tudo já estava arrumado e o show tinha de continuar.” (Arjen Klamer, “Borders Matter: Why the Euro is a Mistake and Why it will Fail,” in The Price of the Euro, ed. Jonas Ljundberg, (New York: Palgrave MacMillan, 2004), p. 33).

Similarmente, Roland Vaubel escreve sobre os efeitos do euro: “A União Monetária Europeia é o ponto de partida para a centralização de várias outras políticas econômicas e, em última instância, para a criação de um estado europeu”. (Roland Vaubel, “A Critical Analysis of EMU and of Sweden Joining It,” in The Price of the Euro, ed. Jonas Ljundberg, (New York: Palgrave MacMillan 2004), p. 94) Ver também James Foreman-Peck, “The UK and the Euro: Politics versus Economics in a Long-Run Perspective,” in The Price of the Euro, ed. Jonas Ljundberg, (New York: Palgrave MacMillan 2004), p. 104.

[12] Frankfurter Allgemeine Zeitung, June 1, 1996.

[13] Charles Gave, “Was the Demise of the USSR a Negative Event?” in Investors-Insight.com, ed. John Mauldin, (5 de maio, 2010), http://investorsinsight.com/.

[14] Até hoje, o governo francês obteve êxito em criar uma influência desproporcional sobre a União Europeia.  A maioria das instituições da UE está localizada na França e na Bélgica.  O francês é um dos idiomas oficiais da UE, ao lado do inglês, mas não o alemão, ainda que a União Europeia tenha muito mais cidadãos que falem alemão do que francês.  Quando se pondera a influência dos estados-membros baseando-se em sua população, a França está sobre-representada e a Alemanha, sub-representada.  Com efeito, a influência proporcional da Alemanha não aumentou absolutamente nada após sua reunificação.  Como escreveu Larsson: “Em suma, a União Europeia e seus arranjos predecessores são basicamente projetos franceses, os quais, não obstante algumas declarações oficiais, em muitos aspectos serviram ao propósito de utilizar todos os meios possíveis para ampliar — ou, no mínimo, manter — a influência política mundial da França, particularmente na Europa.” (“National Policy in Disguise,” p. 165)

Philipp Bagus
Philipp Bagus
Philipp Bagus é professor adjunto da Universidad Rey Juan Carlos, em Madri. É o autor do livro A Tragédia do Euro. Veja seu website.
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