Sempre que surge uma análise incisiva sobre quem manda em nós, e de como seus interesses políticos e econômicos estão interligados, ela invariavelmente é acusada pelos esquerdistas e conservadores (e até mesmo por muitos libertários) de ser uma “teoria da conspiração da história”, “paranoia”, “determinismo econômico”, e até “marxista”. Estes rótulos degenerativos são aplicados de forma geral, muito embora estas análises realistas possam ser, e têm sido, feitas em toda e qualquer parte do espectro econômico, desde a John Birch Society até o Partido Comunista. O rótulo mais comum é “teórico da conspiração”, quase sempre denotando um epíteto hostil, e não adotado pelo próprio “teórico conspiracionista”.
Não é de se estranhar que normalmente estas análises realistas sejam expostas por diversos “extremistas” fora do consenso do Establishment. Pois é vital para a continuidade do poder do aparato estatal que ele tenha legitimidade e até santidade perante o público, e é vital para esta santidade que nossos políticos e burocratas sejam considerados espíritos desencarnados devotados somente ao “bem público”. Uma vez que seja revelado que estes espíritos frequentemente são orientados para a promoção de uma série de interesses econômicos bem terrenos através do uso do estado, a mística fundamental do governo começa a ruir.
Peguemos um exemplo simples. Suponha que fiquemos sabendo que o congresso tenha aprovado uma lei de aumento da tarifa de importação do aço ou de limitação de cotas de importação deste produto. Com certeza só um imbecil não sabe que a tarifa ou a cota foram aprovadas a pedido dos lobistas da indústria doméstica do aço, a fim de impedirem a entrada de concorrentes estrangeiros eficientes. Ninguém iria dizer que esta conclusão é uma “teoria da conspiração”. Mas o que o teórico conspiracionista faz é simplesmente estender sua análise a medidas governamentais mais complexas. Por exemplo: projetos de obras públicas, o estabelecimento da Anvisa, a criação do Banco Central, ou a entrada dos EUA em alguma guerra. Em cada um desses casos, o teórico conspiracionista pergunta a si mesmo cui bono? Quem se beneficia desta medida? Se ele descobre que a medida A beneficia X e Y, seu próximo passo é investigar a hipótese: X e Y de fato fizeram lobby ou pressionaram pela aprovação da medida A? Em resumo, X e Y sabiam que se beneficiariam e agiram em função disso?
Longe de ser um paranoico ou um determinista, o analista da conspiração é um praxeologista; ou seja, ele acredita que as pessoas agem propositadamente, que elas fazem escolhas conscientes para utilizar meios para atingirem objetivos. Consequentemente, se uma tarifa de aço é aprovada, ele supõe que a indústria do aço fez lobby para isso; se um projeto de obra pública é criado, ele presume que tenha sido promovida por uma aliança de construtoras e sindicatos que usufruem de contratos de obras públicas, e burocratas que ampliam suas funções e rendas. São os oponentes da análise “conspiratória” que professam a crença de que todos os eventos – ao menos no governo – são aleatórios e não planejados, e que, portanto, as pessoas não planejam e não fazem escolhas propositais.
Existem, claro, boas análises conspiratórias e más análises conspiratórias, do mesmo jeito que existem bons e maus historiadores ou profissionais de qualquer área. O mau analista conspiratório tende a cometer dois tipos de erros, que de fato o deixam passíveis da acusação de “paranoia” por parte do Establishment. Primeiro, ele para no cui bono; se a medida A beneficia X e Y, ele simplesmente conclui que em vista disto X e Y foram os responsáveis. Ele falha em reconhecer que isto é apenas uma hipótese, e deve ser verificada descobrindo se X e Y realmente fizeram isso ou não. (Talvez o exemplo mais bizarro disto tenha sido o do jornalista britânico Douglas Reed que, ao ver que o resultado das políticas de Hitler foi a destruição da Alemanha, concluiu, sem maiores evidências, que em vista disto Hitler era um agente das forças externas que deliberadamente empenhou-se para a ruína da Alemanha.) Segundo, o mau analista conspiratório parece possuir uma compulsão de juntar todas as conspirações, todos os blocos de poder de caras maus, em uma única conspiração gigante. Ao invés de ver que existe vários blocos de poder tentando obter o controle do governo, algumas vezes em conflito e outras vezes em aliança, ele tem que pressupor – novamente sem evidências – que um pequeno grupo de pessoas controla a todos, e apenas simula coloca-los em conflito.
Estas reflexões são motivadas pelo fato mais do que evidente – tão evidente que foi até mencionado por revistas semanais – que praticamente toda a liderança do governo Carter, de Carter e Mondale para baixo, é formada por membros da pequena e semi-secreta Comissão Trilateral, fundada por David Rockfeller em 1973 para propor políticas para os EUA, Europa ocidental e Japão, e/ou membros do conselho da Fundação Rockfeller. O resto está ligado com os interesses da corporação Atlanta, e especialmente da Coca-Cola Company, a principal corporação da Georgia.
Bem, o que devemos pensar a respeito disso tudo? Dizemos que as extraordinárias iniciativas de David Rockfeller em prol de certas políticas públicas estatistas são meramente um reflexo de um altruísmo aleatório? Ou temos ai interesses econômicos envolvidos? Jimmy Carter foi nomeado membro da Comissão Trilateral assim que ela foi fundada porque Rockfeller e os outros queriam ouvir os ensinamentos de um obscuro governador da Georgia? Ou ele foi alçado da obscuridade e feito presidente através do apoio dela? J. Paul Austin, presidente da Coca-Cola, foi um dos primeiros apoiadores de Jimmy Carter meramente por se preocupar com o bem comum? Todos os trilateralistas e as pessoas da Fundação Rockfeller e da Coca-Cola foram escolhidos por Carter simplesmente porque ele achou que eles eram os mais competentes possíveis para os cargos? Se sim, isto é uma intrigante coincidência. Ou existem ai interesses político-econômicos mais sinistros envolvidos? Eu digo que os ingênuos que teimosamente se recusam a examinar as interligações dos interesses políticos e econômicos no governo estão jogando fora uma ferramenta essencial para analisar o mundo em que vivemos.
Tradução de Fernando Chiocca
Artigo original aqui.
Quem estiver livre de usar o rótulo Teoria da Conspiração (aberta, tácita ou funcionalmente) que atire a primeira pedra.
Nas investigações complexas e de multiníveis e ainda, fora da Janela de Overton, alguém sempre usará de algum critério de corte, algum threshold que determinará um horizonte para além do qual dados ou inferências são considerados irrelevantes ou insustentáveis.
E a sustentabilidade de uma hipótese poderia vir de um campo não considerado.
Ilustração: follow the money é um critério muito bom. Mas e quanto a temas-não-temáticos, temas ‘repulsivos’ a um escrutinizador/analista específico tal como ‘sociedades secretas’ ou escatologia religiosa?
Quando já se tem dinheiro, poder e influência planetários quais eventuais interesses poderia alguém ou alguns grupos terem?
Bem, cada um de nós tem seus interesses e tendências e, consequentemente, viéses e visões de mundo.
Terminamos aplicando o referido corte definidor de horizonte que tornará ‘irrelevantes’ e até risíveis fatores, talvez, mais que relevantes.
O absurdo é um bom esconderijo.