Thursday, November 21, 2024
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A geringonça criada por Milton Friedman

friedNo dia 12 de março, David Stockman, que foi diretor do Office of Management and Budget (órgão que supervisiona a elaboração do orçamento federal americano) no primeiro mandato de Ronald Reagan, deu uma palestra no Mises Institute, no Alabama.  Eu estava na platéia.  Foi um discurso incitante, cheio de tiradas jocosas.  Lembrou-me do filme Patch Adams e a lista de eufemismos para “morte” que o personagem principal utilizava no quarto de hospital do sujeito com câncer terminal.  Toda a platéia riu bastante.

O discurso tinha quatro pontos principais.  Primeiro, o pacote de socorro criado pelo Tesouro americano em conjunto com o Federal Reserve (o banco central americano) em outubro de 2008 não era necessário para salvar os mercados financeiros.  Era necessário para salvar três ou quatro empresas financeiras que haviam adulterado seus registros contábeis e que, por isso, estavam sendo expostas pelo mercado — isto é, o valor de seus ativos estava sofrendo reduções.

Segundo, a crise foi uma decorrência da decisão do presidente Nixon, em 15 de agosto de 1971, de abolir o que restava do padrão-ouro criado pelo acordo de Bretton Woods de 1944 — isto é, a decisão de parar de redimir dólares em ouro de acordo com a demanda dos bancos centrais estrangeiros.  Nixon “fechou a janela por onde fugia o ouro”.  Embora Stockman não tenha mencionado isso, nós, dinossauros defensores do padrão-ouro, nos lembramos perfeitamente: Nixon se recusou a exigir que o Federal Reserve parasse de inflacionar a base monetária dos EUA, algo que ele estava fazendo com o intuito de estimular a economia americana e tirá-la de uma recessão de dois anos.  Nixon admitiu publicamente que agora ele era um keynesiano, e o presidente do Fed, Arhur Burns, financiou essa transição.

Terceiro, a ideia por trás dessa decisão de fechar a janela do ouro foi aquilo que Stockman chamou de geringonça de Milton Friedman — uma reforma feita em duas etapas: deixar que o dólar flutuasse em relação a outras moedas e abolir os últimos vestígios do padrão-ouro.

Quarto, os asiáticos estão praticando economias mercantilistas.  Eles estão inflacionando suas bases monetárias a fim de comprar títulos da dívida americana.  O plano é fazer isso para impedir que suas moedas se apreciem em relação ao dólar, algo que reduziria suas exportações.  Eles não conseguirão manter esse programa por muito tempo, disse Stockman.  Os custos trabalhistas estão subindo.

O texto do seu discurso está aqui.

A Máquina Monetária do Dr. Friedman

Milton Friedman acreditava no livre mercado em quase todas as situações.  O problema era que, sempre que ele resolvia abordar aquela instituição coerciva e monopolista conhecida como governo, ele acabava criando soluções lógicas baseadas na ideia de que o governo poderia se tornar mais eficiente caso adotasse pseudo-arranjos de mercado.

Ele inventou várias ideias para justificar a imposição do imposto de renda retido na fonte em 1943.  Este seria um imposto temporário, que seria aplicado apenas em caráter emergencial, para melhor financiar o esforço de guerra.  Pelo menos foi isso que foi dito ao público.  Ele acreditava que o governo poderia coletar um volume bem maior de receitas por meio do imposto retido na fonte.  Ele estava certo.  Tal arranjo tornou o governo mais eficiente do que nunca na tarefa de extrair a riqueza alheia.

Ele também promoveu a ideia dos vouchers educacionais, os quais seriam emitidos pelos governos locais e financiados via impostos extraídos do público.  Ele não levou em consideração o óbvio fato de que isso representaria o controle estatal sobre a educação privada.  Ele e eu debatemos esse assunto em 1993.

Acima de tudo, ele defendia a ideia de que guardar ouro nos cofres do governo como forma de lastrear a moeda era um desperdício.  O ouro estaria assim sendo inutilizado.  Da mesma forma, havia um desperdício de recursos para manter uma guarda armada cuidando desse ouro.  Logo, para tornar a política monetária mais eficiente, o Banco Central deveria aumentar a oferta monetária — ele nunca especificou qual M (M0, M1, M2, M3…) — de 2 a 5% ao ano.  Ele queria um papel-moeda fiduciário e de curso forçado controlado pelo banco central.

Os únicos críticos dessa proposta, os economistas seguidores da Escola Austríaca de economia, estavam no limbo dos debates acadêmicos.  Nós sabíamos que um governo eficiente é um governo perigoso.  Também sabíamos que um banco central que não tivesse de lidar com a ameaça de fuga de ouro de seus cofres como resposta às suas políticas de inflação monetária iria inflacionar muito mais do que inflacionaria em qualquer economia baseada em ouro.

Respondi a esses argumentos anti-ouro, os quais foram feitos pelo The Wall Street Journal, ainda em 1969.

Hans Sennholz também respondeu em várias outras ocasiões.  O mesmo fez Murray Rothbard.   Mas não fomos levados a sério.  Não fazíamos parte da corrente dominante do pensamento econômico.  Economistas acadêmicos há muito haviam abandonado qualquer apoio a um padrão-ouro genuíno (com moedas de ouro utilizadas nas transações).  Nem todos eles apoiavam a ideia de Friedman de ter um banco central comedido, cuja expansão monetária fosse restrita.  Com efeito, poucos apoiavam essa ideia.  Eles queriam flexibilidade.  Eles ainda querem.

Assim que Nixon aboliu o que restava do padrão-ouro, não havia mais retorno.  A base monetária cresceu, todos os vários Ms cresceram, os preços aumentaram, bolhas surgiram, inflaram e explodiram, e a dívida federal americana cresceu até seu atual e insustentável nível — insustentável a menos que seja paga com uma inflação monetária maciça seguida de hiperinflação de preços.

A abolição de uma moeda conversível em ouro era apenas parte da criação do Dr. Friedman.  A outra parte foi sua sugestão de taxas de câmbio flutuantes.  Essa parte merece uma consideração especial.

Taxas de Câmbio Monetárias

Suponha que haja duas moedas, A e B, ambas redimíveis em ouro sob demanda.  Suponha também que, pelo valor de livre mercado, 35 A valha uma onça de ouro e 70 B valham a mesma onça de ouro.  Nesse caso, ambas as moedas terão uma taxa de câmbio fixa entre si de 2 B por 1 A. Ninguém estabeleceu um controle de preços determinando isso.  Não foi necessário.  Eis o porquê.

Se o banco central do país A começar a imprimir dinheiro, a moeda A ficará desvalorizada — isto é, o preço de A irá cair.  O ouro passará a valer, por exemplo, 36 A no mercado paralelo.  Nesse ponto, ou mesmo antes, os especuladores começarão a comprar a moeda A e irão trocá-la por ouro a 35 unidades de A.  Ato contínuo, eles utilizarão esse ouro para comprar 36 A.  E então eles levarão 35 A até o Tesouro do país e exigirão uma onça de ouro, e embolsarão o A extra.  Com o tempo, eles vão acumular 35 A.  Nesse ponto, eles irão trocar 35 A por outra onça de ouro.

A cada transação, o ouro sairá do tesouro do país A.  Caso isso continue, ou o Tesouro ficará sem ouro ou ele irá interromper esse processo de redimir ouro a 35 A por onça.  Ele pode até abolir todas as restituições em ouro.

A moeda A irá se desvalorizar em relação à moeda B.  Afinal, você pode comprar uma onça de ouro a 70 B.  Qualquer um que tenha a ideia de comprar 35 A para então revender por 70 B, de modo a exigir ouro do Tesouro do país B, irá descobrir que todos os seus concorrentes também tiveram a mesma ideia.  O preço de B em relação a A irá subir — isto é, B se apreciará em relação a A.  Isso irá aniquilar a taxa de câmbio fixa entre A e B.  O câmbio fixo acabou porque o país A parou de restituir ouro ao valor de 35 A a onça.

Havia um câmbio fixo antes do banco central do país A começar a imprimir dinheiro para comprar títulos da dívida de seu governo.  A taxa de câmbio até então vigente não havia sido determinada por lei; ela havia sido determinada pelo livre mercado.  A conversibilidade de A em ouro a 35 A por onça, mais a conversibilidade de B em ouro a 70 B por onça, determinava a taxa de câmbio entre as duas moedas.

Isso não significava um controle de preços da moeda A em relação à moeda B.  Havia apenas um par de controle de preços: a moeda A e o ouro valendo 35 A a onça (determinado por lei nacional), e a moeda B e o ouro valendo 70 B a onça (determinado por lei nacional).  Tais valores foram determinados por lei.  A taxa de câmbio de uma moeda em relação ao ouro foi determinada pelo banco central de cada país.

Qualquer desvio dessa definição fixa causaria uma reação.  Se o preço do ouro fosse estabelecido em um valor alto demais em relação à moeda do país, o banco central deste país seria inundado de ouro: haveria uma abundância de ouro.  Se o preço do ouro fosse estabelecido em um valor baixo demais em relação à moeda do país, o banco central deste país sofreria uma fuga de ouro: haveria uma escassez de ouro.  Qualquer uma dessas duas condições forçaria o banco central a fazer mudanças: ou mudanças na política monetária ou mudanças na definição oficial da taxa de câmbio entre as moedas.

A taxa de câmbio fixa entre a moeda A e a moeda B era uma taxa de câmbio determinada pelo mercado.  Ela até então não havia se alterado porque cada país honrava seu respectivo contrato em relação à conversibilidade do ouro a um preço fixo.

O Fundo Monetário Internacional

O acordo de Bretton Woods feito em 1944 foi uma geringonça.  Foi uma “nova e aprimorada” geringonça cujo desenho original era o padrão ouro-câmbio, criado em 1922 na Conferência de Gênova.  Naquela conferência, os governos concordaram em estabelecer um “novo e aprimorado” padrão-ouro.  Ao invés de restabelecerem um padrão monetário com moedas de ouro totalmente conversíveis domesticamente, o que transferiria a autoridade monetária para os cidadãos, eles fizeram um acordo: ao invés de manterem ouro em seus bancos centrais, os países manteriam títulos da dívida emitidos pelos EUA e pela Grã-Bretanha, os quais renderiam juros.

A Grã-Bretanha retornou ao padrão-ouro em 1925, mas a uma taxa de câmbio vigente anterior à Primeira Guerra Mundial, como se não tivesse havido nenhuma inflação na quantidade de dinheiro em sua economia.  Ou seja, a taxa de câmbio da libra em relação ao ouro ficou artificialmente sobrevalorizada.  Essa foi a decisão de Churchill como ministro da fazenda.  Tal medida inevitavelmente forçaria a Grã-Bretanha ou a perder suas reservas de ouro ou a contrair sua oferta monetária.  O governo não queria nenhuma dessas opções.  Assim, Montagu Norman, presidente do Banco Central da Inglaterra, conseguiu persuadir seu amigo íntimo (muito íntimo) Benjamin Strong, presidente do Federal Reserve, a inflar a oferta monetária americana, de modo a evitar que houvesse uma corrida ao ouro do Banco Central da Inglaterra.  Strong fez isso até o dia de sua morte, em 1928.  O Fed então reverteu essa política já no final de 1928.  Ele parou de inflacionar a oferta monetária.  Isso estourou a bolha formada na bolsa de valores americana, levando ao crash de 1929.

O FMI criou um sistema de taxas de câmbio fixas.  Essas taxas não eram baseadas na conversibilidade em ouro.  Elas eram meros controles de preços.  O FMI fiscalizava o cumprimento dessa regra, mas não com grande eficiência.  De tempos em tempos, algum país desvalorizava sua moeda, isto é, se recusava a oferecer divisas estrangeiras à taxa de câmbio fixada.  O FMI não impunha sanções.  Assim, o sistema seguia cambaleante, de desvalorização em desvalorização.

Somente os EUA vendiam ouro a US$ 35 a onça para governos e bancos centrais.  Mas isso tornou-se insustentável em decorrência do grande aumento da oferta monetária ocorrida nos EUA.  O ouro estava saindo do país.  Após 1964, a França começou a exigir insistentemente a troca de seus dólares por ouro.  E o Federal Reserve continuou inflacionando.

A Geringonça de Milton Friedman

Friedman facilmente desmontou a ideia de taxas de câmbio fixas.  Taxas de câmbio fixas são uma forma de controle de preços.  Friedman era um economista bom o bastante para saber que controle de preços produz escassez.  A moeda artificialmente subvalorizada sai de circulação.  A moeda artificialmente sobrevalorizada torna-se abundante.  Ato contínuo, há uma corrida aos bancos centrais para que a moeda sobrevalorizada seja trocada por ouro.

Os compradores domésticos de bens estrangeiros (importadores) dizem ao banco central: “Venda-nos a moeda estrangeira artificialmente subvalorizada ao preço oficial”.  Com isso, o banco central fica sem reservas internacionais.  O comércio estrangeiro entra em colapso.  E aí ocorre uma desvalorização da moeda nacional.  Os preços oficiais das moedas estrangeiras são elevados a novas taxas de câmbio fixas.

Foi fácil para Friedman mostrar como todo esse arranjo era ridículo.  “Apenas deixem as moedas flutuarem”, disse ele.  “Deixe o livre mercado determinar o preço de cada uma delas”.  Esse foi um bom conselho.  Controles de preços nunca funcionam como propagandeado.  Eles sempre produzem escassezes ou excedentes.

Porém, foi aí que Friedman recomendou sua política favorita: papel-moeda puro, sem nenhum lastro.  Ele disse que tal arranjo poderia ser gerenciado racionalmente por meio de uma regra fixa determinando uma previsível expansão da quantidade de dinheiro.  “Deleguem essa tarefa para o Banco Central.  Tudo dará certo se Banco Central não alterar indevidamente a taxa de crescimento da oferta monetária”.

Nixon adotou essa geringonça criada por Friedman.  Primeiro, não mais haveria conversibilidade de moeda estrangeira em ouro.  Os dólares em posse de governos estrangeiros passariam a ser apenas aquilo que realmente são: papeis pintados, sem direito a serem trocados por ouro.

Durante pouco mais de dois anos, foi imposto um controle geral de preços sobre os bens americanos.  Tal controle de preços gerou escassez e uma desordem no comércio internacional.  O dólar só passou a flutuar oficialmente em dezembro de 1973.

Quando o controle de preços foi abolido, os preços dispararam.  Em 1975, o então presidente Gerald Ford criou o programa WIN: Whip Inflation Now (algo como Derrotemos a Inflação Agora).  A recessão de 1975 fez exatamente isso.  E então veio a pior inflação monetária ocorrida na história dos EUA em períodos de paz: 1976-80.  O preço do ouro e da prata disparou.

A geringonça de Friedman claramente não estava funcionando.  As taxas de câmbio flutuantes não eram o problema.  A abolição do padrão ouro-câmbio é que era o problema.

A geringonça de Friedman mergulhou todo o mundo em uma interminável sequência de inflação monetária, bolhas e recessões.

Stockman Comenta a Geringonça

Stockman culpa as taxas de câmbio flutuantes e a abolição do padrão-ouro.

Dificilmente pode-se negar que a abolição do padrão-ouro foi tão destrutiva para a disciplina fiscal quanto foi para a política monetária.  Sob o antigo regime de taxas de câmbio fixas e conversibilidade monetária, déficits fiscais sem lágrimas eram totalmente insustentáveis — não importava quais doutrinas econômicas fossem seguidas.

Naquela época, podia-se confiar que o mecanismo do dinheiro honesto iria sobrepujar as políticas ruins.  Assim, se os déficits orçamentários fossem monetizados pelo banco central, isso iria enfraquecer a moeda e provocar uma prejudicial fuga das reservas monetárias; e se os déficits fossem totalmente financiados com a poupança dos cidadãos, os juros inevitavelmente subiriam — o que desestimularia o investimento doméstico.

Foi uma análise precisa do que ocorreu.  Porém, a âncora do sistema não era o sistema de taxas de câmbio fixas, pois o FMI nunca teve a autoridade de zelar por sua aplicação.  A âncora era a promessa dos EUA de vender ouro a US$ 35 a onça.  Quando essa amarra foi cortada, e os EUA mantiveram todo o ouro consigo, o sistema monetário internacional ficou totalmente à deriva.  Hoje, essa âncora está armazenada nos cofres da sucursal do Federal Reserve de Nova York.

Nos bons e velhos tempos, observou Stockman, havia dor.  “Os políticos não precisavam ser profundamente versados na parábola de Bastiat sobre o que se vê e o que não se vê.  Os frutos amargos de todo e qualquer déficit orçamentário eram totalmente visíveis e imediatos.”  Isso acabou em 1971.

Durante as quatro décadas desde que o padrão-ouro foi completamente abolido, as regras do jogo fiscal foram completamente adulteradas.  Mais especificamente, sob a geringonça dos papeis-moedas flutuantes criada pelo professor Friedman, os estrangeiros podem acumular papeis redimíveis em dólares ou trocá-los por outras moedas de papel.

Porém, jamais poderá haver um esvaziamento das reservas monetárias americanas, pois títulos redimíveis em dólares não são conversíveis em nada mais que não seja dólares, os quais podem ser criados infinitamente pelo Fed.  Essa máquina infernal de criar dinheiro de papel, por conseguinte, gerou numerosas e lamentáveis consequências, mas a pior delas está no fato de ter facilitado a ilimitada monetização da dívida do governo americano.

O governo americano hoje está incorrendo em um déficit de US$ 1,6 trilhão.  Nada pode ser feito politicamente para impedir isso.  Estamos todos em um trem desenfreado.  Os freios principais foram removidos em 1971.  O único freio que restou é aquele que pode ser aplicado apenas pelos justiceiros do mercado (investidores que vendem títulos de dívida como protesto contra políticas inflacionárias ou de má gestão das contas pública).  Porém, a efetividade destes foi reduzida, uma vez que hoje é o Fed o principal comprador dos títulos da dívida americana, junto com os bancos centrais asiáticos.  Stockman observou que “o quantitative easing 2 feito pelo Fed, que consiste na compra de títulos da dívida americana, está sendo feito em escala tão maciça, que ele está literalmente comprando títulos do Tesouro no mercado secundário quase que na mesma velocidade com que os títulos estão sendo emitidos”.

Isso tudo seria culpa de Friedman?  Stockman, de certa forma, concede uma absolvição.

Em contraste, sob a geringonça inspirada pelo professor Friedman, os desequilíbrios da balança comercial nunca são corrigidos.  Eles apenas vão crescendo, crescendo e crescendo — até o dia em que se transformam em objeto de falatório estéril durante encontros meramente fotográficos organizados por uma sociedade chamada G-20.

Para sermos justos, o professor Friedman não previu um mundo com essa desenfreada flutuação cambial “suja”.  Com efeito, seria necessária uma imaginação poderosa para prever, quatro décadas atrás, que a China iria acumular $3 trilhões em reservas estrangeiras ou mais de 50% do seu PIB, e então insistir por várias décadas para que ela não manipulasse sua taxa de câmbio!

Minha resposta: foi tudo culpa de Friedman, intelectualmente falando.  Quando um economista recomenda uma política, ele também está recomendando seus efeitos.  Friedman falhou ao não prever aquilo que os economistas da Escola Austríaca haviam previsto: a abolição do padrão-ouro resultaria em uma total expansão do papel-moeda, e na consequente manipulação das taxas de câmbio — a flutuação suja.  Em um mundo gerido por bancos centrais que possuem o monopólio da moeda concedido pelos governos, e que não estão sujeitos a redimirem suas moedas em ouro, flutuação cambial suja é o único resultado totalmente previsível.

Porém, justamente por termos repetidamente insistido nessa previsão, década após década, a corrente dominante do pensamento econômico nos marginalizou.

Conclusão

Milton Friedman sempre foi muito astuto.  Ele aconselhou os governos a se tornarem mais eficientes, e eles obedeceram.  Eles utilizaram seu conselho para expandir seu poder e expandir seu alcance até nossas carteiras.

Nós o alertamos.  Ele não quis ouvir.  Seus seguidores também não ouviram.  Hoje, eles estão em silêncio, apenas observando e se limitando a resmungar sobre déficits potencialmente excessivos e sobre uma inflação de preços potencialmente excessiva.  Mas, em geral, eles continuam aprovando a existência de bancos centrais, principalmente a existência do Fed e toda a sua obra.

Todo o problema está na concepção original de geringonça: (1) o controle monopolista do governo sobre a moeda e (2) o sistema de bancos centrais, como existe atualmente.  Nesse quesito, Friedman era um defensor do governo.

O problema nunca foi as taxas de câmbio flutuantes ou o colapso de Bretton Woods em 1971.  Esses foram resultados inevitáveis de Bretton Woods, como Henry Hazlitt já alertava insistentemente no final da década de 1940, fato esse que levou à sua demissão do The New York Times.  Você pode ler exatamente o que ele previu.

Tampouco o problema estava na Conferência de Gênova em 1922, a engenhoca criada para solucionar a inflação que havia surgido como resultado da suspensão da conversibilidade na segunda metade de 1914, quando estourou a Primeira Guerra Mundial.

O problema todo começou em 1914, quando a Primeira Guerra fez com que todos os países saíssem do padrão-ouro, gerando um maciço confisco do ouro que pertencia ao povo: primeiro pelos bancos comerciais; depois pelos bancos centrais.

A geringonça criada por Milton Friedman foi apenas mais uma malfadada tentativa de lidar com os resultados desse confisco original.  Foi apenas mais um exemplo de seu enfoque: “O governo estava certo em confiscar o ouro e abolir o padrão-ouro.  Foi uma maneira eficiente de lutar uma guerra, assim como impostos retidos na fonte são eficientes e assim como vouchers educacionais são eficientes.”

Milton Friedman passou toda sua carreira defendendo a eficiência do livre mercado.  Porém, quando se tratava das grandes questões, ele confiava na eficiência e na boa vontade de políticos e burocratas.  “Confie na eficiência deles”.

Como os austríacos sempre alertaram, o estado se torna mais eficiente apenas para tiranizar as pessoas com maior eficácia em termos de custo.

A geringonça criada por Milton Friedman deixou incontrolável a expansão do estado assistencialista e belicista: incontrolável por causa da tributação via impostos retidos na fonte e incontrolável por causa da abolição do padrão-ouro.

Se isso é eficiência, incluam-me fora dessa.

Gary North
Gary North
Gary North ex-membro adjunto do Mises Institute, é o autor de vários livros sobre economia, ética e história. Visite seu website.
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