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Como a internet nos ensina os benefícios do livre mercado

internetA World Wide Web foi inventada em 1992 pelo físico britânico, cientista da computação e professor do MIT Sir Tim Berners-Lee como um simples mecanismo de compartilhamento de artigos científicos entre seus colegas.  A essencial e principal inovação da rede foi o uso do hipertexto — o mecanismo pelo qual, ao clicarmos em um link, normalmente uma palavra ou uma frase que aparece em destaque, fazemos automaticamente o download de um documento.  Embora esta seja uma ideia muito simples, a rede mudou completamente o mundo em que vivemos.  Seu surgimento e sua ascensão são também um esplêndido exemplo do que acontece quando o setor privado é deixado desimpedido e com plena liberdade para suprir as necessidades do mercado.

Apesar de sua grande complexidade e do seu rápido progresso ao longo dos últimos 10 anos, a internet e todas as pessoas que interagem através dela é um arranjo que funciona basicamente sem qualquer tipo de intervenção estatal.  Os web designers (pessoas que elaboram o projeto estético e funcional de um website) não necessitaram de ajuda do governo para desenvolver as habilidades necessárias para criar websites cada vez mais complexos; os profissionais de tecnologia da informação não ficaram esperando por relatórios oficiais dizendo como e quando eles teriam de se adaptar às mudanças tecnológicas; e as empresas foram rápidas em oferecer toda uma gama de serviços — sempre em constante evolução — necessários para que a internet funcionasse harmoniosamente.

Em outras palavras, o setor privado se adaptou à nova realidade; e se adaptou muito rapidamente.  Os mecanismos do livre mercado fizeram aquilo que sempre fazem — se apressaram para satisfazer as demandas do consumidor.  Isso se refletiu não apenas na ampla variedade de produtos disponíveis, mas também na rápida queda nos preços de praticamente tudo que diz respeito à internet.  Dez anos atrás, ter uma página pessoal na internet era uma ideia cara, principalmente se você necessitasse de algo mais profissional ou refinado.  Hoje, por meio de blogs ou serviços como o Facebook, é tudo gratuito.  No geral, os custos de entrada — quando consideramos o custo do treinamento que era necessário há apenas uma década e que hoje acabou — não simplesmente caíram; eles evaporaram.  Esse baixo custo de entrada permitiu que uma grande variedade de indivíduos e empresas comercializassem online, fornecendo substanciais opções para os consumidores.

Embora o crescimento que temos visto da internet seja excepcional, trata-se apenas de uma versão mais rápida de algo que o capitalismo faz muito bem: satisfazer uma miríade de necessidades em uma sociedade diversa.  É difícil imaginar um melhor exemplo do livre mercado em ação.

Igualmente importante é o que não aconteceu.  A internet está predominantemente à margem de controles governamentais, e fornece inúmeros exemplos de como a livre iniciativa pode empreender em larga escala tarefas que muitos estatistas alegam que podem ser feitas apenas pelo setor público.  Rotineiramente ouvimos que a mão condutora do estado é necessária para a execução de projetos complexos.  Porém, a própria internet em si, com seu incontável número de computadores interconectados, é uma das entidades mais complexas já criada pelo ser humano, e grande parte dela cresceu sem absolutamente qualquer tipo de planejamento.

Similarmente, o governo sempre intervém quando julga haver algum perigo para o público — daí as regulamentações sobre o uso de remédios, as regulamentações sobre o mercado em geral e as leis antifraude.  Porém, é evidente que a internet, como exemplo de um mercado relativamente livre, frequentemente derruba esses argumentos pró-intervenção.  O crescente comércio de remédios online — de antibióticos até infindáveis propagandas de Viagra — demonstra a disposição de vários em obter suas próprias informações e em tomar suas próprias decisões, mesmo que isso traga algum risco pessoal.

Estatistas frequentemente argumentam que o governo deve regular padrões e critérios.  Porém, a internet em si foi toda construída utilizando padrões voluntariamente escolhidos e consentidos de maneira comum, padrões estes que permitem que qualquer navegador de internet decifre qualquer página publicada online.  Novamente, houve poucas fontes centrais para que isso ocorresse; o mercado, na forma de web designers, programadores e usuários, escolheu voluntariamente quais métodos deveriam ser utilizados em comum para manejar a imensa variedade de diferentes websites, desde sites de publicação e transmissão de vídeos, passando por sites de compras virtuais até a própria formatação de textos utilizada.  Nada disso requereu leis ou regulamentações, e seu progresso extremamente rápido foi voluntário e benéfico para todos.

Inversamente, sempre houve tentativas de se criar por escrito padrões definidos e implementados por várias organizações virtuais, mas tais projetos sempre estiveram defasados em anos.  A realidade da internet sempre progrediu mais rápido do que todas essas tentativas de planejamento central.  A lição é simples: vários indivíduos e organizações interagindo com o público e operando competitivamente sempre irão continuamente desbravar uma miríade de alternativas, sendo esse um processo natural cujo resultado final será, por definição, um reflexo das escolhas diretas feitas pelas pessoas.

A fraude é uma atividade criminosa que, justamente por ser criminosa, é vista como uma área natural em que o governo deve intervir.  Porém, mesmo nessa área podemos ver como um livre mercado lida com essa atividade.  Não obstante as vigorosas tentativas de fraudadores, o público em grande medida aprendeu a lidar com as fraudes online.  E-mails spam são rapidamente deletados, e isso quando conseguem furar o bloqueio dos filtros anti-spam especialmente desenvolvidos por engenheiros de software e vendidos tanto para provedores de acesso à internet quanto para indivíduos.  Empresas privadas em busca do lucro têm reputações a proteger, o que as estimula a declarar explicitamente aos seus consumidores que elas jamais se comunicam por meio de canais inseguros, como e-mails, e que elas só irão pedir informações confidenciais — como um número de cartão de crédito — quando houver um elaborado programa de segurança, como aqueles que existem em seus websites seguros e criados sob medida.

Em outras palavras, o mercado se adaptou à realidade, em parte por meio de campanhas informativas visando à educação dos usuários, em parte por meio de mudanças voluntárias de comportamento.  Uma coisa é certa: nenhuma intervenção governamental foi necessária.  Porém, não é difícil imaginar uma proposta estatista visando a limitar os malefícios causados por e-mails fraudulentos e outras trapaças virtuais.  Sem dúvida, isto envolveria uma série de regulamentações para tentar controlar aquelas pessoas que potencialmente poderiam mandar essas perigosas mensagens eletrônicas para pessoas inocentes e tecnologicamente ineptas.  O tom da propaganda em prol da intervenção iria enfatizar a incapacidade das pessoas entenderem as complexidades dos sistemas online — daí a necessidade de qualificações e especializações aprovadas pelo governo.

Uma das principais denúncias feitas pelos estatistas que querem controlar a internet diz respeito ao papel ostensivo que o governo deve ter em controlar o acesso a materiais perturbadores, como pornografia infantil ou encenações de estupro.  A atual legislação sobre material impresso e televisivo é apontada como um exemplo dessa necessária intervenção; é claro que ela deveria ser atualizada para incluir também a internet, certo?  Porém, em um livre mercado, bens e serviços são determinados pela demanda do consumidor, e a demanda por material obsceno nos moldes prescritos pela atual legislação é virtualmente inexistente.  A internet em sua atual forma certamente abriga conteúdo ilegal, mas este não está prontamente disponível; ele tem de ser específica e exaustivamente caçado na deep web, e podemos assumir que tal conhecimento requer uma rede preexistente que não depende da internet.

Aqueles que exigem mais regulamentação sobre a internet frequentemente declaram que seu objetivo é impedir que cidadãos desafortunados vejam acidentalmente esse tipo de pornografia extrema.  O principal apelo é que temos de nos assegurar que os inocentes e ingênuos não encontrem por acaso esse material.  Como dito, esse cenário ignora o fato de que o produto (no caso, o conteúdo virtual) é determinado pelo mercado.  Conteúdos repreensíveis são difíceis de ser encontrados online pelo mesmo motivo que eles não são televisionados no horário nobre — porque quase ninguém quer vê-los.

Essa alegação dos estatistas também ignora o ponto de vista dos provedores de conteúdo.  Todo grande website que aceita conteúdo enviado pelo público possui estritas regras de governança que definem o que é considerado aceitável.  Nenhuma empresa pode se dar ao luxo de se associar a qualquer coisa que o público considere desagradável, seja o conteúdo legal ou não.

Muitas pessoas confundem seus sentimentos.  Uma coisa é desejar que a lei seja aplicada; outra, bem diferente, é querer que o governo encontre uma maneira de tomar o controle de um meio de informação porque as pessoas o utilizam para propósitos ilegais.  Isso é análogo a dizer que o estado deve controlar as ruas porque elas às vezes são utilizadas por assaltantes de banco.  Ninguém levaria tal lógica a sério; entretanto, é exatamente essa a lógica por trás das propostas para o controle estatal da internet.

Legislações criadas para proteger os usuários da internet contra exposições casuais a pornografia infantil de nada servem para impedir a produção e o armazenamento deste material online, pois isso já é ilegal e ocorre mesmo assim.  Já os provedores de conteúdo, entretanto, têm todos os incentivos para controlar o acesso a esse material, pois dependem da boa vontade de sua audiência.  Ou seja, o livre mercado fornece um método bem mais eficiente de regulação, pois os fornecedores de conteúdo têm fortes incentivos para se autorregularem baseando-se no fato de que a pornografia extrema é repugnante.  Qualquer tentativa do estado de atacar essa reduzida e restrita área — como, por exemplo, instalando firewalls controlados pelo governo — significaria um ataque sobre todos nós.  Mais ainda: o estado simplesmente utilizaria esse ‘potencial para atividades ilegais’ como desculpa para monitorar todos os cidadãos.

O meteórico sucesso da internet é praticamente um exemplo clássico de livro-texto libertário sobre os benefícios dos mercados irrestritos.  Quando as pessoas entendem que estão no controle e que suas atitudes têm influência, as coisas acontecem.  O mercado fornece, e as pessoas escolhem de acordo com as opções.  Quanto mais opções elas tiverem, mais concorrência haverá, e maior a probabilidade de nossas demandas serem atendidas.  Ademais, indivíduos não são criaturas estáticas.  Algo que 15 anos atrás era de domínio exclusivo de usuários com conhecimento avançado de computação tornou-se uma experiência simples e rotineira para muitos — algo não mais desafiador do que utilizar o telefone ou um forno microondas.

Essa explosão no crescimento da internet deveria acabar de uma vez por todas com as críticas frequentemente feitas aos ideais libertários — que eles são uma fantasia porque não se pode confiar que cidadãos ignorantes interagindo com o setor privado irão atender às necessidades da sociedade, e que coisas importantes só podem ser manuseadas por aqueles que trabalham por um ideal elevado, e não pelo lucro.

Há vários outros exemplos parecidos com o da internet, nos quais o governo não intervém ou não é capaz de intervir — e ainda assim (ou justamente por causa disso) as coisas funcionam muito bem.  O sucesso da internet, e o claro papel desempenhado pelo público consumidor, que fez com que a internet se desenvolvesse de acordo com seus anseios, demonstra a capacidade da sociedade em conseguir o que quer de um livre mercado.

Agora que começamos a ouvir murmúrios advindos da classe política sobre a necessidade de se regular a internet para nos proteger da pornografia, do jihadismo ou de qualquer tipo de fraude, é imperativo resistirmos a todo e qualquer apelo por mais controle estatal.  Governos não são competentes para controlar nada, muito menos a internet.  Sua intervenção lograria apenas diminuir nossa capacidade de fazermos nossas próprias escolhas.  O estado quer retirar de nós a capacidade de tomarmos decisões de acordo com nossos gostos e preferências, direcionando arbitrariamente esse poder para a própria classe política, que então escolheria um modelo estatal qualquer de sua preferência.  E tudo para nos proteger.

Como a própria internet já demonstrou, qualquer proteção de que porventura necessitemos no futuro nos será rapidamente fornecida como que por mágica, precisamente porque um livre mercado responde diretamente às necessidades das pessoas.

Gerard Docherty
Gerard Docherty
Gerard Docherty é designer de software e escreve sobre variados assuntos, dentre eles livre mercado, liberdades civis e tecnologia. Mora no Reino Unido.
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