Thursday, November 21, 2024
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Por que a concorrência é louvada nos esportes e condenada no mercado?

Businessman and businesswoman lined up getting ready for race in business

Por que as pessoas adoram ver competições na arena dos esportes — seja nos campos, nas quadras, na pista de atletismo, na piscina ou na quadra de tênis —, mas temem e desprezam a competição na arena do mercado?  A analogia entre os esportes olímpicos e a concorrência inerente a um livre mercado é muito próxima, bem mais próxima do que muitas pessoas são capazes de perceber.  Não obstante, ao passo em que festejamos a competição acirrada no âmbito esportivo, fazemos de tudo para tentar bani-la do âmbito empreendedorial.

Considere que, nas últimas duas semanas, milhões de pessoas não desgrudaram os olhos de suas televisões, seus computadores, iPhones e demais apetrechos eletrônicos, ansiosas que estavam para acompanhar as façanhas e proezas individuais de atletas de todo o mundo nos Jogos Olímpicos de Londres.  As pessoas normalmente são mais viciadas em acompanhar esportes de equipes, como futebol, basquete, vôlei, futebol americano e beisebol, mas, a cada quatro anos, somos também levados a acompanhar os dramas proporcionados pelas competições individuais.

São vários os que roem suas unhas e furam o acolchoamento do sofá torcendo nervosamente para seus atletas favoritos ou simplesmente ansiosos para ver feitos heróicos.  Será que haverá outra quebra de recordes na natação?  Haverá um novo homem mais rápido do mundo no atletismo?  O melhor do mundo no tênis conseguirá manter sua fama?  A ginástica artística trará surpresas?

No entanto, as mesmas pessoas que torcem e vibram com a dominância de um atleta na natação e no atletismo condenam e lamentam a dominância de uma empresa no livre mercado.  Por quê?

A competição e os grandes

A competição nos esportes é cada vez mais acirrada.  Um atleta só consegue manter sua hegemonia se ele estiver se aprimorando continuamente e se esforçando crescentemente.  O mesmo raciocínio vale para o mercado.  Uma determinada empresa que opera em um arranjo de livre concorrência, seja ela grande ou pequena, só conseguirá manter sua hegemonia (no caso, sua “fatia de mercado”) caso ela constantemente melhore seus serviços ou continuamente reduza os preços que pagamos por seus serviços.  Ou faça ambos.

A principal alegação dos anticapitalistas neste quesito é a de que uma empresa se tornar muito grande e passar a dominar uma ampla fatia do mercado é algo extremamente perigoso, pois ela, por ser grande, irá praticar preços predatórios para eliminar a concorrência e, logo em seguida, com a concorrência já eliminada, ela voltará a subir os preços e, com isso, jogar os consumidores na miséria.  Não apenas isso nunca aconteceu na prática, como também a própria teoria explica que isso seria completamente insustentável, para não dizer irracional do ponto de vista empreendedorial.

Apenas imagine: você é o gerente de uma grande empresa e quer destruir a empresa concorrente reduzindo seus preços para um valor menor do que os custos de produção. Ao fazer isso, você começa a operar no vermelho. Ao operar no vermelho, por definição, você está destruindo o capital da sua empresa; você está, na melhor das hipóteses, queimando reservas que poderiam ser utilizadas para investimentos futuros.

Pois bem.  Após vários meses no vermelho, você finalmente consegue quebrar o concorrente.  Qual a situação agora?  Você de fato está sozinho no mercado, porém bastante descapitalizado, sem capacidade de fazer novos investimentos.  A sua intenção é voltar a subir os preços para tentar recuperar os lucros de antes.  Só que, ao subir os preços, você estará automaticamente convidando novos concorrentes para o mercado, que poderão vender a preços menores.  Pior ainda: estes novos concorrentes poderão perfeitamente estar mais bem capitalizados, de modo que é você quem agora estará correndo o risco de ser expulso do mercado. Seus concorrentes poderão vender a preços mais baixos e sem ter prejuízos, ao passo que você terá necessariamente de vender a preços altos apenas para recuperar seus lucros.

Ou seja, ao expulsar um concorrente do mercado, você debilitou sua empresa a tal ponto, que você inevitavelmente se tornou a próxima vítima da mesma prática que você aplicou sobre os outros.

E é exatamente por isso que tal prática não é observada no mundo real. Ela é totalmente ignara. Um empreendedor que incorrer em tal prática estará destruindo o capital de sua empresa, correndo o risco de quebrá-la completamente. Um sujeito com esta “sabedoria” não duraria um dia no livre mercado.

Por outro lado, tal prática pode sim ser muito viável em um mercado totalmente regulado e protegido pelo governo, no qual não existe liberdade de entrada para a concorrência. Mas aí, neste caso, obviamente não temos uma falha de mercado, mas sim protecionismo estatal.  Em um mercado assim, no qual o que vale é a amizade com políticos, qualquer incapaz prospera.

Adicionalmente, vale enfatizar que o sucesso é por si só algo que estimula e atrai mais concorrência. Assim como Michael Phelps ao se tornar um gigante inspirou jovens nadadores que hoje são seus concorrentes, o sucesso de empresas como Wal-Mart inspirou o surgimento da Amazon e de vários outros estabelecimento especializados em vender a preços baixos, inclusive a próxima mega loja da sua cidade ou a simples butique da esquina, as quais ainda não existem, mas passarão a existir caso o governo permita.

Em seu livro Liberalismo – Segundo a tradição clássica, Ludwig von Mises explicou o que ocorreria caso a concorrência desaparecesse.  “Não haveria novos progressos no sistema de produção.”  Não haveria novos aperfeiçoamentos.  Sim, isso faria com que ninguém mais tivesse de se esforçar e nem se preocupar com nada, mas a que custo?  Mises afirma que a produção cairia, pois não mais haveria nenhuma relação entre esforço e recompensa.

Que tal raciocínio seja válido para os esportes é algo que ninguém duvida.  Mas é igualmente válido para a economia, exatamente como Mises explicou.

Os benefícios e os obstáculos

A beleza de uma concorrência de livre mercado é que, nela, os reais vencedores são os consumidores.  Todos nós somos beneficiados pela capacidade de uma empresa conseguir fornecer bens e serviços de maneira cada vez mais eficiente e a preços reais cada vez menores.  Da mesma forma, os fãs de esportes se beneficiam ao verem desempenhos cada vez mais exímios dos atletas.  Com o esporte, ganhamos benefícios psicológicos; com o mercado, ganhamos bens e serviços cada vez melhores a preços reais cada vez menores.

De modo oposto, o maior escândalo destas Olimpíadas foi a desclassificação das equipes de badminton da Coréia do Sul, da China e da Indonésia por não terem competido.  Fãs e jogadores se sentiram ultrajados quando estas equipes perderam propositalmente algumas partidas na tentativa de garantir rivais mais fáceis nas fases eliminatórias.  Não competir não é uma opção.

Nos esportes, assim como no mercado, a paz é preferível à guerra.  A sensação de “jogo justo” tem de estar onipresente.  Os mais ferozes e aguerridos adversários se abraçam após a competição, o vencedor e o perdedor se congratulam mutuamente pelo bom jogo.  A maneira mais garantida de se vencer nos esportes e nos negócios é por meio do treinamento e da disciplina.  Nenhum competidor quer realmente ferir e prejudicar seu oponente; todos querem ser vistos como ganhadores limpos, que venceram por seus próprios méritos.

Já o governo, por outro lado, está constantemente quebrando regras, escolhendo favoritos e incorrendo em violência contra aqueles que não estão em sua lista de favoritos.  Se no esporte o favorecimento se dá por meio de arbitragens corruptas, em um mercado sob intervenção estatal o favorecimento se dá por meio de regulamentações que privilegiam alguns poucos e punem outros vários.  Ao passo que, no esporte, o atleta que vencer por meios ilícitos é punido, em um mercado regulado o governo consegue fazer com que seus empresários e empresas favoritos não apenas se mantenham ativos, como também enriqueçam continuamente.

As regulamentações criadas pelo estado sempre foram uma ferramenta utilizada por grandes empresas para suprimir a concorrência de empresas menores e menos politicamente poderosas.  As regulamentações criam barreiras que impedem que novos concorrentes entrem no mercado e desafiem as grandes empresas já estabelecidas.  Quanto mais um empreendedor tem de lidar com regulamentações e reguladores, menos tempo ele tem para se dedicar a criar maneiras de aprimorar seus produtos, cortar seus custos e preços, e criar novos produtos.  As regulamentações estatais desestimulam o genuíno empreendimento e a genuína criação de riqueza, ao mesmo tempo em que impõem incomensuráveis custos (em tempo e dinheiro) às empresas.  Por exemplo, todo o setor de utilidades públicas — como telefonia, energia elétrica, saneamento, TV a cabo e transportes —, fortemente regulado pelo estado, nada mais é do que um cartel monopolista formado exclusivamente por empresas escolhidas pelo governo.  Os preços dos serviços são controlados pelo governo e a concorrência com novas empresas desafiantes é legalmente proibida.  Um privilégio que nos esportes não seria tolerado é, em uma economia regulada, tornado plenamente aceitável pelo governo.

Já em uma sociedade genuinamente capitalista, a concorrência pode vir de absolutamente qualquer lugar.  Ninguém se importa com a pobreza na qual um determinado empreendedor cresceu, qual escola ele frequentou, ou até mesmo se ele chegou a frequentar alguma escola.  É o seu desempenho no mercado o que conta.  No capitalismo laissez-faire, não há nenhum sistema de castas.  Há apenas uma genuína meritocracia.  Ninguém compra um produto só por causa da árvore genealógica do vendedor.  É o mercado — isto é, a livre escolha de consumo das pessoas —, e não o governo, quem decide quem será rico e quem será pobre, baseando-se exclusivamente na capacidade e na qualidade dos bens e serviços ofertados.  Como e onde estes eleitos foram criados é algo que não importa.

Da mesma maneira, os juízes olímpicos não se comovem — e nem poder se comover — com o histórico dos atletas.  Pouco importa se eles cresceram em famílias pobres, se passaram por grandes dificuldades, se os pais são separados ou se algum deles está financeiramente quebrado.  Na competição esportiva, somente a habilidade, a concentração, a disciplina e o desempenho contam.

Isso é exatamente o oposto de como funcionam o governo, suas leis e suas regulamentações.  Em um mercado regulado pelo estado, só vence quem tem bons contatos na burocracia, quem conhece pessoas poderosas e quem tem influência política suficiente para fazer o governo erigir barreiras à entrada de novos concorrentes.  Sem um sistema de livre concorrência determinando quem é mais produtivo e quem se sobressai, os preços dos bens e serviços se tornam altos e sua qualidade, precária.  Os derrotados são os consumidores.

Nas Olimpíadas, o cronômetro e a fita métrica determinam o sucesso e o fracasso.  Por exemplo, apesar de já estar com a avançada idade de 39 anos, o búlgaro Jordan Jovtchev continua competindo acirradamente contra homens com a metade da sua idade.  Ele até mesmo conseguiu a prata nas argolas.

O mesmo ocorre naqueles setores onde o mercado é relativamente livre.  Empresas velhas estão constantemente sendo desafiadas pelo surgimento de novos concorrentes.  Não há regras de senioridade no mercado.  Empresas antigas utilizam sua experiência e malícia para concorrer contra as ideias novas e exuberantes das mais jovens.

Nos esportes, sabemos que os grandes competidores são aqueles que observam meticulosamente e aprendem com os outros.  Eles emulam tudo aquilo que é bem-sucedido e evitam tudo aquilo que se comprovou falho.  E isso é para o bem de todos.  Todo mundo se beneficia porque tal postura faz com que tudo e todos se tornem mais excelentes.  Não apenas sabemos que as coisas funcionam assim, como defendemos que seja assim.  Por outro lado, no comércio, há leis estatais que proíbem pessoas de analisarem e copiarem o comportamento de outros.  Quando o Android observa e copia do iPhone, o governo diz que ele está roubando ideias.

Embora esta competição de mercado enriqueça os consumidores, os anticapitalistas e os políticos se referem a ela em termos derrogatórios, como “impiedosa, “cruel”, “lei da selva”, “cão-come-cão” e “sobrevivência do mais forte”.  Mas por que seria algo violento ou incivilizado competir pela preferência das pessoas?  Sempre que políticos atribuem tais adjetivos ao mercado é porque eles querem criar barreiras para excluir a concorrência e privilegiar seus empresários favoritos.  Afinal, a concorrência reduz as margens de lucro.  Descansar sobre seus louros não é uma opção quando se tem de competir continuamente.  E não é todo mundo que quer viver com esta constante preocupação.

Da mesma maneira, atletas que foram campeões mundiais no ano passado não podem simplesmente enviar pelo correio seus desempenhos do ano passado.  Eles têm de fazer tudo de novo, e provavelmente terão de fazer ainda melhor desta vez se quiserem vencer.  O mercado funciona da mesma maneira.  A tecnologia do ano passado já não concorre com a mesma eficiência este ano.  As pessoas podem até falar que têm nostalgia dos bons e velhos tempos, mas elas querem que seus produtos e serviços estejam constantemente atualizados.

É assim que a sociedade progride.  Em vez de pedir ao governo que coloque obstáculos à concorrência, estipulando salários e determinando preços, tarifas e afins, todos nós deveríamos encorajar e até mesmo vibrar com a concorrência amigável do mercado.

Conclusão

Todo atleta das Olimpíadas está em melhor situação por ter treinado ao extremo, se sacrificado e ter dado o melhor de si.  Quando as empresas, por sua vez, são forçadas a concorrer, elas também irão procurar aperfeiçoar seus produtos e serviços diariamente, sempre querendo ganhar novos clientes.  É a concorrência o que faz dos consumidores os campeões finais.

O que nos leva à pergunta final: por que as pessoas adoram a concorrência nos esportes, mas têm medo dela no mundo do comércio?  A resposta é aquele problema que sempre assombrou a história da humanidade: ignorância econômica.  E apenas o estudo sério e sincero de como realmente funciona a economia pode nos fazer perceber o elo explícito entre esportes e comércio — bem como ver os erros daqueles que celebram o primeiro e demonizam o último.

Não há nenhuma “lei da selva” nas Olimpíadas.  E nem em uma sociedade genuinamente livre.

Douglas French
Douglas French
Douglas French é o diretor do Ludwig von Mises Institute do Canadá. Já foi o presidente do Mises Institute americano, editor sênior do Laissez Faire Club, e autor do livro Early Speculative Bubbles & Increases in the Money Supply. Doutorou-se em economia na Universidade de Las Vegas sob a orientação de Murray Rothbard e tendo Hans-Hermann Hoppe em sua banca de avaliação.
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