A curva de Laffer é conhecida dos estudantes de economia. Trata-se de um modelo segundo o qual existe um nível de tributação que maximiza a arrecadação do governo.
Imaginem um gráfico no formato de um “U” invertido, como um monte. O topo do monte seria o nível de maior arrecadação. Alíquotas mais baixas reduzem a receita do governo. Já as mais altas aumentam a propensão à sonegação e prejudicam a atividade econômica.
Com base nisto, os incautos alunos pensam ter encontrado uma espécie de fórmula da otimização social. Os liberais são os piores. Bradam aos quatro ventos:
– estamos acima do nível ótimo da curva de Laffer. Se reduzirmos impostos aumentamos a arrecadação do governo.
Venho por meio desta estragar a festa liberaleca. A curva de Laffer não passa de mito.
Alunos de economia devem se comportar como Anaximandro, aluno do fundador da Escola Jônica de Cosmologia, o grande Tales de Mileto. Este por sua vez, para explicar os terremotos, baseou-se na Teogonia de Hesíodo, concluindo que a Terra flutuava no oceano como um navio.
Diante da teoria de Tales, que hoje sabemos ser absurda, Anaximandro ofereceu uma refutação lógica: se a Terra deve ser sustentada pelo oceano, quem sustenta o oceano e, logo, quem sustenta o sustentáculo do oceano? Este loop infinito só poderia ser resolvido se assumirmos que a Terra se mantém equilibrada sem nenhum suporte mecânico. A abordagem audaz de Anaximandro deu origem à mecânica celeste, inspirando cientistas como Aristarco e Copérnico.
Felizmente, Anaximandro não era o típico coxinha liberal das instituições de ensino contemporâneas que ousam intitular-se faculdades. Se fosse este o caso, ele não teria encarado a teoria de Tales como um mito, mas como dogma simplesmente porque Tales era professor, o que o afastaria da busca pela verdade absoluta.
Submetamos o modelo da curva de Laffer a um escrutínio lógico de igual rigor.
5) Como se calcula este suposto nível ótimo?
4) O modelo leva em conta o método de tributação?
3) O fator temporal entra no modelo?
2) É realista assumir que governos estão dispostos a seguir a recomendação do modelo?
E a pergunta mais importante: 1) por que seria bom maximizar a arrecadação do governo?
O mito da curva de Laffer não passa em nenhum dos 5 testes lógicos. Vejamos:
5 – Não dá pra calcular este nível.
A maneira como os impostos afetarão a atividade econômica depende de percepções subjetivas dos agentes afetados, tornando impossível quantificar seu impacto. Ainda que um economista rode regressões estatísticas, elas nada significarão, já que os parâmetros assumidos não possuem unidades de referência quantificáveis, não levam em conta mudanças temporais e ainda por cima assume-se que mantém-se constantes apesar da distorção causada pela existência de uma estrutura governamental. Como nos lembra o economista Frank Shostak, isto equivale a assumir que os cidadãos estão todos mortos ou congelados. Mais importante que isto é a constatação de Ludwig von Mises em Ação Humana:
“As experiências com a quais as ciências da ação humana têm de lidar são sempre experiências de fenômenos complexos. Nenhum experimento de laboratório pode ser desempenhado com relação à ação humana”
4 – O modelo desconsidera o método de tributação.
O homem responde a incentivos, sendo esta resposta essencial para uma sólida análise praxeológica de como as intervenções estatais, no caso o assalto tributário, afetarão o desempenho de uma economia. Embora toda forma de tributação prejudique a sociedade, algumas modalidades são mais danosas que outras conforme o prazo analisado. Impostos sobre consumo são agudamente prejudiciais aos mais pobres no curto prazo, enquanto impostos sobre lucros corporativos tendem a levar mais gente à pobreza e reduzir a qualidade de vida dos pobres no longo prazo. Impostos sobre herança e sobre renda são especialmente tóxicos para as virtudes, família e subsidiariedade. Impostos sobre movimentação financeira aprofundam ressessões e concentram renda artificialmente.
3 – A curva de Laffer não incorpora o tempo.
Toda tributação destrói capital, seja consumindo-o ou alocando-o mal. Logo, toda tributação em um período X necessariamente diminuirá a quantidade de seiva da sociedade a ser espoliada pelo estado no período X+1. Assim sendo, a máxima arrecadação teorética do estado só poderia ser calculada se soubéssemos o ano do Juízo Final, estabelecendo zero de impostos até a data em questão e aumentando repentinamente o tributo para 100% no último dia; apesar de que o fluxo trazido a valor presente nesta situação seria anulado, demonstrando toda a contradição do modus operandi estatal. Felizmente, Nosso Senhor Jesus já terá destruído as potestades terrenas algum tempo antes.
2 – Quem disse que o estado está disposto a seguir este modelo?
O psicólogo Walter Mischel demonstrou, em um estudo na Universidade de Rochester, que crianças com preferência temporal mais baixa tendiam a ser mais virtuosas. Era o famoso experimento do marshmallow. Crianças que abdicavam de comer um marshmallow para receber dois no futuro eram também mais diligentes e industriosas. Em condições normais, pessoas virtuosas tendem a ser melhor sucedidas, mas a política, especialmente a democracia, inverte esta relação ao subsidiar o vício. O governo confere poderes descomunais a pessoas inescrupulosas, incompetentes no mercado e dispostas a atropelar as etapas de um sólido crescimento pessoal para conseguir privilégios pagos pelo gado da fazenda humana (chamados cinicamente de contribuintes). Aplicando a lógica de Mischel em uma análise reversa, podemos facilmente concluir que membros do governo possuem alta preferência temporal. E como demonstrou Hoppe, a democracia piora o quadro. Logo, eles não estão preocupados com uma sustentabilidade econômica característica de uma gerência privada ou ao menos dinástica de uma sociedade. Procurarão espoliar o máximo que puderem. Há contudo um investimento de longo prazo que lhes interessa, especialmente para a elite metaestatal: A expansão das estruturas de poder. Para o estado, não há incentivos em maximizar ganhos contábeis, mas em investir em aparatos de repressão e manipulação psicosocial para continuar o esquema de espoliação legitimada. Neste aspecto, eles são extremamente diligentes, industriosos e pensam a muito longo prazo.
1 – Não queira enriquecer seu inimigo.
Maximizar ganhos do governo é péssimo. Autores como Albert Jay Nock, Mencken, Frank Oppenheimer, Chodorov, Spooner, Rothbard, Lew Rockwell, di Lorenzo e a Serva de Deus Dorothy Day demonstraram que o estado é nosso inimigo, em guerra contra a humanidade. Porque um cidadão comum em sã consciência iria querer otimizar as operações financeiras do inimigo? Quanto mais o governo arrecadar, mais ele investirá na nossa escravização. Perderemos a capacidade de buscar soluções técnicas e gerenciais para nossos problemas cotidianos através de relações civilizadas e racionais, o que nos priva de algo ainda mais importante: o incentivo à caridade e ao uso da razão, que nos torna humanos. Se algum parâmetro contábil deve ser maximizado é a quantidade de riqueza nas mãos privadas. Assim sendo, a preocupação de um estudante de economia deve ser em procurar novas maneiras de sonegar e não de entregar nossas riquezas para tiranos sociopatas. Do contrário, este economista estará traindo a humanidade.
A Curva de Laffer surgiu de constatações lógicas.
O lógico é sempre pensar que o governo aumenta os impostos sobre a população com o objetivo de aumentar as suas receitas, ninguém pensa que os impostos são aumentados por outros motivos que não esse.
A segunda constatação lógica é a que um imposto de 100% é equivalente a um imposto de 0% para o governo no longo prazo. Como toda a riqueza será confiscada em absoluto e nenhum capitalista poderá auferir lucros e nenhum funcionário receberá salários, porque as pessoas produziriam então?
A terceira constatação é que isso também é verdade caso trabalhemos com estimativas bem aproximadas da ultima constatação, um imposto de 99% vai acabar por dar retornos iguais ou menores para um governo que um imposto de 0,1% no longo prazo. (a lógica é a mesma)
Daí o que os economistas de Chicago pressuporam é que no meio dessa arrecadação 0 nos extremos e uma arrecadação maior que zero entre os extremos e cuja a receita cresce conforme aumente pouco as taxas iniciais (Subir de 10% para 11% por exemplo), deve existir um nível ótimo nesse meio (é até lógico pensar isso devido as premissas).
Agora, de fato não é capaz de ser calculado um nível ótimo (se é que ele existe), já que a economia é dinâmica.
E realmente eu não quero maximizar a arrecadação do governo, mas tem muita gente que quer…
O que eu vejo quando falam em maximizar os ganhos do governo é, pra que taxar a galera em 70%, se com 50% eles arrecadariam mais. Se é pra existir esse roubo, que seja em 50% por exemplo. Não querem dinheiro? Querem ou não querem. Então eh isso, ngm quer dar nada aprovação govern.
Grande Kogos,
Parabéns por mais essa contribuição à causa libertária.
Sugiro um post semelhante sobre o “peso morto dos impostos”. Conheço “economistas” formados pelo MEC que não entendem plenamente esse conceito, provavelmente por dificuldade em ler gráficos simples (analfabetismo funcional).
Saudações católicas e libertárias.
Sds.,
Felipe
Em complemento ao ultimo comentário, Robert Murphy já demonstrou também que a Curva de Laffer pode ser utilizada por governos mesmo numa nação libertária. Desta forma, seria ineficiente que as taxas cobradas no território fossem além do nível ótimo de Laffer, tanto na visão de quem recebe as taxas quanto de quem as paga.
Espetacular! artigo excelente! Sou grato por ainda ter o Instituto Rothbard e grandes autores como o Kogos no Brasil, isso mostra a forças do libertarianismo nesse país
O fato do “nível ótimo” (que de ótimo não tem nada) não poder ser calculado, não quer dizer que ele não exista. Nem que seja fixo, nem que seja o mesmo em diferentes sociedades e modelos de tributação.
Obviamente, essa é uma página libertária e ninguém aqui quer nenhum tipo de taxação. Mas esse não é o ponto da discussão. Até onde sei, o governo Reagan aumentou a arrecadação vinda dos mais ricos abaixando seus impostos. E o mesmo aconteceu no governo Macri quando ele abaixou os impostos dr exportação.
Dois exemplos não servem de prova cabal, mas não deixam de ser indícios de uma teoria com uma lógica bastante apelativa. Além do mais, quem acha que a teoria precisa ser capaz de fornecer um número exato para se provar verdadeira, está tratando a economia como uma ciência exata e não humana.
É belo e moral? Claro que não.
O que não quer dizer que seja falso.
A Curva de Phillips também é outra lenda.
É claro que se há uma forte carga tributária e ela é reduzida para um nível médio, a arrecadação tende a aumentar. A questão é que não tem como saber esse ótimo. Isso ignorando a questão ética, claro.
Todo modelo pressupõe a simplificação, é fundamento da ciência econômica o ceteris paribus, não fosse assim, a economia seria uma ciência metafísica. Por exemplo, para se construir um avião, vocÊ testa primeiro a aerodinâmica em um protótipo, onde outras variáveis não estarão presentes. Concordo com muita coisa, não podemos ver uma suposição ou modelo como dogma, mas o método até então mais eficiente é este – modelo teórico – modelo matemático – modelo econométrico. A econometria é cheia de falhas, a própria estatística é, no máximo o que temos é uma correlação, por enquanto acho muito difícil que haja um método infalível de causa e efeito, afinal, estamos lidando com o comportamento humano e de toda espécie de ação irregular, Bentham já alertava para isso, não é por isso que vamos deixar de criar modelos com a maior proximidade da realidade tendo como suposição o comportamento racional. É óbvio que por exemplo um masoquista maximize a dor e minimize o prazer, mas devo pautar minha pesquisa levando em consideração esta anomalia? Assim são as ciências sociais, o Direito por exemplo normatiza somente o comportamento racional, o que está fora deste parâmetro está sujeito a punições, assim como o agente econômico que não segue os princípios básicos da economia sofre, é pobre, passa fome, etc. O fato de nós termos um governo e pagarmos impostos é da nossa própria natureza, pagar por segurança, por paz. Com relação ao welfare state, também pagamos devido às externalidades negativas que a miséria pode causar inclusive no mais rico dos cidadãos, se não quisermos mais pagar impostos, não vai ser por meio de políticas públicas e sim pela vontade do coletivo que irá derrubar o sistema. Todas as vezes em que houve tentativa de mudar um sistema pela teoria, houve morte e destruição. Vamos seguir a nossa natureza, nós não somos melhores que as formigas, pelo contrário.
Kogos, faz uma live sobre a ruptura dentro do IMB que levou a criação do Ins. Rothbard. Pq a família Chiocca saiu de lá? Como foi a ruptura?
Só uma sugestão.
Se vc concorda que a alíquota de 100% retorna a arrecadação a zero, então a curva existe.
Não é mito. É fato.
Mesmo que não possa ser calculada.
Eu não concordo. Concordar com isso é ir contra o fato de que a escravidão (alíquota de 100%) existiu. O primeiro estágio do conto do escravo mostra que a alíquota de 100% tem retorno de arrecadação.
Discordo. …. Paulo Kogos diz ser formado em administração, mas ignora questões de Administração da Produção e de Pesquisa Operacional que mostram matematicamente como funcionam outras curvas similares a da Curva de Laffer. … Quero observar o questionamento 1 (por que seria bom maximizar a arrecadação do governo?) que está na parte final de seu texto. E que é a BASE do SOCIALISMO e do COMUNISMO, o Estado é o grande provedor. … E considero correta a questão de que quanto mais o governo arrecadar, mais promoverá na nossa escravização. … Excesso de impostos impedem que as pessoas possam decidir sobre o que desejam fazer (liberdade) e os tonam DEPENDENTES do que o governo que que eles façam (escravidão). … Como é possível fazer caridade quando se passa fome? … A curva de Laffer não é exata ou precisa porque foca estimativas futuras, mas corresponde a uma situação real. … Excesso de taxação leva a falência da economia porque, não deixa dinheiro suficiente para investimento privado de inovação ou reinvestimento. … É justamente ela que mostra que o socialismo e o comunismo que querem Estados Gigantescos são INVIÁVEIS. A Suécia teve um exemplo prático disto entre 1974 e 1990. … A Curva de Laffer é a expressão matemática da história infantil “Galinha dos Ovos de Ouro”. Ignorá-la é matar a galinha dos ovos de ouro. … Cálculos e lógica equivalentes são utilizados em todas as indústrias bem gerenciadas e realmente existe um “ponto ótimo” que após ser ultrapassado o custo se torna maior e o lucro cai
Gosto de ler contrapontos, até para entender pontos de vista diferentes dos meus, mas confesso que fazia tempo que não lia tanta besteira.
Passados alguns anos, entrei nesse “post” porque eu finalmente entendi o ponto do exótico Paulinho: ele não prova, mas sugere que, dada à “informalidade” da suposta curva, quer dizer, sua imponderabilidade ou “incalculabilidade”, seriam argumentos definitivos de sua inaplicabilidade como modelo prático do estabelecimento do ponto ótimo.
Do ponto de vista teórico, é evidente que o tal ponto deva existir. E que também, existindo ou não, o Governo sempre vai tentar maximizar seus ganhos e garantir a manutenção da estrutura de poder.
Mas Kogos apresenta um argumento razoável sobre a mania que domina as análises econômicas atuais de que não só a tal curva exista, como também que o comentarista que a cita tem absoluto domínio sobre qual seja esse ótimo, na inflexão precisa da parábola (quem disse que é parábola?) que aponta tal otimização.
Por fim, concordo com ele: é nada mais que uma ideia, e a sonegação é a obrigação de todos, seja em que ponto estiver o ótimo de tal trajetória nefasta laferiana.
Que economista é esse que não entende o bom senso da Curva de Lafer
Ah já sei, é só fechar a mente para o mundo real