Ouvi com muita atenção os comentários proferidos pelo historiador Marco Antônio Villa na rádio Jovem Pan, no último dia 22, sobre o fato de mulheres estarem comprando armas de eletrochoque para sua defesa.
O historiador se mostrou indignado — com razão! — por vivermos em um país com tamanha e crescente criminalidade, e afirmou que é inimaginável ver uma cena dessas na França ou na Itália, onde o estado cuida da segurança pública. Acrescentou que é um verdadeiro absurdo transferir ao cidadão a responsabilidade pela segurança pública, e complementou dizendo que a busca de meios de defesa pelo cidadão é um retrocesso, uma ameaça ao estado democrático de direito.
Opa! Sinal vermelho aceso!
Não sei qual a posição dele sobre a posse e o porte de armas, mas desconfio. No entanto, o que importa neste momento é que o historiador erra feio ao correlacionar legítima defesa com a falência do estado de direito. Todos os países sérios do mundo preveem o direito à legítima defesa e garantem a possibilidade de meios para exercê-la, entre elas a França e a Itália, exemplos citados por ele.
Na França, é permitido o uso de sprays de defesa e armas de choque para qualquer cidadão com mais de 18 anos. Na Itália, anos atrás, o porte de armas de fogo foi bastante facilitado e não é nada raro.
Agora, se um francês precisa andar com objetos para se defender são outros quinhentos, e tal necessidade não se pode ser confundida com a liberdade de fazê-lo.
A lógica de que a necessidade deve pautar a liberdade é perigosíssima e tem seu nascedouro e acalanto nos braços do marxismo. Uma lógica perversa que não raramente é usada para projetos liberticidas.
Utilizando-se essa lógica, se eu não tenho a necessidade de ter dois carros, então o estado pode me tolher desta liberdade. Se um relógio de poucos reais faz o mesmo que outro de muitos milhares de reais, então eu não preciso da liberdade de comprar o mais caro. Entenderam o perigo dessa relação?
Vejamos um exemplo genuinamente brasileiro: o Estatuto do Desarmamento. Seu objetivo é desarmar o cidadão e garantir o monopólio das armas nas mãos do estado. Nasceu da “necessidade” de impedir milhares de assassinatos todos os anos.
No que resultou? Como mostrarei na parte final deste artigo, recordes de homicídios e a supressão da liberdade de possuir e portar armas.
Mas não parou por aí o uso da tal “necessidade”. Entre muitos subterfúgios para perseguir seus objetivos reais ou proclamados, o estatuto criou a tal exigência de declaração ou comprovação de efetiva necessidade. Alguém acredita que vivendo em um país com 60 mil assassinatos por ano, 150 mil estupros, milhões de roubos, sequestros e agressões perpetradas por criminosos, essa necessidade não exista?
Existe, claro que existe! Então por que diariamente a compra e porte de armas são negados aos cidadãos exatamente com base nesta necessidade? Porque o estado recorre a outra necessidade como fiel da balança. Explico.
Com o discurso de que é necessário ter um estado que garanta a segurança ao cidadão, nega-se a necessidade do cidadão de se autodefender. É a necessidade como pautadora da liberdade.
A verdade é que não interessa para mim se o estado é ou não competente em me defender e em defender a minha família; eu tenho a liberdade de exercer o meu direito de defesa e ponto final.
Vejamos um último caso em que uma suposta ausência de necessidade foi usada para tentar suprimir uma liberdade: o referendo na Suíça em 2011.
Grupos desarmamentistas, alegando que a Suíça, por ser um dos países mais pacíficos do mundo, com quase inexistentes taxas de homicídios e crimes violentos, tentou por meio de um plebiscito proibir a posse de armas e munições nas residências suíças. O resultado foi a derrota da proposta. Os suíços entenderam que a única necessidade real é a liberdade, e foram respeitados.
Enquanto isso, no Brasil, as supostas necessidades continuam pautando nossas liberdades.
Os desarmamentistas e seu exercício de futurologia
Ao final do ano passado, voltou ao noticiário a triste notícia de que o Brasil é líder mundial em números absolutos de homicídios e ocupa o 11º lugar do ranking considerando o índice de assassinatos a cada 100 mil habitantes.
Com 56.337 homicídios ocorridos em 2012, o país registrou 29 mortes violentas a cada 100 mil habitantes, número quase cinco vezes maior do que o índice mundial (6,2).
As estatísticas foram contabilizadas pelo Observatório de Homicídios pertencente ao Instituto Igarapé, do Rio de Janeiro. Não se trata de nenhuma novidade, uma vez que, ano após ano, o Brasil quebra consecutivos recordes de criminalidade violenta, entre elas os homicídios.
Concomitantemente, continua circulando a informação de que 120 mil vidas teriam sido “salvas” pelo advento do chamado Estatuto do Desarmamento, o qual foi aprovado em dezembro de 2003 em uma conturbada votação que ocorreu em plena vigência do “mensalão”, recurso por meio do qual o poder executivo pagava propina ao Congresso em troca da aprovação de projetos de lei de seu interesse.
De acordo com essa tese, graças ao Estatuto do Desarmamento a crescente “epidemia” de homicídios teria sido reduzida, o que na prática resultaria em vidas poupadas.
Seria mesmo esse o caso? Como “prever” taxas de homicídios? Essa metodologia de projeção de crimes é utilizada em mais algum lugar do mundo para se medir eficiência em Segurança Pública? Seria possível comprovar a causalidade entre a restrição de armas legais e a queda dos homicídios?
Com essas e outras perguntas iniciamos um estudo sobre a tal eficácia do desarmamento no Brasil e, pegando o gancho do termo “epidemia” tão usado por aqueles que advogam pelo desarmamento, recebi de muito bom grado a ajuda do Dr. Luís Fernando Waib, epidemiologista, que possui grande conhecimento na análise de dados e estatísticas.
Em suas palavras:
Após ter me deparado com dados de mortalidade por arma de fogo, divulgados na mídia e em redes sociais recentemente, me incomodei com a análise dos dados divulgados e desconfiei da consistência dos números. Particularmente, me causou estranhamento a inclinação da curva de homicídios, a falta de clareza na apresentação dos dados e as conclusões depreendidas deste conjunto.
Em resumo: algo não estava certo.
O gráfico abaixo mostra três indicadores. A linha azul mostra o total de homicídios para cada 100 mil habitantes (eixo da esquerda). A linha vermelha mostra o total de homicídios para cada 100 mil habitantes cometidos com armas de fogo (eixo da esquerda). E a linha verde mostra a porcentagem total dos homicídios cometidos por armas de fogo (eixo da direita; os números devem ser multiplicados por 100 para se obter o valor inteiro).
Foram utilizados os dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade do Sistema Único de Saúde (SIM/SUS) para prospecção dos dados de mortalidade por causas externas (a mesma fonte utilizada para confecção do Mapa da Violência) e os dados do IBGE para a prospecção dos dados populacionais. Os dados utilizados nesta análise são de 1996 a 2012 — último ano com dados disponíveis no SIM/SUS.
A partir dos dados obtidos nas fontes oficiais — que, repito, são as mesmas utilizadas para a confecção do Mapa da Violência — , não chegamos à mesma conclusão veiculada pela imprensa pelos motivos abaixo elencados:
1. De 1996 a 1999 há uma tendência de elevação na violência geral (traduzida pela crescente taxa de homicídios por 100.000 habitantes, linha azul), em paralelo à tendência de elevação da taxa de homicídios por armas de fogo (linha vermelha).
2. Entre 1999 e 2004 há um desvio desta curva, que sugere uma incidência anormal de homicídios por arma de fogo (linha vermelha). É necessário examinar com mais profundidade o que houve (“quebrar” os dados e contextualizar com os demais fatores que interferem nos índices) para poder determinar causas prováveis.
3. No entanto, como todo “surto”, este também mostrou sua tendência do retorno à média. Neste caso, não exatamente à média, mas à tendência histórica. Isso ocorreu em 2005, linha vermelha.
4. A partir de 2005, no entanto, a curva vermelha retoma o crescimento anterior, até 2011, quando vemos nova inflexão para cima (2012). Não há dados disponíveis nos sistemas consultados para avaliar este novo fenômeno, mas o foco prioritário desta análise é o primeiro.
5. Em nenhuma hipótese observa-se queda da taxa de homicídios por arma de fogo (linha verde) após o advento do desarmamento. Caso existisse, teria de haver uma queda progressiva da violência a partir de 2004, mantendo-se assim até hoje. O estatuto do desarmamento se encontra em plena vigência e, como dito, a partir de 2005 os homicídios (linhas azul e vermelha) voltaram a crescer.
6. É falsa, portanto, a afirmação de que mortes foram prevenidas pelo advento do desarmamento. Em primeiro lugar porque a curva de incidência iniciou seu retorno à média antes dos efeitos do desarmamento, mas principalmente porque a projeção da curva não pode ser feita a partir de um período de “surto”, mas sim do período endêmico da série histórica.
7. Outro dado relevante para a análise é que a curva da taxa de homicídios (linha azul) é, durante toda a série histórica, paralela à curva de homicídios por arma de fogo (linha vermelha).
Se tivesse havido uma inflexão para baixo da curva da taxa de homicídios a partir de 2004 (quando efetivamente se iniciou o recolhimento de armas de fogo), poderíamos depreender que o desarmamento provocou uma redução gradual e constante da violência. Tivesse havido manutenção da curva de homicídios, mas redução da curva de homicídios por arma de fogo, poderíamos depreender que a violência se manteve, mas mudou de método.
A conclusão aqui é que o desarmamento foi ineficaz, seja para reduzir a violência, seja para mudar a participação das armas de fogo nestes eventos.
8. Por fim, o crescimento constante da participação das armas de fogo nos homicídios (de 59% em 1996 para 71% em 2012, linha verde) mostra que não só o poder público impediu o uso legítimo de armas de fogo pelo cidadão, mas falhou na redução da disponibilidade destas armas para os criminosos.
Nenhum estudo sério no mundo projeta “taxas de homicídios que não ocorreram” como ferramenta de medição de eficácia de políticas de segurança pública. Esse tipo de futurologia é mais uma jabuticaba brasileira.
A queda pontual dos homicídios com utilização de armas de fogo foi acompanhada na mesma proporção pela queda dos homicídios com a utilização de outros instrumentos, ficando assim comprovado que não existe relação com as restrições trazidas pelo estatuto do desarmamento.
Por mais que tentem, forcem, espremam e torturem os dados, não há o menor indício que aponte para uma possível eficácia do desarmamento na redução da criminalidade violenta simplesmente porque isso não aconteceu. Quem assim o faz, mente desesperadamente na tentativa de não ver aprovado o PL 3722/2012, de autoria do deputado federal Rogério Peninha Mendonça, que devolve ao cidadão o direito de se defender autonomamente, uma vez que já está constatada a total ineficácia do estado de fazê-lo minimamente.
O desarmamento fracassou, continuará fracassando, e o Brasil, de mentiras em mentiras, vai se consolidando como o país do faz-de-conta.
Mais armas = menos crimes e mais educação
Quase 5 anos atrás, os shoppings começaram adotar seguranças armados depois de um surto de roubos à lojas, em especial joalherias. Como não poderia deixar de ser, os desarmamentistas, profetas do caos, começaram a gritaria de que isso geraria tiroteios e mortes.
Um desses profetas de araque foi o “especialista” em segurança pública José Vicente, que inclusive participa das audiências públicas sobre o PL 3722. Disse ele ao jornal Folha de São Paulo de 16 de agosto de 2010:
Para o consultor em segurança pública José Vicente da Silva, coronel da reserva da PM paulista, esse tipo de medida só aumenta o risco aos usuários dos lugares. “Os shoppings estão optando para aumentar os riscos aos seus frequentadores”, disse. Isso porque, para ele, os bandidos não vão deixar de roubar os shoppings porque há homens armados e os vigilantes não têm treinamento suficiente para isso.
Passados 5 anos, o que aconteceu? Alguém se lembra da última vez que houve um roubo em shopping? Houve alguma morte? Tiroteio? Algum segurança armado matou algum cliente em uma discussão? Zero! Nada! Nem roubos, nem mortes. Mais armas e menos crimes.
Neste ano, fui entrevistado pela mesma Folha de São Paulo e entre outras coisas afirmei: “Cidadão armado faz criminoso evitar contato com a vítima”. Isso não é teoria, não. É empiria.
Dias atrás conversei com um segurança em um Shopping perto da minha casa, um dos que ficam armados. Disse ele que nunca mais houve qualquer tentativa de roubo e nem mesmo de furto de veículos, coisas corriqueiras ali antes do armamento da segurança.
Adicionalmente, ele também disse que os seguranças nunca mais foram ameaçados ou enfrentados por bandos de moleques que gostavam de fazer arruaça nas dependências. E sentenciou: “É engraçado, doutor, o pessoal ficou mais educado com nóis (sic)”!
De forma empírica, ele chegou à mesma conclusão que o cidadão que escreveu o excelente artigo “A arma de fogo é a civilização“, do qual cito o trecho final:
Quando estou portando uma arma, eu não o faço porque estou procurando confusão, mas sim porque quero ser deixado em paz. A arma em minha cintura significa que não posso ser coagido e nem violentado; posso apenas ser persuadido por meio de argumentos racionais. Eu não porto uma arma porque tenho medo, mas sim porque ela me permite não ter medo. A arma não limita em nada as ações daqueles que querem interagir comigo por meio de argumentos; ela limita apenas as ações daqueles que querem interagir comigo por meio da força.
A arma remove a força da equação. E é por isso que portar uma arma é um ato civilizado.
Neste caso, muito especificamente, o nexo causal da variante arma é claro e inequívoco. Os seguranças, desarmados, sempre estiveram lá; bastou armá-los para que imediatamente acabassem as ocorrências de roubo.
A conclusão é mais do que óbvia: armas nas mãos certas e minimamente treinadas não significam mais mortes e crimes. Significam menos crimes e até mesmo mais educação.
Se diz contrário ao armamento da população para evitar conflitos e mortes, mas chama um indivíduo armado “policial” quando terceiros estão violando seus direitos. Poser.