Em 2 de julho de 1881, apenas quatro meses após o início do primeiro mandato do presidente James A. Garfield, um furioso advogado de Illinois chamado Charles J. Guiteau deu um tiro no peito de Garfield em uma estação de trem de Baltimore, Maryland. Guiteau tinha um motivo. Ele estava indignado porque acreditava, devido ao seu trabalho na campanha, que Garfield lhe daria um emprego no novo governo. Mas nenhum veio. Foi vingança. Garfield morreu dos ferimentos meses depois.
Foi uma coisa chocante. O Congresso imediatamente começou a trabalhar para descobrir como evitar o próximo assassinato. Eles tinham a teoria de que precisavam acabar com o sistema de clientelismo no governo para que as pessoas não ficassem bravas por ficarem de fora e atirassem no presidente. Não é uma teoria muito boa, mas é assim que a política funciona. O resultado foi a lei Pendleton que criou um serviço público permanente. O novo presidente, Chester Arthur, assinou o projeto de lei em 1883. Estava feito: nascia o estado administrativo.
O que o Congresso não entendeu na época foi que eles haviam alterado fundamentalmente o sistema de governo americano. A Constituição em nenhum lugar prevê uma classe permanente de senhores administrativos a quem o Congresso poderia terceirizar sua autoridade. Em nenhum lugar ela diz que existiria uma máquina tecnicamente acima do Poder Executivo que o presidente não poderia controlar. A lei Pendleton criou uma nova camada de imposição estatista que não estava mais sujeita ao controle democrático.
Não foi tão ruim no começo, mas depois veio o Banco Central, o imposto de renda e a Grande Guerra. A burocracia expandiu-se em alcance e poder. A cada década que passava, as coisas pioravam. A Guerra Fria entrincheirou o complexo militar-industrial, e a Great Society construiu um enorme estado de bem-estar social de controle civil. Assim foi até hoje, quando não se sabe nem mesmo que os políticos fazem alguma diferença.
Para citar apenas um exemplo, quando Donald Trump descobriu que havia sido enganado por Anthony Fauci, Trump decidiu demiti-lo. Então ele descobriu: ele não podia. A lei não permite isso. Trump certamente ficou surpreso ao ouvir isso. Ele deve ter se perguntado: como isso é possível? É muito possível. Esse mesmo status vale para milhões de servidores federais, entre 2 e 9 milhões, dependendo de quem se quer incluir como parte do estado administrativo.
A mudança é mesmo possível?
Dizem que as eleições de novembro trarão mudanças dramáticas ao cenário político em Washington. E dois anos depois, a presidência mudará de um partido para o outro. Está se tornando muito evidente que este governo e o partido que ele representa provavelmente estão fritos. É só esperar a próxima eleição.
Graças a Deus pela democracia, certo? A pergunta certa a fazer é se isso vai mudar alguma coisa. Não é nenhum cinismo duvidar que muita coisa vá mudar. O problema está embutido na estrutura do governo hoje, que não é como os formuladores da Constituição imaginavam que fosse.
A ideia de democracia é que o povo está no comando por meio de seus representantes eleitos. O oposto seria, por exemplo, uma vasta e permanente classe de burocratas administrativos, que não ligam para a opinião pública, às eleições ou aos líderes eleitos e suas nomeações.
É triste dizer, mas esse é exatamente o sistema que temos hoje.
Seus verdadeiros governantes
Os últimos dois anos nos deram uma lição arrepiante sobre quem realmente governa o país. São as agências de nível executivo que não respondem a nada nem a ninguém, exceto talvez as forças de poder do setor privado que têm portas giratórias formando uma simbiose entre os interesses corporativos e os órgãos públicos. Os nomeados políticos escolhidos para chefiar agências como o CDC ou HHS ou o que quer que seja são basicamente irrelevantes, marionetes de quem os burocratas de carreira riem, isso se chegarem a saber quem eles são.
Anos atrás, eu morava em um condomínio em Washington e todos os meus vizinhos eram funcionários de carreira de órgãos federais. Você escolhe: Transporte, Trabalho, Agricultura, Habitação, o que for. Eles eram eternos e sabiam disso. Seus salários dependiam de avaliações meramente burocráticas e sequência na carreira. Não havia como eles serem demitidos, a não ser algo absurdamente grave e que atraia muita atenção pública.
Ingenuamente, no começo tentei falar conversar com eles sobre questões de política. Eles olhavam para mim com rostos vazios. Eu pensei na época que eles deveriam ter opiniões fortes, mas de alguma forma eram impedidos de falar sobre isso.
Mais tarde, percebi algo mais arrepiante: eles não se importavam nem um pouco. Falar com eles sobre política era como falar comigo sobre times de hóquei na Finlândia. Não é um assunto que afeta minha vida. É assim com essas pessoas: elas são totalmente e completamente não afetadas por quaisquer mudanças políticas. E elas sabem disso. Elas se orgulham disso.
Um quadrinho na parede
Mais ou menos na mesma época, por razões inusitadas, passei várias semanas nos escritórios do Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano. Eu estava fazendo pesquisas e tive acesso total a todos os registros, quando fazer algo assim era possível para um cidadão comum. Era uma época em que o antigo diretor nomeado politicamente do departamento estava saindo e um novo estava entrando.
Eu estava trabalhando em silêncio quando ouvi uma série de estrondos de vidro no corredor. Eu coloquei minha cabeça para fora e observei. Um cara estava andando, arrancando os quadros com as fotos do cara antigo da parede e deixando-os cair no chão. Cerca de uma hora depois, um funcionário veio com uma vassoura e varreu a bagunça. Uma hora depois disso, um funcionário apareceu e pendurou outros quadros com fotos do cara novo na parede.
Durante toda a barulhenta, nenhum outro funcionário da agência esboçou a menor curiosidade sobre o que estava acontecendo. Eles tinham visto isso dezenas de vezes e simplesmente não se importavam. Relembrando o episódio, é bastante óbvio que esta cena resume tudo. A burocracia permanente não é afetada por nenhuma das mudanças cosméticas na política.
Digamos que 2 milhões de pessoas ocupem o estado administrativo permanente, excluindo coisas como militares e funcionários dos correios. As nomeações políticas concedidas ao novo presidente são cerca de 4.000 e elas vêm e vão. A política é mortal; a burocracia é imortal.
Certamente, os republicanos poderiam tentar resolver esse problema. Mas eles irão tentar? Quase todo líder eleito tem algo a esconder. Se não tiver, a mídia sempre pode inventar algo. É assim que o estado administrativo mantém a classe política na linha, como vimos durante os anos Trump.
Não sejamos ingênuos sobre as perspectivas de mudança. Será preciso muito mais do que simplesmente eleger uma nova classe de supostos governantes por meio do processo democrático. Os verdadeiros governantes são espertos demais para se submeterem a eleições. Esses são projetados para manter nossas mentes ocupadas com a crença de que a democracia ainda sobrevive e, portanto, são os eleitores, não o governo, os responsáveis pelos resultados.
Até que o público descubra essa jogada, uma mudança genuína ainda vai demorar muito. Enquanto isso, a crise econômica emergente vai desencadear o estado administrativo como nunca antes.
Artigo original aqui
Artigo extremamente interessante. Esse é tipicamente um assunto que me interessa. Enquanto os bobos da corte mantém as massas entretidas, os burocratas não-eleitos deitam e rolam. É patético ler na mídia maistream que altos funcionários do banco central renunciaram a seus cargos por causa do fascismo do atual governante, como se eles fossem no outro dia par a fila do desemprego…
Tem um episódio curioso que eu li anos atrás em um dos livros do Elio Gaspari que demonstra a força da burocracia não-eleita, o verdadeiro poder do estado. Eu acho que foi um general chamado Mourão Filho, em 1964. Ele estacionou um tanque de guerra na frente da sede Petrobras no Rio. Entrou com a tropa, baionetas caladas e todo aquele espetáculo que os milicos adoram e anunciou: agora o presidente da Petrobras sou eu. Tinha um gaiato por lá que perguntou se o general era acionista da Petro. Como ele não era, não podia ser presidente. E não foi mesmo…