Thursday, November 21, 2024
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A economia do “Grande Reinício”

[Discurso proferido na reunião de setembro de 2023 da Property and Freedom Society, em Bodrum, Turquia]

Introdução  

Nos próximos 30 minutos, tentarei desenterrar os fundamentos político-econômicos que caracterizam o “Grande Reinício“.

Com base nesses insights, apresentarei uma avaliação das consequências econômicas do Grande Reinício, se este for colocado em prática.

Minha conclusão será que o Grande Reinício se baseia em ideias ideológicas comunistas-socialistas e fascistas, que, se implementadas, destruiriam a liberdade e a prosperidade e, presumivelmente, até mesmo a vida da grande maioria das pessoas do planeta.

Talvez possa parecer simplista ou exagerado para você, mas para mim, o Grande Reinício parece ser uma tentativa neomarxista-comunista de derrubar, uma receita para destruir, a sociedade livre existente no mundo ocidental (ou o pouco que resta dela).

Essa conclusão basicamente se baseia em uma visão bastante simples: a de que há apenas duas maneiras pelas quais as pessoas interagem umas com as outras.

O primeiro caminho é a ação voluntária. Exemplo: Eu te ofereço uma maçã por 1 US$, e você aceita minha oferta ou não – exatamente da maneira que você desejar; ou você me convida para jantar, e eu voluntariamente concordo ou recuso, fazendo o que eu achar melhor para mim.

A segunda forma é a coerção e a violência. Eu te forço a fazer algo que você não quer fazer por vontade própria, e se você me desobedecer, eu te castigo; ou você me ameaça com violência se eu me recusar a lhe dar o que você quer de mim.

Ação voluntária ou coerção e violência são os princípios gerais da interação humana – não há terceira opção, não há meio termo entre as duas. Tertium non datur.

Capítulo 1: Cooperação voluntária

O liberalismo e sua forma lógica e consistente, o libertarianismo, representam o caminho da cooperação voluntária.

O libertarianismo baseia-se no princípio da não-agressão. Ele proíbe a agressão física indesejada (seja ameaçada ou realizada) contra pessoas e seus bens.

O sistema de livre mercado, ou capitalismo, é a forma econômica compatível com o libertarianismo assim entendido.

O capitalismo é um sistema econômico no qual (1) os meios de produção são de propriedade privada. Aplica-se o respeito incondicional à propriedade: cada um é proprietário de seu corpo (possui autopropriedade) e dos bens que adquiriu por meios não agressivos – ou seja, pela “apropriação original” de bens não reivindicados anteriormente por outros, pela produção e troca voluntária (incluindo presentes). (2) As pessoas usam o dinheiro para fins de contabilidade econômica e comércio, possibilitando um grau avançado da divisão do trabalho, nacional e internacionalmente. (3) Os mercados são livres; Cada um é livre para oferecer seus bens, e cada um é livre para exigir os bens que deseja consumir. (4) No capitalismo “real” – que é compatível com o conceito libertário – não existe Estado (como o conhecemos hoje). Todos os produtos são oferecidos no mercado livre. Isso também inclui as leis “boas” e segurança, estradas, educação, moeda, crédito etc.

Capítulo 2: Coerção e violência

Agora, a outra forma de relacionamento interpessoal: a coerção e a violência. A coerção e a violência têm muitas formas e são os princípios básicos de muitas teorias sociais. Um exemplo disso é o marxismo.

O marxismo é a teoria político-econômica fundada por Karl Marx (1818-1883), usada para supostamente justificar uma demanda por transformação social. Segundo o marxismo, o desenvolvimento social é determinado pelos “fatores materiais de produção” (ferramentas, fábricas etc.). O progresso da tecnologia de produção material provoca uma crescente divisão do trabalho e cria riqueza material.

A crítica central de Marx é que os trabalhadores criam riqueza, mas ela está concentrada nas mãos de poucos capitalistas.

Segundo os marxistas, essa contradição básica – a classe trabalhadora produz riqueza, e os capitalistas se apropriam dela – só pode ser eliminada por um levante revolucionário, isto é, pela coerção e violência no sentido mais verdadeiro das palavras.

O marxismo exige que a classe trabalhadora exproprie os proprietários dos meios de produção e converta os meios de produção em propriedade comum.

O comunismo é construído sobre a doutrina do marxismo – e, portanto, seu fundamento também é a coerção e a violência. Luta por uma sociedade sem classes, uma sociedade sem governantes. Após o necessário colapso do capitalismo (com o qual os marxistas contam) e a derrubada violenta da estrutura de propriedade vigente – segue-se a fase do socialismo.

O socialismo refere-se à ordem econômica e social em que a propriedade dos meios de produção é nacionalizada – em outras palavras, na qual os proprietários foram expropriados pelo uso da coerção e da força.

No socialismo, um pequeno grupo de pessoas (ou, em casos extremos, apenas uma pessoa, um ditador) determina como os meios de produção devem ser usados – ou seja, o que deve ser produzido quando e em que quantidade – e também é determinado centralmente quem recebe o quê dos bens produzidos e quando.

Do ponto de vista dos comunistas, o socialismo deve ser apenas uma etapa de transição, no final da qual está a sociedade comunista sem classes, sem Estado, na qual tudo pertence a todos.

Como disse Vladimir Ilyich Ulyanov (1870 – 1924), mais conhecido como Lênin, em 1917: “A classe trabalhadora deve se desmembrar, esmagar a ‘máquina estatal pronta’ e não se limitar apenas a se apossar dela”.[1]

Na vida real, no entanto, os socialistas nunca haviam quebrado a “máquina estatal pronta”. A razão é óbvia, como observou Joseph Stalin (1878-1953): “O Estado é uma máquina nas mãos da classe dominante para suprimir a resistência de seus inimigos de classe”.[2]

Outra estratégia, mais sutil, para chegar ao socialismo é o socialismo democrático. Ela também é construída sobre coerção e violência.

O socialismo democrático pretende manter formalmente a propriedade dos meios de produção. No entanto, ao mesmo tempo, exige que os proprietários deixem de ter direito a 100% sobre os lucros que obtêm com a sua propriedade. Parte deve ser paga ao Estado por meio de impostos. Aqueles que resistirem serão punidos, jogados na cadeia e até mortos.

Através de maiorias parlamentares, o socialismo democrático garante que as condições que levam ao socialismo sejam gradualmente criadas (aumento de impostos, leis que restringem a propriedade privada, difusão de doutrinas socialistas etc.). O socialismo democrático difere apenas em grau, mas não categoricamente, do socialismo marxista.

O socialismo democrático normalmente faz uso do intervencionismo. O intervencionismo representa a ideia de que há um “meio-termo” viável entre capitalismo e socialismo: o bem de ambos pode ser aproveitado, e o mal de ambos pode ser eliminado. Essa ideia exige que o Estado intervenha na economia e na sociedade conforme julgar necessário para alcançar resultados politicamente desejáveis. As medidas intervencionistas incluem, por exemplo, impostos, proibições, subsídios, restrições comerciais, controles de preços (preços máximos ou mínimos), educação obrigatória etc.

Do ponto de vista econômico, no entanto, pode-se dizer que o intervencionismo está fadado ao fracasso. Ludwig von Mises deixou isso inequivocamente claro em seu Uma Crítica ao Intervencionismo de 1929, que o intervencionismo não cumpre suas promessas e que, se o intervencionismo for implementado cada vez mais até seu fim lógico, ele levará ao socialismo e até mesmo terminará em um sistema totalitário.

Um resultado do intervencionismo é o fascismo. O fascismo pode ser descrito como um “movimento de massas com líderes carismáticos”, e sua forma moderna remonta ao político italiano Benito A. A. Mussolini (1883-1945). Caracteriza-se por colocar os interesses da comunidade acima dos interesses do indivíduo (podemos falar de “anti-individualismo”) e dar aos governantes o poder de eliminar toda a concorrência.

Além disso, a vida econômica e social está incondicionalmente alinhada com os objetivos do fascismo. Nem é preciso dizer que o fascismo, seja sob que forma for, também se constrói na coerção e na violência, não na ação voluntária.[3]

Outro resultado do intervencionismo é o marxismo cultural. O marxismo cultural é um neologismo (dos anos 1990 que apareceu pela primeira vez nos EUA). É basicamente um processo de infiltração intelectual através do qual a revolução social e política é realizada.

As origens do marxismo cultural remontam ao teórico marxista italiano Antonio Gramsci (1891-1937). Ele acreditava que o marxismo não poderia ser estabelecido no Ocidente (ao contrário do Oriente) através de uma revolução violenta, como na Rússia. Ele argumentou que uma abordagem diferente era necessária, ou seja, derrubar o sistema burguês de moral e valores: uma vez que o casamento, a família, a propriedade, a lei, as fronteiras, a nação e a fé cristã fossem relativizados e desacreditados, o terreno estaria preparado para uma revolução marxista.

Nas últimas décadas, surgiu outro conceito, também baseado na coerção e na violência, usualmente chamado de “globalismo político”.

Por trás do globalismo político está a visão de que o destino da humanidade não deve ser deixado ao livre mercado, mas deve ser moldado e controlado por uma autoridade, um corpo político central. Sejam crises econômicas e financeiras, climáticas, terrorismo ou epidemias. De acordo com os globalistas políticos, a comunidade de Estados, idealmente um governo mundial que exerce todo o poder que deseja, deveria consertar as coisas.

Capítulo 3: Anatomia do “Grande Reinício”

O globalismo político nos leva diretamente à ideia do Grande Reinício.

O Grande Reinício é promovido em particular pelo Fórum Econômico Mundial (FEM). Ele não é uma teoria ou estratégia detalhada e explicitamente formulada. Em vez disso, é um conglomerado de visões completamente fascinantes do futuro, assustadores cenários ameaçadores e fantasias e fantasmas de transformação econômica e social de longo alcance, cujas consequências econômicas geralmente permanecem obscuras.

Vamos dar uma olhada mais de perto nos blocos de construção mais importantes que compõem o Grande Reinício.

#1: “Capitalismo das partes interessadas”. Isto significa que os proprietários das empresas não devem continuar a servir apenas os seus próprios interesses, mas, sobretudo, os interesses de terceiros.

#2: “Governança Ambiental, Social e Corporativa” (“ESG”): Os investidores de capital são instados a investir em empresas que ostentem o selo ESG – e um bom selo ESG é concedido apenas às empresas que aderem a critérios politicamente prescritos.

#3: “Wokeismo”: Esta é a noção psicológica de criar conflitos entre as pessoas, de destruir a coesão pacífica entre as pessoas, de incutir culpa e complexos de inferioridade nas pessoas, por exemplo, que elas só estão indo bem porque os outros estão indo mal, que é bom e certo desejar menos.

#4: “Catastrofismo climático”: De acordo com essa teoria, a Terra e seus habitantes morrerão se o capitalismo não for abolido. Os Estados devem ser colocados no banco do motorista – e restringir, controlar e suspender o sistema de livre mercado, e restringir, até mesmo acabar, a liberdade individual.

#5: “Transhumanismo”: A ideia de expandir as possibilidades dos seres humanos através das tecnologias modernas, mais precisamente: “hackear” o que constitui o ser humano, informatizando seu ser espiritual.

#6: “Quarta Revolução Industrial” (“RI4 “): A convulsão tecnologicamente impulsionada e politicamente promovida da produção e da sociedade através de novas tecnologias (Inteligência Artificial, Robótica, Genética), Comunicação Máquina-a-Máquina, Contratos Inteligentes, Internet das Coisas, Internet dos Corpos, Realidade Aumentada (RA), Realidade Virtual (VR) e Realidade Mista (MR), o Metaverso – e especialmente a introdução da “Moeda Digital do Banco Central” – vou chegar a isso em um momento.

#7: Lockdowns: A paralisação da atividade econômica e social também faz parte da caixa de ferramentas dos Grandes Reiniciadores para atingir seus objetivos.

#8: Parceria público-privada: O Estado une forças com as (grandes) empresas para atingir determinados objetivos (no que diz respeito, por exemplo, ao clima, à saúde, a moeda e ao crédito), ou as grandes empresas (big business, big tech, big pharma, big banking) usam o Estado para seus fins; Estado e grandes empresas entram em simbiose.

De importância central para difundir a ideia do Grande Reinício é que seus representantes apontam e dramatizam problemas – como mudanças climáticas, poluição ambiental, epidemias, desigualdade de renda etc. – e os rotulam como ameaças existenciais à humanidade. As possíveis soluções que os representantes do Grande Reinício recomendam para lidar com os problemas levantados, são invariavelmente o intervencionismo estatal.

Capítulo 4: Interpretação Teórica

Como o Grande Reinício, ou melhor, seus blocos de construção, podem ser teoricamente interpretados em termos da história das ideias?

É óbvio que a ideia de que o capitalismo é mau é de origem marxista; o capitalismo é a causa das queixas que os defensores do Grande Reinício abominam.

A exibição de cenários ameaçadores também tem claras reminiscências da teoria marxista do empobrecimento.

Como um lembrete, para encorajar o apoio ao socialismo-comunismo, as pessoas foram incutidas com medo de que o capitalismo empobreceria um grande número de pessoas, as deixaria morrer de fome e que apenas muito poucas pessoas lucrariam com isso. Quem não quisesse isso teria que acabar com o capitalismo e ajudar o socialismo-comunismo a avançar.

Não é preciso muito para perceber que isso é profundamente anticapitalista, hostil ao capitalismo, e a orientação e o controle do Estado devem se sobrepor ao que resta do livre mercado.

O Grande Reinício se utiliza do intervencionismo, não pede abertamente uma revolução comunista, não prevê nacionalizar a propriedade privada no curso de uma tomada violenta. No entanto, a implementação da agenda do Grande Reinício levará previsivelmente a uma mudança forçada de fato nas estruturas de propriedade, uma expropriação de fato de muitos proprietários de propriedade privada.

Considere, por exemplo, que abrir mão dos combustíveis fósseis reduzirá drasticamente a renda e a riqueza de muitas pessoas. Os rendimentos reais diminuem e as pessoas empobrecem.

Por exemplo, muitas pessoas não podem mais pagar por imóveis como apartamentos e casas. Elas têm que vendê-los. Isso permite que grandes bancos e empresas de investimento (que têm custos de refinanciamento favoráveis) comprem terrenos, casas e apartamentos e os ofereçam para aluguel. Antigos proprietários de apartamentos tornam-se “escravos de aluguel”.

Ou: pequenas e médias empresas enfrentam problemas quando o poder de compra de seus clientes diminui, elas não têm força financeira para sobreviver e aos lockdowns de vírus e climáticos. Elas quebram, ou são compradas por grandes empresas.

O wokeismo pode ser entendido como um alinhamento direto com o marxismo ou o marxismo cultural. Visa não só destruir as relações sociais existentes para provocar agitação e conflito, mas também desmoralizar e desencorajar as pessoas – porque, como sabemos, isso enfraquece a resistência das pessoas a desenvolvimentos que não tolerariam sem desmoralização e desânimo. Dessa forma, o Estado pode restringir e revogar com relativa facilidade as liberdades dos cidadãos e empresários.

Acima de tudo, o wokeismo também garante que as pessoas digam adeus interiormente ao princípio da realização, ao capitalismo e à busca de uma vida material melhor. O sistema de livre mercado, a concorrência e a busca por ser melhor do que os outros são desacreditados.

O wokeismo até se baseia (geralmente não abertamente) no polilogismo com que os marxistas procuravam invalidar, difamar e desacreditar seus oponentes. Por exemplo, a afirmação de que existem mais de dois sexos biológicos, ou que a “lógica” é uma expressão da “supremacia branca”, que não existe apenas uma lógica.

O Grande Reinício não tem apenas elementos marxistas-socialistas-comunistas, mas também inequivocamente fascistas. Bastante óbvio, por exemplo, é como as corporações se aproveitam para atingir objetivos políticos (por exemplo, a redução de CO2 ou conversão de alimentos – longe do consumo de carne para alimentos artificiais, incluindo insetos).

A tão propalada “parceria público-privada” de hoje é, no fundo, uma expressão do conceito fascista: as empresas privadas tornam-se uma extensão do Estado e dos seus interesses. Dessa forma, o Estado ganha uma enorme expansão de suas capacidades financeiras e de pessoal; o setor corporativo torna-se um ramo do governo – estabelece-se um regime de “governamentalidade”, ou seja, o setor corporativo como um semi-Estado funcionando em nome e como parte do próprio Estado.

Visto sob esse prisma, o Grande Reinício atende plenamente à ideia de globalismo político, segundo a qual os povos deste mundo não devem moldar seus destinos em um sistema de livre mercado, mas sim que seu modo de vida deve doravante ser dirigido e controlado por uma autoridade mundial central – uma elite mundial tecnocrática, um “conselho mundial dos iluminados”.

Nesse contexto, não é difícil perceber que o Grande Reinício contém elementos que indiretamente ou diretamente promovem ou (podem) evocar estruturas totalitárias.

Talvez a ferramenta técnica mais óbvia para isso seja a emissão de moeda digital do banco central.

Capítulo 5: Moeda digital do banco central

Que os bancos centrais estejam trabalhando para emitir moeda digital do banco central não é surpreendente à luz do que foi dito até agora.

Os Grandes Reiniciadores preveem e defendem que basicamente todas as transações da vida cotidiana serão mapeadas digitalmente, até a “Internet dos Corpos”, para armazenar a atividade cerebral de todos na Internet.

Ter tudo acontecendo na Internet também inclui adaptar as transações de dinheiro às necessidades e possibilidades digitais. Em particular, o dinheiro programável é de grande interesse para o Grande Reinício.

Poder-se-ia, é claro, usar dinheiro fiduciário convencional produzido por bancos comerciais para esse fim e em forma tokenizada. No entanto, a moeda digital dos bancos centrais está sendo defendida porque há enormes oportunidades de controle e poder associadas aos bancos centrais emissores e aos grupos de interesse especial que buscam aproveitá-los para seus próprios fins.

Aqui estão apenas algumas das consequências da questão da moeda digital do banco central: (1) O dinheiro digital do banco central substitui o dinheiro em espécie. Assim, os consumidores e os produtores perdem completamente a sua privacidade financeira e tornam-se transparentes.

(2) Uma vez que o dinheiro digital do banco central se tornou suficientemente difundido, o banco central pode literalmente aumentar a oferta de moeda na economia com o apertar de um botão. A possibilidade de abuso da inflação, que é colocada nas mãos dos Estados e de seus bancos centrais, é praticamente maximizada.

(3) A alocação da moeda digital do banco central é baseada no princípio da arbitrariedade: o banco central decide quem recebe quanto dinheiro e quando – e quem não recebe nenhum. Alguns são favorecidos pela política, outros são desfavorecidos. Com o dinheiro digital do banco central, a derrubada das relações de renda e riqueza pode ser alcançada mais facilmente do que nunca usando meios monetários.

(4) A moeda digital do banco central pode ser combinada com uma pontuação de crédito social. O tipo de comportamento que está de acordo com o sistema é favorecido, enquanto a crítica ou mesmo a resistência ao sistema é punida. Por exemplo, as opções de pagamento com MDBC são restritas se uma quantidade máxima de carne politicamente prescrita for consumida, distâncias máximas de viagem forem excedidas ou livros politicamente indesejáveis forem comprados.

Não é difícil imaginar o que acontecerá se a moeda digital do banco central estiver mesmo vinculada a um passaporte digital de vacinação e a uma identificação digital: seria um controle total de um tipo nunca antes visto na história. O mundo se tornaria uma prisão digital – ou: gulag digital, como disse Michael Rectenwald – em comparação com o que o 1984 de George Orwell pareceria uma suave brisa primaveril.

Capítulo 6: Para onde o Grande Reinício nos leva

Uma análise econômica revela que o Grande Reinício não pode criar um mundo melhor, mais justo e próspero. Trata-se de uma economia de comando dirigida pelo Estado, baseada na coerção e na violência, que previsivelmente produzirá escassez, pobreza, fome e até tirania. As moedas digitais dos bancos centrais podem criar um mundo de controle total.

Os esforços dos formuladores de políticas para esconder da população em geral os custos da transição para o Grande Reinício – como perdas de produção e emprego – previsivelmente causarão enormes aumentos nos gastos do governo financiados por crédito.

Os bancos centrais comprarão a onda de títulos públicos e colocarão dinheiro novo em circulação. O resultado será a inflação de preços de bens cada vez maior e a destruição da sociedade civil – especialmente se e quando as moedas digitais do banco central se tornarem o tipo dominante de dinheiro.

O esforço fanático para acabar com o uso de combustíveis fósseis, acompanhado por uma restrição ou aumento politicamente deliberado do preço dos alimentos, não apenas abrirá o caminho para a pobreza para muitas pessoas, mas também representará uma séria ameaça à sobrevivência de grande parte da humanidade.

Capítulo 7: Parar e reverter o Grande Reinício

É possível deter o avanço do Grande Reinício, reverter o “progresso” já feito?

Sim, isso é perfeitamente possível. O destino da humanidade neste planeta não está pré-determinado, como querem fazer crer os marxistas. Pelo contrário, é a ação do homem no mundo que determina decisivamente o seu futuro.

E como a ação humana é, em última consequência, indiscutivelmente determinada por ideias ou teorias, ideias e teorias são, no final, o campo de batalha no qual devemos resistir ao Grande Reinício se quisermos detê-lo e revertê-lo.

Ludwig von Mises formulou isso de forma impressionante:

    “Somente ideias podem superar ideias e somente as ideias do capitalismo e do liberalismo podem superar o socialismo. Somente através de uma batalha de ideias se pode chegar a uma decisão.[4] … “A sociedade humana é uma questão da mente. A cooperação social deve primeiro ser concebida, depois desejada, depois realizada em ação. São as ideias que fazem a história, e não as “forças produtivas materiais, aqueles esquemas nebulosos e místicos da concepção materialista da história”.[5]

Presumivelmente, no entanto, não basta ensinar as pessoas sobre economia sólida para secar a fonte do Grande Reinício. Pelo contrário, um “novo iluminismo ” também é necessário. O que quero dizer com um novo iluminismo?

Foi o filósofo do Iluminismo e nativo de Königsberg, Immanuel Kant (1724-1804), quem deu às pessoas o ideal de autonomia razoável.

Por autonomia, Kant se refere a capacidade de conduzir a vida de maneira autodeterminada, de acordo com regras que estabelece para si mesmo, e, de acordo com Kant, uma pessoa razoável é aquela que define as regras que segue para si mesma, e só o faz depois de dar conta de sua aceitabilidade geral.

O ideal de iluminismo de Kant mostra que cada um é chamado a pensar por si mesmo, e que cada um tem que superar sua covardia e tomar coragem para pensar por si mesmo, não é obrigado a seguir “opiniões de especialistas”, autoridades e sacerdotes de opinião autonomeados. Em vez disso, a regra é “Sapere aude!” Ouse usar sua própria mente!

Mas, infelizmente, a falta de coragem do homem e, não raro também, sua preguiça de pensar por si mesmo fazem com que ele permaneça no estágio do pré-iluminismo – ou mesmo caia nele novamente; a mais recente crise do coronavírus é certamente um exemplo de anti-iluminismo.

Felizmente, um resultado do pensamento esclarecido pode ser entendido com bastante facilidade: ninguém tem o direito de governar sobre os outros, e pode-se justificar tal afirmação logicamente. E a forma humana de interação associada ao iluminismo é a ação voluntária, não a coerção e a violência.

No entanto, o mundo dos Estados tal como o conhecemos hoje baseia-se precisamente na coerção e na violência, não na ação voluntária. Não há bênção nisso, e aceitar e tolerar o Estado (como o conhecemos hoje) tem consequências ruins, na verdade destrutivas.

O Estado como o conhecemos hoje está se tornando cada vez maior e mais poderoso, expandindo-se incansavelmente, destruindo as liberdades civis e empresariais. E mesmo um estado mínimo, mais cedo ou mais tarde, se tornará um estado máximo, como Hans Hermann Hoppe (*1949) expõe de forma incisiva.[6]

Visto sob esse prisma, o Grande Reinício nada mais é do que uma manifestação concreta desse insight (lógico-ação): grupos de interesse especial aproveitam o poder do Estado para seus propósitos ideológicos, e o Estado ganha apoiadores poderosos ao conceder privilégios. É o Estado que possibilita algo como o Grande Reinício, que é antieconômico, anti-humano, antimoral e anti-iluminista.

Mas, uma vez que tenha ficado claro que o Estado (como o conhecemos hoje) é baseado na coerção e na violência, e que o Grande Reinício é, em última análise, apenas uma manifestação concreta da escalada da tirania estatal, nenhuma pessoa esclarecida pode dar seu consentimento a esse desenvolvimento, pelo contrário, elas são instadas a pará-lo e revertê-lo – com a ajuda de uma economia sólida e, de modo algum menos importante, um novo iluminismo.

Muito obrigado pela atenção!

 

 

 

Artigo original aqui

_______________________________

Notas

[1] Lênin, V. I. (1917), Estado e Revolução, p. 28.

[2] Stalin, J. (1924), Os fundamentos do leninismo, p. 40.

[3] Historicamente, é importante que se diga aqui, nem todas as formas de fascismo foram igualmente desumanas e destrutivas. Assim, a “perfeição totalitária” do fascismo italiano era menor do que a do fascismo alemão sob os nacional-socialistas.

[4] Mises, L. v. (1932), Socialismo, p. 494.

[5] Ibidem, p. 509.

[6] Ver A ordem da propriedade privada: uma entrevista com Hans-Hermann Hoppe.

Thorsten Polleit
Thorsten Polleit
Thorsten Polleit é economista-chefe da empresa Degussa, especializada em metais precisos, e co-fundador da firma de investimentos Polleit & Riechert Investment Management LLP. Ele é professor honorário da Frankfurt School of Finance & Management.
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1 COMENTÁRIO

  1. Lendo este artigo é que entendi porque tanto soças quanto liberaloides odeiam a Igreja Católica anterior ao Concílio Vaticano II – a única verdadeira: ela é um freio moral – economia moral, ao iluminismo e seu humanisno decadente e do igualitarismo.

    Que Deus nos ajude.

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