Thursday, November 21, 2024
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Capítulo I – Introdução

1. Canonização

O economista mais famoso do século XX é John Maynard Keynes; e o livro de economia mais influente da era atual, tanto em teoria quanto em política econômica, é seu livro Teoria Geral do Emprego, Juros e Dinheiro, publicado em 1936.

Este fato é reconhecido não só pelos seus admiradores e seguidores, mas até por seus maiores críticos. Abra qualquer edição de um periódico acadêmico de economia e lá estará o seu nome e os termos cunhados por ele ou popularizou encontrados dispersos pelas páginas do periódico. Abra o jornal, e você verá interpretações de acontecimentos da economia atual, ou propostas de políticas econômicas e monetárias, às quais se deve sua popularidade, ou até sua origem, aos seus trabalhos.

Para demonstrar o grau especial que ocupa a reputação de Keynes, escolhi algumas frases praticamente aleatoriamente.

Logo após sua morte, o London Times[1] o descreveu como:

“um grande inglês… um homem de genialidade, que como um economista político teve influência mundial no ponto de vista dos especialistas assim como do público em geral… Para se encontrar um economista de influência comparável, dever-se-ia voltar na história até Adam Smith”.

D. H. Cole, o economista socialista, disserta sobre a Teoria Geral:

“O escrito teórico de economia mais importante desde o Capital de Marx, ou, considerando somente a economia clássica, desde os Princípios de Ricardo… O que ele fez, conclusivamente e com sucesso, foi demonstrar a falsidade, mesmo de um ponto de vista capitalista, das “morais” práticas mais valorizadas dos economistas ortodoxos e construir uma teoria alternativa do funcionamento do capitalismo tão próxima aos fatos que será impossível deixá-la de lado ou ignorá-la.”

O professor Alvin H. Hansen de Harvard, visto como o principal seguidor americano de Keynes, escreve sobre o mesmo livro:

“Há poucos que negariam, atualmente, dezessete anos depois, que este livro mudou mais o cenário econômico, mesmo em um curto espaço de tempo, do que qualquer livro desde Economia Política de David Ricardo. Apesar de ser muito cedo para confirmar que, junto a Origem das Espécies de Darwin e das Kapital de Marx, a Teoria Geral é um dos livros mais significativos dos últimos cem anos… Mas, continua a ganhar importância.”[2]

Na visão extremamente positiva de alguns admiradores, até os erros do livro têm valor positivo. O professor Paul A. Samuelson, do Massachusetts Institute of Technology, autor do livro universitário de economia mais usado atualmente, escreve sobre a Teoria Geral:

“É um livro mal escrito e mal organizado; qualquer leigo que comprou o livro analisando pela reputação anterior do autor foi enganado. Não é um livro bom para uso em salas de aula. É um livro arrogante, mal-humorado, polêmico, e não muito generoso em seus reconhecimentos. É um livro extremamente confuso… resumidamente, é um escrito genial.”[3]

Mais estranho ainda é a implicação de Samuelson de que a própria obscuridade do livro é uma vergonha, não para os discípulos de Keynes, mas principalmente para seus críticos:

“Vale a pena repetir que a Teoria Geral é um livro obscuro para que os anti-keynesianos possam assumir a sua real posição em relação ao crédito”.[4]

Evidentemente não é difícil encontrar o extravagante julgamento de R. F. Harrod, o biógrafo de Keynes:

“Explicando o assunto de maneira direta, eu acredito que o historiador econômico do futuro valorizará a assistência dada por Keynes na “estrada do progresso” como muito mais importante do que seu famoso mestre, Alfred Marshall. Ele é, no meu julgamento, um economista do mesmo nível de Adam Smith e David Ricardo. Em precisão lógica ele foi altamente superior a Adam Smith, e em lucidez de escrita, superior a Ricardo.”[5]

O professor Dudley Dillard da Universidade de Maryland, em seu livro a Economia de John Maynard Keynes escreve:

“Por quaisquer medidas, Keynes está entre um dos grandes economistas de todos os tempos e é o pensador economista mais influente já produzido pelo século 20…

Após as primeiras décadas de sua publicação, a Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda (1936) influenciou mais os economistas profissionais e a política pública na história em total da economia do que qualquer outro livro em toda a história do pensamento econômico em um espaço comparável de tempo. Assim como a Riqueza das Nações de Adam Smith no século 18 e O Capital de Karl Marx no século 19, a Teoria Geral de Keynes tem sido um ponto de controvérsias entre escritores, tanto profissionais quanto não profissionais. O livro de Smith foi um grande desafio ao então dominante mercantilismo, o livro de Marx é uma pesquisa crítica do capitalismo, e o livro de Keynes é uma visão oposta aos fundamentos do laissez faire. Muitos economistas reconhecem grande valor aos pensamentos revolucionários do lorde Keynes.

Se a influência do lorde Keynes fosse limitada ao campo da doutrina econômica técnica, seria de pouco interesse ao mundo em geral. Mas, a teoria econômica prática leva consideravelmente mais profundamente o “selo” de Keynes do que a economia teórica.”[6]

Citações como estas poderiam ser continuadas indefinidamente, mas seria muito repetitivo fazê-lo. Mesmo os críticos mais radicais das teorias de Keynes não questionam a amplitude de sua influência. Apenas citarei uma:

“A sua influência [de Keynes] na presidência de Roosevelt foi considerável. Sua influência sobre a maioria dos economistas nos ministérios do Governo é incrivelmente alta. Foi escrito um volume de literatura teórica tão extenso sobre Keynes quanto foi escrito na base das obras de Karl Marx.”[7]

2. Usos da refutação

No entanto, sobre a Teoria Geral há um estranho paradoxo. A literatura keynesiana talvez tenha crescido para centenas de livros e milhares de artigos. Há livros totalmente dedicados a expor a Teoria Geral em termos mais simples e inteligíveis. Mas no lado crítico há uma grande escassez. Os não-keynesianos e antikeynesianos se contentaram ou com artigos curtos, algumas páginas parentéticas, ou uma breve rejeição da teoria de que seu trabalho vai desmoronar de suas próprias contradições e logo será esquecido. Não conheço nenhuma obra que se dedique a uma análise crítica capítulo por capítulo ou teorema por teorema do livro. É esta tarefa que estou realizando aqui.

Tendo em conta as citações que acabo de fazer, tal empreendimento não deveria exigir desculpas. Mas há duas objeções possíveis que gostaria de considerar. A primeira é a afirmação de que as teorias de Keynes têm vindo a perder rapidamente a sua influência nos últimos anos, que têm sido refutadas pelo curso real dos acontecimentos, e não requerem mais nenhuma resposta. A segunda é a afirmação de que só precisamos de apresentar teorias verdadeiras numa forma positiva; que é de pouco valor analisar o erro porque as possibilidades de erro são infinitas e a mera afirmação da verdade é em si uma refutação do erro.

A respeito da primeira dessas possíveis objeções, posso responder que embora tenha havido alguma diminuição da influência de Keynes, e embora várias de suas teorias tenham recebido um enterro decente, sua influência tanto no pensamento acadêmico quanto na política prática ainda é tremenda. De qualquer forma, seria um desserviço esclarecer o pensamento simplesmente para permitir que suas teorias sejam esquecidas, mesmo se assumirmos que isso é o que pode ocorrer. “Uma das peculiaridades da especulação recente, especialmente na América”, escreveu Santayana, “é que as ideias são abandonadas em virtude de uma mera mudança de sentimento, sem qualquer nova evidência ou novos argumentos. Hoje em dia não refutamos os nossos antecessores, despedimo-nos agradavelmente deles”.[8]

Simplesmente dizer adeus aos nossos antecessores não traz mais clareza ou progresso de pensamento. A menos que saibamos não só que alguma doutrina do passado estava errada, mas precisamente porque estava errada, não aprendemos todas as lições que o erro tem para nos ensinar, e há um perigo real de que ele possa fazer sua aparição em outra forma.

Na história do pensamento, grandes novas contribuições têm sido frequentemente feitas como uma espécie de subproduto do que originalmente se pretendia que fosse meramente refutação. A Riqueza das Nações de Adam Smith cresceu em grande parte a partir de uma refutação dos erros dos mercantilistas. O famoso ensaio de Malthus sobre População surgiu de uma tentativa de refutar as doutrinas otimistas de Godwin. A Crítica da Razão Pura de Kant começou como um esforço para refutar as teorias de Hume. O Exame da Filosofia de Sir William Hamilton, de John Stuart Mill, tornou-se mais famoso do que qualquer um dos escritos do filósofo que ele atacou.

Espero não ser considerado suficientemente presunçoso para comparar o presente trabalho modesto com nenhum dos grandes livros que acabo de mencionar. Eu os cito meramente para mostrar que a refutação do erro está longe de ser uma ocupação fútil. É um método importante, não apenas para defender, expor e esclarecer as verdades conhecidas, mas para avançar para novas verdades e para um maior discernimento. Como a lógica e a matemática suficientemente provam, quanto mais compreendemos as implicações de qualquer teorema, melhor compreendemos o próprio teorema.

Nem, ao examinar os pontos de vista apresentados por um único homem (ou seus discípulos), nos limitamos necessariamente a esses pontos de vista. A sua análise torna-se uma forma de obter uma compreensão mais clara e mais ampla dos problemas com que esse escritor lidou. No primeiro capítulo de seu Exame da Filosofia de Sir William Hamilton (1865), Mill escreveu:

“Meu assunto, portanto, não é Sir W. Hamilton, mas as perguntas que Sir W. Hamilton discutiu. É, no entanto, impossível escrever sobre essas questões em nosso próprio país e em nosso próprio tempo, sem incessante referência, expressa ou tácita, ao seu tratamento delas.”

O assunto deste livro, da mesma forma, não é John Maynard Keynes, mas os problemas que ele discutiu. E não podemos discutir esses problemas nos dias de hoje sem discutir seu tratamento deles.

3. Um pioneiro que abre caminho?

Agora embora eu tenha analisado a Teoria Geral de Keynes nas páginas seguintes teorema por teorema, capítulo por capítulo, e às vezes até mesmo sentença por sentença, ao que alguns leitores podem parecer uma extensão tediosa, eu não tenho sido capaz de encontrar nela uma única doutrina importante que seja verdadeira e original. O que é original no livro não é verdadeiro; e o que é verdadeiro não é original. De fato, como veremos, mesmo muito do que é falso no livro não é original, mas pode ser encontrado em uma partitura de escritores anteriores.

Francamente, quando comecei esta tarefa, não pensei que chegaria a uma conclusão tão abrangente. Meu primeiro pensamento foi que eu poderia fazer um trabalho curto, analisando as doutrinas principais de Keynes para que o leitor que desejasse uma análise crítica fosse capaz de encontrar um em uma forma breve e legível. Mas quando eu realmente embarquei em uma análise linha por linha, minha experiência foi estranhamente como a que John Stuart Mill descreve em sua Autobiografia a respeito de sua análise de Sir William Hamilton:

“Conforme eu avançava na minha tarefa, o dano a reputação de Hamilton tornou-se maior do que eu inicialmente esperava, através da quase incrível multidão de inconsistências que se mostravam ao comparar diferentes passagens entre si.”[9]

Então eu encontrei na Teoria Geral de Keynes um número incrível de falácias, inconsistências, imprecisões, definições e usos de palavras inconstantes e erros simples de fato. Meu desejo de me aprofundar apontando esses erros tem levado o comprimento deste livro muito além do que eu pretendia originalmente.

No entanto, atrevo-me a pensar que houve uma certa compensação pela extensão desta análise. Os resultados não são meramente negativos. Eles não apenas provam que as principais afirmações de Keynes estavam erradas. Porque ao lidarmos com as falácias keynesianas somos obrigados não só a examinar muito de perto os seus próprios argumentos, mas também as doutrinas “clássicas” ou “ortodoxas” que ele negava. E ao fazer isto, nós frequentemente descobriremos que algumas destas doutrinas “ortodoxas” têm sido apenas pouco compreendidas, mesmo por muitos dos seus proponentes. Em outros casos, encontraremos erros ou lacunas na declaração usual de algumas das próprias doutrinas “ortodoxas”.

Uma outra possível objeção ao presente volume permanece por considerar que ela é dirigida contra um autor que não está mais em posição de responder. Mas qualquer vantagem que eu possa ganhar com isso certamente será mais do que compensada pelo número e ardor controverso dos discípulos de Keynes. Pela mesma razão, não peço desculpas pela franqueza da minha crítica,[10] ou pelo fato de que escrevo sobre Keynes no presente e frequentemente discuto seu trabalho como se o autor ainda estivesse vivendo. Isto é, afinal, apenas uma forma de confessar que as doutrinas de Keynes ainda estão muito vivas na influência que exercem.

Em um aspecto o alcance do presente livro é mais estreito do que eu tinha originalmente pretendido. Não há nenhum esforço para lidar com todos os erros no imenso corpo da literatura keynesiana. Tal esforço teria sido inútil, como eu percebi quando eu já estava bem lançado na minha tarefa. O leitor vai encontrar apenas algumas referências de passagem para obras dos keynesianos ou “pós-keynesianos”. Até mesmo minhas referências ao próprio Keynes estão confinadas quase inteiramente à Teoria Geral, outros de seus trabalhos sendo citados apenas quando eu estou chamando a atenção para alguma inconsistência ou para alguma afirmação da mesma doutrina em outra forma. O exame das falácias do próprio Keynes, só na Teoria Geral, tem me levado a uma extensão tão grande quanto eu senti que minha tarefa poderia justificar.

Uma vez que tenhamos examinado minuciosamente as falácias no mestre, podemos economizar tempo sem nos preocuparmos em dissecá-las novamente, geralmente de uma forma ainda mais vulnerável, nos discípulos.

No prefácio da Teoria Geral, Keynes tenta antecipar algumas críticas gerais. Ele se desculpa pelo “argumento altamente abstrato” que está para seguir, declarando que seu livro:

“é dirigido principalmente aos meus colegas economistas” (p. 5)

E diz que:

“nesta fase do argumento o público em geral, embora bem-vindo no debate, é apenas ouvinte” (p. 6)

Acho que não podemos desculpar a má escrita na maior parte da Teoria Geral por este motivo. Pois Keynes consegue, como veremos, ser envolvido e técnico sem ser preciso. Uma das características mais marcantes do livro é a frouxidão de muitos dos termos principais, e os sentidos em constante mudança nos quais eles são usados.

Tentando antecipar outra crítica, Keynes observa:

“Aqueles que estão fortemente casados com o que eu chamarei de ‘a teoria clássica’ flutuarão, espero, entre uma crença de que eu estou completamente errado e uma crença de que eu não estou dizendo nada de novo” (p. 5)

Isso insinua um argumentum ad hominem. Ele tenta desacreditar os críticos antecipadamente por não se converterem à nova revelação. Na verdade, como veremos, não é necessário “flutuar” entre essas duas crenças. As principais “contribuições” de Keynes estão comprovadamente erradas, e nos casos em que ele está dizendo algo que é verdade, ele está realmente dizendo nada de novo.[11]

Finalmente, Keynes apresenta-se ao leitor, não muito modestamente, como um grande pioneiro intelectual “trilhando caminhos desconhecidos” (p. 7). O que é estranho sobre isso, no entanto, é que no final de seu livro, no capítulo 23, ele cita como confirmação da verdade dessas novas ideias pioneiras o fato de que a maioria delas era detida pelos mercantilistas do século XVII!

4. A teoria “geral”

Depois de alguma hesitação, decidi que a melhor maneira de analisar a Teoria Geral é fazê-la capítulo por capítulo. O livro de Keynes não está bem organizado. Portanto, minha crítica, assim como o próprio livro, não seguirá a ordem mais lógica e será às vezes repetitiva. Para compensar essas deficiências, dei aos meus próprios capítulos, na maior parte das vezes, os mesmos números dos capítulos correspondentes que eles discutem na Teoria Geral. Isto tornará mais fácil para os leitores que desejarem confirmar ou ampliar qualquer citação que eu tenha feito da Teoria Geral, ou seguir o argumento de Keynes em sua forma original se eles devem questionar minha própria interpretação.

Felizmente o Capítulo 1 de Keynes, “A Teoria Geral”, é apenas um único parágrafo longo. Mas esse parágrafo levanta três pontos que pedem comentários.

“Eu chamei este livro de A Teoria Geral do Emprego, do Juro e do Dinheiro, colocando a ênfase no prefixo geral. O objetivo de tal título é contrastar o caráter de meus argumentos e conclusões com os da teoria clássica do assunto, sobre a qual fui criado e que domina o pensamento econômico, tanto prático quanto teórico, das classes governantes e acadêmicas desta geração, como tem acontecido há mais de cem anos (p. 3).

Vou argumentar [Keynes continua] que os postulados da teoria clássica são aplicáveis apenas a um caso especial e não ao caso geral, a situação que assume ser um ponto limitante das possíveis posições de equilíbrio” (p. 3)

A boa economia anterior a 1936, no entanto, tal como a boa economia desde então, não dependia de postulados que se encaixavam apenas em casos especiais. Tratava-se do ciclo econômico, de períodos de prosperidade e depressão, bem como da teoria “estática” simplificada. É a economia de Keynes, como veremos, que se aplica apenas a um caso especial; e não dá uma análise correta desse caso especial.

“As características do caso especial assumido pela teoria clássica [Keynes continua] não são as da sociedade econômica em que vivemos realmente, com o resultado de que seu ensino é enganoso e desastroso se tentarmos aplicá-lo aos fatos da experiência” (p. 3)

Não se trata de um argumento, mas de uma mera afirmação. Por enquanto, contentar-me-ei com a contra-afirmação de que a economia “ortodoxa” era sempre suficientemente flexível para analisar as condições reais, e que são os pressupostos de Keynes que “não são os da sociedade econômica em que vivemos realmente”.

As minhas críticas ao Capítulo 1 devem aplicar-se a todas as frases nele contidas. Elas devem se aplicar, também, ao seu uso curioso do termo “clássico”, que ele defende em nota de rodapé. Lá ele aponta que “os economistas clássicos” foi um nome inventado por Marx para cobrir Ricardo e James Mill e seus antecessores.

“Eu me acostumei [escreve ele] talvez perpetrando um solecismo, para incluir na ‘escola clássica’ os seguidores de Ricardo, ou seja, aqueles que adotaram e aperfeiçoaram a teoria da economia ricardiana, incluindo (por exemplo) J. S. Mill, Marshall, Edgeworth, e Prof. Pigou” (p. 3)

Este uso prolongado do termo “clássico” é meramente confuso. Dá ao leitor uma imagem bastante falsa. Ele está sendo solicitado, de fato, a considerar praticamente toda a economia antes do aparecimento da Teoria Geral em 1936, não importa por quem escreveu, como uma teoria uniforme e uma teoria acordada. Mas havia uma enorme diversidade nas opiniões de escritores particulares, e muitas controvérsias entre os chamados economistas “clássicos”. Havia também pontos que alguns deles não pretendiam ter resolvido. Keynes escreve como se todos os economistas antes dele tivessem adormecido numa espécie de sono dogmático, incitando uns aos outros, sem pensar, alguns clichês de pensamento não examinados.

Suas referências à escola “clássica” são enganosas em mais de um aspecto. Ele inclui entre os economistas clássicos os pioneiros e continuadores das teorias do valor subjetivo ou da utilidade marginal que representam uma ruptura com a economia “clássica”. E quando ele escreve sobre economia ortodoxa ele parece confinar-se a maior parte do tempo a Marshall e Pigou. Ele escreve como se não estivesse ciente dos grandes avanços além desses escritores que foram feitos, particularmente na teoria do capital e dos juros, por Böhm-Bawerk, John Bates Clark, Knut Wicksell, Irving Fisher, Ludwig von Mises e F. A. Hayek.

O quadro de referência de Keynes é estranhamente provincial. Ele parece assumir que o que não foi descoberto por Marshall ou Pigou, ou discutido em seu pequeno círculo em Cambridge, nunca foi pensado.

___________________________________

Notas

[1] 22 de abril, 1946. Reeditado em The New Economics, ed. por Seymour E. Harris, (Nova Iorque, Alfred Knopf, 1952).

[2] A Guide to Keynes, (Nova Iorque, McGraw-Hill, 1953).

[3] The Development of Economic Thought, ed. por Henry William Spiegel (Nova Iorque: Wiley, 1952), p. 767.

[4] Ibid., p. 768.

[5] The Life of John Maynard Keynes, (Nova Iorque, Harcout Brace, 1951), p. 466.

[6] (Nova Iorque, Prentice-Hall, 1948), pp. vii e 1-2.

[7] Benjamin M. Anderson, Economics and the Public Welfare, (Nova Iorque, Van Nostrand, 1949), p. 391.

[8] George Santayana, Character and Opinion in the United States, (Nova Iorque, Scribner’s, 1920), p. 9.

[9] (Oxford, World’s Classics edition), p. 234.

[10] A própria atitude de Keynes é assim descrita por seu biografista: “Não há dúvida de que Keynes… pensou que tudo fosse claro no argumento e que um homem não deveria ter uma queixa se ele fosse refutado sem piedade… se sensibilidade não tinha espaço em um jogo, ainda menos na discussão dos assuntos públicos ou problemas econômicos”. R. F. Harrod, The Life of John Maynard Keynes, (Nova Iorque: Harcout Brace, 1951), pp. 329-330.

[11] Eu posso complementar isso em uma nota de rodapé com a revisa da Teoria Geral pelo Professor Frank H. Knight, no The Canadian Journal of Economics and Political Science de fevereiro, 1937, p. 122: “Isso, claro, é um dos dois ‘argumentos’ normalmente erguidos pelos pensadores revolucionários àqueles que não imediatamente se juntam a eles, o outro é que a rejeição é baseada em um interesse investido… desde que se tornou quase que a moda comentar sobre diferenças no posicionamento intelectual por psicanalisar, ou de alguma forma ‘explicar’ o oponente (e o exemplo de seguir a moda foi neste caso dado pelo senhor Keynes), pode ser permissível notar que a nossa civilização de hoje, sendo essencialmente romântica, ama e exalta heresias tanto quanto anteriormente, em poucos séculos atrás, odiava-nas e temia-as. A demanda por heresia está sempre em excesso para com a oferta e sua produção é sempre um empreendimento próspero. Onde uma vez que fosse necessário escrever meramente reafirmando e interpretando a doutrina passada pelos pais, certamente a forma de atrair interesse e atenção agora se baseia em derrubar e passar por cima de tudo que for estabelecido ou aceito”

Henry Hazlitt
Henry Hazlitt
Henry Hazlitt foi um dos membros fundadores do Mises Institute. Ele foi um filósofo libertário, economista e jornalista do The Wall Street Journal, The New York Times, Newsweek e The American Mercury, entre outras publicações. Ele é mais conhecido pelo seu livro Economia em uma Única Lição.
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