Thursday, November 21, 2024
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A situação militar na Ucrânia

Primeira parte: o caminho para a guerra

Durante anos, de Mali ao Afeganistão, tenho trabalhado pela paz e arrisquei minha vida por ela. Portanto, não se trata de justificar a guerra, mas de compreender o que nos levou a ela. Observo que os “especialistas” que se revezam na televisão analisam a situação, na maioria das vezes, com base em informações duvidosas e hipóteses levantadas como fatos – e, com isso, não conseguimos mais entender o que está acontecendo. É assim que se criam os pânicos.

O problema não é tanto saber quem está certo neste conflito, mas questionar a maneira como nossos líderes tomam suas decisões.

Vamos tentar examinar as raízes do conflito. Começando com aqueles que, nos últimos oito anos, têm falado de “separatistas” ou “independentistas” de Donbass. Isto é falso. Os referendos realizados em maio de 2014 pelas duas repúblicas autoproclamadas de Donetsk e Lugansk não foram referendos de “independência” (независимость), como alguns jornalistas inescrupulosos reivindicaram, mas referendos de “autodeterminação” ou “autonomia” (самостоятельность). O qualificador “pró-russo” sugere que a Rússia foi uma parte que levou ao conflito, o que não foi o caso. O termo “falantes russos” teria sido mais honesto. Além disso, estes referendos foram conduzidos contra o conselho de Vladimir Putin.

Na verdade, estas repúblicas não estavam procurando se separar da Ucrânia, mas ter um status de autonomia, garantindo-lhes o uso da língua russa como língua oficial. Para o primeiro ato legislativo do novo governo, resultante da derrubada do Presidente Yanukovych, foi abolida, em 23 de fevereiro de 2014, a lei Kivalov-Kolesnichenko, de 2012, que tornou o russo uma língua oficial. Um pouco como se os putchistas decidissem que o francês e o italiano não seriam mais idiomas oficiais da Suíça.

Esta decisão causou um alvoroço na população de língua russa. O resultado foi uma repressão feroz contra Odessa, Dnepropetrovsk, Kharkov, Lugansk e Donetsk, que foi realizada a partir de fevereiro de 2014 e levou a uma militarização da situação e a alguns massacres (em Odessa e Marioupol, os mais notáveis). No final do verão de 2014, somente as autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk permaneceram.

Nesta fase, demasiado rígida e absorvida por uma abordagem doutrinária da arte das operações, o Estado-Maior ucraniano subjugou o inimigo sem conseguir prevalecer. O exame do curso dos combates entre 2014 – 2016 em Donbass mostra que o Estado-Maior ucraniano aplicou sistemática e mecanicamente os mesmos esquemas operativos. Entretanto, a guerra travada pelos autonomistas foi muito semelhante ao que observamos no Sahel: operações altamente móveis, conduzidas com meios leves. Com uma abordagem mais flexível e menos doutrinária, os rebeldes puderam explorar a inércia das forças ucranianas para repetidamente “encurralá-las”.

Em 2014, quando eu estava na OTAN, era responsável pela luta contra a proliferação de armas ligeiras, e estávamos tentando detectar as entregas de armas russas aos rebeldes, para ver se Moscou estava envolvida. As informações que então recebíamos vinham quase inteiramente dos serviços de inteligência poloneses e não “batiam” com as informações vindas da OSCE – apesar das acusações bastante grosseiras, não houve entregas de armas e equipamentos militares da Rússia.

Os rebeldes estavam armados graças à deserção de unidades ucranianas de língua russa que passaram para o lado rebelde. Enquanto as falhas ucranianas continuavam, tanques, artilharia e batalhões antiaéreos inchavam as fileiras dos autonomistas. Isto foi o que levou os ucranianos a se comprometerem com os Acordos de Minsk.

Contudo, logo após assinar os Acordos de Minsk 1, o presidente ucraniano Petro Poroshenko lançou uma maciça operação antiterrorista (ATO/Антитерористична операція) contra Donbass. Bis repetita placent: mal-aconselhados pelos oficiais da OTAN, os ucranianos sofreram uma derrota esmagadora em Debaltsevo, o que os forçou a se engajar nos Acordos de Minsk 2.

É essencial lembrar aqui que os Acordos de Minsk 1 (setembro de 2014) e Minsk 2 (fevereiro de 2015) não previram a separação ou independência das Repúblicas, mas sua autonomia no âmbito da Ucrânia. Aqueles que leram os Acordos (são muito, muito poucos os que realmente o fizeram) notarão que está escrito, em todas as cartas, que o status das Repúblicas deveria ser negociado entre Kiev e os representantes das Repúblicas, para uma solução interna à Ucrânia.

É por isso que, desde 2014, a Rússia tem sistematicamente exigido sua implementação enquanto se recusa a fazer parte das negociações, por se tratar de um assunto interno da Ucrânia. Por outro lado, o Ocidente – liderado pela França – sistematicamente tentou substituir os Acordos de Minsk pelo “formato Normandia”, que colocou russos e ucranianos frente a frente. Entretanto, lembremos que nunca houve tropas russas em Donbass antes de 23 – 24 de fevereiro de 2022. Além disso, os observadores da OSCE nunca observaram o menor vestígio de unidades russas operando em Donbass. Por exemplo, o mapa de inteligência dos Estados Unidos, publicado pelo Washington Post em 3 de dezembro de 2021, não mostra tropas russas na região.

Em outubro de 2015, Vasyl Hrytsak, diretor do Serviço de Segurança Ucraniano (SBU), confessou que apenas 56 combatentes russos haviam sido observados em Donbass. Isto era comparável aos suíços que iam lutar na Bósnia nos fins de semana, nos anos 90, ou aos franceses que estão lutando na Ucrânia hoje.

O exército ucraniano estava, então, em um estado deplorável. Em outubro de 2018, após quatro anos de guerra, o procurador-chefe do exército ucraniano, Anatoly Matios, declarou que a Ucrânia havia perdido 2.700 homens em Donbass: 891 por doenças, 318 por acidentes rodoviários, 177 por outros acidentes, 175 por envenenamentos (álcool, drogas), 172 por manuseio descuidado de armas, 101 por violações das normas de segurança, 228 por assassinatos e 615 por suicídios.

De fato, o exército foi minado pela corrupção de seus quadros e não desfrutou mais do apoio da população. De acordo com um relatório do Home Office britânico, em março/abril de 2014, na convocação de reservistas, 70% não apareceram para a primeira sessão, 80% para a segunda, 90% para a terceira e 95% para a quarta. Em outubro/novembro de 2017, 70% dos recrutas não compareceram à campanha de convocação para o “outono de 2017”. Isto não conta com suicídios e deserções (muitas vezes para o lado dos autonomistas), que atingiram até 30% do pessoal na área da ATO. Os jovens ucranianos se recusaram a ir lutar em Donbass e preferiram a emigração, o que também explica, pelo menos parcialmente, o déficit demográfico do país.

O Ministério da Defesa ucraniano recorreu, então, à OTAN para ajudar a tornar suas forças armadas mais “atraentes”. Tendo já trabalhado em projetos similares no âmbito das Nações Unidas, fui solicitado pela OTAN a participar de um programa para restaurar a imagem das forças armadas ucranianas. Mas este é um processo de longo prazo e os ucranianos queriam progredir rapidamente.

Assim, para compensar a falta de soldados, o governo ucraniano recorreu às milícias paramilitares. Elas são essencialmente compostas por mercenários estrangeiros, muitas vezes, militantes de extrema-direita. Em 2020, eles constituíam cerca de 40% das forças ucranianas e contavam com cerca de 102.000 homens, de acordo com a Reuters. Eles eram armados, financiados e treinados pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha, Canadá e França. Havia mais de 19 nacionalidades – inclusive suíça.

Assim, os países ocidentais claramente criaram e apoiaram as milícias ucranianas de extrema-direita. Em outubro de 2021, o Jerusalem Post fez soar o alarme denunciando o projeto Centuria. Estas milícias estavam operando em Donbass desde 2014, com apoio ocidental. Mesmo que se possa argumentar sobre o termo “nazista”, o fato é que estas milícias são violentas, transmitem uma ideologia repugnante e são virulentamente antissemitas. Seu antissemitismo é mais cultural do que político, razão pela qual o termo “nazista” não é realmente o apropriado. Seu ódio aos judeus tem origem na grande fome dos anos 1920 e 30 na Ucrânia, resultante do confisco das colheitas por Stalin para financiar a modernização do Exército Vermelho. Este genocídio – conhecido na Ucrânia como Holodomor – foi perpetrado pela NKVD (a precursora do KGB), cujos escalões superiores de liderança eram compostos principalmente por judeus. É por isso que, hoje, os extremistas ucranianos estão pedindo a Israel que peça desculpas pelos crimes do comunismo, como observa o Jerusalem Post. Isto é muito diferente da “reescrita da história” de Vladimir Putin.

Estas milícias, originárias dos grupos de extrema-direita que motivaram a revolução Euromaidan em 2014, são compostas por indivíduos fanáticos e brutais. A mais conhecida delas é o Regimento Azov, cujo emblema lembra a 2ª Divisão Panzer SS Das Reich, reverenciada na Ucrânia por libertar Kharkov dos soviéticos em 1943, antes de realizar o massacre de Oradour-sur-Glane, de 1944, na França.

Entre as figuras famosas do regimento Azov estava Roman Protassevitch, preso em 2021 pelas autoridades bielorrussas após o caso do voo FR4978 da RyanAir. Em 23 de maio de 2021, o sequestro deliberado de um avião comercial por um MiG-29 –  supostamente com a aprovação de Putin – foi mencionado como motivo para a prisão de Protassevich, embora as informações disponíveis na época não confirmassem de forma alguma este cenário.

Então, foi necessário mostrar que o Presidente Lukashenko era um bandido e Protassevich um “jornalista” que amava a democracia, entretanto, uma investigação bastante reveladora produzida por uma ONG americana em 2020 destacou as atividades militantes de extrema-direita de Protassevitch. O movimento de conspiração ocidental então começou, e a mídia inescrupulosa “dourou a pílula” de sua biografia. Finalmente, em janeiro de 2022, o relatório da ICAO foi publicado e mostrou que, apesar de alguns erros processuais, a Bielorrússia agiu conforme as regras em vigor e que o MiG-29 decolou 15 minutos depois que o piloto da RyanAir decidiu pousar em Minsk. Portanto, nenhuma trama bielorrussa e muito menos de Putin. Ah!… Outro detalhe: Protassevitch, cruelmente torturado pela polícia bielorrussa, está agora livre. Aqueles que quiserem se corresponder com ele, podem ir em sua conta no Twitter.

A caracterização dos paramilitares ucranianos como “nazistas” ou “neonazistas” é considerada propaganda russa. Talvez, mas essa não é a visão do Times of Israel, do Centro Simon Wiesenthal ou do Centro de Contra-terrorismo da Academia West Point. Mas isso ainda é discutível, porque em 2014, a revista Newsweek parecia associá-los mais com… o Estado Islâmico. Faça sua escolha!

Assim, o Ocidente apoiou e continuou a armar milícias que têm sido culpadas de inúmeros crimes contra a população civil desde 2014, incluindo estupros, torturas e massacres. Mas, embora o governo suíço tenha sido muito rápido em adotar sanções contra a Rússia, não adotou nenhuma contra a Ucrânia, que vem massacrando sua própria população desde 2014. Na verdade, aqueles que defendem os direitos humanos na Ucrânia há muito condenam as ações destes grupos, mas não têm sido apoiados por nossos governos. Porque, na realidade, não estamos tentando ajudar a Ucrânia, mas sim lutar contra a Rússia.

A integração dessas forças paramilitares na Guarda Nacional não foi de forma alguma acompanhada por uma “desnazificação”, como alguns afirmam. Entre os muitos exemplos, o da insígnia do Regimento Azov é instrutivo:

Em 2022, muito esquematicamente, as forças armadas ucranianas que combatiam a ofensiva russa, estavam organizadas assim:

  • O Exército, subordinado ao Ministério da Defesa. Organizado em 3 corpos do exército e composto de tanques, artilharia pesada, mísseis, etc.
  • A Guarda Nacional, que depende do Ministério do Interior e está organizada em 5 comandos territoriais.

A Guarda Nacional é, portanto, uma força de defesa territorial que não faz parte do exército ucraniano. Ela inclui milícias paramilitares, chamadas “batalhões voluntários” (добровольчі батальйоні), também conhecidas pelo nome evocativo de “batalhões de represália”, e compostas de infantaria. Formados principalmente para o combate urbano, eles agora defendem cidades como Kharkov, Mariupol, Odessa, Kiev, etc.

Segunda parte: a guerra

Como ex-chefe das forças do Pacto de Varsóvia no serviço de inteligência estratégica da Suíça, observo com tristeza – mas não com espanto – que nossos órgãos não são mais capazes de entender a situação militar na Ucrânia. Os autoproclamados “especialistas” que desfilam em nossas telas transmitem, incansavelmente, as mesmas informações moduladas pela alegação de que a Rússia – e Vladimir Putin –  é irracional. Vamos dar um passo atrás.

  1. A deflagração da guerra

Desde novembro de 2021, os americanos têm constantemente alertando sobre a ameaça de uma invasão russa na Ucrânia, entretanto, os ucranianos não pareciam concordar. Por que não concordaram?

Temos que voltar a 24 de março de 2021. Naquele dia, Volodymyr Zelensky emitiu um decreto para a recaptura da Crimeia, e começou a enviar suas forças para o sul do país. Ao mesmo tempo, vários exercícios da OTAN foram realizados entre o Mar Negro e o Mar Báltico, acompanhados por um aumento significativo de voos de reconhecimento ao longo da fronteira russa. A Rússia realizou, então, vários exercícios para testar a prontidão operacional de suas tropas e para mostrar que estava acompanhando a evolução da situação.

As coisas se acalmaram até outubro – novembro com o fim dos exercícios ZAPAD 21, cujos movimentos de tropas foram interpretados como um reforço para uma ofensiva contra a Ucrânia. Entretanto, até mesmo as autoridades ucranianas refutaram a ideia dos preparativos russos para uma guerra, e Oleksiy Reznikov, Ministro da Defesa ucraniano, afirmou que não houve nenhuma mudança em sua fronteira desde a primavera.

Em violação aos Acordos de Minsk, a Ucrânia estava realizando operações aéreas em Donbass utilizando drones, incluindo, pelo menos, um ataque contra um depósito de combustíveis em Donetsk, em outubro de 2021. A imprensa americana observou o ocorrido, mas não os europeus; e ninguém condenou estas violações.

Em fevereiro de 2022, os eventos foram precipitados. Em 7 de fevereiro, durante sua visita a Moscou, Emmanuel Macron reafirmou a Vladimir Putin seu compromisso com os Acordos de Minsk, compromisso que ele repetiria após seu encontro com Volodymyr Zelensky no dia seguinte. Mas em 11 de fevereiro, em Berlim, após nove horas de deliberações, a reunião de assessores políticos dos líderes do “formato Normandia” terminou sem nenhum resultado concreto: os ucranianos ainda se recusavam a aplicar os Acordos de Minsk, aparentemente sob pressão dos Estados Unidos. Vladimir Putin observou que Macron havia feito promessas vazias e que o Ocidente não estava pronto para aplicar os acordos, como vinha fazendo há oito anos.

Os preparativos ucranianos na zona de contato continuaram. O Parlamento russo ficou alarmado e em 15 de fevereiro pediu a Vladimir Putin que reconhecesse a independência das Repúblicas, o que ele se recusou a fazer.

Em 17 de fevereiro, o Presidente Joe Biden anunciou que a Rússia atacaria a Ucrânia nos próximos dias. Como ele soube disso? É um mistério. Mas desde o dia 16, os bombardeios de artilharia à população de Donbass aumentaram drasticamente, como mostram os relatórios diários dos observadores da OSCE. Naturalmente, nem a mídia, nem a União Europeia, nem a OTAN, nem qualquer governo ocidental reage ou intervém. Dir-se-á mais tarde que isto é desinformação russa. De fato, parece que a União Europeia e alguns países mantiveram-se deliberadamente em silêncio sobre o massacre da população de Donbass, sabendo que isto provocaria uma intervenção russa.

Ao mesmo tempo, houve relatos de sabotagem em Donbass. Em 18 de janeiro, combatentes de Donbass interceptaram sabotadores, que falavam polonês, equipados com equipamentos ocidentais e que estavam procurando criar incidentes químicos em Gorlivka. Eles poderiam ter sido mercenários da CIA, liderados ou “aconselhados” por americanos e compostos por combatentes ucranianos ou europeus, para realizar ações de sabotagem nas Repúblicas de Donbass.

 

De fato, já em 16 de fevereiro, Joe Biden sabia que os ucranianos tinham começado a bombardear a população civil de Donbass, colocando Vladimir Putin em uma escolha difícil: ajudar Donbass militarmente e criar um problema internacional, ou ficar parado e ver o povo de língua russa de Donbass ser trucidado.

Caso ele decidisse intervir, Putin poderia invocar a obrigação internacional de “Responsabilidade de Proteger” (R2P). Mas ele sabia que qualquer que fosse sua natureza ou escala, a intervenção desencadearia uma tempestade de sanções. Portanto, quer a intervenção russa se limitasse à Donbass ou fosse mais longe para pressionar o Ocidente pelo status da Ucrânia, o preço a pagar seria o mesmo. Foi o que ele explicou em seu discurso de 21 de fevereiro.

Naquele dia, ele concordou com o pedido da Duma e reconheceu a independência das duas Repúblicas de Donbass e, ao mesmo tempo, assinou tratados de amizade e assistência a elas.

O bombardeio da artilharia ucraniana contra a população de Donbass continuou e, em 23 de fevereiro, as duas Repúblicas pediram assistência militar da Rússia. Em 24 de fevereiro, Vladimir Putin invocou o artigo 51 da Carta das Nações Unidas, que prevê a assistência militar mútua no âmbito de uma aliança defensiva.

De modo a tornar a intervenção russa totalmente ilegal aos olhos do público, foi ocultado, deliberadamente, que a guerra realmente começou em 16 de fevereiro. O exército ucraniano estava se preparando para atacar Donbass já em 2021, como alguns serviços de inteligência russos e europeus bem sabiam. Os juristas irão julgar.

Em seu discurso de 24 de fevereiro, Vladimir Putin declarou os dois objetivos de sua operação: “desmilitarizar” e “desnazificar” a Ucrânia. Portanto, não se trata de tomar posse da Ucrânia, nem mesmo, presumivelmente, de ocupá-la; e certamente não de destruí-la.

A partir daí, nossa visibilidade sobre o curso da operação é limitada: os russos têm uma excelente segurança de operações (OPSEC) e os detalhes de seu planejamento não são conhecidos. Mas, rapidamente, o curso da operação nos permite compreender como os objetivos estratégicos foram traduzidos no nível operacional.

Desmilitarização:

  • Destruição em terra da aviação ucraniana, dos sistemas de defesa aérea e dos ativos de reconhecimento;
  • Neutralização das estruturas de comando e inteligência (C3I), assim como as principais rotas logísticas na profundidade do território;
  • Cerco da maior parte do exército ucraniano, reunido no sudeste do país.

Desnazificação:

  • Destruição ou neutralização dos batalhões voluntários que operam nas cidades de Odessa, Kharkov e Mariupol, assim como em várias instalações no território.
  1. Desmilitarização

A ofensiva russa foi realizada de uma maneira “clássica”. Inicialmente – como os israelenses haviam feito em 1967 – com a destruição em solo da força aérea logo nas primeiras horas. Em seguida, testemunhamos uma progressão simultânea ao longo de vários eixos de acordo com o princípio de “água corrente”: avançar em todos os lugares onde a resistência era fraca e deixar as cidades (muito exigentes em tropas) para mais tarde. No norte, a usina de Chernobyl foi ocupada imediatamente para evitar atos de sabotagem. As imagens de soldados ucranianos e russos protegendo a usina juntos não são mostradas, é claro.

A ideia de que a Rússia está tentando tomar Kiev, a capital, para eliminar Zelensky, vem tipicamente do ocidente – foi o que fizeram no Afeganistão, Iraque, Líbia, e o que queriam fazer na Síria com a ajuda do Estado islâmico. Vladimir Putin, contudo, nunca teve a intenção de derrubar Zelensky. Em vez disso, a Rússia procura mantê-lo no poder, pressionando-o para negociar, cercando Kiev. Até agora, ele havia se recusado a implementar os Acordos de Minsk, mas agora os russos querem obter a neutralidade da Ucrânia.

Muitos comentaristas ocidentais ficaram surpresos que os russos continuassem a buscar uma solução negociada enquanto realizavam operações militares. A explicação está na perspectiva estratégica russa desde a era soviética. Para o Ocidente, a guerra começa quando a política termina, entretanto, a abordagem russa segue uma inspiração Clausewitziana: a guerra é a continuidade da política e pode mover-se fluidamente de uma para a outra, mesmo durante o combate. Isto permite criar pressão sobre o adversário e empurrá-lo para a negociação.

Do ponto de vista operacional, a ofensiva russa foi um exemplo de seu tipo: em seis dias, os russos apreenderam um território tão grande quanto o Reino Unido, com uma velocidade de avanço superior à que a Wehrmacht havia conseguido em 1940.

A maioria do exército ucraniano foi enviada para o sul do país em preparação para uma grande operação contra Donbass. É por isso que as forças russas conseguiram cercá-la desde o início de março no “caldeirão” entre Slavyansk, Kramatorsk e Severodonetsk, com um impulso do Leste através de Kharkov e outro do Sul, a partir da Crimeia. Tropas das repúblicas de Donetsk (DPR) e Lugansk (LPR) estão complementando as forças russas com um empurrão do Leste.

Nesta fase, as forças russas estão lentamente apertando o nó, não estando mais sob pressão do tempo. Seu objetivo de desmilitarização foi praticamente alcançado e as forças ucranianas restantes não mais possuem uma estrutura de comando operacional e estratégica.

A “desaceleração” que nossos “especialistas” atribuem à má logística é apenas a consequência de terem atingido seus objetivos. A Rússia parece não querer se envolver em uma ocupação de todo o território ucraniano. Na verdade, parece que a Rússia está tentando limitar seu avanço à fronteira linguística do país.

Nossa mídia fala de bombardeios indiscriminados contra a população civil, especialmente em Kharkov, e as imagens dantescas são transmitidas em loop. No entanto, Gonzalo Lira, um latino-americano que vive lá, nos apresenta uma cidade calma nos dias 10 e 11 de março. É verdade que se trata de uma cidade grande e não vemos tudo – mas parece indicar que não estamos na guerra total que nos é servida continuamente em nossas telas.

Quanto às Repúblicas de Donbass, elas “libertaram” seus próprios territórios e estão lutando na cidade de Mariupol.

  1. Desnazificação

Em cidades como Kharkov, Mariupol e Odessa, a defesa é fornecida por milícias paramilitares. Elas sabem que o objetivo da “desnazificação” é dirigido principalmente a elas.

Para um atacante em uma área urbanizada, os civis são um problema. É por isso que a Rússia está procurando criar corredores humanitários para esvaziar cidades e deixar apenas as milícias, para combatê-las mais facilmente.

Ao contrário, estas milícias procuram manter civis nas cidades para dissuadir o exército russo de lá lutar. É por isso que elas relutam em implementar esses corredores e fazem de tudo para garantir que os esforços russos não tenham êxito – elas podem usar a população civil como “escudo humano”. Vídeos mostrando civis tentando sair de Mariupol e sendo espancados por combatentes do regimento Azov são, obviamente, cuidadosamente censurados aqui.

No Facebook, o grupo Azov foi considerado na mesma categoria do Estado islâmico e sujeito à “política sobre indivíduos e organizações perigosas” da plataforma. Portanto, era proibido glorificá-lo e postagens favoráveis eram sistematicamente proibidas. No entanto, em 24 de fevereiro, o Facebook mudou sua política e permitiu postagens favoráveis à milícia. No mesmo espírito, em março, a plataforma autorizou, nos antigos países do Leste, pedidos para o assassinato de soldados e líderes russos. Lá se vão os valores que inspiram nossos líderes, como veremos.

Nossa mídia propaga uma imagem romântica da resistência popular. Foi esta imagem que levou a União Europeia a financiar a distribuição de armas para a população civil. Este é um ato criminoso. Na minha qualidade de chefe da doutrina de manutenção da paz na ONU, trabalhei na questão da proteção civil. Constatamos que a violência contra a população civil ocorre em contextos muito específicos, em particular, quando as armas são abundantes e não existem estruturas de comando.

Estas estruturas de comando são a essência dos exércitos: sua função é canalizar o uso da força para um objetivo. Ao armar os cidadãos de forma aleatória, como é atualmente o caso, a UE está transformando-os em combatentes, com o consequente efeito de torná-los alvos potenciais. Além disso, sem comando e sem metas operacionais, a distribuição de armas leva inevitavelmente ao acerto de contas, banditismo e ações que são mais mortais do que eficazes. A guerra se torna uma questão de emoções. A força se torna violência. Foi o que aconteceu em Tawarga (Líbia) de 11 a 13 de agosto de 2011, onde 30.000 negros africanos foram massacrados com armas entregues de paraquedas (ilegalmente) pela França. A propósito, o Instituto Real Britânico de Estudos Estratégicos (RUSI) não vê nenhum valor agregado nestas entregas de armas.

Além disso, quem entrega armas a um país em guerra se expõe a ser considerado beligerante. Os ataques russos de 13 de março de 2022 contra a base aérea de Mykolayev vieram depois dos avisos russos de que os carregamentos de armas seriam tratados como alvos hostis.

A UE está repetindo a experiência desastrosa do Terceiro Reich nas últimas horas da Batalha de Berlim. A guerra deve ser deixada aos militares e, quando um dos lados tiver perdido, isto deve ser reconhecido. E, para haver resistência, ela deve ser liderada e estruturada. Porém, estamos fazendo exatamente o contrário –  estamos pressionando os cidadãos a lutar e, ao mesmo tempo, o Facebook autoriza apelos para o assassinato de soldados e líderes russos. Lá se vão os valores que nos inspiram.

Alguns serviços de inteligência veem esta decisão irresponsável como uma forma de usar a população ucraniana como bucha de canhão para combater a Rússia de Vladimir Putin. Este tipo de decisão assassina deveria ter sido deixada aos colegas do avô de Ursula von der Leyen. Teria sido melhor se envolver em negociações e assim obter garantias para a população civil do que jogar gasolina no fogo. É fácil ser combativo com o sangue dos outros.

  1. O Hospital Maternidade em Mariupol

É importante entender de antemão que não é o exército ucraniano que está defendendo Marioupol, mas a milícia Azov, composta de mercenários estrangeiros.

Em seu resumo da situação de 7 de março de 2022, a missão russa da ONU em Nova York declarou que “os residentes relatam que as forças armadas ucranianas expulsaram o pessoal do hospital maternidade nº 1 da cidade de Mariupol e instalaram um posto de fuzilamento dentro das instalações”.

Em 8 de março, a mídia russa independente Lenta.ru, publicou o testemunho de civis de Marioupol que disseram a maternidade teria sido dominada pela milícia do regimento Azov, que expulsou os ocupantes civis, ameaçando-os com suas armas, confirmando as declarações do embaixador russo, algumas horas antes.

O hospital de Mariupol ocupa uma posição dominante, perfeitamente adequado para a instalação de armas antitanque e para observação. Em 9 de março, as forças russas atingiram o edifício. Segundo a CNN, 17 pessoas foram feridas, mas as imagens não mostram nenhuma baixa no edifício e não há evidências de que as vítimas mencionadas estejam relacionadas a este ataque. Fala-se de crianças, mas na realidade, não há nada. Pode ser verdade, mas pode não ser. Isto não impede que os líderes da UE vejam isto como um crime de guerra, o que permite a Zelensky pedir uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia.

Em verdade, não sabemos exatamente o que aconteceu. Mas a sequência dos acontecimentos tende a confirmar que as forças russas atingiram uma posição do regimento Azov e que a maternidade estava, naquele momento, livre de civis.

O problema é que as milícias paramilitares que defendem as cidades são incentivadas pela comunidade internacional a não respeitar os costumes da guerra. Parece que os ucranianos repetiram o cenário da maternidade da cidade do Kuwait em 1990, que foi totalmente encenada pela firma Hill & Knowlton por 10,7 milhões de dólares, a fim de convencer o Conselho de Segurança das Nações Unidas a intervir no Iraque para as Operações Escudo do Deserto e Tempestade no Deserto.

Os políticos ocidentais aceitaram ataques contra civis em Donbass por oito anos, sem adotar nenhuma sanção contra o governo ucraniano. Há muito tempo, entramos numa dinâmica em que os políticos ocidentais concordaram em sacrificar o direito internacional para atingir seu objetivo de enfraquecer a Rússia.

Terceira parte: conclusões

Como um ex-profissional de inteligência, a primeira coisa que me impressiona é a total ausência dos serviços de inteligência ocidentais no que diz respeito à representação da situação durante o ano passado. Na Suíça, os serviços têm sido criticados por não terem fornecido uma imagem correta da situação. Na verdade, parece que, em todo o mundo ocidental, os serviços de inteligência têm sido sobrecarregados pelos políticos. O problema é que são os políticos que decidem – o melhor serviço de inteligência do mundo é inútil se o tomador de decisões não o escuta. Isto foi o que ocorreu durante esta crise.

Dito isto, enquanto alguns serviços de inteligência tinham uma imagem muito precisa e racional da situação, outros tinham claramente a mesma imagem propagada por nossa mídia. Nesta crise, os serviços dos países da “nova Europa” desempenharam um papel importante. O problema é que, por experiência, eu os achei extremamente ruins no nível analítico, eles não têm a independência intelectual e política necessária para avaliar uma situação com “qualidade” militar. É melhor tê-los como inimigos do que como amigos.

Em segundo lugar, parece que, em alguns países europeus, os políticos ignoraram deliberadamente seus serviços, a fim de responder ideologicamente à situação. É por isso que esta crise tem sido irracional desde o início. Deve-se notar que todos os documentos apresentados ao público durante esta crise foram apresentados por políticos baseados em fontes comerciais.

Alguns políticos ocidentais obviamente queriam que houvesse um conflito. Nos Estados Unidos, os cenários de ataque apresentados por Anthony Blinken ao Conselho de Segurança foram apenas o produto da imaginação de um Tiger Team que trabalhava para ele – ele fez exatamente como Donald Rumsfeld fez em 2002, que tinha assim “contornado” a CIA e outros serviços de inteligência que eram muito menos assertivos sobre as armas químicas iraquianas.

Os acontecimentos dramáticos que estamos hoje testemunhando têm causas previamente conhecidas, mas que nos recusamos a reconhecer:

  • No plano estratégico, a expansão da OTAN (que não tratamos aqui);
  • No nível político, a recusa ocidental de implementar os Acordos de Minsk;
  • Operacionalmente, os contínuos e repetidos ataques à população civil de Donbass nos últimos anos e seu dramático aumento no final de fevereiro de 2022.

Em outras palavras, podemos naturalmente deplorar e condenar o ataque russo, mas nós (isto é: os Estados Unidos, a França e a União Europeia) criamos as condições para a eclosão de um conflito. Mostramos compaixão pelo povo ucraniano e pelos dois milhões de refugiados. Isso é correto, mas se tivéssemos tido um mínimo de compaixão pelo mesmo número de refugiados das populações ucranianas de Donbass, massacradas por seu próprio governo e que procuraram refúgio na Rússia por oito anos, provavelmente nada disso teria acontecido.

Vítimas civis decorrentes das hostilidades ativas entre 2018 – 2021, por território

Em território controlado pelas “repúblicas” autoproclamadas Em território controlado pelo governo Na “terra de ninguém” Total Diminuição em relação ao ano anterior (por cento)
2018 128 27 7 162 41,9
2019 85 18 2 105 35,2
2020 61 9 0 70 33,3
2021 36 8 0 44 37,1
Total 310 62 9 381
Percentual 81,4 16,3 2,3 100,0

Como podemos ver, mais de 80% das vítimas em Donbass foram o resultado dos bombardeios do exército ucraniano. Durante anos, o Ocidente permaneceu em silêncio sobre o massacre de ucranianos de língua russa pelo governo de Kiev, sem nunca tentar pressioná-lo. Foi este silêncio que forçou o lado russo a agir. [Fonte: “Conflitos relacionados a vítimas civis”, Missão de Monitoramento dos Direitos Humanos das Nações Unidas na Ucrânia].

 

Se o termo “genocídio” se aplica aos abusos sofridos pelo povo de Donbass, é uma questão em aberto. O termo é geralmente reservado para casos de maior magnitude (Holocausto, etc.), mas a definição dada pela Convenção sobre Genocídio é provavelmente ampla o suficiente para se aplicar a este caso. Os estudiosos do direito entenderão este ponto.

Claramente, este conflito nos levou à histeria. As sanções parecem ter se tornado a ferramenta preferida de nossas políticas externas. Se tivéssemos insistido para que a Ucrânia cumprisse os Acordos de Minsk, que havíamos negociado e endossado, nada disso teria acontecido. A condenação de Vladimir Putin também é a nossa. Não adianta lamentar depois do fato – deveríamos ter agido mais cedo. Entretanto, nem Emmanuel Macron (como garantidor e membro do Conselho de Segurança da ONU), nem Olaf Scholz, nem Volodymyr Zelensky respeitaram seus compromissos. No final, a verdadeira derrota é a daqueles sem voz.

A União Europeia foi incapaz de promover a implementação dos acordos de Minsk – ao contrário, não reagiu quando a Ucrânia bombardeava sua própria população em Donbass. Se o tivesse feito, Vladimir Putin não teria tido necessidade de reagir. Ausente da fase diplomática, a UE se distinguiu por alimentar o conflito. Em 27 de fevereiro, o governo ucraniano concordou em entrar em negociações com a Rússia, mas, algumas horas depois, a União Europeia votou um orçamento de 450 milhões de euros para fornecer armas à Ucrânia, colocando gasolina no fogo. A partir de então, os ucranianos sentiram que não precisavam chegar a um acordo. A resistência da milícia Azov em Mariupol levou até mesmo a um aumento de 500 milhões de euros para o fornecimento de armas.

Na Ucrânia, com a bênção dos países ocidentais, aqueles que são a favor de uma negociação foram eliminados. É o caso de Denis Kireyev, um dos negociadores ucranianos, assassinado em 5 de março pelo Serviço Secreto Ucraniano (SBU) por ser favorável à Rússia e considerado um traidor. O mesmo destino recaiu sobre Dmitry Demyanenko, ex-chefe adjunto da direção principal da SBU para Kiev e região, que foi assassinado em 10 de março por ser favorável a um acordo com a Rússia – ele foi baleado pela milícia Mirotvorets (“pacificadora”). Esta milícia está associada ao site Mirotvorets, que lista os “inimigos da Ucrânia”, com seus dados pessoais, endereços e números de telefone, para que possam ser hostilizados ou mesmo eliminados; uma prática punível em muitos países, mas não na Ucrânia. As Nações Unidas e alguns países europeus exigiram o fechamento deste site – recusado pela Rada.

No final, o preço será alto, mas Vladimir Putin provavelmente alcançará os objetivos que estabeleceu para si mesmo. Seus laços com Pequim se solidificaram. A China está emergindo como mediadora no conflito, enquanto a Suíça está se juntando à lista dos inimigos da Rússia. Os americanos têm que pedir petróleo à Venezuela e ao Irã para sair do impasse energético em que se colocaram – Juan Guaidó está saindo definitivamente de cena e os Estados Unidos têm que recuar piedosamente nas sanções impostas a seus inimigos.

Os ministros ocidentais que procuram colapsar a economia russa e fazer o povo russo sofrer, ou mesmo apelar para o assassinato de Putin, mostram (mesmo que tenham revertido parcialmente a forma de suas palavras, mas não a substância!) que nossos líderes não são melhores que aqueles que odiamos, pois sancionar os atletas russos nos Jogos Paraolímpicos ou os artistas russos não têm nada a ver com o combate a Putin.

Assim, reconhecemos que a Rússia é uma democracia, pois consideramos que o povo russo é responsável pela guerra. Se este não é o caso, então por que procuramos punir toda uma população pela culpa de um? Lembremos que a punição coletiva é proibida pelas Convenções de Genebra.

A lição a ser aprendida com este conflito é nosso senso de humanidade variável. Se nos preocupávamos tanto com a paz e a Ucrânia, por que não encorajamos a Ucrânia a respeitar os acordos que ela havia assinado e que os membros do Conselho de Segurança haviam aprovado?

A integridade da mídia é medida por sua disposição de trabalhar dentro dos termos da Carta de Munique. Eles conseguiram propagar o ódio contra os chineses durante a crise da Covid e sua mensagem polarizada leva aos mesmos efeitos contra os russos. O jornalismo está se tornando cada vez mais antiprofissional e militante.

Como disse Goethe: “Quanto maior for a luz, mais escura será a sombra”. Quanto mais as sanções contra a Rússia forem desproporcionais, mais os casos em que nada fizemos evidenciam nosso racismo e servilismo. Por que nenhum político ocidental reagiu aos ataques contra a população civil de Donbass durante oito anos?

E finalmente, o que torna o conflito na Ucrânia mais censurável do que a guerra no Iraque, no Afeganistão ou na Líbia? Que sanções adotamos contra aqueles que deliberadamente mentiram à comunidade internacional a fim de travar guerras injustas, injustificadas e assassinas? Temos procurado “fazer o povo americano sofrer” por ter mentido (porque eles são uma democracia!) antes da guerra no Iraque? Adotamos uma única sanção que seja contra os países, empresas ou políticos que estão fornecendo armas para o conflito no Iêmen, considerado como o “pior desastre humanitário do mundo”? Temos sancionado os países da União Europeia que praticam a tortura mais abjeta em seu território em benefício dos Estados Unidos?

Fazer essas perguntas é respondê-las… e a resposta não é nada bonita.

 

 

 

 

Artigo original aqui

Jacques Baud
Jacques Baud
é um ex-coronel do comando geral, ex-membro da inteligência estratégica suíça, especialista em países do Leste. Ele foi treinado nos serviços de inteligência americanos e britânicos. Ele atuou como Chefe de Políticas para as Operações de Paz das Nações Unidas. Como especialista da ONU em Estado de Direito e instituições de segurança, ele projetou e liderou a primeira unidade de inteligência multidimensional da ONU no Sudão. Trabalhou para a União Africana e foi durante 5 anos responsável pela luta, na OTAN, contra a proliferação de armas ligeiras. Ele esteve envolvido em discussões com os mais altos oficiais militares e de inteligência russos logo após a queda da URSS. Dentro da OTAN, ele acompanhou a crise ucraniana de 2014 e mais tarde participou de programas de assistência à Ucrânia. É autor de vários livros sobre inteligência, guerra e terrorismo, em particular Le Détournement publicado pela SIGEST, Gouverner par les fake news, L’affaire Navalny. Seu último livro é Poutine, maître du jeu? publicado por Max Milo.
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5 COMENTÁRIOS

  1. Sinceramente, eu fico impressionado com o quão ambíguo o termo politico “direita” é, em uma análise aprioristica, é um tanto quanto óbvio que todos os chamados de “extrema-direita” são na verdade esquerda (o que se aplica aos nazistas) ou extrema-esquerda. Esse termo já foi tão deturpado nas últimas décadas que hoje em dia eu considero esquerdista e direitista tudo farinha do mesmo saco, já que no final das contas são guerras entre políticos, a única diferença é que os auto-proclamados políticos de direita buscam que o Estado siga uma direção menos gulosa e intervencionista, enquanto os Esquerdistas

  2. Ótimo artigo, esclareceu muitas dúvidas minha, pois esse conflito está lotado de propagandas para todos os lados, tornando quando impossível de descobrir o que realmente está acontecendo sem precisar se aventurar mais á fundo no tema.

  3. Artigo extremamente importante.
    O ponto principal aqui é que não se pode concluir com base neste texto que a Rússia é a agressora original. Isso muda completamente a perspectiva. É preocupante todavia como o rolo compressor da mídia do sistema mais uma vez tenta induzir as pessoas.
    A publicação deste artigo vale mais que Bitcoin…
    Eu não pensei que pudesse vir a ler algo assim. Obrigado.

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