Eugen-Maria Schulak
[Eugen-Maria Schulak (schulak@philosophische-praxis.at) é um empresário que trabalha como conselheiro filosófico em Viena, Áustria (www.philosophische-praxis.at). Professor universitário e autor de seis livros, ele é o diretor do Departamento de Filosofia da Siemens Academy of Life.]
Nota pessoal prefatória do autor:
Lieber Hans,
Die vielen guten Gespräche, die ich bislang mit Dir führen konnte, haben mich, nebst der Lektüre Deiner Schriften, ganz außerordentlich bereichert und beflügelt, wofür ich Dir von Herzen danken will. In meiner Heimatstadt Wien, deren Blüte längst Geschichte ist, fand ich im Zuge meiner philosophischen Entwicklung wohl manchen guten Lehrer, doch letztlich niemanden, der imstande war, die Welt in Form einer grundlegenden Kritik philosophisch gegen den Strich zu bürsten. Nichts hob sich wohltuend vom Üblichen und Erlaubten ab, nichts wies in eine neue Richtung. Die Klarheit und zwingende Logik Deiner Gedanken haben mich, das kann ich heute sagen, aus einer Art dogmatischem Schlummer geweckt. Es wurde mir eine neue und wertvolle Gedankenwelt eröffnet, deren Wurzeln—und das ist die Pointe—hier in Wien zu suchen sind. Du hast mir in gewissem Sinne meine Heimatstadt, in der ich mich philosophisch verloren glaubte, wiederum zurückgegeben. Auch in emotionaler Hinsicht ist dies für mich von unschätzbarem Wert.
Alles Gute und noch viel Kraft für weiteres fruchtbares Schaffen
—Eugen[1]
A ética empresarial é um tema que está muito na moda e que nos confronta a cada passo. Isso nos leva a perguntar, por que deveria ser assim; qual pode ser a razão para isso; e quem, ou o quê, poderia estar por trás desse desenvolvimento? Mas antes que possamos tentar responder a essas perguntas, devemos ser bastante claros sobre o que queremos dizer com a expressão “ética empresarial” e o que esperamos obter de seu uso. Devemos ir mais fundo e perguntar quem foi que trouxe a expressão e a introduziu na discussão; quem tem mais a se beneficiar com sua aplicação; e contra quem é dirigida, ou tem mais a perder?
Um dos insights mais importantes de Ludwig Wittgenstein foi que o significado de uma palavra depende do contexto em que foi usada. O significado de uma palavra só pode ser avaliado e compreendido quando sabemos a finalidade para a qual a palavra é usada. É especialmente importante compreender o significado das palavras que estão na moda. Essas palavras são usadas principalmente porque outras pessoas também as usam. Palavras elegantes são governadas por uma certa dinâmica que é mais emocional do que racional; elas dependem de seu impacto emocional muito mais do que de uma consideração cuidadosa do que a pessoa realmente deseja dizer.
Permita-me um breve excursio ao reino da psicologia aplicada. Quando algumas pessoas falam de ética empresarial, sua expressão assume um caráter solene, quase sacerdotal. Alguns ficam tão dominados pela ira moralista que parecem ser comissários do Politburo. Outros, por outro lado, irradiam hipocrisia; tem-se a impressão de que eles se sentem obrigados a discutir a ética empresarial – e invariavelmente acabam sorrindo constrangidos. Com outros, é bastante óbvio que eles não têm ideia do que estão falando. Essas são as pessoas que sempre seguem servilmente quaisquer ideias que estejam “na moda” e regurgitarão tudo o que for considerado politicamente correto. E, mais uma vez, existem aqueles que sabem muito bem por que usam esse termo, mas que mascaram habilmente suas verdadeiras intenções. E, finalmente, há aqueles que nem tentam ocultar suas intenções, e aproveitam a oportunidade para falar mais uma vez sobre “porcos capitalistas” e a chamada “necessidade social”.
Por mais de uma década, o tema da ética empresarial tem sido assunto de intensa discussão. Essa tendência ainda está aumentando. As razões para essa discussão não são novas de forma alguma. Podemos encontrar episódios semelhantes desde o século XIX, quando o economista alemão Gustav Schmoller, que fundou a Verein für Socialpolitik, comparou o papel de sua profissão ao do coro em uma tragédia grega clássica. O papel do economista profissional, como o do coro, era avaliar e comentar os acontecimentos políticos e econômicos que ocorriam no cenário mundial; entretanto, não lhe era permitido participar ativamente no palco. O economista, assim como o coro, desempenhava o papel de autoridade especialista. Na era moderna, a ética do economista passou a ser baseada em conceitos como “o povo”, “justiça social”, “desenvolvimento”, “progresso”, “igualdade” ou “compensação social”, que foram, consequentemente, adotados nos programas dos governos nacionais.
Tais desenvolvimentos conceituais foram precursores do socialismo de estado, bem como do nacional-socialismo. Que tais conceitos pudessem ser desenvolvidos com relativa facilidade, tanto em ditaduras de direita quanto de esquerda, e continuem a ser desenvolvidos até hoje, dá muito o que pensar. Tanto o socialismo quanto o nacional-socialismo tinham isso em comum: utilizaram todas as forças concebíveis para manipular e regular todos os movimentos empresariais. A ditadura e a regulamentação das empresas sempre andam de mãos dadas.
As ditaduras modernas invariavelmente se descrevem como “democracias dos povos” ou evoluíram de democracias que começaram gradualmente a manipular a população por meio de novos preceitos morais. Além disso, elas começaram a controlar a economia. Dessa forma, elas conseguem implementar e financiar seus objetivos políticos sem medo de obstáculos.
Em última análise, liberdade política e liberdade econômica são a mesma coisa. A política é financiada exclusivamente por meio de pagamentos obrigatórios; em outras palavras, da tributação. Quanto mais ambiciosas forem as intenções políticas e quanto mais abrangentes forem as medidas políticas necessárias, maior será a administração necessária e tudo custará mais.
A receita necessária só pode ser obtida daqueles que criam riqueza, ou seja, daqueles que produzem bens e serviços, ou que estão envolvidos na produção de bens e serviços. Essas pessoas produzem bens e serviços que outros estão dispostos a pagar ou negociam mercadorias que outros estão dispostos a comprar voluntariamente. Essas pessoas, e somente elas, criam riqueza. A política não pode criar riqueza. Por esta razão, a Política está continuamente buscando adquirir o máximo de riqueza possível dos outros por meio de seu monopólio da força.
O fato é que dificilmente é possível cobrar mais impostos na Áustria hoje do que os que estão sendo cobrados. Qualquer aumento da carga tributária real faria com que as empresas deixassem o país em massa e levaria os indivíduos privados a recorrerem à economia paralela. Em outras palavras, atingimos o teto do que é possível ou aceitável. Em contraste a isso, nossa burocracia estatal exige cada vez mais receita. Mais e mais pessoas estão vivendo às custas do estado. Nosso sistema público de saúde está falido. Os fundos de pensão públicos estão falidos. A dívida pública aumenta continuamente. Ainda evitamos expropriações públicas. Porém, cada vez mais a riqueza privada terá de ser expropriada se quisermos continuar a financiar nosso chamado Estado socialista.
Aqueles que de bom grado nos desapossariam estão ocupados em espalhar a opinião de que vivemos em uma era de neoliberalismo. Além do fato de que muito poucos têm alguma ideia do que isso significa, é bastante inadequado considerar a época atual digna da designação de “liberal”. Por um lado, a participação do governo no PIB é atualmente de cerca de 40%. No apogeu do liberalismo austríaco, a tributação da renda acabara de ser introduzida, com uma alíquota marginal máxima de 5%.
Aqueles que querem nos despojar continuamente, passo a passo, não se cansam de frisar que somos, aparentemente, um país rico. Isso só pode ser considerado uma falácia, considerando que qualquer pessoa, com uma renda mensal líquida de € 2.000 ou mais, pertence aos 10% com maior renda na Áustria. Na verdade, vivemos em um regime socialista paternalista que conseguiu orientar nossos pontos de vista e nosso comportamento e que, assim, conseguiu produzir uma extraordinária uniformidade de pensamento e comportamento consensual. Lenta, mas inexoravelmente, caminhamos para uma nova forma de comunismo. No momento, não podemos dizer exatamente para onde isso está nos levando.
* * *
Passemos agora aos numerosos debates sobre ética empresarial que são conduzidos na Áustria. Em relação a esses diversos grupos de discussão, é possível fazer uma observação extraordinária: Entre os que atuam no mundo dos negócios, observamos uma convicção arraigada de que a economia só pode prosperar no longo prazo se for movida por considerações éticas. Aqueles que pertencem a profissões distantes dos negócios do dia-a-dia tendem a considerar as expressões “sucesso empresarial” e “atitudes éticas” como mutuamente excludentes.
Se analisarmos esses dois grupos mais de perto, veremos que ambos participam da economia – mesmo que apenas como consumidores. No entanto, é perceptível que esses grupos são completamente diferentes no que diz respeito a como ganham seu sustento; enquanto um grupo atua em empreendimentos econômicos, o outro depende de renda proveniente do setor público.
Olhando para esses dois grupos em termos de sua relação com o estado, podemos designá-los, para simplificar, como “recebedores líquidos” ou “pagadores líquidos”. Nas finanças públicas, descrevemos os “recebedores líquidos” como “recebedores de pagamentos de transferência”, o que deixa bem claro que cada recebedor está sendo subsidiado por alguém que está pagando. Os recebedores do pagamento por transferência incluiriam todos aqueles que trabalham no setor público, como funcionários públicos, professores, polícia, políticos, cientistas, funcionários de várias associações comerciais e funcionários públicos dos governos federal e regionais, incluindo comerciantes associados e trabalhadores manuais. É claro que os aposentados e pensionistas também pertencem a esse grupo. O que é significativo sobre os “recebedores” é que suas obrigações fiscais, assim como suas receitas líquidas, são um fardo para os orçamentos públicos, o que significa que devem ser pagas pelo “pagador líquido”.
Os pagamentos de transferência são pagamentos de instituições estatais a pessoas privadas. Eles devem ser financiados por uma redistribuição da receita do estado ou por meio de empréstimos públicos. Os recebedores do pagamento por transferência são pessoas físicas que recebem mais do estado do que contribuem para as finanças do estado e que dependem do estado, no todo ou em parte, para seu sustento.
Prossigamos com a questão sobre como o número de recebedores de pagamentos de transferência na Áustria se compara ao de contribuintes.[2]
Registro de eleitores para as eleições parlamentares, 2002 5.912.592
Recebedores líquidos de pagamentos de transferência (2004)
Aposentados 1.842.538
Funcionários da administração pública e da previdência social 450.300
Funcionários da educação[3] 143.532
Funcionários da área de saúde, medicina veterinária, e serviços sociais[4] 171.667
Desempregados/beneficiários do auxílio-desemprego[5] 306.236
De licença (com pagamento) 110.489
________
Total (2004)
3.024.770
Em 2004, havia cerca de três milhões de recebedores líquidos de pagamentos de transferência na Áustria. Não estão incluídas as pessoas para as quais os pagamentos de transferências constituíram apenas uma parte dos seus rendimentos. Assim, por exemplo, encontramos grupos como beneficiários de subsídios familiares, subsídios agrícolas, ou pensões complementares (estatais) que não estão incluídos nas estatísticas. Consequentemente, podemos facilmente imaginar que o número de beneficiários líquidos constitui uma clara maioria do eleitorado. Não é muito difícil imaginar que implicações isso pode ter para a democracia.
Os aposentados constituem cerca de dois terços dos beneficiários do pagamento de transferência. Durante toda a vida profissional, foram obrigados a fazer contribuições regulares para os fundos de pensão do Estado. A prática normal desses fundos de pensão era, e ainda é, esbanjar esse dinheiro, em vez de investi-lo criteriosamente. Essas pessoas foram, para ser franco, espoliadas. Sua riqueza foi confiscada, aos poucos, ao longo dos anos. Hoje elas são dependentes – dependentes do Estado e à mercê dos desdobramentos políticos – e possuem um destino incerto.
Este sistema, que chamamos de “contrato intergeracional” na Áustria, nada mais é do que um esquema de pirâmide. Você pode imaginar um corretor de seguros entrando em sua casa e apresentando a seguinte proposta: “Tenho uma oferta fantástica para lhe fazer. Todos os meses, você vai me pagar € 1.000. Transferirei esse dinheiro para o Sr. X, pois ele já está velho e precisa do dinheiro. E, quando você envelhecer, encontrarei uma Sra. Y a quem venderei um contrato semelhante ao que agora lhe ofereço. O dinheiro que receberei da Sra. Y, irei então pagar a você quando você envelhecer.”
Acho que podemos concordar que quem assinar tal contrato é um completo idiota. Assim, o estado austríaco não nos oferece tais contratos para nossas assinaturas voluntárias, mas os impõe com a ameaça da força. Basicamente, estamos lidando com nada menos do que um esquema de pirâmide que, aliás, o próprio estado proibiu. Os esquemas da pirâmide são ilegais; seguro estatal obrigatório, não.
* * *
Voltemos às muitas discussões e debates que agora ocorrem sobre o tema da ética empresarial. E vamos nos concentrar em certas observações que podemos fazer, quando analisamos o que está acontecendo nesses debates.
Em primeiro lugar, é facilmente evidente que a grande maioria desse grupo de pessoas que podemos descrever de forma geral como os “moralistas” da ética empresarial pertence à categoria dos recebedores líquidos das transferências sociais. É típico desse grupo não se enxergar como parte da economia. No entanto, eles reivindicam o direito de criar as regras relevantes. O tom predominante dessa discussão é que não se pode simplesmente aceitar que o comércio sozinho possa organizar o mundo, ou ditar como o mundo é administrado. Os seus pontos de vista também devem ser levados em consideração. Na ausência de diretrizes e regulamentos detalhados, que eles formulam e que podem precisar ser policiados por lei, se necessário, o sistema econômico ficaria fora de controle.
O capitalismo sozinho, supostamente movido pela ganância nua e crua e seu foco limitado no interesse próprio, carece da perspectiva ampla para saber o que está fazendo. A autorregulação é uma falha completa. Por isso, é necessário nortear os processos de pensamento dos economicamente produtivos, e a melhor maneira de conseguir isso é por meio de “restrições voluntárias”, de preferência respaldadas por regulamentação estatal. Assim, o espírito da época e o interesse público exigem que aqueles que buscam o lucro tenham que obter um selo oficial de legitimação, visto que, por definição, eles não se pautam pela ética empresarial.
Basicamente, é bastante óbvio o que esse grupo de “moralistas” deseja alcançar. Seu objetivo é desempenhar um papel de porteiro da sociedade, alocando cargos e direitos com base em certificados oficiais e selos de aprovação.
A contribuição dos “moralistas” para o debate muitas vezes exibe deficiências significativas, tanto em termos de personalidade quanto de credibilidade profissional. Eles lembram um pouco os pronunciamentos vigorosos sobre sexualidade vindos de um clero que vive uma vida de celibato. Em princípio, buscam fazer afirmações de peso sobre algo que rejeitam, se é que não desprezam. Seus oponentes podem perguntar, com razão, que direito têm eles de fazer tais propostas, em que autoridade moral se baseia sua reivindicação, e que qualificação profissional ou especializada eles podem exibir para dar credibilidade a seus pontos de vista? Talvez sua legitimidade seja baseada na visão de que, para observar e comentar sobre algo objetivamente, deve-se, em certo sentido, ser “de fora”. No entanto, é óbvio para todos que suas reivindicações são basicamente uma busca pelo poder monopolista.
Podemos dizer, caridosamente, que reivindicar o direito de co-determinação em um contexto onde não se tem nenhuma experiência e, em particular, nenhuma responsabilidade é uma atitude um tanto quanto ousada, e mais do que um pouco embaraçosa. Na verdade, estamos diante de um caso flagrante de cara de pau, porque aqueles que são mais propensos a argumentar a favor da regulação econômica são precisamente as mesmas pessoas que obtêm sua renda com o pagamento de impostos das pessoas que regulam. Quase todos os funcionários públicos científicos e intelectuais, e todos os políticos e funcionários públicos vivem de doações do estado. Esses “moralistas da ética empresarial” não gostam nada de serem lembrados de que sua remuneração é obtida das receitas tributárias extraídas dos contribuintes por meio do poder monopolista coercitivo do Estado.
Os “moralistas da ética” costumam se opor veemente a qualquer sugestão de que o estado deva se desligar, total ou parcialmente, de várias atividades e setores econômicos. E realmente não ajuda apontar para as comprovadas ineficiências no governo e a destruição em grande escala de recursos durante as décadas de 1970 e 1980 nos chamados “estados de bem-estar social”. Os “moralistas” defenderão o tamanho inflado do governo com todas as suas forças – da mesma forma que um caçador cuida de sua caça.
Será muito interessante quando os “moralistas” forem questionados sobre seus próprios padrões éticos. Ficará bastante evidente que aqueles que conduzem o debate sobre a ética empresarial quase nunca pensam em discutir a ética do servidor público, ou do setor público da economia. Isso é especialmente surpreendente quando se considera que o Estado, por meio da tributação, responde por quase metade do total da atividade econômica do país. Como, então, os “moralistas” podem ignorar tão resolutamente que as altas taxas de IVA movem grupos nada insignificantes da população para abaixo do limite da pobreza? E por que nunca se questiona que quase todos os grandes escândalos das últimas décadas ocorreram no setor estatal, ou em setores intimamente ligados ao Estado?
Basicamente, é perfeitamente óbvio que os “moralistas” são guiados principalmente por seus próprios interesses, assim como qualquer outra pessoa, e como recebedores líquidos de pagamentos de transferência, estão simplesmente preocupados em salvaguardar suas rendas. Que isso precise ser camuflado sob a retórica da ética é simplesmente uma indicação de que seu desempenho produtivo no mercado aberto provavelmente não renderia mais do que uma fração do que eles ganham atualmente. Sua reação instintiva é disfarçar em termos moralistas o que é, na realidade, implorar por seus salários.
É óbvio que essa motivação questionável é forte o suficiente para garantir que os “moralistas” dominem quase todos os debates relacionados à ética empresarial. No entanto, o resultado contém muitas contradições. Assim, rejeitam o crescimento econômico por ser destrutivo e antiético, mas insistem em aumentos salariais automáticos como se fossem algo natural, independentemente de como eles deverão ser financiados. Exigem garantia de abastecimento nas áreas de energia e alimentos, mas é claro que rejeitam os projetos de construção concomitantes como sendo prejudiciais. E fulminam contra a globalização enquanto aguardam ansiosamente sua próxima viagem para o exterior. Talvez não seja possível construir um mundo melhor sem estar ativo no projeto de construção.
* * *
Não tenhamos dúvidas sobre uma coisa – a ética empresarial é uma força integradora. Os princípios éticos básicos, ou virtudes do comportamento corporativo, são vigor (ou seja, disposição para se esforçar mais), confiança em si mesmo e nos outros, ambição, curiosidade, responsabilidade pelo capital e funcionários, honestidade em questões financeiras, frugalidade, lealdade, ser um homem de palavra, honrar contratos, a prudência de um homem de negócios correto, pontualidade, presença marcante e comportamento honrado, clareza de discurso, visão forte e empreendedorismo.
O fato é que homens e mulheres de negócios devem possuir muitas dessas qualidades se quiserem perseverar e ter sucesso no mercado. Eles podem ser considerados éticos, por si só. Eles lucram ou, em outras palavras, criam valor. Eles fornecem às pessoas os bens de que precisam ou desejam. Só eles criam empregos genuínos. E eles, junto com seus funcionários, são os únicos que pagam impostos.
Há uma conclusão clara que podemos tirar de tudo isso. Não são as empresas, e nem os empresários, que devem provar que cumprem os padrões éticos adequados. Na realidade, o ônus da prova recai sobre os recebedores líquidos dos pagamentos de transferência, uma vez que são eles que vivem das deduções compulsórias que são pagas pelas empresas e pelos seus empregados. Os recebedores líquidos destes pagamentos, dos quais excluímos naturalmente os aposentados, são os que têm de justificar os seus rendimentos e o dinheiro que recebem.
As empresas comerciais, e seus funcionários, já provaram sua tese no sentido de que produziram bens e serviços para venda que os clientes estavam dispostos a comprar. Isso significa que eles foram benéficos, ou proporcionaram benefícios, para outras pessoas. O mesmo não pode ser dito dos recebedores das transferências, ou pelo menos o caso deles não é tão claro. Essa é a razão pela qual eles deveriam ser obrigados a se esforçar muito mais para justificar seu direito ao que adquirem da economia. Nem devem ser autorizados a usar a ética comercial de terceiros como cortina de fumaça para desviar a atenção da necessidade de justificar sua situação privilegiada como recebedores de renda estatal.
É lamentável como os moralistas da ética empresarial de hoje conseguem manter a comunidade empresarial constantemente na defensiva. Todos aqueles que desejam regulamentar as empresas estão, eles próprios, “na defensiva” e extraindo renda econômica de suas atividades. O meio de impor tal regulação é o poder político, por meio da legislação pública. No caso das organizações não governamentais (ONGs), a justificativa se baseia em uma certa moralidade, muitas vezes duvidosa. Desse modo, as empresas são expostas ao público e ridicularizadas, da maneira anteriormente reservada para inimigos políticos em tribunais soviéticos.
Muitas empresas entram no jogo dessa fraude ética. Os motivos para isso são variados; alguns cooperam devido a um hábito de obediência; outros o fazem por medo; outros, por pura estupidez. Raramente isso parte de um senso de convicção. Existem cerca de 250.000 PME (pequenas e médias empresas) na Áustria. Já é tempo de essas empresas começarem a refletir sobre o que realmente são e o que realmente fazem. Sem este primeiro passo de reflexão, elas nunca conseguirão criar um espírito de solidariedade para se livrar do jugo.
Em última análise, dependerá de nós, amigos da Escola de Viena, a tarefa de abrir os olhos e conscientizar. Essa tarefa pedagógica está diante de nós.
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Notas
[1] Caro Hans:
É do fundo do meu coração que agradeço as muitas boas discussões que tivemos até agora, bem como seus escritos. Eles me enriqueceram e inspiraram muito. Em minha cidade natal, Viena, que floresceu há muito tempo, encontrei no decorrer de meu desenvolvimento filosófico muitos bons professores, mas, em última análise, nenhum deles foi capaz de lançar uma nova luz filosófica sobre o mundo com uma crítica fundamental. Não havia gênio além da sabedoria convencional e lícita, nenhuma nova direção de pensamento. Hoje posso dizer que a clareza e a lógica estrita de seus pensamentos me despertaram do sono dogmático. Eles me apresentaram um novo e precioso universo intelectual cujas raízes – e essa é a ironia da história – podem ser encontradas aqui em Viena. Em certo sentido, você me devolveu minha cidade natal, na qual me senti perdido como filósofo. Do ponto de vista emocional, também foi um feito inestimável.
Com votos de muitos mais anos produtivos
—Eugen
[2] Estatísticas de Herbert Unterköfler.
[3] Uma proporção muito pequena dos empregados em educação é remunerada através de taxas ou contribuições, ou são empregados do setor privado (e.g., em escolas privadas).
[4] O financiamento do sistema de saúde, serviços de medicina veterinária, e serviços sociais ocorrem principalmente através de pagamentos de transferência. As estatísticas disponíveis cobrem apenas parte daqueles empregados neste setor.
[5] Dados sobre desempregados a auxílio-desemprego incluem 42645 “desempregados” em retreinamento, 27033 beneficiários de pagamentos adiantados de aposentadoria, e 2166 recebedores de “pagamentos temporários”.